Cristian Klein, Raphael Di Cunto, Vanessa Jurgenfeld, Paola de Moura, Marcos de Moura e Souza, Sérgio Ruck Bueno, Marli Lima e Murillo Camarotto
SÃO PAULO, FLORIANÓPOLIS, RIO, BELO HORIZONTE, PORTO ALEGRE, CURITIBA E RECIFE - A possibilidade de coligação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), com o PSDB, numa eventual candidatura do ex-governador José Serra à sua sucessão, não deverá levar a legenda que fundou a uma mudança na política de alianças para as eleições municipais de outubro. Apesar do receio de alas pessedistas de que a associação entre Kassab e Serra marcaria o partido com a pecha de oposicionista, o impacto da candidatura Serra nos arranjos que estão sendo feitos nas 26 capitais é praticamente nulo.
A situação é diferente da verificada quando Kassab abriu negociações com o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para in dicar o vice na chapa do ex-ministro da Educação Fernando Haddad. A iniciativa provocou uma maior inclinação de seções regionais do PSD em direção ao PT, a despeito do histórico de rivalidades locais, como publicado pelo Valor em 24 de janeiro.
Com Serra, de acordo com novo levantamento, o efeito tende a ser residual. E se expressaria mais como uma retaliação de petistas a uma suposta traição ou desfeita de Kassab a Lula. É o caso de Porto Alegre.
Na capital gaúcha, o PSD, liderado pelo deputado federal e ex-goleiro Danrlei, já conversou com as três principais forças: o PT, cujo candidato é o deputado estadual Adão Villaverde; o PCdoB, que lançará a deputada federal Manuela D"Ávila; e o PDT, do prefeito José Fortunati. A decisão ainda não foi tomada e, segundo o líder da bancada na Câmara, Tarciso Flecha Negra, o PSD espera uma definição do quadro local até o fim de março. Mas o vereador afirma que uma aliança do partido com o PSDB em São Paulo dificultaria um acordo com o PT em Porto Alegre pela reação dos próprios petistas. Mesmo assim, isso não vincularia a decisão do partido na cidade.
Em Santa Catarina, a associação entre o PSDB e integrantes do PSD - uma enorme maioria oriunda do DEM - já é estreita. Diante desse quadro, o esforço do governador Raimundo Colombo (PSD) tem sido o de dar ao partido uma feição mais maleável e aproximá-lo dos petistas, ao estilo de Kassab, seu presidente nacional. As negociações em São Paulo ainda não interferiram em seus planos, que seguem sendo o de fazer alianças com legendas distintas, podendo apoiar o PT ou o PSDB, de acordo com a necessidade da disputa em cada município. Do lado do PT, a diretriz é a de não apoiar o PSD no Estado, mesmo que em algumas cidades uma coligação já seja considerada inevitável.
Ao Valor, Colombo disse que há chances, de fato, de uma aliança PT-PSD ocorrer, especialmente, em cidades menores. "Nós não somos preconceituosos, mas cada município tem sua relação de convivência, de identidade. Em alguns lugares, a coligação é de um jeito, em outra, é de outro. A autonomia será do diretório municipal", disse.
Ou seja, uma entrada de Serra em cena pouco deve alterar o cenário local. Prova disso é que há conversações com o PT em municípios de pequeno a médio porte, como Ibirama, Balneário Arroio Silva, Jacinto Machado, Imbituba e Criciúma. Em Criciúma, o PSD não terá candidato próprio e poderá apoiar a chapa PT-PMDB. Já em Imbituba, há chances de PT e PSD se unirem para enfrentar o PSDB.
No entanto, nos três maiores colégios eleitorais do Estado, Joinville, Florianópolis e Blumenau, a união não deve ocorrer. De acordo com o presidente estadual do PT, José Fritsch, a sigla tende a se coligar mais com o PMDB, como em Florianópolis.
No Rio, o PSD é comandado pelo ex-deputado federal Indio da Costa, que foi vice de José Serra na campanha à Presidência da República, em 2010. Uma aliança entre Kassab e Serra, no entanto, não mudaria seu posicionamento a ponto de se juntar a siglas da oposição, como o PSDB. O PSD fluminense é governista e está fechado com o grupo do governador Sérgio Cabral (PMDB).
No Nordeste, argumento de pessedistas é o de que a aliança Serra-Kassab é mais pessoal do que política
O partido apoiará a reeleição do prefeito Eduardo Paes (PMDB), que tem acordo com o PT para indicar o vice, apesar das recentes ameaças de rompimento. Indio da Costa afirma que a aliança com o governador e consequentemente com o prefeito se deve ao bom governo que ambos estão fazendo. "Eles são reconhecidos nacionalmente e internacionalmente pelos resultados que vêm apresentando. Por isso, não há porque brigar com o que está dando certo", diz Indio.
A fidelidade ao governador é grande. O dirigente afirma que nas cidades onde o PSD não lançar candidato próprio - as maiores apostas estão em 15 dos 92 municípios - a sigla não fará coligações com os adversários de Cabral, como PSDB, DEM ou PR.
Em Minas Gerais, o PSD faz parte da base do governador Antonio Anastasia (PSDB) e uma decisão de Kassab em apoiar Serra à Prefeitura de São Paulo colocará a legenda numa posição mais confortável na costura das alianças no Estado. É o que afirma o presidente estadual da sigla, Paulo Simão, embora parte do partido veja com muito desagrado uma coligação em São Paulo com os tucanos.
"Mesmo se o Kassab acabar decidindo pelo PT em São Paulo, nossas conversas com o PSDB não serão comprometidas aqui. Mas é claro que uma decisão do partido em São Paulo pelo PT, levará a pressões aqui nessa direção", afirma Simão, que conta que Kassab se comprometeu a decidir a situação em São Paulo até 15 de março.
Em Belo Horizonte, PT e PSDB fazem parte do governo do prefeito Márcio Lacerda (PSB), que tentará a reeleição. O PT, porém, ameaça romper o pacto e lançar o nome do vice-prefeito Roberto Carvalho.
Simão diz que qualquer que seja a decisão de Kassab ela trará efeitos sobre o PSD em todo o Brasil. "Em especial em Minas, porque temos aqui talvez o provável candidato da oposição à Dilma [o senador Aécio Neves]."
Parte dos integrantes do PSD em Minas, no entanto, consideram um equívoco o apoio aos tucanos em São Paulo.
"As pessoas com as quais conversei estão reagindo a essa possibilidade de o PSD apoiar o Serra com muito desgosto", diz o segundo vice-presidente do partido, o mineiro Roberto Brant.
"As principais lideranças do PSDB fizeram o possível e o impossível para impedir a fundação do PSD. Parlamentares e prefeitos que estavam com a gente tiveram de voltar para o PSDB por pressão dos governadores. Então o partido viu com naturalidade a aproximação com o PT", avalia ele. A crítica de Brant - que foi ministro no governo Fernando Henrique Cardoso - não é a Serra, de quem é amigo e admirador. Mas ao PSDB.
O temor de Brant e seus interlocutores no PSD é que, ao fechar uma aliança com o PSDB em São Paulo, seu partido venha a se desidratar politicamente, como ocorreu com o DEM. "O DEM sofreu muito com a submissão ao PSDB, e o PSD não veio para ser o DEM repaginado. Vai nos transformar numa sucursal do PSDB", critica.
No Paraná, o PSD também dá sustentação a um governador tucano, Beto Richa, porém há menos divergência interna. Em Curitiba, a sigla deve permanecer em seu apoio à reeleição de Luciano Ducci (PSB), aliado de Richa, contra a coligação em formação em torno do ex-deputado federal e ex-tucano Gustavo Fruet (PDT), que contaria com o PT. "Cada Estado é um caso", afirma o deputado federal Eduardo Sciarra, presidente do diretório paranaense do PSD.
Em capitais do Nordeste, o apoio de Gilberto Kassab a José Serra também não terá influência relevante sobre a estratégia do PSD. Aliado de primeira hora do PSB, que governa quatro Estados na região, o partido de Kassab deve seguir à risca as recomendações do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), principal liderança política nordestina e que estará ao lado do PT na grande maioria dos palanques, apesar das ótimas relações que mantém com o tucanato.
O argumento predominante entre os representantes locais do PSD é de que a aliança Serra-Kassab é mais pessoal do que política. "Trata-se de uma afinidade entre duas pessoas e não entre dois partidos", afirmou o ex-deputado federal pelo DEM André de Paula, atual presidente do PSD em Pernambuco.
O partido no Estado estará alinhado com a Frente Popular, grupo de 16 legendas comandado por Campos e que inclui o PT. "Temos uma sintonia muito grande com Eduardo (Campos) e esse será nosso caminho", afirmou o dirigente.
O cenário é bem parecido no Ceará, onde a criação do PSD ajudou o governador Cid Gomes (PSB) a fazer o que foi chamado localmente de "lipoaspiração" no tucanato. De acordo com o presidente estadual do PSD, Almircy Pinto, a maior parte dos 40 prefeitos conquistados pela nova legenda veio do PSDB.
Funcionário do gabinete de Cid, Almircy afirmou que as alianças municipais serão fechadas em comum acordo com o governador na maioria dos casos. É pequena a possibilidade, portanto, de qualquer coligação com os tucanos cearenses. "Essa candidatura do Serra não muda nada. O Kassab sempre disse que era leal a ele. É um problema da política paulista, que é uma ilha nessa imensidão que é o Brasil", disse o presidente estadual do PSD.
Na Bahia, fora da zona de influência direta de Eduardo Campos, o PSD também não indica qualquer mudança de direção. O vice-presidente nacional do partido, Otto Alencar, é também vice-governador da Bahia, Estado governado pelo PT e onde o PSDB respira por aparelhos. Em Sergipe, o PSD está alinhado com o governador petista Marcelo Déda.
No único Estado do Nordeste governado pelos tucanos, Alagoas, o PSD é presidido pelo deputado federal João Lyra, adversário ferrenho do governador Teotônio Vilela Filho (PSDB). Sob o comando do parlamentar, a tendência é que o PSD marche ao lado do senador Renan Calheiros (PMDB), outro inimigo do governador. O PT, pouco representativo no Estado, deve seguir com este grupo.
Na Paraíba, o ex-tucano Rômulo Gouveia, governador em exercício e presidente regional do PSD, minimiza o efeito de uma decisão em São Paulo sobre as alianças estaduais. "As realidades são diferentes já no plano estadual e ainda mais no municipal", diz. Ele lembra que PT e PSDB fazem parte tanto da administração do governador Ricardo Coutinho quanto do prefeito de João Pessoa, Luciano Agra, ambos do PSB.
Nas demais capitais, o impacto da decisão de Kassab em São Paulo também deve esbarrar na conjuntura local. Até o presidente nacional do PSDB, deputado federal Sérgio Guerra (PE), tem poucas esperanças de que uma candidatura Serra reforce a posição dos tucanos nas disputas país a fora. "Não tem muito rebatimento. A candidatura ajuda a imagem do partido no sentido geral, mas não especificamente".
FONTE: VALOR ECONÔMICO