segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

OPINIÃO DO DIA - Andrea Matarazzo::domínio

Os nossos adversários querem fazer da conquista de São Paulo o passo final do processo hegemônico do Brasil. Os nossos adversários, em especial o PT, querem repetir a gestão nefasta e destruidora que fizeram em São Paulo. Nesse contexto, José Serra decidiu que gostaria de participar do processo eletivo de São Paulo. Nós não podemos desprezar o currículo de José Serra

Não podemos deixar que importem de Brasília os métodos nefastos do PT, que tem a cada mês que substituir um ministro

Andrea Matarazzo, secretário de cultura do estado de S. Paulo, O Globo, 27/2/2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Após reduzir verba, governo promete nova base em 2 anos
Farc dizem que não vão mais sequestrar
Equador: 140 intelectuais contra Correa
Matarazzo e Covas desistem para apoiar Serra

FOLHA DE S. PAULO
Após reduzir verba, governo promete nova base em 2 anos
Farc dizem que não vão mais sequestrar
Equador: 140 intelectuais contra Correa
Matarazzo e Covas desistem para apoiar Serra

O ESTADO DE S. PAULO
Reconstrução da base na Antártida vai levar um ano
18 quilômetros 'sumiram' em obra de estrada privatizada
G-20 aumenta pressão sobre a Alemanha
Serra disputará pressão em SP com 2 tucanos

VALOR ECONÔMICO
Mercado mantém cautela mesmo com alta da Bolsa
Empresas no país elevam gastos com TI
G-20 reafirma regulação de bancos
Apostas para a Rio+20
Cruzamento de dados eleva arrecadação
Restrição a vinhos será analisada

CORREIO BRAZILIENSE
Fisco vigia cartão para flagrar gasto superior à renda
Base deve ser reerguida em dois anos
Faxina de Dilma deixa o segundo escalão de fora

ESTADO DE MINAS
O leão à espreita a partir de quinta-feira
Projetos importantes e campanha nas ruas
Antártida

ZERO HORA (RS)
Fogo consome história do Brasil na Antártica

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Dilma volta ao Estado com agenda política
Brasil manterá pesquisas na Antártida

Matarazzo e Covas desistem para apoiar Serra

Andrea Matarazzo e Bruno Covas, secretários estaduais em SP, desistiram de suas pré-candidaturas a prefeito pelo PSDB para deixar o caminho livre para o ex-governador José Serra. Mas José Aníbal e Ricardo Trípoli disseram que continuam na disputa e não aceitam adiar a data das prévias

Matarazzo e Covas desistem em favor de Serra

Ricardo Trípoli e José Aníbal não chegam a um acordo com Alckmin, e prévia tucana está mantida para o próximo domingo

Sérgio Roxo, João Sorima Neto,  Silvia Amorim e Marcos Alves

SÃO PAULO. Dos quatro postulantes a disputar o cargo de prefeito de São Paulo pelo PSDB, dois - José Aníbal e Ricardo Trípoli - disseram ontem, em conversa com o governador Geraldo Alckmin, que vão manter suas pré-candidaturas e que não aceitam adiar a data das prévias, marcadas para o próximo domingo. Serra deve enviar hoje ao partido uma carta para formalizar a sua intenção de disputar as prévias tucanas e a prefeitura.

Se a posição de Trípoli e Aníbal não for revertida, Serra terá de enfrentar as prévias, mas ele não se opõe. Ontem, o secretário estadual de Cultura, Andrea Matarazzo, anunciou a sua desistência da disputa. O quarto postulante, o secretário estadual do Meio Ambiente, Bruno Covas, deve fazer anúncio semelhante hoje de manhã. Na noite de sábado, porém, ele já avisara ao governador Geraldo Alckmin que aceita abrir mão da pré-candidatura. Ontem à noite, ele se reuniu com seus apoiadores para justificar a sua desistência. Disse ser um homem de partido e que não poderia dizer não a um pedido de Alckmin.

´Pré-candidatos mantém agenda com militância

Os dois pré-candidatos que resistem a desistir das prévias foram recebidos juntos por Alckmin, no Palácio dos Bandeirantes, ontem pela manhã. O governador formalizou a Aníbal e Trípoli a intenção de Serra de concorrer, mesmo com o prazo de inscrição para as prévias já encerrado.

- Foi uma conversa tranquila. O governador quis saber se tínhamos alguma oposição à entrada de Serra, apesar de o prazo de inscrição das prévias ter se encerrado. Tanto eu como o Aníbal, dissemos que não abrimos mão da disputa das prévias e também queremos que elas sejam realizadas na data marcada. Toda militância está na rua e já temos compromissos agendados. Adiar as prévias não tem sentido - afirmou o deputado federal Ricardo Trípoli.

- Seria um anticlímax adiar. Péssimo. Já pedimos para as pessoas se programarem, não viajarem no final de semana - disse o secretário estadual de Energia, José Aníbal.

Diante da resistência da dupla ao primeiro pedido, Alckmin nem teve clima para abordar com eles uma possibilidade de desistência. Ontem, os dois pré-candidatos mantiveram a agenda de encontro com militantes em bairros da capital.

Aníbal avalia que Serra não precisa de tempo para divulgar a sua candidatura entre os militantes tucanos.

- A candidatura do Serra já está sendo amplamente divulgada - afirmou.

Matarazzo reuniu parte de seus apoiadores e a imprensa, na tarde de ontem, para anunciar que desistiu da pré-candidatura à prefeitura. Em um discurso recheado de críticas ao PT, justificou ser amigo de Serra e que, por isso, seria impossível entrar em uma disputa contra o ex-governador.

- Nunca vocês vão me ver disputando uma eleição com o Serra. Nós somos do mesmo grupo político e somos amigos. Não faria sentido.

Contou ainda que o ex-governador falou com ele, na quinta-feira, sobre a possibilidade de disputar a prefeitura. No mesmo dia, Serra se encontrou com Alckmin.

- O Serra sempre terá mais credenciais do que eu para disputar alguns cargos.

Também afirmou acreditar que Serra reviu a sua decisão de não disputar a prefeitura porque enxergou que a "ameaça da volta do PT a São Paulo poderia ser uma realidade".

- Os nossos adversários querem fazer da conquista de São Paulo o passo final do processo hegemônico do Brasil. Os nossos adversários, em especial o PT, querem repetir a gestão nefasta e destruidora que fizeram em São Paulo (na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy). Nesse contexto, José Serra decidiu que gostaria de participar do processo eletivo de São Paulo. Nós não podemos desprezar o currículo de José Serra - afirmou.

Matarazzo diz que seus votos vão para Serra

Matarazzo disse ainda contar com cerca de 2.600 votos dos cerca de 6.000 militantes que devem participar das prévias e afirmou que esse apoio será transferido para Serra.

- Não podemos deixar que importem de Brasília os métodos nefastos do PT, que tem a cada mês que substituir um ministro - disse.

O secretário garantiu que Serra abriu mão de seu projeto nacional e não renunciará novamente à prefeitura, como fez em 2006, quando deixou o cargo um ano e três meses depois de tomar posse para disputar o governo do estado. Um discurso semelhante havia sido adotado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, aliado do ex-governador tucano, no sábado, numa pista de como os tucanos vão rebater as dúvidas que devem ser levantadas pelos adversários em relação à permanência de Serra na prefeitura até o final do mandato.

- Tenho certeza que ele voltará e ficará provavelmente quatro anos ou, quem sabe, oito anos na prefeitura - afirmou Matarazzo.

Numa forma de pressão aos dois pré-candidatos que seguem na disputa, apoiou o adiamento das prévias.

- Defenderia, sim, o adiamento. Não acharia um problema, se eu estivesse disputando. Vai adiar no máximo dez dias.

Hoje, os pré-candidatos à prefeitura de São Paulo têm um debate agendado numa universidade. A dúvida entre os tucanos é se Serra participará do encontro.

FONTE: O GLOBO

Serra disputará pressão em SP com 2 tucanos

Com a entrada de Jossé Serra na disputa pela Prefeitura de São Paulo, os secretários estaduais Andrea Matarazzo (Cultura) e Bruno Covas (Meio Ambiente) decidiram retirar a inscrição na prévia que vai definir o candidato do PSDB. Outros dois tucanos prometeram ir até o fim na disputa contra Serra: José Aníbal e Ricardo Trípoli

Dois pré-candidatos desistem em favor de Serra, mas prévia do PSDB é mantida

Julia Duailibi, Fausto Macedo

A decisão de José Serra de entrar na disputa pela Prefeitura de São Paulo forçou a intervenção do governador Geraldo Alckmin (PSDB) que, ontem, reuniu-se com nomes da sigla inscritos para a prévia, marcada e mantida para o próximo 4 de março, para informá-los sobre a entrada tardia do ex-governador no páreo e negociar desistências das pré-candidaturas. A primeira baixa foi do secretário estadual da Cultura, Andrea Matarazzo, que renunciou ontem à pré-candidatura. Bruno Covas, secretário do Meio Ambiente, repete o script hoje. Mas o secretário José Aníbal (Energia) e o deputado estadual Ricardo Tripoli disseram a Alckmin que não desistem e não aceitaram mudar a data da consulta interna.

Alckmin chamou Aníbal e Tripoli para uma conversa no Palácio dos Bandeirantes ontem, ainda pela manhã. Sondou-os sobre a possibilidade de postergar a eleição interna - o grupo serrista quer mais tempo para aglutinar apoios em torno do nome do ex-governador. Serra disse a Alckmin que entraria na disputa na sexta-feira e deve fazer o anúncio oficialmente hoje. A aproximação do PSD, criado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, ao PT foi fundamental para aumentar a pressão sobre o tucano. A única hipótese de Kassab desistir da aliança com os petistas seria a candidatura de Serra.

Aníbal e Tripoli disseram a Alckmin que aceitavam a entrada de Serra na corrida, mesmo fora da data de inscrição da prévia - o prazo terminou no dia 14 de fevereiro. Os dois não recuaram e argumentaram a Alckmin que o ex-governador tem de se submeter ao pleito interno no próximo domingo e também comparecer hoje à noite ao debate do partido, o último programado. A cúpula tucana tentava ontem adiar o debate, o que provocou a reação dos pré-candidatos.

"As prévias estão garantidas no dia 4 de março, conforme combinado em novembro", declarou Aníbal. "Lamento a saída dos outros dois. Mas acho muito bom que o Serra vá se inscrever. O processo segue." Tripoli, por seu lado, deixou claro que não abre mão da disputa. "A militância continua proprietária do processo. Portanto continuo candidato."

Coube a Alckmin dizer aos dois pré-candidatos que Covas e Matarazzo desistiriam das pré-candidaturas. Na conversa, o governador disse também que, diferentemente de 2004, quando entrou em campo para desmarcar a pré-convenção então agendada para que Serra disputasse a Prefeitura, desta vez não pediria aos postulantes que não concorram.

Ritual da renúncia. Às 17h35 de ontem, em uma sala acanhada no centro da cidade, depois de sete meses de campanha, "sempre de paletó, gravata e abotoaduras" - paramentos que ontem não exibia -, Matarazzo anunciou sua renúncia a um reduzido grupo de correligionários, a quem citou quase todos pelo nome e deles recebeu aplausos.

O secretário da Cultura revelou-se um dedicado cabo eleitoral de Serra. "Aqui abro mão da minha candidatura e peço ao meu grupo que substitua meu nome pelo nome de José Serra nessas prévias. O processo eleitoral das prévias continua, o que muda é apenas o nome. Abro mão do meu lugar e faço isso com orgulho, por alguém que é exemplo de homem público."

Matarazzo afirmou que Alckmin não lhe pediu "nem que entrasse (na prévia) nem que saísse". E que "não vai postular" nada, ante a indagação se almeja a vaga de vice do ex-governador caso o PSDB opte por uma chapa "puro-sangue". Ele foi categórico ao comentar seu gesto, a uma semana das prévias. "Tem uma coisa que é da minha formação: a questão da precedência e da hierarquia. Vocês não verão nunca eu disputando uma eleição com o Serra. Somos do mesmo grupo político. O Serra sempre estará mais credenciado do que eu."

Ontem à noite, Covas comunicou a decisão à militância, mas evitou a imprensa. Hoje ele anuncia a desistência.

Colaborou Luiz Guilherme Gerbelli

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Dois tucanos desistem de prévias para apoiar Serra

Os secretários do governo paulista Andrea Matarazzo (Cultura) e Bruno Covas (Meio Ambiente) desistiram ontem de desputar as prévias do PSDB que definirão o candidato do partido à Prefeitura de São Paulo.

Os dois já declararam apoio a José Serra, que decidiu pela candidatura na semana passada. José Aníbal e Ricardo Tripoli seguem na disputa da vaga.

Dois desistem para apoiar Serra no PSDB e esvaziam prévias

Andrea Matarazzo e Bruno Covas abandonam disputa e defendem candidatura do ex-governador à prefeitura

Alckmin mobiliza aliados para adiar votação, mas outros dois pré-candidatos resistem à articulação

Catia Seabra, Daniela Lima e Mariana Carneiro

BRASÍLIA, SÃO PAULO - Dois pré-candidatos tucanos decidiram ontem abandonar a corrida à Prefeitura de São Paulo para apoiar o ex-governador José Serra, esvaziando as prévias convocadas pelo PSDB para definir seu candidato a prefeito.

O secretário estadual de Cultura, Andrea Matarazzo, anunciou ontem sua desistência e o apoio a Serra. O secretário do Meio Ambiente, Bruno Covas, anunciará hoje a retirada de seu nome.

Aliados de Geraldo Alckmin passaram o dia tentando convencer os dirigentes do partido a adiar as prévias, para dar a Serra mais tempo para entrar no processo. Em uma reunião ontem à noite, o governador fixou o dia 11 de março como o ideal para realizar a consulta, marcada antes para o dia 4.

O grupo de Alckmin diz ter reunido número de votos necessários para mudar a data. No entanto, a reunião da executiva municipal do partido que estava marcada para hoje foi adiada para amanhã.

O ex-governador, que no início do ano dizia não ter interesse na eleição municipal e mudou de ideia nas últimas semanas, deve formalizar hoje a decisão de concorrer à Prefeitura por meio de uma carta endereçada ao partido.

As prévias foram convocadas quando Serra se dizia fora do páreo. Como o prazo para inscrições acabou em fevereiro, o partido terá que encontrar agora uma maneira de incluir Serra no processo.

Alckmin conversou ontem com os outros dois pré-candidatos inscritos nas prévias, o secretário de Energia, José Aníbal, e o deputado federal Ricardo Tripoli, mas não conseguiu convencê-los a aceitar o adiamento da consulta. Ambos disseram que não se opõem à entrada tardia de Serra nas prévias, mas resistem ao adiamento.

"Já mandei carta para eleitor e assumi compromissos", disse Tripoli, ao justificar sua posição contrária ao adiamento. Para Aníbal, mudar a data da consulta agora só serviria para "tensionar" o partido. "Serra é conhecido por todo mundo", afirmou. "De que mais tempo ele precisa?"

"Um soldado"

Ao anunciar sua desistência em entrevista coletiva ontem à tarde, Matarazzo lembrou sua ligação antiga com Serra, de quem é amigo. Ele defendeu o adiamento da consulta. "Não vejo problema, não vai adiar mais do que dez dias", disse o secretário.

Covas comunicou sua decisão ontem para Serra e ofereceu uma saída jurídica para sua entrada na disputa, sugerindo que poderia pedir formalmente à executiva do partido a substituição do seu nome pelo do ex-governador.

Segundo Covas, o procedimento está previsto na legislação eleitoral brasileira e poderia ser adotado pelo PSDB no caso de Serra, na ausência de norma que trate do assunto no estatuto do partido.

Na conversa que teve ontem com o ex-governador, Covas apresentou-se como "um soldado" de sua candidatura. Ele deverá assumir um posto na coordenação da campanha se o PSDB confirmar a indicação de Serra.

Segundo o Datafolha, Serra é o tucano com melhores chances na corrida à Prefeitura. Ele tem 21% das intenções de voto na sondagem mais recente, de janeiro. Mas o ex-governador também enfrenta alto índice de rejeição. Um de cada três eleitores diz que jamais votaria nele.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Monólogo :: Aécio Neves

O governo da presidente Dilma encena um monólogo a dois no qual uma das partes -o governo- fala e determina, e a outra -o Congresso- cala e obedece.

O corte no Orçamento, de R$ 55 bilhões, que extirpou todas as emendas parlamentares, reforçou o traço autoritário existente na relação entre os dois Poderes, sinalizando a manutenção de uma política baseada na barganha.

Conhecemos esse filme: cortam-se todas as emendas para que possam ser liberadas em conta-gotas a alguns escolhidos ou em épocas de votações de interesse do governo.

Se há que condenar os casos em que as emendas servem a interesses escusos e em que existem as que são destinadas a investimentos supérfluos, não tem como desconsiderar que, quando corretas, são instrumentos importantes. Representam, muitas vezes, a única chance de centenas de municípios brasileiros terem necessidades atendidas, pois nem sempre os investimentos do Executivo pautam-se por critérios republicanos.

O ano passado já havia sido marcado por demonstrações de autoritarismo do Executivo sobre o Legislativo. A decisão do governo de retirar do Legislativo a prerrogativa de fixar o valor do salário mínimo -sem entrar no mérito ou na legalidade da iniciativa, mas me atendo ao seu sentido político- foi um marco triste na história do Congresso.

É possível imaginar qual teria sido a posição do PT se a mesma iniciativa tivesse partido de um governo do PSDB.

O mesmo aconteceu com a PEC 11, que cria novo rito de tramitação para as MPs editadas pelo Executivo e reconstitui parte do papel constitucional do Legislativo no exame das medidas. Aprovada no Senado por meio de acordo, a base governista acabou repreendida pelo Palácio do Planalto em função do apoio dado ao que é consenso na Casa. Não por acaso, a PEC adormece, desde agosto, no esquecimento da Câmara dos Deputados.

Blindada pela muralha das alianças de conveniência, o governo ignora o Congresso como instituição e apequena a relação entre os Poderes. Sou um dos que se perguntam até quando os próprios aliados resistirão em silêncio ao desrespeito continuado.

Nesse momento, em que o Legislativo prepara-se para discutir temas importantes como o pré-sal, os royalties sobre minérios e o Código Florestal, não interessa à sociedade que tal debate ocorra em um Congresso fragilizado. São temas que pertencem à agenda do futuro dos brasileiros e não podem estar submetidos aos interesses imediatos ou à conveniência de um governo, qualquer que seja ele.

Só um Congresso em pleno exercício das suas prerrogativas pode garantir ao país as salvaguardas necessárias para que prevaleça o interesse nacional.

Aécio Neves, senador (PSDB-MG).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Odeio-te, meu amor:: Ricardo Noblat

"A questão da Presidência da República está encerrada na vida de Serra" (Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo)

Dá-se como certo que José Serra disputará este ano a prefeitura de São Paulo, embora somente hoje ele deva formalizar seu desejo. Desde já, quer-se dar também como certo que ele renunciou em definitivo à ideia de ser candidato a presidente da República pela terceira vez. Rendeu-se — e por que não? — à tese do "candidato óbvio", Aécio Neves.

Até outro dia, Serra dizia acreditar em suas chances de enfrentar Dilma em 2014, derrotando-a talvez. E dizia não acreditar que Aécio pudesse fazê-lo.

Considerava- o um candidato fraco, sem disposição para travar combates, e vulnerável a dossiês que costumam circular durante campanhas eleitorais. De repente, um anjo desceu do céu, cochichou no ouvido de Serra e ele mudou de opinião — quanto ao seu e ao futuro de Aécio.

Acredite quem quiser... Há muitas pedras no meio do caminho de Serra em direção à prefeitura. Uma delas: sua renúncia ao cargo de prefeito em 2006 para concorrer ao governo de São Paulo.

Os desafetos de Serra haviam avisado com antecedência: não votem nele. Se votarem e ele for eleito, largará o mandato no meio para tentar se eleger governador. Serra respondeu que jamais procederia assim.

E para mostrar que falava sério, provocado por um jornal, pôs por escrito a promessa de cumprir até o fim o mandato de prefeito. Vexame! Que será relembrado à exaustão na próxima campanha.

O antídoto ao vexame começou a ser aplicado no último sábado por Gilberto Kassab (PSD), o vice que completou o mandato de Serra e se elegeu prefeito depois. Kassab falou: "Ele quer ser prefeito de São Paulo. E abandonou essa opção (a de concorrer à Presidência)".

Quem já viu algum político abdicar da opção de reunir mais poder? Assim como Aécio não suou a camisa para eleger Serra presidente em 2002 e em 2010, Serra também não vai suar a sua se, por acaso, Aécio for candidato a presidente daqui a dois anos.

Mas o tempo costuma aprontar surpresas. E se Aécio não for candidato? Anastasia, ex-vice de Aécio, eleito por ele governador de Minas Gerais, não poderá ser candidato a novo mandato em 2014.

Abre-se espaço para o atual vice, Alberto Pinto Coelho (PP), quatro vezes deputado estadual. Só que a eventual eleição dele não será um passeio. É possível então que Aécio se veja compelido a voltar ao governo. Aí...

Aí chega de tanta especulação! De concreto: entre se limitar a fazer política nas redes sociais (blog, Twitter, Facebook) ou passar a fazê-la a partir da prefeitura de São Paulo, Serra escolheu o certo.

Caso se eleja provará do gosto saboroso de ter batido Lula, que impôs ao PT a candidatura de Fernando Haddad, ex-ministro da Educação. Caso perca...

Bem, dirá que nunca faltou ao partido nas horas mais difíceis e sempre que o partido precisou dele. É verdade! Nem por isso será uma verdade menos amarga.

Desejará mais tarde ser candidato a deputado federal como foi em 1986 ao dar início à sua carreira política? Ou viverá o resto da vida como professor e economista? Serra tem a ganhar e a perder ao ambicionar a prefeitura de São Paulo pela quarta vez.

Geraldo Alckmin (PSDB), governador de São Paulo, só tem a ganhar com a ambição de Serra. O mundo gira e a Lusitana roda. Há quatro anos foi Alckmin que dependeu de Serra para se eleger prefeito da capital.
Agora é o contrário.

Se Alckmin não jogar pesado para eleger Serra, ele não se elegerá — como Alckmin não se elegeu quando Serra, governador, preferiu a companhia de Kassab. Ali, Serra e Alckmin se tornaram mais do que desafetos. O que um dizia do outro era impublicável.

Não fizeram as pazes. Estão juntos por conveniência. Se Serra recusasse a candidatura a prefeito, Alckmin ganharia debitando na conta dele a derrota de qualquer outro nome do PSDB. Se Serra se eleger, Alckmin ganhará. Candidato à reeleição, será ajudado pelas máquinas do governo e da prefeitura.

Se Serra perder...Bem, Alckmin celebrará em silêncio.

FONTE: O GLOBO

Quem dá mais?:: José Roberto de Toledo

A entrada de paraquedas de José Serra na corrida eleitoral em São Paulo altera alguns, mas não todos os aspectos da sucessão paulistana. Continua sendo uma eleição mais favorável à oposição do que à situação. Permanece a divisão do eleitorado em três grupos: petistas, antipetistas e independentes. O clima econômico positivo não prejudica o candidato federal. O que muda, então?

1) Grau de conhecimento dos candidatos. Por comparação, Serra é um gigante entre nanicos: 92% o conhecem bem (73%) ou ao menos um pouco (19%), segundo pesquisa Datafolha de janeiro. Ele é quatro vezes mais conhecido do que seu principal adversário, o petista Fernando Haddad, e três vezes mais do que Gabriel Chalita (PMDB).

Serra alcançou 21% das intenções de voto quando seu nome foi estimulado pelo pesquisador (embora fique em 2% na pesquisa espontânea, porque disse e repetiu que não seria candidato a prefeito). Não se sabe quanto disso é fama e quanto é voto, mas os 21% lhe dão uma velocidade inicial muito maior do que a de seus adversários diretos. Haddad e Chalita ainda patinam entre 4% e 6%.

No caso de Serra, porém, mais reconhecimento implica mais rejeição: um terço dos paulistanos disse que não votaria nele, principalmente petistas e os mais críticos à atual gestão municipal. Por isso, interessa a Serra uma campanha curta e intensiva. Uma longa exposição, como aconteceu em 2010, só aumentaria o risco de desgastar sua imagem. É o oposto do que seria a campanha do PSDB se o candidato do partido fosse, por exemplo, Bruno Covas.

2) Quem representa o governo do prefeito Gilberto Kassab. Se a articulação de Lula para cooptar o PSD em São Paulo tivesse dado certo, o ônus de defender a gestão kassabista ficaria dividido entre PT e PSDB. Com Serra na disputa, o atual prefeito sai da esfera tucana para a petista. Serra ganha a ajuda da máquina municipal, um tempinho a mais na TV e o peso de falar bem de uma prefeitura malvista por 4 em cada 10 eleitores. O saldo tende a ser mais negativo do que positivo, porque reforça sua rejeição.

Kassab só virou prefeito por causa de Serra, que deixou a Prefeitura com menos de dois anos de mandato para se eleger governador. O tucano tem uma escolha a fazer: ignorar ou defender a atual gestão. Os adversários não tornarão fácil a primeira opção - e ficar em cima do muro já mostrou ser uma má ideia em 2010. Restará tentar melhorar a imagem do governo Kassab durante o horário eleitoral na TV. Para isso, Serra precisará de tempo de propaganda.

3) Quem galvanizará o antipetismo. Serra sai na frente das pesquisas, mas não é certo que chegue ao segundo turno. O fracasso de Geraldo Alckmin em 2008 relembrou que quando o PSDB racha e tem pouco tempo de TV o candidato tucano chega em terceiro ou quarto lugar - também foi assim em 1988, 1992, 1996 e 2000. A primeira missão de Serra é curar as feridas tucanas, depois somar partidos coligados, e, só então, mirar no eleitorado antipetista.

O primeiro turno em São Paulo deverá replicar as prévias republicanas nos EUA: uma corrida para o eleitorado conservador decidir quem tem mais chances de bater Barack Obama no turno final. Haddad não é Obama, obviamente, mas o candidato do PT, fosse quem fosse, sempre chegou ao segundo turno paulistano. Foram cinco vezes seguidas. Isso fecha a porta para um candidato à esquerda do petista.

Quem mais ameaça tomar a vaga do PSDB no segundo turno é o PMDB, pois tem o segundo maior número de spots publicitários na TV, atrás apenas do PT. Se fechar alianças com PSC e PTB, adotar um discurso crítico a Kassab, repisar a promessa descumprida por Serra de não abandonar a Prefeitura e cativar o eleitorado religioso, Chalita pode se viabilizar no final. Hoje, porém, ele perde eleitores com a entrada do tucano.

São os spots, estúpido! Por essas três razões, o nome do jogo é coligação. A primeira briga é por tempo de TV - especialmente pelas propagandas de 15 a 60 segundos distribuídas ao longo da programação. Elas são o principal trampolim para alcançar o eleitor a partir de 21 de agosto. É vital para PT, PSDB e PMDB o tempo de outros partidos, que vão cobrar caro pelo apoio. O leilão está aberto.

Quanto vale um spot de propaganda eleitoral na TV em São Paulo? Os spots são diários e variam de 15 a 60 segundos. Eles devem ser distribuídos em quantidades iguais em quatro faixas de horário, com diferentes audiências: das 8h ao meio-dia, do meio-dia às 18h, das 18h às 21h e das 21h à meia-noite. Vão ao ar em todos os canais. Na média, dá mais de R$ 250 mil por 30 segundos. São 45 dias de propaganda só no primeiro turno. Faça as contas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Analistas: PSDB tem dificuldades para renovar quadros em São Paulo

Entrada de Serra na disputa pela prefeitura deixaria caminho aberto para Aécio concorrer à Presidência em 2014

SÃO PAULO. Cientistas políticos ouvidos pelo GLOBO consideram que a entrada do ex-governador José Serra na disputa pela prefeitura mostra a dificuldade do PSDB de renovar seus quadros no estado. Os especialistas avaliam que, embora tenha uma rejeição alta entre os eleitores da capital paulista (33%, segundo pesquisa do Datafolha), Serra é o único nome do PSDB com reais chances de vencer. E isso altera o desenho que a eleição municipal vinha tomando, com a aproximação entre o PT e o PSD do prefeito Gilberto Kassab. Além disso, analisam, a decisão abre espaço para que o senador Aécio Neves seja o candidato natural dos tucanos na disputa pela Presidência, em 2014. Mesmo assim, segundo esses especialistas, isso não invalida a possibilidade de Serra voltar a disputar as eleições presidenciais em 2018.

- A entrada de Serra na disputa foi um pedido de socorro do partido a ele. O PSDB tem dificuldade de renovar seus quadros em São Paulo. E a aproximação entre o PSD do prefeito Gilberto Kassab e o PT foi decisiva para que Serra entrasse no jogo. O PSDB corria o risco de perder a eleição para prefeito na cidade e para o governo do estado, em 2014. Serra é um nome forte, mas o jogo desta vez é mais arriscado do que em 2004, quando ele se elegeu prefeito sendo franco favorito. A rejeição a Serra é grande e tende a aumentar ao longo da campanha, podendo chegar a 40%. Não estou dizendo que ele vai perder, mas o risco é maior - diz o cientista político Fernando Abrucio, professor da Fundação Getúlio Vargas.

Para Abrucio, a pré-candidatura de Serra à prefeitura define quem é o candidato do partido nas eleições presidenciais de 2014: Aécio Neves. Mas o cientista político não descarta que Serra ainda pretenda ser presidente.

- Em 2006, Serra avaliou que Lula dificilmente perderia. Por isso, mesmo sendo o preferido do partido, abriu mão da candidatura para que Geraldo Alckmin enfrentasse Lula. O mesmo deve acontecer com Dilma. Portanto, Serra abriria mão da disputa em 2014 em favor de Aécio para voltar em 2018, após mais de 16 anos da era Lula - diz Abrucio.

Na avaliação do cientista político Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Análise e Pesquisa da Comunicação (Cepac), o PSDB tem um núcleo duro de lideranças, que há mais de 15 anos disputa as eleições em São Paulo e em nível nacional. Isso mostra a dificuldade de renovação de quadros do partido.

- Essa renovação não é fácil. O PT conseguiu renovar seus quadros basicamente pela transferência de apoio do Lula, que saiu do governo com nível de aprovação nunca visto antes neste país - diz Figueiredo.

Para ele, o natural agora seria Serra se aproximar e apoiar Aécio na disputa presidencial em 2014. Figueiredo não acredita que, se eleito prefeito de São Paulo, Serra abandonaria o cargo para uma nova disputa à Presidência em 2014.

- Seria um golpe baixo para a opinião pública, considerando que ele já deixou a prefeitura de São Paulo para concorrer ao governo do estado. Depois, deixou o governo para concorrer à presidência. E no atual quadro político, avalio que seria muito difícil ele se apresentar como candidato contra a Dilma, que terá muita força em 2014 - avalia Figueiredo.

Para Fernando Antônio Azevedo, professor de ciência política da Universidade de São Carlos (UFSCar), a entrada de um "político da velha guarda" como Serra altera o desenho que a eleição municipal em São Paulo vinha tomando. Ele considera que, embora a taxa de rejeição de Serra seja alta, ele tem um bom ""recall" político e é um nome forte para a formação de uma aliança política mais sólida. Para Azevedo, pesa também contra Serra o fato de a atual administração de Gilberto Kassab estar mal avaliada pelos paulistanos. Serra e Kassab sempre foram aliados em São Paulo.

- Se a aliança entre PSD e PT vingasse, a campanha de Fernando Haddad (PT) pouparia a atual administração de Kassab de críticas. Com a entrada de Serra e o apoio de Kassab a ele, a eleição em São Paulo novamente será polarizada entre PSDB e PT - diz Azevedo.

Segundo ele, a dificuldade do PSDB de renovar seus quadros em São Paulo deve-se à própria formação do partido.

- É um partido de notáveis. Foi criado e dominado por políticos desse tipo e, apresenta dificuldade de renovação interna. Entre os pré-candidatos tucanos na disputa pela prefeitura de São Paulo, apenas Bruno Covas era uma novidade.

FONTE: O GLOBO

Após reduzir verba, governo promete nova base em 2 anos

Depois de gastar apenas metade do orçamento previsto para o programa brasileiro na Antártica no ano passado, deixando de aplicar R$9 milhões, o governo promete agora reconstruir em dois anos a Estação Comandante Ferraz. Um incêndio na madrugada de sábado matou dois militares e destruiu 70% das instalações. Pesquisadores choravam ontem a morte dos companheiros de missão e a destruição das pesquisas. O governo estuda usar o navio polar Almirante Maximiniano como base provisória

Nova estação em dois anos

Marinha diz que 70% da base foram destruídos, e Ministério da Defesa investiga curto-circuito

Roberto Maltchik

TRAGÉDIA NO GELO

A Marinha contabilizou a destruição de 70% da Estação Antártica Comandante Ferraz, após o incêndio que matou dois militares, feriu um terceiro e causou sérios prejuízos à pesquisa científica brasileira no continente gelado. O Ministério da Defesa investiga se um curto-circuito na praça de máquinas da EACF provocou o acidente. No sábado, o ministro da Defesa, Celso Amorim, disse que o planejamento da nova estação Antártica, na Ilha Rei George, deve começar já a partir de hoje e a base deve ser totalmente refeita em dois anos. Segundo o ministro, a nova base terá uma arquitetura nova, mais "completa e orgânica".

- A nossa ideia é imediatamente, já, chamar arquitetos para fazer desenhos, inclusive um desenho mais novo. Não estou dizendo que é por isso que aconteceu o incêndio, mas, obviamente, a base começou há 30 anos, então, ali ela foi agregando um pedaço ou outro. Agora já podemos pensar numa coisa para o futuro, digamos, de maneira mais completa, mais orgânica - disse Amorim.

Haverá urgência no levantamento dos estragos na estrutura física dos equipamentos de medição científica, bem como na elaboração do inventário das informações científicas consumidas pelo fogo. Segundo a Marinha, o prédio principal, onde ficava a parte habitável e alguns laboratórios da estação, foi totalmente destruído. Porém, o ministro da Ciência e Tecnologia informou que alguns contêineres, como os que armazenavam equipamentos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), podem ter sido preservados.

- O programa antártico é estratégico para o país. Então, não pode parar, obviamente. Temos que fazer esse inventário nas próximas semanas. Equipamentos que fazem medições permanentes e tiveram que parar. Esse é o exemplo das medições do oceano e da atmosfera. Parou isso? Isso tem que ser continuado - explicou Raupp.

A Marinha informou que os refúgios (módulos isolados para casos de emergência), os laboratórios (de meteorologia, de química e de estudo da alta atmosfera), os tanques de combustíveis e o heliponto, estruturas isoladas do prédio principal, resistiram ao incêndio. O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT&I), Marco Antônio Raupp, determinou a realização de estudo para avaliar se o navio polar Almirante Maximiliano, que opera desde 2009 e auxiliou no resgate às vítimas, terá condições para servir de base provisória. Se esse uso do navio for possível, o Brasil se valerá de um investimento de R$ 80 milhões, que resultou na construção de uma embarcação que opera com capacidade para abrigar helicópteros UH-12/13 (Esquilo) e IH-6B (Bell Jet Ranger), com um hangar climatizado. Foram instalados ainda cinco laboratórios, sendo dois secos, dois molhados e um misto, os quais abrigam modernos equipamentos para o desenvolvimento de projetos científicos no ambiente antártico.

Programa não será interrompido

Raupp salientou que projetos detecnologia avançada, como a Estação Antártica, estão sempre sujeitos a acidentes. Entre os cientistas, consultados pelo GLOBO, não há reclamação quanto a problemas de manutenção de equipamentos ou da própria estrutura da EACF.

- Os países que encaram o desafio de tocarem projetos de grande complexidade tecnológica correm esse risco. Você deve se cercar de condições de segurança e salvaguardas para evitar esse tipo de ocorrência e outros danos. Mas dizer quenão vai acontecer nada, não existe isso.

O diretor do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Jefferson Simões, diz que o programa antártico continuará funcionando porque a Comandante Ferraz, apesar de concentrar uma parte importante das pesquisas brasileiras, não era a única estação científica brasileira. Ele explica que pelo menos metade dos pesquisadores trabalha em navios de pesquisa ou em acampamentos isolados na Antártica.

-- O processo de reconstrução, para voltar ao nível em que estava, demorará de dois a três anos. A logística é muito difícil e só podemos construir durante o verão antártico. E o inverno já está chegando - observa.

FONTE: O GLOBO

Refazer o orgulho :: Cristovam Buarque

O Brasil é um dos poucos países com base na Antártica. Ao longo de mais de 20 anos, tem mantido de forma permanente grupos de cientistas e militares que se revezam, tentando entender aquele continente e as consequências de seu clima para o futuro do planeta. Ali são feitas pesquisas sobre a vida marinha em baixas temperaturas, sobre fontes de alimentos de microrganismos, pesquisas sobre as mudanças climáticas e inclusive sobre recursos naturais disponíveis. Além disso, ali o Brasil mostra que aceita desafios. Não temos como enviar uma tripulação ao espaço sideral, mas não fugimos de ter nossa base na Antártica e sentimos orgulho por isso.

Esta Estação Comandante Ferraz tem custado um enorme esforço às nossas Forças Armadas, especialmente à Marinha e à Aeronáutica, e tem atraído apoio de diversos setores, entre os quais uma Frente Parlamentar de Apoio ao ProAntar, como é conhecido o programa.

De repente, ainda não sabemos por que, um incêndio com explosão, provavelmente no depósito de combustível, transforma nossos prédios e os dados das pesquisas em cinzas. Visitei duas vezes a Antártica, em uma delas foi possível ir até a estação. Muitos vibram com a seleção de futebol, eu vibrei ao posar com uma bandeira ao lado dos cientistas e militares naquele ponto extremo do planeta, sabendo que estava em território brasileiro e ao lado de pesquisadores brasileiros. Há anos, sou presidente da Frente Parlamentar ProAntar e talvez por isso tenha sido informado logo no início e certamente devo ser um dos que mais sentem o drama que estamos vivendo.

A morte de dois militares, além de um outro ferido, e a destruição das pesquisas, salvo aquelas já compartilhadas pela internet, deixaram-me com a sensação de uma imensa tragédia para o Brasil, embora em um ponto tão distante. Ao mesmo tempo, despertaram a vontade de fazer tudo o que é possível para ajudar na recuperação daquele nosso território científico.

A partir desta semana, a Marinha já começa a entender o que houve e a fazer os trâmites para reconstruir a Estação Comandante Ferraz. Estamos certos de que não serão poupados esforços de todos nós e do governo brasileiro para que, em breve, todo o trabalho de pesquisa possa ser retomado e o Brasil possa mostrar que já tem uma nova base construída.

O custo disso será quase nada se comparado com os custos com a Copa do Mundo, as Olimpíadas e o trem-bala. E, com certeza, trará muito mais resultados positivos para o orgulho nacional e para as pesquisas mundiais. Trata-se de refazer um orgulho brasileiro.

*Professor da UnB, senador (PDT-DF) e presidente da Frente Parlamentar ProAntar

FONTE: ZERO HORA (RS)

Vácuo de ideias :: Denis Lerrer Ronsenfield

A política brasileira está dando mostras de um cenário deprimente, cuja característica principal é um vácuo total de ideias. Partidos se digladiam por tempo de rádio e televisão, estando dispostos às mais distintas alianças, sempre e quando esse tempo seja preservado. Alianças não obedecem a nenhum imperativo de programas, valores e ideias, mas tão somente a ganhos pragmáticos imediatos. É como se partidos renunciassem a si mesmos. O que fazer com o Poder conquistado, além de preservá-lo, não entra minimamente em consideração.

Denominações de "esquerda" e "direita", se já não tinham muito significado, perdem o pouco que conservavam, pois partidos de "esquerda" fazem sem o menor pudor alianças com partidos de "direita", como se isso fosse a coisa mais natural do mundo. Alianças impensáveis há apenas poucos anos tornaram-se corriqueiras, tudo sendo virtualmente possível. Se não há menor apego a ideias e valores, não surpreende que negociações partidárias sejam feitas nas mais distintas direções. É o terreno do vale-tudo porque valores nada valem.

Não deveria, portanto, causar tanto impacto que as igrejas evangélicas estejam progredindo eleitoralmente, agindo à revelia dos partidos, segundo os seus próprios interesses específicos. Partidos são, para elas, meros instrumentos, o que valeria para praticamente todas as agremiações, nenhuma delas apresentando uma proposta abrangente que valha para toda a sociedade. Partidos deveriam mostrar que seus interesses particulares, por exemplo, têm validade para toda a sociedade, fazendo, neste sentido, a passagem do particular para o universal e o coletivo.

Nesta perspectiva, as igrejas evangélicas estão ocupando um espaço deixado vazio pelos partidos, assumindo valores que são reconhecidos não somente por sua clientela tradicional, mas ganham também amplos setores dos eleitores. Estão, desta maneira, redesenhando, na sua ótica própria, as relações entre política e valores, tanto mais eficazmente que os partidos têm abdicado da defesa dos valores.

Tomemos o caso da discussão sobre o aborto e a união homossexual. Independentemente da consideração de se ser contra ou a favor, o mais relevante é que se tenha posições a respeito, sendo essas discutidas e defendidas em praça pública. As igrejas evangélicas defendem as suas posições e não por serem essas retrógradas ou atrasadas, o que pressuporia que os defensores do aborto e da união homossexual seriam tidos por "progressistas", mas porque veiculam ideias da vida (a ser considerada desde a fecundação) e da família (baseada na união entre homem e mulher).

Ocorre que os partidos políticos estão fugindo dessas questões, pois, sendo essencialmente controversas, produzem efeitos políticos e eleitorais. Ninguém, incluindo os partidos, está infenso a assumir consequências decorrentes da defesa de posições a favor ou contra. Isto seria, aliás, natural. O que não poderia acontecer - mas é o que está acontecendo - é que os partidos políticos não sejam a favor, nem contra, mas muito antes pelo contrário. Ao desertarem do campo das ideias, deixaram o campo vazio para que outras organizações o ocupem.

Questões públicas exigem exposições de princípios. Nessas questões em pauta, há considerações relevantes sobre a liberdade de escolha e os seus limites, sobre o que é considerado como natural, sobre a concepção da vida, estando essa dotada ou não de uma finalidade própria, sobre o que é saúde pública, sobre o que é o exercício legítimo da diferença e assim por diante. Trata-se de questões públicas que requerem um tratamento eminentemente racional, independente de orientações religiosas.

O recurso a um texto sagrado não deveria ser aqui de nenhuma valia, pois é de sua natureza ser válido para aqueles que nele creem. Logo, se valesse somente a orientação religiosa, apenas os fiéis deveriam seguir as diretrizes relativas ao aborto e à união homossexual, não devendo ser elas objeto de uma lei pública.

Os partidos políticos, no entanto, estão fugindo desse debate, atentos somente aos seus interesses eleitorais mais imediatos. Nas últimas eleições presidenciais, o espetáculo foi deprimente tanto no que concerne ao PT quanto ao PSDB, ambos partidos assumindo posições ao sabor das oscilações de opinião pública, cujo único pilar era a conquista do voto. Aliás, ambos partidos já foram - ou são -, por exemplo, favoráveis ao aborto ou à união homossexual, porém se recusam a assumir essa postura por medo das consequências eleitorais. O espaço não ocupado por eles termina sendo ocupado por outros.

Referi-me, na abordagem dessas questões, principalmente aos evangélicos, por serem esses os mais claros e aguerridos, não se envergonhando de suas posições. A Igreja Católica, embora sua corrente hoje principal assuma também essas posições, tinha abandonado parcialmente esse campo em proveito de posicionamentos mais propriamente sociais e políticos, inclusive com o marxismo ganhando posições em seu seio em detrimento do cristianismo propriamente dito.

Em nome da revolução, bem tido por maior, chegou a fazer concessões a valores então tidos como menores. A partir do momento em que setores seus passaram a se comportar como se fossem partidos políticos, em estreita vinculação com movimentos sociais que propugnam pela abolição do capitalismo e da propriedade privada, criaram vínculos ideológicos e abandonaram o terreno que veio a ser ocupado pelos evangélicos.

Isto faz também com que os partidos políticos estejam, agora, tentando se aproximar cada vez mais da classe média ascendente, a dita classe C, pois essa está abrindo o seu próprio caminho, defendendo os seus próprios valores, muitos desses sendo considerados como "conservadores". Ela tem uma visão própria da relação entre política e valores, relação essa que os partidos políticos têm uma nítida dificuldade em abordar. A natureza, dizia Aristóteles, tem horror ao vácuo.

Denis Lerrer Rosenfield é professor de filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Liberdade de imprensa duplamente violada :: Paulo Brossard

É de ontem o conflito instaurado entre a chefe do governo argentino e a imprensa daquele país ou com a parte que se insurgiu contra a unanimidade jornalística, que se pretendeu impor em relação aos meios de comunicação. A situação de bom convívio se manteve até o chamado "tarifaço agrário" decretado pelo governo de Cristina Kirchner; não há quem ignore a importância do segmento agrícola, abrangente do pecuário, naquele país e o relevo da questão criada; o complexo capitaneado pelo jornal Clarín, o mais importante da Argentina, tomou o partido do mundo rural e daí o seu afastamento do governo. A partir desse momento, o Grupo Clarín passou a ser estigmatizado e, não tardou o dia, foi em fins de dezembro, que 200 fiscais fazendários, de inopino, invadiram a TV a cabo do grupo, levando consigo documentos da empresa. Não durou muito, o Senado aprovou projeto declarando de "interesse público" a fabricação, comercialização e distribuição de papel-jornal. Ocorre que o papel-imprensa era fabricado por uma só empresa que abastece 75% dos consumidores, 172 jornais em todo o país. Vale salientar que dessa empresa o Grupo Clarín possuía 49% das ações, o La Nación era titular de 22%, a República Argentina, 27,5%, e o restante 1,5%, pequenos acionistas. Mas, com a iniciativa de batizar o papel-imprensa como de "interesse público", proibiu que empresas jornalísticas possuíssem ações do Papel-Prensa. Ora, o mais acanhado observador não custaria a concluir que o Grupo Clarín ficava com seus dias contados e, faz dias, foi divulgada a notícia de que o maior jornal da nação suspendera dois suplementos em suas edições dominicais por falta de papel... O caso não é novo. A própria Argentina já conheceu coisa parecida; quando o peronismo começava também sua guerra contra a imprensa e seus grandes jornais, La Nación e La Prensa figuravam entre os maiores e melhores do mundo; o resultado está à vista de qualquer do povo.

O que está acontecendo na Argentina, mutatis mutandis, aconteceu também no Equador; um no sul do continente, de costas para os Andes e voltado para o Atlântico, outro, voltado para o Pacífico, deixando os Andes para o lado, ou seja, um fenômeno no Sul, outro de igual natureza no Norte. Ambos antológicos. No Equador, uma ou duas pessoas, referindo-se ao presidente Correa, disseram-no ditador. Certa ou equivocada, tratava-se de mera opinião, errônea ou luminosa. Ora, entre milhares de pessoas, dificilmente não haveria algumas centenas a dizer o mesmo, com ou sem a intenção de ferir o bom nome do alvo, mas com o propósito de caracterizar a atuação de um governante, e com cujos atos não concordam. Procedimentos correntes em uma sociedade democrática. Pois bem, a pessoa ou pessoas que tenham assim se expressado foram condenadas a três anos de prisão e à condenação por danos morais da ordem de US$ 40 milhões!

Não conheço nação democrática que tenha legislação semelhante. Os presidentes Obama e Sarkozy são assim tratados uma vez por ano, senão mais, ou por mês, ou por semana, ou por dia, ou por hora, por motivos concludentes ou por meros preconceitos; quem não lembra de Churchill, até chegar a primeiro-ministro em 1940, era um dos homens mais malquistos da Inglaterra, e jamais se lembrou ele de ocupar-se dos que o desestimavam. E era Churchill.

Por falar em Churchill, não resisto em lembrar livro recente do professor Nigel Knight intitulado Churchill Desmascarado. Ao longo de 450 páginas, sustenta ele que nada fez de bom, de útil ou de belo. Tudo errado. As derradeiras palavras dizem tudo: "Foi Hitler que tornou Churchill uma figura histórica" da qual "nos lembramos de Churchill, acima de todo o resto, pela derrota de Hitler. Hitler, entretanto, é lembrado por si mesmo"!!!

Ora, a todas as luzes, o que está ocorrendo na Argentina e no Equador, pela desproporção das penas impostas, criminal e indenizatória, deixando de concluir que não são sanções dotadas de um mínimo de razoabilidade, e porejam sentimentos próprios de uma inimizade capital com a liberdade de imprensa. Os maus exemplos também se reproduzem e, quiçá, com abundância maior do que os bons. Este é o mal que, depois de tantos erros a propósito, começa a aparecer e deitar sementes, o que é perigoso para todos, e até de onde menos se espera. A liberdade de imprensa, escreveu Rui Barbosa, é a primeira das liberdades, só que há alguns que não a estimam.

*Jurista, ministro aposentado do STF

FONTE: ZERO HORA (RS)

O projeto verde:: Renato Janine Ribeiro

Preocupo-me com uma triste curiosidade da política brasileira: temos por um lado partidos sem projeto político, como é o caso de várias agremiações médias ou pequenas, que nada almejam senão uma fatia do poder e, por outro, projetos ou agentes políticos sem partidos. Estas semanas, discorri sobre este assunto. Tratei dos empreendedores e ongueiros, que, a despeito de suas diferenças, estão desenvolvendo um know-how de qualidade para organizar a sociedade - mas não têm, e talvez jamais venham a ter, projeto político. Substituem com vantagem, a meu ver, um liberalismo que nunca deitou raízes reais em nosso país, mas nem por isso se converteram em ator político. Tratei disso há poucas semanas. Na última coluna, lembrei aqueles, economistas ou políticos, que acham insuficiente o Brasil exportar produtos agropecuários e minérios, querendo uma pauta de produção e de exportações que agregue mais valor-trabalho a nossas mercadorias. 

Acrescentei que esta importante discussão não tem desdobramento político; fui então agradavelmente surpreendido pelo lançamento, em breve, da Frente Parlamentar em Defesa da Indústria Nacional, comunicado a mim pelo deputado Newton Lima. Espero que dê frutos, embora eu esteja convencido de que hoje a oposição indústria-lavoura está sendo substituída pela do trabalho inteligente vs. o braçal.

Hoje há duas forças políticas capazes de disputar o poder no Brasil - o PT e o PSDB. Mas há outras ideias, outras questões, que precisam ocupar mais espaço em nossa cena pública - seja criando novos partidos que com o tempo se tornem competitivos, seja levando os dois principais a levar em conta conceitos e concepções que não constam, ainda, de suas agendas. Aliás, esse foi o caminho tomado pelos verdes, na sua história de quase meio século. Sabendo que não conseguiriam votos suficientes para chefiar um governo, eles se aliaram aos socialistas, na França e na Alemanha, a fim de implantar ao menos parte de suas políticas. Isso, que vale para os verdes nos dois países mais importantes em que exerceram algum poder, parece-me valer para todos os projetos de que tratei, mais o que verei hoje, que é o dos verdes de Marina Silva. Empreendedores podem ser mais fãs do capital (ainda que social), industrializantes podem ter tido em José Serra seu político mais proeminente e Marina foi ministra de Lula; mas não há impossibilidade, de princípio, para que uma dessas políticas seja assumida, quer pelo PT, quer pelo PSDB.

Vamos então aos verdes. Eles passaram do romantismo para a ciência e a tecnologia. No começo, era o amor às matas e a tudo o que é natural. Depois, tornou-se princípio econômico. Entre nós, o lançamento da obra organizada por Ricardo Arnt, "O que os economistas pensam sobre sustentabilidade" (2010), marcou bem essa transição do ideal à proposta ou, se quiserem, esse revestimento da ética pela ciência, essa aliança do romantismo com a economia. Temos aí um projeto de vida, mais até do que uma proposta política. Estamos acostumados à ideia de que um partido importante tem uma visão global do mundo. Aqui, não é o caso. Quem tem a visão global são os defensores do desenvolvimento sustentável, isto é, membros de um partido pequeno - ou nem membros, de partido nenhum. Isso pode até fazer deles pessoas de uma nota só, mas o relevante é que tenham propostas para cada momento do dia, para a ação cotidiana assim como para o planejamento econômico.

Aqui, o paradoxo. Por um lado, os verdes têm uma visão do mundo mais detalhada e mais consistente, quem sabe, do que nossos dois principais partidos. Mas, por outro, a experiência dessas décadas lhes dá, quando muito, a chance de serem parceiros minoritários numa coligação de governo. Assim foi no estrangeiro, mas também aqui: geralmente, o PV se coliga com administrações tucanas municipais ou estaduais. Ou seja, entre seu ideal e suas possibilidades, vai uma distância. Eles bem que gostariam de moldar o mundo à sua imagem - pois têm uma utopia, talvez a única de nossos dias -, porém dificilmente o conseguirão. Mas talvez a república que eles propõem, sua visão de "coisa pública", de "como viver juntos", seja política só em parte. Como ela diz respeito a toda uma mudança espiritual e comportamental - que inclui a reciclagem, o não desperdício, o respeito à natureza e ao outro -, pode ser que seu projeto esteja mais na ética do que na política. O que, certamente, não os exclui da disputa pelo poder, mas define um leque interessante: muita ambição nos ideais, um certo pragmatismo nas alianças de governo, pouca chance de mandar.

Quer isso dizer que a candidatura de Marina Silva, com todos os votos que obteve, não terá chances - ela ou outra - de conquistar a presidência da República, ainda que a longo prazo? Assim acredito. É verdade que poderíamos compará-la, sim, ao PT, que lentamente, durante 20 anos, construiu sua ascensão ao poder. O PT é um partido de certa forma único no mundo - uma grande agremiação de trabalhadores, tendendo à esquerda, mas sem ser comunista. Há partidos trabalhistas no mundo, há partidos grandes e há esquerda não comunista; mas essas três características, ao mesmo tempo, só o PT tem. Por isso mesmo, se o PV em outros países nunca chefiou o poder, quem sabe seremos originais também nisso. Ele pode começar pelo Brasil... Mas, por ora, o papel dos verdes - não o do partido, mas o do movimento que Marina capitaneou - parece ser o da pregação ética e científica. O que, por sinal, nos longos anos de travessia do deserto, foi uma das grandes contribuições do próprio PT para nossa política.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Serra foca na polarização com o PT e em alianças

Raphael Di Cunto

SÃO PAULO - Pré-candidato com o mais alto grau de rejeição na disputa pela prefeitura de São Paulo - 35% segundo o Instituto Datafolha - o ex-governador José Serra (PSDB) pretende enfrentá-la com foco em dois pilares: a polarização da disputa contra o PT, apostando no eleitorado de perfil conservador da capital paulista, e com o argumento de que sua eleição ao governo do Estado ampliou as parcerias com o município e possibilitou a que o vice que o sucedeu, Gilberto Kassab (PSD), pudesse concluir em melhores condições as realizações do mandato.

A investida contra a rejeição começou já neste fim de semana. Ontem o secretário da Cultura Andrea Matarazzo, o primeiro dos quatro pré-candidatos do PSDB a desistir da disputa, foi enfático: "Ele ficará provavelmente quatro anos ou talvez oito anos na prefeitura". No sábado, Kassab disse que o ex-governador desistiu do sonho de concorrer à Presidência da República para ser prefeito de São Paulo.

A tentativa de polarizar com o PT ficou clara ontem, no discurso de Matarazzo. "Nosso grupo não poderia se dividir. Precisamos nos unir por aquilo que é mais importante - derrotar o projeto do PT, que devastou a cidade de na sua administração", disse o tucano, sobre o governo da ex-prefeita e hoje senadora Marta Suplicy (2001 a 2004).

Matarazzo disse que saiu da disputa porque o ex-governador é a pessoa mais preparada para enfrentar a eleição. "Ele foi o melhor prefeito que esta cidade já teve", afirmou. Além de Matarazzo, o secretário estadual de Meio Ambiente, Bruno Covas, também já decidiu desistir da disputa em favor de Serra, mas deixou para anunciar a decisão hoje.

Os outros dois pré-candidatos do PSDB, o deputado federal Ricardo Tripoli e o secretário estadual de Energia, José Aníbal, conversaram ontem com o governador Geraldo Alckmin (PSDB) no Palácio dos Bandeirantes e disseram não ver problemas de o ex-governador participar das prévias, mas rejeitaram a hipótese de adiar a data da votação. Há meses, os quatro pré-candidatos participam de eventos e debates como uma preparação para a disputa interna no partido para a escolha de quem irá liderar a campanha na cidade de São Paulo.

"Já mandei carta para meus apoiadores, mobilizei-os para o próximo fim de semana. Então sou contra remarcar as prévias", afirma Trípoli. "O Serra já está se anunciando como pré-candidato faz tempo, se mobilizando internamente, é totalmente desnecessário adiar a eleição", explicou ontem Tripoli.

Ganha força a ideia de uma chapa puro-sangue, que contemple setores do PSDB insatisfeitos com o fim das prévias, mas essa proposta colide com a necessidade de uma ampla aliança partidária que, além de garantir maior espaço no horário eleitoral gratuito, visa isolar o PT ao eleitorado de esquerda na capital que, historicamente, não tem ultrapassado um terço dos votos.

Para enfrentar a campanha petista, que deve bater na tecla do abandono do cargo de prefeito quando ele entrou na disputa para governador do Estado, Serra precisará ampliar o leque de alianças e, assim, conquistar o maior tempo possível do horário eleitoral gratuito. O PSD, do prefeito de São Paulo e aliado certo, Gilberto Kassab, ainda não tem garantido a cota partidária do horário eleitoral.

À época em que se aproximou da candidatura do ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT), Kassab contava com a pressão petista sobre o Tribunal Superior Eleitoral para um julgamento favorável da demanda por tempo de televisão e acesso ao fundo partidário. Com o apoio já declarado de Kassab a Serra na principal cidade do país, é provável que já não interesse mais ao PT apoiar a demanda do PSD.

Até agora, o único partido que o governador Alckmin havia conseguido atrair para a coligação tucana era o PP, do deputado federal Paulo Maluf. O DEM está dividido entre o apoio ao PSDB, ao PMDB ou à candidatura própria - esta última, hipótese menos provável, segundo integrantes da legenda.

Com a entrada de Serra na disputa, o partido pretende investir no PPS, que tem como pré-candidata a ex-vereadora e ex-apresentadora de televisão Soninha Francine, e no PDT, que lançou o deputado federal Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical - Paulinho já disse a aliados que poderia desistir para virar vice do ex-governador. PSB e PV são outros aliados em potencial e estão tanto na base de sustentação de Alckmin quanto de Kassab.

Antes de partir em busca de aliados, no entanto, Serra terá que pacificar seu próprio partido, ainda dividido em relação ao fim das prévias que haviam sido marcadas para 4 de março. Representantes do diretório municipal do partido começaram a ligar ontem para os presidentes dos diretórios zonais para saber se o debate de hoje à noite, na região central de São Paulo, está mantido, mesmo com apenas dois candidatos - Trípoli e Aníbal.

"Por enquanto, eles [presidentes zonais] estão divididos. Estamos avaliando se vale a pena fazer um debate com apenas duas pessoas, já que o Serra ainda não se inscreveu nas prévias e ele só pode participar do debate depois disso", afirmou ao Valor o tesoureiro do partido na capital, Fábio Lepique. O ex-governador não deve participar porque ainda não se inscreveu nas prévias - a expectativa é que ele entregue hoje uma carta para o diretório municipal pedindo a inscrição.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Aliança entre PSD e PSDB é melhor acolhida por vereadores

SÃO PAULO - A aliança com o PSDB tende a ser melhor acolhida pela bancada do PSD na Câmara dos Vereadores de São Paulo do que aquela que vinha sendo negociada com o PT. O grupo que melhor acolhe a aliança entre o ex-governador de São Paulo, José Serra, e o partido do prefeito Gilberto Kassab é formado por vereadores que saíram do DEM, PPS e PSDB para fundar o PSD. A bancada do partido é a segunda maior da Câmara de São Paulo, com dez parlamentares, atrás apenas do PT, com 11. Os pessedistas receiam perder votos e diminuir de tamanho se apoiarem os petistas. Para eles, seria difícil explicar a mudança de postura depois de terem tomado a prefeitura do PT em 2004 com um discurso recheado de críticas.

Por outro lado, há setores no partido, como os deputados e o movimento sindical, que preferem a parceria com os petistas. Segundo aliados de Kassab, o acordo com os petistas era almejado pelo próprio prefeito como forma de se aproximar ainda mais do governo federal. O plano era apoiar a reeleição de Dilma em 2014, quando o PSD trabalharia para aumentar a bancada na Câmara e depois se posicionar como alternativa para a sucessão da petista em 2018, em aliança com o governador de Pernambuco e presidente nacional do PSB.

Com a entrada de Serra na disputa, o PSD irá compor um arco de alianças com o PSDB. O prefeito era vice do tucano em 2006, quando ele renunciou para concorrer ao governo estadual, e tem o compromisso público de apoiá-lo na sucessão municipal. O fim das conversas com o PT na capital paulista não interfere na posição nacional do partido, dizem pessedistas, mas freia, pelo menos temporariamente, a guinada de Kassab em direção aos petistas.

"O ideal seria seguir a mesma linha de antigamente, do Democratas com o PSDB. Seria uma continuidade, um acordo mais fácil de explicar para o eleitor", afirma a vereadora Edir Sales, uma das que saíram do DEM com o prefeito. Irmã do ex-vereador e conselheiro do Tribunal de Contas do Município, Eurípede Sales, Edir concentra a maioria dos seus votos na Vila Prudente, região na zona leste da cidade onde o PT tem perdido as eleições para o bloco conservador.

A parlamentar garante que defenderá a aliança decidida pelo partido, mas acredita que o acordo poderia prejudicar inclusive a reeleição dos vereadores petistas, que também ficariam sem discurso. "Ainda não me imaginei subindo no palanque do Haddad para dizer "vote no PT, vote 13". Tomara que o meu líder, o prefeito Gilberto Kassab, não me submeta a esse sofrimento", afirma.

O vereador Souza Santos, ex-tucano, diz que seguirá a decisão da legenda. "Se o partido achar melhor [a aliança] com o PSDB, tanto melhor. Se fosse com o PT, não teria problema. É uma composição meio difícil, mas não impossível", comenta. Ex-PPS, o vereador Milton Ferreira concorda. "Nossa filosofia política, história, projetos e programas coincidem com os do PSDB", analisa.

Apesar da comemoração dos vereadores do PSD, que achavam ruim a aliança com o PT pela mudança de discurso, o acordo pretendido pelo PSDB com seus aliados, porém, é para impedir a coligação para a chapa de vereadores. "O que foi conversado pelo partido nas últimas 24 horas é que o PSDB não vai permitir coligação para a eleição proporcional com partidos maiores, ou corre o risco de eleger o prefeito e não ter a maior bancada na Câmara", afirma o líder dos tucanos no Legislativo municipal, Floriano Pesaro. A entrada de Serra possibilitou ao PSDB um ótimo puxador de votos para a legenda, mas uma coligação poderia diminuir essa vantagem, pois o PSD tem três vereadores a mais que os tucanos e sairia na frente, com mais candidatos à reeleição.

O PSDB tem oito vereadores, três a menos que o PSD. Com uma coligação, os candidatos com mais votos nessa chapa seriam eleitos.

A opinião é compartilhada pelo vice-governador Guilherme Afif Domingos, que já declarou diversas vezes preferir manter a coligação que o elegeu com o governador Geraldo Alckmin (PSDB) em 2010. Afif era o pré-candidato do PSD para prefeito, mas só aceitava concorrer com um vice tucano, proposta que naufragou pela resistência do partido aliado, que quer um candidato próprio.

Outro foco de resistências era a ala evangélica do PSD, que não quer ouvir falar do pré-candidato do PT, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, por causa do "kit anti-homofobia" que ele pretendia distribuir nas escolas. A campanha foi duramente criticada por religiosos e a presidente Dilma Rousseff teve de abandoná-la para evitar retaliação da bancada no Congresso.

Estão nesse grupo, segundo pessedistas, os vereadores David Soares, filho do missionário Romildo Ribeiro Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus, e Marta Costa, filha do pastor José Wellington Bezerra da Costa, presidente da Convenção Geral das Assembleias de Deus. O Valor tenta contato com Marta desde a quarta-feira, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. Soares está de licença até o início de março.

Favorável à aliança com os petistas, que foi interrompida, está o movimento sindical. "Me identifico mais com o PT, que tem um olhar social mais parecido com o nosso", afirma Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), terceira maior central sindical do país, e da futura fundação de formação política do PSD.

Segundo Patah, a vontade no movimento sindical era que Serra não se candidatasse. "São Paulo tem uma possibilidade importante de renovação, de ter uma cara nova no comando, o melhor seria aproveitar essa oportunidade", expõe o sindicalista, que apoiou as campanhas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma. A UGT, que também tinha filiados em partidos da oposição, ficou neutra em 2010.

Os deputados do PSD que saíram de legendas da oposição com o desejo de aderir ao governo federal também gostariam de ver a legenda junto ao PT em São Paulo. A proposta de indicar um vice do PSD para Haddad, feita em janeiro por Kassab a Lula, desencadeou uma onda, até então improvável, de negociações em outros Estados, e hoje as duas siglas podem fechar aliança em cerca de dois terços das capitais.

O líder da bancada, Guilherme Campos, nega que exista essa disposição por parte dos deputados e diz que o partido é independente. "O PSD é composto por parlamentares que vieram de vários partidos. Muitos apoiaram a presidente Dilma na eleição. Outros, como eu, ficaram ao lado do Serra. A bancada está bem dividida, não tem uma posição de consenso", diz.

Já o presidente da Câmara de São Paulo, vereador José Police Neto, um ex-tucano que articulou com Kassab a formação da bancada municipal, via chances de entendimento com os dois lados. Ele avalia que PT e PSD se assemelham nas políticas de distribuição de renda, mas que seu partido está mais próximo do PSDB em outras propostas, como o investimento em metrô e trem, enquanto os petistas pregam a construção de corredores de ônibus. "Não tenho dificuldade nenhuma em construir convergências, que já existem, com o PT, ou reatar os entendimentos com o partido que me criou", garante. (RC)

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Concessão ainda que tardia :: Paulo Paiva

A recente, porém tardia, concessão dos Aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília trouxe novamente à agenda do governo o tema da participação privada na gestão de serviços até então providos pelo poder público. Infelizmente, os debates se concentraram nas disputas políticas. De um lado, a oposição afirmando que enfim o PT se curvou ao modelo tucano de governar e, de outro, os governistas justificando que suas concessões são diferentes da "privatização" tucana. Debate que nada esclarece a opinião pública.

Gostaria de discutir o tema em outra perspectiva, isto é, qual o papel e os limites das concessões para o desenvolvimento da infraestrutura no Brasil.

Começo pelo lado não controverso da participação do governo no fornecimento de serviços à sociedade. Cabe ao governo prover serviços que por natureza são de uso geral e não excludentes, como segurança pública e atividades de regulação e de fiscalização. São serviços não sujeitos aos mecanismos de mercado e, portanto, não têm preço unitário. São, pois, pagos pela arrecadação de tributos de toda a sociedade. No caso brasileiro, acrescem-se ainda saúde pública e educação, conforme dispositivos constitucionais, e vários programas de transferência de renda, como seguro-desemprego e Bolsa-Família. Para esse conjunto de atividades a população paga impostos e espera que a sua gestão seja eficiente e os serviços prestados, eficazes.

Muito embora tenha sido fundamental nos estágios passados de desenvolvimento, com a expansão econômica e a complexidade do País, a participação do governo no provimento de infraestrutura concorre com os serviços estritamente públicos, reduzindo tanto sua cobertura quanto sua qualidade. Nessas condições, é recomendável a participação privada nos serviços em que os mecanismos de mercado se aplicam reservando o uso da receita tributária aos serviços de cobertura universal. Por exemplo, uma rodovia pavimentada gera uma despesa permanente de manutenção ao governo que concorre com os gastos em segurança, saúde pública, educação, etc. Certamente, está aí a raiz da má qualidade das rodovias federais e do déficit de investimentos em infraestrutura no País, além da conhecida ineficiência da gestão pública nesse setor. A gestão privada de uma rodovia, cuja receita venha do pagamento de seus usuários, deixará os recursos tributários disponíveis para os serviços sociais.

Assim, a concessão da gestão de serviços de infraestrutura à iniciativa privada oferece oportunidade de investimentos e possibilidade de melhoria na qualidade do serviço, contribuindo para maior eficiência da economia e resultando em estímulo ao crescimento econômico e à geração de empregos. É nessa perspectiva que o papel das concessões deve ser avaliado. O caso dos três aeroportos permite examinar algumas dimensões do processo de concessões para dimensionar seus limites e planejar futuros programas.

A primeira é a participação de fundos de pensão no consórcio que administrará o Aeroporto de Guarulhos. Numa economia carente de poupança, os fundos de pensão são instrumentos importantes para investimentos de longo prazo e sua participação em projetos de infraestrutura deve ser bem-vinda, desde que alinhada com a regulamentação específica que rege as aplicações desses fundos.

A segunda é a participação de entidade pública na gestão como sócia minoritária. Essa não é uma questão pacífica. De um lado, há modelos de coparticipação público-privada de grande sucesso no mercado, como o caso da Companhia Energética de Minas Gerais. De outro, a presença da Infraero na nova empresa mantém com o governo parcela de responsabilidade dos investimentos e riscos da administração, não atendendo ao princípio de transferência da gestão ao setor privado. Configura-se uma "meia" concessão. O futuro mostrará as consequências desse modelo.

A terceira é o financiamento pelo BNDES ao consórcio vencedor. Tem sido tradição no Brasil a participação do banco no financiamento dos projetos de infraestrutura por meio do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Mas, quando o BNDES utiliza recursos do Tesouro Nacional, o subsídio resultante da diferença entre a Selic e a TJLP é pago pelo contribuinte e concorre com outras alocações dos recursos públicos. Nesse caso, não é recomendável o financiamento público.

A quarta é a estrutura financeira da concessão, que maximizou o pagamento da outorga sem considerar a garantia da qualidade dos serviços. Isso resultou em ofertas extremamente ousadas, com riscos não calculados de êxito. Aparentemente, disso resultou a vitória de grupos economicamente mais frágeis, eliminando-se consórcios com maior tradição e solidez na gestão de infraestrutura. Parece que o modelo de concessão buscou obter o maior valor da outorga visando a financiar a gestão pública no restante do País, em vez de atentar para a qualidade dos serviços a serem prestados e que poderiam ser replicados em outros aeroportos cujo porte justifique investimentos privados.

O caminho está sendo construído, mas carece de mais celeridade e mais clareza de objetivos.

*Professor da Fundação Dom Cabral, foi Ministro do Trabalho do Planejamento e Orçamento no governo FHC

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Euro, pensar o impensável:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

É melhor que os europeus pensem seriamente na alternativa de extinguir a moeda comum de 17 países

Na China, em 1979, era "impensável" caminhar para o capitalismo, e no entanto Deng Xiaoping pensou e se antecipou à estagnação que ocorreu na União Soviética. Na Argentina, em 2001, era impensável terminar com o "plan de convertibilidad"; De La Rua curvou-se a esse impensável, e o custo foi uma crise brutal. Na zona do euro, hoje, é impensável extinguir o euro, e no entanto é melhor que os europeus pensem seriamente nessa alternativa. A criação do euro foi um erro, porque não havia um Estado por trás dele, e porque ele se transformou em uma moeda estrangeira para cada um dos 17 Estados que o adotaram -uma moeda que, nas crises, eles não podem emitir nem desvalorizar.

O impensável é muitas vezes puro medo e conservadorismo de governantes sem visão. Nesta grande crise do euro, a Grécia tornou-se um país insolvente, mas declarou-se "impensável" reestruturar sua dívida; quando a dívida foi reestruturada com um desconto de 21%, tornou-se impensável aumentar essa porcentagem; quando o desconto foi aumentado para 50%, tornou-se impensável o socorro do Banco Central Europeu a ela e aos demais países e bancos, mas um pouco depois o BCE passou a comprar de forma moderada títulos públicos e inundou o sistema bancário europeu de liquidez. O impensável revelou-se, afinal, a solução.

"Seria a desordem e o caos", gritam os defensores do impensável. Não creio. A crise dos países do sul da Europa desencadeada em 2010 é de balanço de pagamentos: foi causada pela sobrevalorização do euro implícita que se expressa em salário médio incompatível com o nível de produtividade. Teve como consequência elevados deficits em conta corrente seguidos por elevado endividamento externo, principalmente privado. A dívida pública já estava alta porque, diante da crise financeira global de 2008, todos os países haviam adotado política fiscal expansiva.

A extinção implicará alguns riscos, mas o custo de se tentar resolver uma crise causada por deficits em conta corrente através de redução dos deficits fiscais já foi muito grande, mesmo em termos de sacrifício da democracia, e continuará a sê-lo por muitos anos, para todos os países, inclusive para a Alemanha.

Do ponto de vista prático, não haveria grandes problemas. Seria naturalmente necessário imprimir novas cédulas. E, em determinado momento, em vez de retornar às antigas moedas, os países em conjunto transformariam o euro em um "euro nacional": o euro alemão, o euro francês, e assim por diante. Em seguida, os países com elevados deficits em conta corrente e altas dívidas externas desvalorizariam sua moeda. O que provocaria a queda dos salários e alguma inflação. Mas esta é uma forma muito mais humana e mais eficiente de praticar a austeridade e diminuir os salários do que aquela que está sendo praticada hoje: através da recessão e do desemprego.

No caso do euro, não é apenas o medo da inflação que torna sua extinção impensável. É também o medo que ela "desestruture" a União Europeia. Mas não há esse risco; a UE é o mais extraordinário caso de construção política e social que conheço, e só ganhará se agora der um passo atrás. Haverá espaço, no futuro, para muitos passos adiante.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO