domingo, 15 de abril de 2012

OPINIÃO DO DIA – Alvaro Dias: culto e dinheiro público

É o culto sem limites à personalidade feito com dinheiro público. O próximo passo será construir uma estátua do ex-presidente Lula, como se fazia para os deuses gregos.

DIAS, Álvaro, senador (PSDB-PR), sobre os R$ 14 milhões que o governo investirá para financiar a construção de um museu para lembrar as greves de metalúrgicos no ABC comandadas pelo ex-presidente Lula, Folha de S. Paulo,15/4/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Futuro presidente do STF diz que julga mensalão este ano
Grandes bicheiros ampliam alcance
Dilma pode rever incentivo à indústria

FOLHA DE S. PAULO
Cachoeira sacou R$ 8,5 milhões em ano eleitoral
Ayres Britto, do Supremo, quer julgar mensalão até fim de junho
Aviação vive era de avanço modesto e passagens caras
Renegociação de dívida renderia R$ 6,6 bilhões a SP, MG, RJ e RS

O ESTADO DE S. PAULO
Agnelo nega renúncia: ‘Só se me abaterem fisicamente’
Conselho da ONU aprova envio de missão à Síria
Malvinas e Cuba dividem Cúpula das Américas
Endividados dão carro de graça
Com Lula, Marta diz que apoiará Haddad

CORREIO BRAZILIENSE
CPI vai investigar irmão de Demóstenes
Dilma critica política dos países ricos
Receita aperta fiscalização e dívida chega a R$ 2 trilhoes
O verde de Brasília perde espaço para concreto

ESTADO DE MINAS
Valadares agora envia dinheiro para o EUA
Os negócios milionários de Cachoeira em Minas
O PT decide rumo que vai tomar nas eleições

ZERO HORA
Saúde privada superlotada

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Saídas para o Recife andar

Futuro presidente do STF diz que julga mensalão este ano

O 'Ideal é julgar antes de 6 de julho'

Futuro presidente do STF planeja julgamento do mensalão antes do período eleitoral

Carolina Brígido

Entrevista:: Ayres Britto

BRASÍLIA. Sergipano de Propriá, o ministro Carlos Ayres Britto, de 69 anos, vai assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima quinta-feira. Será dele a tarefa de presidir o julgamento do mensalão, evento que ele quer marcar para antes do processo eleitoral, que começa em 6 de julho. Mas avisou que, se isso não for possível, ainda assim marcará o julgamento. Ao GLOBO, disse que os partidos políticos no Brasil ainda não têm "consistência ideológica" e, por isso, prefere votar em candidatos, não na legenda. Revelou que, por três vezes, percebeu que votou errado após um julgamento, mas já não havia mais nada a ser feito


O GLOBO: O STF está para julgar o mensalão e, dependendo do resultado, o PT pode sair enfraquecido em ano eleitoral.

Ayres Britto - Para nós julgadores, o mensalão impressiona pela quantidade de réus, pelo número de páginas do processo, pelo número de testemunhas. Mas quanto ao nosso ânimo de fazer justiça, ele é um processo igual aos outros. O que nos cabe é perseverar na isenção, na imparcialidade, na análise objetiva das peças do processo, sem prejulgamentos.

O senhor, como presidente do STF, vai pautar o julgamento para breve?

Ayres Britto - Seja quem for o presidente do Supremo, um processo dessa envergadura, no campo quantitativo pelo menos, e em ano eleitoral, ele fará o possível para que não corram concomitantemente esse tipo de processo avultado, complexo, e o processo eleitoral. O ideal é que um não corra paralelo com o outro. Se for possível julgar o mensalão antes do dia 6 de julho, quando começa o processo eleitoral, é o ideal.

E se não for possível?

Ayres Britto - Paciência.

No segundo semestre, haverá só dez ministros na Corte, porque o ministro Cezar Peluso estará aposentado. E terá começado o processo eleitoral. O senhor pautaria o processo mesmo assim?

Ayres Britto - Sim. O ideal é o número 11, ímpar. Mas se só tiver dez, qual o presidente que vai esperar nomear o substituto do ministro Peluso, que você não sabe quando vai acontecer, e deixar o processo sem julgamento? Mas a formatação das decisões será fruto de um consenso. Nada será feito solitariamente, e sim colegiadamente. Dia de julgamento, formatação das sessões, horas de trabalho por dia: tudo será decidido com os demais ministros. A minha administração será rigorosamente compartilhada, dialogada. É da minha natureza isso.

Este será o primeiro ano em que a Lei da Ficha Limpa vai vigorar. O senhor acredita no poder da norma para filtrar os bons candidatos?

Ayres Britto - Sim, ela é uma das mais belas novidades transformadoras do país, porque tem o potencial de qualificar a nossa vida política, e o Brasil precisa de qualidadede vida política mais que tudo.

O senhor fica decepcionado com a política diante dos inúmeros casos de corrupção noticiados diariamente?

Ayres Britto - Eu fico entristecido, mas não desalentado, porque jamais devemos desertar da luta por um Brasil passado a limpo. TS Eliot disse o seguinte: “No mundo de desertores, quem toma a direção contrária é quem parece estar fugindo”. Você não tem o direito de abdicar dos seus ideais, dos valores que dão propósito de grandeza à sua vida. Eu fico triste, mas eu não jogo a toalha nunca.

Na hora de votar, o senhor tem dificuldade para escolher os seus candidatos?

Ayres Britto - Não, eu faço logo a minha triagem, a minha seleção. Eu sou muito seletivo na escolha dos meus candidatos e nunca experimentei dificuldade maior.

Todos esses casos de corrupção não afetam os candidatos que o senhor costuma escolher?

Ayres Britto - Não, porque a cada eleição é possível fazer uma boa triagem ética. Ética antes de tudo, mas técnica também. Você quer votar em pessoas preparadas, em pessoas com condições de representar bem a população, apresentar bons projetos de lei, fazer uma boa administração. Nunca tive dificuldade.

Como ex-integrante do partido, o senhor ainda vota no PT?

Ayres Britto - Hoje eu não tenho partido. Hoje o meu partido se chama Constituição, a minha militância é exclusivamente constitucional. Eu ultimamente tenho votado mais em candidatos do que em partidos.

É interessante essa posição, porque em vários votos o senhor procurou fortalecer os partidos em relação aos candidatos, como no caso da fidelidade partidária. O senhor acha que os brasileiros, como o senhor, ainda votam mais em candidatos do que em partidos?

Ayres Britto - O ideal seria que você votasse em uma legenda.

Os partidos brasileiros ainda não são bons o suficiente?

Ayres Britto - É preciso aguardar mais uns anos para que os partidos obtenham um pouco mais de consistência ideológica. Por enquanto, nos últimos anos, eu tenho votado mais, confesso, em candidatos.

Qual foi o melhor dia do senhor no STF?

Ayres Britto – Eu tive tantos dias bons... O melhor eu acho que foi quando consegui, numa viragem de jurisprudência, emplacar a tese de que o gozo do direito à aposentadoria voluntária, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, não implica a ruptura automática do vínculo de emprego. Foi uma decisão pouco explorada pela imprensa, mas deu a uma massa de milhões de trabalhadores uma duplicidade de renda. O trabalhador, sem prejuízo do seu salário e do seu vínculo de emprego, passou a ganhar também o benefício da aposentadoria junto ao INSS. Isso significou uma injeção de recursos financeiros na musculatura econômica do trabalho como valor. O poder aquisitivo da classe trabalhadora foi densamente encorpado. Isso me deu uma alegria muito grande, porque isso encurta a distância social.

O senhor foi relator de muitas causas polêmicas no STF. Isso te deu prazer?

Ayres Britto - Todas as causas de grande impacto social que eu protagonizei como relator me causaram êxtase profissional: combate ao nepotismo, células-tronco embrionárias, liberdade de imprensa, homoafetividade, Lei da Ficha Limpa, Raposa Serra doSol... Eu experimentei aqui grandes momentos de alegria pessoal e de honra profissional com essas decisões que transformaram uma cultura nacional, direcionando-a para um estágio civilizatório mais avançado. Digo isso com toda a sinceridade, não é discurso retórico, não.

E qual foi o pior dia que do senhor no tribunal?

Ayres Britto - Umas três vezes eu experimentei tristeza quando proferi votos e dois, três dias depois, eu encontrei um equacionamento diferente do que eu havia encontrado na ocasião de votar. Ou seja: eu votei de um jeito e dois, três dias depois, foi que me bateu a inspiração para um equacionamento diferente.

O senhor poderia citar um caso concreto?

Ayres Britto - Eu tenho um exemplo, mas não quero citar nesse momento, porque eu vou reabrir feridas. Esse caso até foi pior: eu votei de um jeito, em cima de uma informação, e depois vim a saber que a informação não era procedente.

Ou seja, em três ocasiões o senhor se arrependeu do voto que deu.

Ayres Britto - É. Eu encontrei um equacionamento melhor para a causa só alguns dias depois.

E não voltou atrás?

Ayres Britto - Não tinha como. A matéria já estava vencida.

O presidente do STF, Cezar Peluso, baixou norma estabelecendo que processos e inquéritos cheguem ao tribunal apenas com as iniciais dos investigados, sem o nome deles. Depois, o relator decide se abre o sigilo ou não. O senhor pretende revogar esse ato?

Ayres Britto - Eu não vou mudar solitariamente métodos de trabalho do ministro Peluso, eu conversarei com os outros ministros. Mas, pessoalmente, eu sou pela interpretação ultrarestritiva das normas que sinalizam segredo de justiça. Acho que os processos devem chegar com os nomes. Eu dou às normas que possibilitam segredo de justiça uma interpretação muito restrita. Claro que, em se tratando de menores, ou de casos de família, aí a regra é o sigilo. Fora dessas hipóteses, só casos excepcionalíssimos me levariam a imprimir segredo de justiça à tramitação de um processo.

Como presidente do CNJ, o senhor pretende propor a unificação dos critérios de acesso às informações de processos que tramitam nos tribunais?

Ayres Britto - O que eu puder desburocratizar, facilitar, desinibir o acesso, no âmbito do CNJ, eu farei. Já atendendo à Lei de Acesso à Informação, que é uma lei importante.

O senhor é afavor do aumento de salário para ministros do STF?

Ayres Britto - Esse é um tema recorrente, que faz parte das reivindicações do Poder Judiciário como um todo. É minha intenção colocar à frente das tratativas o CNJ, e não o Supremo. O CNJ lida com números e pode fazer comparações de sistemas de remuneração entre os poderes. Cabe ao CNJ zelar pela autonomia administrativa, orçamentária e remuneratória do Judiciário. Eu entregarei aos cuidados do CNJ a condução dessa retomada de discussão.

O senhor, enquanto presidente do CNJ, vai encaminhar ao Congresso novos projetos de aumento salarial para o Judiciário?

Ayres Britto - Eu vou propor a formação de uma comissão tripartite, com Executivo, Legislativo e Judiciário, para trabalhar em cima de números, de estatísticas, de comparação entre cargos em termos remuneratórios. Na medida em que se confirme defasagem em desfavor do Judiciário, aí batalharemos pela equiparação.

Na avaliação do senhor, o CNJ tem exercido bem o papel de fiscalizar os desvios de conduta dos juízes?

Ayres Britto - Acho que o CNJ tem ocupado um bom espaço e realizado bem o seu papel. Eu tenho o CNJ como órgão absolutamente necessário. Longe de ser um problema, para mim é uma solução.

Para o senhor, filhos de ministros do STF e do STJ devem atuar como advogados no tribunal?

Ayres Britto - Eu, pessoalmente, entendo que na casa onde trabalha o ministro ou desembargador não deva trabalhar o filho.

FONTE: O GLOBO

Agnelo nega renúncia: ‘Só se me abaterem fisicamente’

Identificado pela Polícia Federal como o "01 de Brasília" e o "Magrão", citado em diálogo da quadrilha comandada pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, está sob pressão do seu partido, o PT, com o governo sob vigilância do Planalto e virou protagonista de uma crise que ressuscita o fantasma da intervenção federal. Em entrevista ao Estado, ele garante que não renuncia nem se afasta do cargo, e negou ter recebido apoio financeiro ou caixa 2 para sua campanha seja de Cachoeira, seja da construtora Delta

Agnelo descarta renúncia: "não tenho culpa no cartório"

Governador do Distrito Federal nega ligações com Carlinhos Cachoeira e se diz vítima de inimigos poderosos

Vannildo Mendes

BRASÍLIA - Identificado pela Polícia Federal como o "01 de Brasília" e o "Magrão", citado em diálogos da quadrilha comandada pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), está sob pressão do seu partido, com o governo sob vigilância do Planalto e como protagonista de uma crise que faz ressuscitar o fantasma da intervenção federal. Auxiliares diretos seus se envolveram ou tentaram se aproximar do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

Mesmo assim, em entrevista ao Estado, Agnelo garante que não vai renunciar nem se afastar do cargo "sob qualquer hipótese". A não ser uma: "Só se me abaterem fisicamente", diz, reproduzindo inconscientemente o script do ex-ministro do Trabalho, Carlos Lupi, de que só deixaria o governo a bala - e que saiu demitido. "Tenho conversado com a presidente Dilma", adverte, para sinalizar apoio.

Cercado por denúncias desde que assumiu o cargo em 2011, e com baixos índices de popularidade, Agnelo é alvo de inquérito criminal no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por suspeita de irregularidades desde seus tempos no Ministério do Esporte (2003-2006) e, depois, como diretor da Agência de Vigilância Sanitária (2007-2010). Agora é alvo também da CPI mista do Congresso que vai investigar as atividades de Cachoeira. Além do apoio da presidente Dilma, garante que tem o da direção do PT para resistir às pressões. "O cara só pensa nisso (renúncia) se tem culpa no cartório. E eu não tenho", afirma. Ele vê, na CPI, uma oportunidade de provar sua inocência.

O governador disse que encontrou no governo uma máquina pública dominada por "corrupção sistêmica" e, assim, atraiu a ira de grupos econômicos poderosos contrariados. Disse também ter-se encontrado apenas uma vez com Cachoeira, numa reunião com empresários da indústria farmacêutica, em 2009 ou 2010, e negou que tenha recebido apoio financeiro ou caixa dois para sua campanha.

O senhor vai renunciar ou se afastar do cargo para facilitar as investigações?

Absolutamente. O cara só pensa nisso se tem culpa no cartório. Defendo a CPI e quero a apuração disso porque não tenho culpa no cartório.

O Planalto mandou reforços federais para seu governo, numa espécie de intervenção branca. O sr. perdeu o apoio da presidente Dilma e do PT?

Os reforços foram iniciativa nossa. Não foi nada (de intervenção ou socorro) do Planalto. Passei um ano e três meses paquerando para trazer um grande quadro federal, que é daqui de Brasília, o Luiz Paulo Barreto (ex-ministro da Justiça, que assumiu a Secretaria de Planejamento do GDF esta semana). Não houve intervenção. Só fala isso quem não conhece a presidente Dilma. Não tem acontecido isso (abandono do Planalto ou do PT). Tenho conversado com a presidente. Ontem mesmo (quinta-feira) estive com o presidente Rui Falcão (do PT). Tenho apoio de vários partidos e da minha bancada inteira no DF.

O presidente Rui Falcão afirmou que a CPI vai servir para desmascarar a farsa do mensalão...

Acho que ela vai desmascarar mesmo os ataques contraditórios que estou sofrendo. Estão tentando fazer com que a população acredite que há uma ligação (minha com Cachoeira). Mas os diálogos mostram o contrário: que os caras não conseguiram (emplacar o lobby). Não há um único exemplo de o cara ter emplacado alguma coisa.

Brasília vive o trauma de escândalos recentes, como o da Caixa de Pandora, que provocaram a prisão e cassação de um governador e indiciamento de vários políticos. O sr. teme ser punido por esse clima de clamor público?

Essa crise não é minha nem do PT, nem de Brasília. Não há um único fato que mostre envolvimento do governo do DF com esse grupo (de Cachoeira).

E quanto às suspeitas de favorecimento da Delta nos contratos com o GDF?

Não teve nenhuma facilidade, sequer um aditivo em favor da Delta. Ela só está aí porque ganhou na Justiça o direito de manter o contrato.

Porque então o sr., eleito governador em 2010, pediu ao governador em exercício, Rogério Rosso, a prorrogação do contrato com a Delta? Não é uma forma de beneficiar?

Em absoluto. Fiz um pedido genérico em relação a serviços essenciais do governo. Se não, quem vai recolher o lixo?

O que se coloca nos diálogos interceptados é que a Delta e Cachoeira deram apoio financeiro à sua candidatura e depois cobraram a fatura em forma de nomeações e contratos.

Nego absolutamente. Cite uma nomeação ou contrato. A nomeação do João Monteiro (SLU) foi minha. É uma pessoa séria, não tem vinculação nenhuma com esse segmento.

Com relação ao Cachoeira, num primeiro momento o sr. disse que não o conhecia e depois admitiu ter tido um contato com ele. Como foi esse contato e do que trataram?

Há uma forçação de barra brutal. Chegaram a publicar, a partir de diálogos de terceiros, que eu estava pedindo uma audiência com o Cachoeira (risos). É absolutamente mentiroso. Se eu quisesse falar com ele, por ser um empresário do ramo farmacêutica, jamais falaria com ele por vias como essas. Foi um encontro antes de eu ser candidato. Visitei várias indústrias em Goiás, São Paulo, fiz reuniões. Falei com outros empresários, não só com ele.

A que o sr. atribui essa onda de denúncias?

Há uma tentativa desesperada de envolver o meu nome e o PT nessa crise. Essa crise não é nossa, é do DEM e do PSDB de Goiás. A PF investigou um ano e meio a contravenção-jogos, caça-níqueis, bingos e os crimes conexos. O que a PF pegou, efetivamente? Pegou um senador, Demóstenes Torres, e o DEM de Goiás , em 300 telefonemas, entre os quais negociando interesse do jogo no Congresso. Está tudo fartamente disponível. Uma série de relações com o setor político de Goiás. Prefeitos, deputados, vereadores. Na lista da PF não constam o DF nem meu governo. Não fomos lenientes ou omissos com relação à expansão do jogo no DF.

Mas o senhor afastou seu chefe de gabinete e dois assessores. Não é uma forma de admitir envolvimento?

Em absoluto. Não há uma declaração ou diálogo direto dessas pessoas. Há um diálogo atribuindo influência sobre o chefe de gabinete (Cláudio Monteiro), falando em dinheiro para indicar o presidente do Serviço de Limpeza Urbana. O que ele (Monteiro) fez? Saiu do governo, vai se defender, mostrar que isso é falso e, uma vez provada a falsidade, voltar pro governo.

O sr. não recebeu nenhuma doação de campanha ou caixa dois, seja de Cachoeira ou da Delta?

Em absoluto.

Além da Monte Carlo, o sr. é alvo de inquérito, no STJ que apura irregularidades na sua gestão no Ministério do Esporte e na Anvisa.

O processo que corre no STJ é do meu interesse porque provém de uma denúncia de um bandido, que alegou ter-me dado suborno na véspera do período eleitoral (abril de 2010). Foi espontaneamente a uma delegacia num sábado e lá encontrou o delegado e o promotor para tomar o depoimento. Como depois eu fui eleito, o caso subiu para o STJ. Espero desmascarar esses detratores. As denúncias com relação à Anvisa já foram apuradas e rechaçadas. No (programa do Ministério do Esporte) Segundo Tempo não há nada contra minha gestão, tive todas as contas aprovadas, com certidão do TCU e CGU.

Quem está tentando derrubá-lo?

Estou enfrentando grupos poderosos, que saquearam o patrimônio público. Sou alvo desses interesses contrariados. Instaurei uma Secretaria de Transparência e fiz 14 mil auditorias. Estou buscando o dinheiro saqueado. Estou pedindo de volta R$ 750 milhões roubados. Já declarei várias empresas inidôneas. E não tem ninguém preso. (O esquema) está aí operando, com métodos que não há em nenhum outro lugar do País.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cachoeira sacou R$ 8,5 milhões em ano eleitoral

O tesoureiro de Carlinhos Cachoeira, preso sob a acusação de corrupção, usou uma empresa de fachada para sacar R$ 8,5 milhões oriundos da Delfa Construções, revelam Leandro Colon e Fernando Mello.

O dinheiro foi retirado ao longo do ano eleitoral de 2010. A Polícia Federal investiga se a quantia financiou campanhas políticas

Dinheiro da Delta abasteceu grupo de Cachoeira em 2010

Contador sacou R$ 8,5 milhões em conta irrigada pela "empreiteira do PAC", diz PF

Transações feitas no ano eleitoral teriam ocorrido por meio de repasses a uma empresa de fachada

Leandro Colon, Fernando Mello

BRASÍLIA - O contador do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, sacou no ano eleitoral de 2010 R$ 8,5 milhões que saíram dos cofres da construtora Delta, empresa que detém contratos milionários com o poder público.

Único foragido da Operação Monte Carlo, Geovani Pereira da Silva é apontado pela Polícia Federal como tesoureiro do esquema de Cachoeira e, de acordo com investigadores, seria o elo financeiro do grupo com políticos.

Perícias em sigilo bancário feitas pela PF, às quais a Folha teve acesso, mostram que Geovani sacou os recursos de uma conta bancária em nome de uma empresa em Brasília chamada Alberto e Pantoja Construções e Transportes Ltda. Ela não existe no endereço declarado.

Essa empresa, segundo a investigação, foi criada em fevereiro de 2010 somente para receber dinheiro da Delta.

No dia 11 de maio de 2010, a Pantoja abriu uma conta bancária no HSBC em Anápolis (GO), terra natal do empresário. Onze dias depois, a Delta começou a transferir dinheiro para esta conta, conforme mostram os extratos.

Apenas 72 horas depois do primeiro depósito, o contador de Cachoeira começou a retirar o dinheiro. A Pantoja, segundo a polícia, está em nome de dois laranjas, e no local funciona uma empresa de lanternagem e pintura.

Caixa dois

Diante da descoberta dos milionários saques em 2010, uma das linhas de investigação da PF e do Ministério Público é se esse dinheiro teve fins eleitorais, principalmente porque Geovani não declarou nenhum rendimento naquele ano, o que indica que o recurso não seria para ele.

Entre junho, quando começou a pré-campanha, e fim de setembro de 2010, véspera do primeiro turno, cerca de R$ 5,5 milhões foram retirados, 65% do total sacado naquele ano pelo tesoureiro.

A Operação Monte Carlo envolve parlamentares, entre eles o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), um grupo de deputados, além dos governos de Goiás e do Distrito Federal.

O Congresso deve instalar uma CPI depois de amanhã para investigar as ligações de Cachoeira com políticos.

A conta corrente no HSBC foi encerrada em agosto do ano passado. Em 2011, Geovani sacou mais R$ 3,4 milhões, além do que havia retirado no ano anterior.

Ao todo, foram 143 saques feitos pelo contador de Cachoeira. Todos entre R$ 90 e R$ 99 mil, abaixo de R$ 100 mil, limite que, quando ultrapassado, deve ser comunicado automaticamente ao Coaf, órgão de inteligência financeira do governo federal.

No período, a Delta Construções repassou R$ 27,2 milhões para a Pantoja, 99,98% do que ela recebeu.

A Delta é desde 2006 a que mais recebe dinheiro do Orçamento, principalmente por obras do Programa de Aceleração do Crescimento. Segundo a polícia, ela faz parte do esquema de Cachoeira.

Além dos saques, empresas suspeitas de participar do esquema de Cachoeira foram destinatárias do restante dos recursos repassados.

Colaborou Flávia Foreque

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Um ano depois da criação, PSD luta para não ser um naufrágio político

Partido de Kassab busca solução jurídica no TSE para não desaparecer até 2014

Fernanda Krakovics

BRASÍLIA. O PSD foi lançado como uma grande promessa para políticos de oposição que queriam aderir ao governo sem perder o mandato por infidelidade partidária. Mas, passado um ano desde a criação, seus integrantes temem ter embarcado em uma canoa furada. Apesar do otimismo da direção, na base do partido há o receio de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decida que a nova sigla não terá direito a tempo de TV para fazer propaganda política gratuita e nem ao fundo partidário, proporcionais ao tamanho da bancada na Câmara dos Deputados, hoje a terceira maior.

Apesar de ser o mais importante, esse não é o único problema do PSD. Expoentes do partido reclamam do caciquismo do presidente e fundador da legenda, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Ele é considerado grande articulador político, mas correligionários consideram que deu um mau passo em São Paulo ao negociar aliança com o PT e, depois, fechar apoio à candidatura do tucano José Serra (PSDB) à prefeitura da capital paulista.

- Ele errou no dia em que não se sentou com José Serra e teve uma conversa definitiva. Ele não podia ter assumido o risco de ter bancado tantos gestos, ter ido ao aniversário do PT. Foi como se, na hora de fazer o gol, ele tivesse chutado contra - diz um desses dirigentes do PSD.

A decisão do TSE sobre o tempo de TV e o fundo partidário é crucial para o PSD. Na segunda-feira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deu parecer considerando que o partido não tem direito à fatia proporcional do fundo partidário e a tempo de TV porque seus deputados foram eleitos por outras legendas. Ainda não há uma data para o julgamento no tribunal.

A preocupação do partido não é com as eleições municipais deste ano, e, sim, com 2014, como relata um parlamentar:

- Se chegarmos a 2014 sem tempo de TV, não teremos nenhuma importância. Estaremos fora da mesa de pôquer. Não somos um partido de grandes lideranças regionais, então, não temos força, por si só, para indicar candidato a governador ou a senador para compor uma chapa.

Já foi balde de água fria para deputados e senadores do PSD a derrota sofrida no Supremo Tribunal Federal, que negou, em liminar, o direito do partido de presidir comissões da Câmara.

Ao contrario da base, os dirigentes do PSD que estão na linha de frente se dizem confiantes na vitória no TSE e minimizam o revés sofrido até agora.

- Não estou pessimista porque tenho convicção de que o partido tem direito ao tempo de TV e ao fundo partidário - afirmou o secretário-geral da legenda, Saulo Queiroz.

No dia a dia, deputados do PSD se ressentem de pequenas coisas, como não ter um lugar destinado para a bancada no plenário da Câmara e de não serem indicados para relatar projetos. Com a indefinição jurídica , os parlamentares da nova sigla se sentem como "zumbis".

- É um momento de cautela, mas tudo tem limite. Em determinado momento, o partido terá que dizer a que veio, cobrar espaço, tempo de TV e vida partidária - diz o deputado federal Moreira Mendes (RO).

Para pontuar a insatisfação com o comando de Kassab, parlamentares reclamam que ele só reuniu a Executiva Nacional uma vez, há seis meses, quando o partido obteve o registro no TSE. O líder do PSD na Câmara, deputado Guilherme Campos (SP), minimiza as queixas:.

- Neste momento, cada um está cuidando de seu estado, por isso não tem reunião da Executiva. Mas nós nos falamos sempre, e Kassab não deixa de atender ninguém.

No Congresso, o partido - que não é de direita, não é de esquerda e nem de centro - costuma votar com o governo, mas se mantém oficialmente "independente", para salvar as aparências, já que seus deputados e senadores acabaram de migrar da oposição.

- Estamos satisfeitos com a interlocução com o Planalto e com nosso espaço nas comissões da Casa. Preferimos permanecer independentes - disse a senadora Kátia Abreu (TO), vice-presidente do partido.

FONTE: O GLOBO

Para não desaparecer, DEM já admite fusão

Parlamentares se dizem contra a união com outra legenda, mas acham que será inevitável se partido fracassar nas eleições

Paulo Celso Pereira

BRASÍLIA. A sala da liderança do Democratas na Câmara tem apenas uma foto na parede. É de Luís Eduardo Magalhães. Filho de Antonio Carlos Magalhães e ex-presidente da Câmara, Luís Eduardo simboliza um tempo que o partido não gosta de esquecer. Modernizador, carismático, poderoso, ele foi preparado longamente para levar o então PFL de volta ao poder central. Em 1998, iria para o governo da Bahia. Nos planos no PFL, em 2002 estaria pronto para chegar ao Palácio do Planalto com auxílio do presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas no dia 21 de abril de 1998, um infarto fulminante levou Luís Eduardo e, com ele, as esperanças de toda uma geração do partido.

Desde então, uma espécie de maldição parece pairar sobre o partido - rebatizado em 2007 como Democratas, ou DEM. Rosena Sarney, Cesar Maia, José Roberto Arruda e agora Demóstenes Torres. Todos nomes cotados, em maior ou em menor grau, para disputar a Presidência da República. Todos, por motivos diversos, abatidos antes mesmo do início da campanha.

Do luto de Luís Eduardo ao de Demóstenes, passaram-se 14 anos. Neste período, o partido deixou de ser governo e viu sua bancada que era de 105 deputados encolher para 27. E, pior, disseminou-se entre os correligionários uma discussão impensável para o outrora maior partido do país: o caminho para o DEM é a fusão a um grande partido?

Na última semana, O GLOBO ouviu 23 dos 31 parlamentares da legenda. Entre eles, 74% são contra a fusão hoje. Mas, a opinião disseminada é que a medida pode tornar-se inevitável, dependendo do resultados das eleições deste ano. Metade dos ouvidos opinou sobre a possibilidade de uma fusão. O PMDB foi o partido preferido, com 50% dos votos, o dobro do PSDB.

Partido espera manter fundo de R$ 5,4 milhões

Além das eleições, nos próximos meses outro fator pesará na definição do futuro da legenda. O TSE julgará em breve se o DEM terá o direito de manter o tempo de televisão e o valor do fundo partidário proporcional à bancada que elegeu em 2010 ou se perderá parte deles para o recém-criado PSD - o partido de Gilberto Kassab que tomou 16 deputados da legenda.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, manifestou-se na última semana a favor do DEM. Caso o TSE concorde com a PGR, o partido continuará tendo um papel importante na definição de alianças partidárias nas eleições deste ano e na de 2014 - tem a oferecer preciosos minutos de propaganda na TV e um bom naco do fundo partidário.

Com base na bancada de 43 deputados federais que elegeu em 2010, o DEM receberá este ano do fundo partidário cerca de R$ 5,4 milhões, valor semelhante ao que será destinado ao PSDB e menos da metade do que recebe o maior partido (PT), R$ 12,2 milhões.

Os líderes do partido se fiam nessa expectativa positiva para manter viva a esperança de sobrevivência.

- O gado foi embora, mas ficamos com as benfeitorias da fazenda - comentava recentemente o ex-deputado federal José Carlos Aleluia (BA) em conversa com amigos no Congresso.

FONTE: O GLOBO

José Agripino diz que papel do DEM na política é especial

Líder do partido no Senado, Agripino conduz legenda com missão de garantir sobrevivência

Paulo Celso Pereira

BRASÍLIA - Presidente do Democratas e líder no Senado, José Agripino Maia (RN), conduz o partido na missão de garantir a sobrevivência. Fundador do ex-PFL, Maia diz que há espaço ideológico para o DEM na política: a centro-direita.

Como o senhor vê a redução do partido, que já foi o maior do país?

JOSÉ AGRIPINO: A situação de hoje é uma coisa, a perspectiva de futuro é outra. Hoje, o Democratas é um partido depurado. É um partido que perdeu nomes, mas manteve sua essência. Hoje o DEM é menor, mas se fala mais de nós do que de vários partidos com mais deputados que nós.

E o capital eleitoral?

AGRIPINO: Tivemos lideranças que perderam as eleições, mas não o capital político. Marco Maciel, Heráclito Fortes, José Carlos Aleluia continuam atuando. Todos eles ainda mantêm sua força e sua respeitabilidade.

Muitos parlamentares falam que caso a eleição deste ano for ruim, a fusão é inevitável.

AGRIPINO: Falar em fusão agora é uma piada de mau gosto. Por que devemos prever um mau resultado quando a perspectiva é positiva? Nós lideramos as pesquisas em Aracaju, Salvador, Macapá, Mossoró, Feira de Santana... Nós temos todas as condições de sair dessas eleições maiores do que entramos.

O fato de ter ficado os últimos nove anos na oposição, depois de décadas como governo, foi decisivo para a redução da legenda?

AGRIPINO: Não posso negar que o êxito das políticas públicas do governo Lula tenha impedido a reeleição de muitos dos nossos.

Ainda há espaço ideológico para o partido?

AGRIPINO: Nosso papel na política brasileira é especial. O espaço que nos está reservado é o da centro-direita, com ideias liberais. Este é um país que está ficando menos competitivo a cada dia. Esse tamanho do Estado brasileiro, a enorme carga tributária e o aumento do gasto público são inviáveis no longo prazo. E nós temos de cumprir o papel de denunciar esses fatos.

FONTE: O GLOBO

Em 8 anos, repasses federais para a Delta cresceram 2.000%

Fernando Cavendish, dono da empreiteira central no caso Cachoeira, entrou em evidência após acidente aéreo

Empresa, uma das seis maiores empreiteiras do país, é suspeita de ter como sócio oculto o contraventor preso

Dimmi Amora, Natuza Nery

BRASÍLIA - Fernando Cavendish, dono da Delta Construção, viveu em 17 de junho de 2011 duas tragédias: "Perdi minha mulher e virei alvo".

A confidência, feita a amigos, remonta a um acidente naquela tarde. No trajeto de Porto Seguro (BA) a Trancoso (BA), o helicóptero que levava sua mulher e seu filho caiu, matando os dois e mais cinco.

O episódio explicitou a relação entre ele e um amigo importante: o governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ). Pouco depois, descobriu-se que os dois foram à Bahia em um jatinho de Eike Batista.

A exposição do caso trouxe à tona a bilionária evolução dos negócios de Cavendish. Agora, a empreiteira aparece no centro da investigação sobre os negócios suspeitos do empresário Carlinhos Cachoeira.

Foi no Rio, a partir de 2000, que a Delta surgiu como potência da construção civil. Já recebeu R$ 1,5 bilhão em obras no Estado. Atua ainda na coleta de lixo, medição de água e aluguel de carros.

Hoje figura entre as seis maiores empreiteiras do país, focada no setor público. O contato pessoal de Cavendish com políticos é tido no mercado como segredo do sucesso.

A empresa emergiu em 2005 para o cenário nacional. Foi escolhida para tocar a maior parte de uma das primeiras grandes ações do governo Lula, uma operação sem licitação para remendar rodovias federais.

Em pouco tempo, bateu mais recordes: em 2007, virou campeã de recebimentos federais quando o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) dava os passos iniciais. Entre 2003 e 2011, cresceu mais de 2.000% em recursos federais.

Também avançou em 24 Estados e no Distrito Federal. Ao lado de Goiás, o DF está no foco do atual escândalo com Cachoeira, apontado pela polícia como sócio oculto de Cavendish. Na semana passada, foi criada uma CPI para investigar o caso.

O principal cliente da Delta é o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), de onde vêm 90% de tudo o que a empresa recebeu da União em 2011.

Por lá, a Delta é conhecida como "a mergulhadora". Na confraria dos construtores, Cavendish recebe a alcunha de "Sr. Ousado". Ele não quis falar com a Folha.

No ramo, "mergulhar" o preço é a prática de fazer uma oferta muita baixa na licitação e, após vencer, não cumprir o combinado ou pedir revisões que encarecem a obra.

Nem sempre, porém, o "mergulho" deu certo. Em 2006, a Delta perdeu parte de um grande negócio porque a Prefeitura do Rio se recusou a revisar os valores da construção de um estádio.

Em 2011, o governo ameaçou a Delta: caso não cumprisse o prazo na entrega de um terminal do aeroporto de Guarulhos, a empresa não receberia novos contratos.

A Delta cumpriu, mas a imagem saiu arranhada: no dia da inauguração, o forro do teto desabou.

A investigação da Operação Monte Carlo da Polícia Federal aponta ligações de Cachoeira com a companhia no Centro-Oeste.

Ao menos R$ 39 milhões da Delta foram depositados em empresas-fantasma ligadas ao grupo de Cachoeira, afirma a PF.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

CPI no Rio já destacava 'prestígio' de Cachoeira

Investigação sobre Loterj, por causa do escândalo Waldomiro, mostrou que contraventor tinha "excelentes relações entre os políticos locais"

Wilson Tosta

RIO - O prestígio de que o contraventor Carlinhos Cachoeira desfrutava entre políticos goianos já fora apontado em investigação na Assembleia Legislativa do Rio. A CPI da Loterj, sobre as relações de Cachoeira com o ex-presidente da autarquia Waldomiro Diniz, também ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil sob José Dirceu, já destacava, em seu relatório final, votado em outubro de 2004, a popularidade de Cachoeira na política de Goiás, não se limitando à atuação do acusado em relação ao governo fluminense.

"Em Goiás, Carlos Ramos mora no mais sofisticado edifício de Goiânia, o Excalibur", afirma o relatório. "É vizinho de alguns dos mais importantes empresários do Estado e é considerado um bem-sucedido homem de negócios, com excelentes relações entre os políticos locais."

A descrição confere com o que afirmou, quase oito anos depois, o governador Marconi Perillo (PSDB), em entrevista publicada na última segunda-feira pelo Estado: "Todos os políticos importantes de Goiás tiveram alguma relação com o Cachoeira." A CPI da Loterj, na época, pediu o indiciamento de Cachoeira por extorsão, violação da Lei de Licitações, corrupção ativa, fraude de concorrência pública e compra de voto.

Proximidade do poder, corrupção e arapongagem foram temperos importantes do escândalo de 2004. Ele começou com a divulgação, pela revista Época de 13 de fevereiro daquele ano, de uma gravação em vídeo da conversa entre Waldomiro e Cachoeira. Nela, o então assessor de Dirceu aparecia, provavelmente em junho de 2002 (quando presidia a Loterj), oferecendo ao contraventor a oportunidade de redigir um edital de licitação da autarquia, sobre jogos eletrônicos. O objetivo seria beneficiar o consórcio Combralog, de Cachoeira.

Waldomiro pediu dinheiro para as campanhas de Benedita da Silva (PT) e de Rosinha Garotinho (então no PSB) ao governo. Chegara ao posto na gestão Anthony Garotinho (1999-2002) e fora mantido pela petista (que assumiu em abril de 2002).

Em seu depoimento à CPI, Cachoeira diria que, na conversa que mandara gravar, apenas agira para tentar fazer Waldomiro pensar que seria atendido, mas nada lhe dera, e explicou que a fita fora editada. "Na verdade, ele (Waldomiro Diniz) me fez "n" pedidos, mas nenhum foi atendido, só da boca para fora. Eu queria fazê-lo entender que estaria negociando, mas não repassei nada para o Waldomiro (...) Na época ele fez solicitação para campanha política, está na fita, não foi dado nenhum centavo a ele. O que me lembro é isso, ele pediu um porcentual também."

Já o ex-assessor de Dirceu - que perdeu o cargo na Casa Civil em junho de 2005, no primeiro grande escândalo político da Era Lula - afirmou que Cachoeira o chantageou.
Setor privado. Montada em um cenário político adverso para o PT do governo federal - era dominada pela maioria pró-Rosinha Garotinho, engrossada pelo apoio do PSDB e por partidos nanicos -, a CPI da Loterj listou empresas que seriam controladas por Carlos Cachoeira: Barna Construções, Brasília Armazéns Gerais, Gerplan (que administrava as loterias goianas), Vantagens Net Marketing de Incentivo, Bet-Capital, Vitapan Indústria Farmacêutica, Brazilina Games e Teclogic.

A listagem torna difícil de sustentar eventuais versões sobre o suposto "desconhecimento", em Goiás, em relação à atuação de Cachoeira - que rejeita o rótulo de bicheiro.

Além de Carlos Cachoeira e Waldomiro Diniz, outras 18 pessoas tiveram indiciamentos pedidos pela CPI da Loterj.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

No Rio, PT e PSDB são apenas coadjuvantes

Alfredo Junqueira

RIO - Enquanto se enfrentam há 18 anos em acirradas eleições à Presidência da República, PT e PSDB assistem como coadjuvantes às disputas pelo poder no Estado do Rio. Principalmente na capital.

Liderado pelo governador Sérgio Cabral e pelo prefeito Eduardo Paes, ambos ex-tucanos, o PMDB é a principal força política no Rio hoje. De um lado, a candidatura de Marcelo Freixo, do PSOL, à Prefeitura do Rio e, de outro, a aliança regional entre DEM, do ex-prefeito Cesar Maia, e PR, do ex-governador Anthony Garotinho, são as duas opções mais viáveis de oposição à hegemonia peemedebista.

O momento áureo do PSDB no Rio foi entre 1994 e 1998, quando Marcello Alencar se elegeu governador e Fernando Henrique Cardoso era presidente da República. Nas eleições municipais de 1996, tucanos chegaram a eleger 27 prefeitos e obtiveram 26,24% do total dos votos válidos nas disputas pelos executivos municipais.

No pleito seguinte, com o governo do Estado já sob a gestão Anthony Garotinho, na época do PDT, os tucanos debandaram. Elegeram 11 prefeitos e tiveram 15,78% dos votos válidos no Estado. Na capital, Ronaldo Cezar Coelho ficou em sexto lugar, com 1,82% dos votos, em eleição vencida por Cesar Maia, então no PTB. Foi a última vez que tucanos tiveram cabeça de chapa na capital. O PSDB do Rio viu suas vitórias nas eleições municipais minguarem para três cidades, em 2004, e oito, em 2008.

Já o PT apresenta movimentos díspares no Estado. Suas candidaturas na capital tiveram desempenho crescente nos anos 1990. Na última década, após confusa gestão de Benedita da Silva no governo do Estado, entre abril e dezembro de 2002, o desempenho do partido foi pífio. Já a participação na região metropolitana e no interior vem tendo avanço constante.

Em 1996, Chico Alencar foi o terceiro colocado na capital, com 21,67%. O partido venceu em dois municípios. Benedita disputou a prefeitura em 2000 e também ficou em terceiro, com 22,62% dos votos válidos. Petistas elegeram apenas um prefeito no Estado.

Em 2004, primeira eleição municipal depois da posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência e da gestão Benedita no governo do Estado, Jorge Bittar obteve 6,31% dos votos válidos na capital. Ficou na quinta posição. O partido, no entanto, fez nove prefeitos. Na última eleição, em 2008, Alessandro Molon também ficou em quinto, com 4,97%. O PT fez 10 prefeitos.

O melhor resultado do PT no Estado do Rio foi em 2010, quando Lindberg Farias, prefeito de Nova Iguaçu por duas vezes, foi o candidato ao Senado mais votado no Estado, com 4,2 milhões de votos. O petista também cumpriu "cota de sacrifício" pelo projeto nacional do partido. Queria concorrer ao governo, mas foi impedido pelo PMDB de Cabral, que disputava a reeleição, em troca do apoio do partido à eleição de Dilma Rousseff.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Meta das duas siglas (PT-PSDB) é eleger mais vereadores

RIO - PT e PSDB desempenharão papel secundário nas eleições do Estado do Rio. Diretórios regionais dos dois partidos estabeleceram a ampliação de cadeiras nas câmaras municipais como meta principal nos pleitos de outubro.

Pela primeira vez desde a redemocratização, o PT não terá candidato à Prefeitura no Rio. O vereador Adilson Pires será vice na chapa à reeleição de Eduardo Paes (PMDB). Petistas cumprem "cota de sacrifício" por causa do projeto nacional. Pretendem passar de 70 vereadores para 150.

Já o PSDB, após 12 anos, terá candidato na capital: o deputado federal Otávio Leite. O partido deve ficar sozinho na disputa, já que o DEM lançará candidato, o deputado federal Rodrigo Maia; o PPS e o novato PSD aderiam a Paes; e o PV deve lançar a deputada estadual Aspásia Camargo. O partido espera eleger 90 vereadores.

Atualmente, o PT controla oito das 92 prefeituras fluminenses; o PSDB, três cidades. / A.J.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A federação PT

Depois que chegou ao poder, com Lula, o PT se fragmentou em núcleos regionais que travam duras disputas internas, a exemplo do que ocorre hoje no Recife

Sérgio Montenegro Filho

Após quase 12 anos de poder, o Partido dos Trabalhadores (PT) é hoje, sem sombra de dúvida, diferente daquela legenda operária dos anos 80 e 90, que primava por um discurso radical de oposição e – mesmo dividido em várias tendências ideológicas – sempre unia forças quando se tratava de combater os governos “neoliberais”. Bem maior do que era antes de assumir o Palácio do Planalto, em 2003, o PT atual é um partido institucionalizado e fracionado em vários PTs regionais, cujos núcleos, muito além de divergirem entre si, travam disputas fratricidas pela hegemonia local.

A necessidade da realização de prévias para a escolha do candidato a prefeito do Recife é um exemplo do processo de autofagia a que se submeteram os petistas. Embora em nível estadual o partido esteja sob o comando do senador Humberto Costa, na capital o cenário é diferente. Além do grupo de Humberto, outros dois segmentos – o do prefeito João da Costa e o do deputado federal João Paulo – brigam, nem sempre silenciosamente, por espaço. Essas subdivisões do PT lembram, segundo o cientista político paranaense Roberto Romano, o início do processo de fragmentação do PMDB, deflagrado ainda durante a ditadura militar, ainda com a sigla MDB, que abrigava sob um único guarda-chuva toda a oposição ao regime de exceção.

Professor da disciplina de Ética e Política da Universidade Federal de Campinas (Unicamp), Roberto Romano elaborou um estudo em que compara a subdivisão do PT às “capitanias hereditárias” do PMDB, espalhadas pelo País, sob o controle de caciques regionais. A diferença, segundo ele, é que os peemedebistas não dispõem mais de uma grande liderança, papel que já coube a figuras como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e Franco Montoro. Alguém que os comande rumo a um projeto nacional. O PT, por sua vez, conta com a força política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, mais recentemente, com a da presidente Dilma Rousseff. “No início do atual governo, eu imaginava que Dilma faria apenas um mandato-tampão, abrindo espaço para a volta de Lula em 2014. Mas ela construiu estilo e força próprios, e já tem essa capacidade de unir o PT”, reconhece Romano.

Para o professor, porém, o trabalho de “costura” do partido deve ficar mais difícil a cada dia. Sobretudo pelo recrudescimento das disputas regionais no PT. “hoje temos o PT de Jaques Wagner (BA), o de Tarso Genro, o de Humberto Costa (PE), o dos irmãos Tião e Jorge Vianna (AC), o de Luizianne Lins (CE) e vários outros espalhados pelo País. Sem falar de São Paulo, que tem vários PTs. E em todos esses locais, o partido trava brigas internas entre grupos rivais”, analisa. Para ele, com tantos segmentos, o PT já atingiu o mesmo nível de “oligarquização” do PMDB, mas com uma diferença: embora tenha passado quase 12 anos no governo, não soube ampliar seu poder nos municípios, como fez o PMDB.

“Os petistas optaram por fazer alianças com outros partidos, em nome da governabilidade. Já o MDB, pelo fato de ser oposição num período de ditadura, não dispunha dessa alternativa e precisou se reforçar nos municípios. Tornou-se, assim, o maior partido nacional, e se mantém até hoje como fiel da balança, inclusive nos governos do PSDB e do PT”, explica Roberto Romano. Mas ao menos por ora, segundo ele, o PT ainda conta com alguém que costure a unidade interna entre os núcleos regionais da sua federação. “Lula, mesmo doente, continua sendo um operador poderoso, de uma genialidade política espetacular na construção de alianças e acordos”, afirma.

O estudioso, porém, levanta dúvidas sobre o futuro eleitoral do ex-presidente. Considera improvável que ele ainda venha a disputar a Presidência em 2014, diante da alta popularidade conquistada por Dilma, que deve concorrer à reeleição e, de alguma forma, assumir a ponta no papel de articuladora da federação petista. “Lula fez o milagre político de reproduzir em Dilma esse elo que, antes, somente ele representava, que une todo o PT”, analisa. E provoca: “Quem mais empolgaria o partido em 2014? Tarso (Genro) não passa da região Sul. Patrus (Ananias) não sai de Minas Gerais. (José) Genoíno, Marta (Suplicy) e (Aloísio) Mercadante são quadros do passado paulista do PT. E (Antônio) Palocci e (José) Dirceu, que eram os nomes preferidos de Lula, foram para o espaço depois das várias denúncias contra eles”.

Restrições

Roberto Romano também descarta, por enquanto, a hipótese de o PT vir a jogar o jogo presidencial de 2014 apoiando um candidato de uma legenda aliada, a exemplo do governador Eduardo Campos (PSB), cujo nome, vez por outra, tem sido especulado. “A própria Dilma, pelo fato de ter pertencido antes ao PDT, enfrentou restrições no PT, e só foi aceita depois que Lula declarou apoio integral a ela”, lembra. “Eduardo Campos é um político jovem e articulado, tem um bom discurso. Mas lhe falta o respaldo da mídia nacional e, principalmente, do PT. Talvez tenha chances em 2018, quando Lula e Dilma tiverem saído de cena”, conclui.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Em Recife, oposições mais uma vez sem união

Assim como as eleições de 2008, o campo da oposição no Recife caminha para ir fracionada para a disputa da PCR, apesar das expectativas da unidade

Débora Duque

Cada eleição tem sua história. O jargão, reiterado sempre que se tenta fazer uma analogia entre um processo eleitoral e outro, virou regra no meio político. Há de se convir, entretanto, que a história (ou parte dela) se repete, sim. E, na disputa pela Prefeitura do Recife, a máxima se aplica – em alguns aspectos, vale ressaltar – ao campo da oposição. Desde que deixou o poder municipal, em 2000, o grupo ainda não conseguiu sequer provocar a realização de um segundo turno contra os “Joões” do PT. Nem mesmo em 2004, quando a extinta União por Pernambuco estava à frente do governo do Estado com Jarbas Vasconcelos (PMDB). Hoje, as perspectivas são de uma fragmentação ainda maior do que foi em 2008. E a pergunta que fica é se o desfecho também será o mesmo dos dois últimos pleitos.

Em relação ao cenário de quatro anos atrás, algumas condições são semelhantes. Entre elas, os rumos “próprios” tomados por DEM e PMDB com as candidaturas de Mendonça Filho (DEM) e Raul Henry (PMDB). A diferença é que, em 2008, a “divisão” foi encarada com mais naturalidade. Até porque já era esperada, diante da derrota do democrata na eleição estadual (2006) e do desejo de Henry de concorrer desde 2004. Para 2012, criou-se uma expectativa de união que, por hora, não se concretizou e os indicativos são de que, novamente, nenhum dos dois irá abrir mão do seus projetos.

O agravante, desta vez, é que tanto o PPS de Raul Jungmann como o PSDB, com Daniel Coelho, também não cederam. Na última eleição, o primeiro apoiou a postulação “híbrida” de Cadoca (PSC) que, recém-saído do PMDB, fez uma campanha de oposição no âmbito municipal, mas atrelada ao governador Eduardo Campos (PSB). Já os tucanos foram representados pelo ex-deputado Bruno Rodrigues (PSDB) na vice de Henry. É ao descolamento deles, inclusive, que o cientista político Maurício Romão atribui, entre outros fatores, o atual fracionamento da oposição. Somado também, segundo ele, à ausência de uma coordenação política, como houve em 2004 (leia abaixo). “Desde o início, houve um afastamento dos grandes líderes. Os interessados são que negociam, o que torna a unidade mais difícil”, avaliou.

Apesar da “desarrumação”, os oposicionistas consideram que o cenário deste ano é mais favorável do que o passado. O curioso, porém, é que o mérito não é atribuído à capacidade de articulação do grupo, mas à desorganização da base governista com o racha no PT e a dissidência do senador Armando Monteiro Neto (PTB). “Temos mais sorte do que juízo”, admite Jungmann.

Já em 2008, mesmo com a insatisfação de setores PT com a imposição da candidatura de João da Costa (PT), a frente que ainda comanda o município estava mais coesa e desfrutava da popularidade do governo Lula. “Por apenas 1,5%, não houve segundo turno”, relembra Mendonça Filho.

Mas o desfecho, segundo Romão, não pode ser creditado a um erro do grupo. “Desde o início, as pesquisas já apontavam a ascensão de João da Costa. Hoje é o contrário e a eleição pende para um segundo turno. O ideal seriam duas candidaturas. Mas acredito que o cenário atual não é o fim do mundo”, destaca.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

A normalidade das coisas :: Renato Lessa

Demóstenes Torres é um "senador normal pego em flagrante". Sua desgraça consiste exatamente no flagrante

Se a identidade nacional de uma população for definida por suas práticas mais usuais, pode-se dizer que o brasileiro é, antes de tudo, um telespectador. A medida de exposição diária ao veículo supera a quantidade média de horas passadas pelas crianças brasileiras, a cada dia, nos bancos escolares. Se fosse eu um paranoico amador diria que o conteúdo veiculado está a serviço do propósito de transformar os cidadãos do País em uma cáfila de oligofrênicos cívicos.

(Nota metodológica: por ignorar qual seja o coletivo de "oligofrênicos cívicos", optei por "cáfila", que me parece menos ofensivo do que "vara" e mais apropriado do que "alcateia" ou "enxame"; espero não ser molestado pela Sociedade de Proteção dos Camelos.)

Não sei se há propósito na coisa, mas isso é irrelevante. O que parece ser incontroverso é o fato de que no jorro televisivo o espaço dedicado à informação política resume-se a poucos minutos dos jornais intercalados em meio ao que interessa – as novelas – e a alguns minutos a mais para os notívagos, nos jornais do fim da noite. Da qualidade da informação, pouco há que falar: pouquíssimo texto, abundância de lugares comuns, imagens agressivas. Sobretudo denúncias, já que o animal telespectador que se quer fabricar deve ser um vingador vicário, adicto à droga inscrita na dose diária de escândalo que lhe é ministrada.

O civismo do personagem deve confinar-se na indignação instantânea, que fenece no próprio ato de expressão, imediatamente encoberta pelo turbilhão de imagens a respeito de assuntos diversos. Em plena "sociedade da informação", são os ecos do padre Antonil, importante cronista colonial, que se insinuam, ao falar, no século 18, das crianças criadas nos engenhos de açúcar "como tabaréus, que nas conversações não saberão falar de outra coisa mais do que do cão, do cavalo, e do boi".

Mas, mesmo supondo que as energias cognitivas médias do País estejam em estado de deflação – e que passemos grande parte de nossos trabalhos e dias a falar do "cão, do cavalo e do boi" – há coisas que não podem deixar de ser percebidas. Não há como imaginar que os brasileiros sejam, por natureza, menos inteligentes do que outros povos. Nesse sentido, é inacreditável pretender sustentar que o turbilhão que envolve o senador Demóstenes Torres seja extrínseco ao enredo que o constituía, até o momento de sua caída em desgraça, como campeão da direita brasileira e virtual candidato à Presidência da República.

Seu ex-partido – o quase ex-DEM – é formado por experientes expoentes da política tradicional brasileira, que têm noção precisa a respeito do que deva ser a vocação da política. É pouco crível que ao menos parte dos elementos, digamos, biográficos do senador Demóstenes fosse desconhecida de seus pares mais importantes. A cultura política que paira sobre o Estado do Goiás, e parece vincular em uma rede pluripartidária todo o espectro da representação política a um circuito criminoso, não é goiana, sua linguagem e sua gramática podem ser compreendidas em diversos cantos do País. E nesses cantos, entre próceres operadores de outros partidos, há os que pertencem à agremiação que tinha no senador Demóstenes destemido e implacável campeão.

Assim como Nelson Rodrigues definia os tarados como "homem normais pegos em flagrante", os correligionários de Demóstenes Torres, no âmago de suas almas, devem concebê-lo como um "senador normal pego em flagrante". Sua desgraça consiste exatamente no flagrante. É evidente que é um erro generalizar a proposição, mas será ingenuidade desconhecer a plausibilidade do mantra. O caso Demóstenes é expansivo: a mesma rede se apresenta a alguns insuspeitos e a outros nem tanto assim. A rede é viscosa e sua pregnância não reconhece distinções partidárias. O efeito da dispersão – ou da onipresença da relação entre alta criminalidade e alta política – apresenta-se em uma percepção pública, cada vez mais comum e consolidada, de que os agentes públicos apanhados em conversas estranhas são "homens normais pegos em flagrante". O flagrante aparece como capricho; como azar e como descuido que revelam a normalidade das coisas.

Se o espectro do Direito Penal ronda a política, os tribunais, de modo necessário, convertem-se em arenas decisivas, não apenas para a sentença devida, mas para a elucidação do que está a se passar. Graças à inteligente e oportuna intervenção do presidente do Partido dos Trabalhadores, aprendemos que o evento Demóstenes – e toda a infestação que o acompanha – possui, digamos, propriedades compensatórias com relação ao estrago de 2004. Com a palavra o STF, que, assim, cumpre tripla função: a que lhe é própria – a de julgar; a de dirimir disputas políticas; e a de explicar o País para os telespectadores. Do jeito que as coisas seguem, as sentenças do STF qualificam-se como itens bibliográficos obrigatórios para quem quer entender a normalidade do Brasil.

Renato Lessa é professor titular de Teoria Política da Universidade Federal Fluminense; Investigador associado do Instituto de Ciências Sociais, da Universidade de Lisboa; presidente do Instituto Ciência Hoje.

FONTE: ALIÁS/O ESTADO DE S. PAULO

Partidos e representação:: Merval Pereira

A fragmentação do sistema partidário brasileiro é considerada por muitos analistas de nosso cenário político como a razão para a instabilidade das relações entre o Executivo e o Legislativo. Por isso o historiador José Murilo de Carvalho, membro da Academia Brasileira de Letras, considera que o começo de uma reforma institucional deveria se dar pelos sistemas eleitoral e partidário, para evitar o risco de paralisia decisória e a compra de votos e partidos, colocando em contraposição conceitos de governabilidade e corrupção.

Para ela, o número de partidos "sempre gera maior custo de transação, mas não necessariamente afeta os resultados ou aumenta problemas de governabilidade", o que depende "da posição ideológica dos partidos parlamentares".

"Há estudos, com amostra do mundo inteiro, que mostram que, acima de três partidos e alguma coisa, há uma queda nos efeitos negativos do número de partidos", lembra Argelina Figueiredo.

Ela se diz favorável ao sistema eleitoral brasileiro, proporcional com lista aberta. "Mudanças só na regulamentação e fiscalização de campanhas."

É contra o voto distrital, até mesmo o que chama de "a conta de chegar" do sistema distrital misto, pois não aceita "nada que limite o poder de escolha do eleitor, ou seja, a representação".

Enquanto Sérgio Abranches defende o fim das coligações proporcionais, segundo ela, "não há causalidade entre coerência e coligações".

As coligações eleitorais têm objetivos, como não desperdiçar votos, por exemplo, "que são exógenos à ideologia dos partidos e não têm efeito sobre eles".

Argelina Figueiredo explica que "partidos ideológicos se coligam se acham que, por meio de alianças, vão ter resultados mais eficazes na mobilização dos eleitores. Da mesma forma que ocorre com partidos não ideológicos".

Ela admite que as coligações podem ter impacto "na capacidade de os eleitores poderem responsabilizar o partido em que votaram, mas no caso do Brasil ainda podem responsabilizar o parlamentar, ou seja, o parlamentar pode ser punido".

Ela também é contra as chamadas "cláusulas de barreira", que estipulam um percentual mínimo de votos para que os partidos possam ter representação no Congresso, e lembra que "já existe uma cláusula de barreira no próprio distrito do partido que é o coeficiente eleitoral".

Para excluir do quadro partidário os chamados "partidos de aluguel", ela diz que algumas medidas poderiam ser adotadas, por exemplo com relação ao tempo de TV.

Mas considera que "o mais fundamental é garantir que nenhuma cláusula de barreira possa atingir partidos ideológicos ou de representação de opiniões (verde, municipalista, cristão etc)".

"Prefiro que alguns partidos de aluguel permaneçam do que partidos que representam qualquer corrente de opinião sejam excluídos."

Para Argelina Figueiredo, "são exatamente as instituições de representação, a forma de governo e de organização do Estado (federalismo) que, permitindo vários pontos de entrada no sistema político, constituem um sistema de checks and balances que neutraliza a força do Executivo no interior do sistema decisório".

Já o cientista político Sérgio Abranches considera a fragmentação partidária um problema, embora admita que "sobre esse ponto há enorme controvérsia. Qualquer solução é muito difícil, porque afeta os cálculos individuais de elegibilidade dos próprios parlamentares que teriam que votar as mudanças".

Abranches diz que sempre foi contra o voto distrital, que na sua opinião "só pioraria as coisas, com o localismo que lhe é inerente".

Uma das soluções para reduzir a fragmentação dos partidos seria a mudança de cálculo da proporcionalidade, "para acabar com as sobras de votos que elegem representantes sem votos".

Ele defende a mudança do sistema D"Hondt, que utilizamos, para o Saint Laguë. A diferença é que o primeiro "permite sobras grandes, que produzem o "efeito Enéas", pelo qual um candidato muito bem votado elege outros praticamente sem voto, enquanto o segundo "cobra" mais votos para eleger cada deputado e praticamente elimina as sobras".

Esse método, adotado nas sociais-democracias escandinavas, tende a reduzir o número de partidos que conseguem representação entre 4 e 6. "Isso, somado à proibição de alianças e coligações, reduziria consideravelmente a fragmentação e permitiria melhorar significativamente a governança no presidencialismo de coalizão", diz Sérgio Abranches.

A não coincidência entre as eleições nacionais - presidente, senadores e deputados federais - e as locais - governadores, prefeitos, deputados estaduais e vereadores - "permitiria dar um pouco mais de conteúdo nacional às campanhas nacionais e um pouco mais de teor programático às alianças".

Fora isso, Abranches aponta o problema da corrupção, "que ficou crônico", como uma questão a ser superada .

Seu enfrentamento depende de atitudes fortes do presidente, tolerância zero, Dilma às vezes parece querer chegar nisso; da independência do Ministério Público e da Polícia Federal; e da formação de consenso contra a impunidade no Judiciário."

(Terça-feira, falam os políticos).

FONTE: O GLOBO

Em ritmo de mutirão:: Dora Kramer

O ministro Carlos Ayres Britto toma posse na presidência do Supremo Tribunal Federal na próxima quinta-feira confiante em que o processo do mensalão possa ser julgado no prazo de 20 dias úteis de trabalho quase ininterrupto: de segunda a sexta-feira, com sessões de manhã e à tarde, em ritmo de mutirão.

Assim que o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, liberar o processo o novo presidente da Corte, consultará os colegas sobre a ideia do esforço concentrado e levará o tema à pauta, respeitadas as 48 horas de antecedência para publicação no Diário da Justiça. "O script será definido pelo colegiado."

A preliminar, que não depende dele, é a liberação do relatório do revisor. Se isso ocorrer no mês de maio, "como seria o ideal" , o julgamento poderia ser concluído até o fim de junho, antes do início oficial do período de campanhas eleitorais, em 6 de julho.

Na visão de Ayres Britto, o melhor seria que o processo não entrasse na pauta do Supremo no segundo semestre, pois seis ministros (três titulares e três substitutos) dos 11 integrantes da Corte estarão voltados integralmente para as atividades do Tribunal Superior Eleitoral.

"A possibilidade de o julgamento ocorrer durante o período eleitoral torna de fato mais difícil a sua conclusão ainda este ano", aponta, ressalvando, no entanto, que considera factível a hipótese de acontecer antes das eleições.

Não obstante esteja atento ao processo – "incomum, pela quantidade de réus (38), de testemunhas, pelo volume dos autos, pelo risco de prescrição e o interesse que desperta no público", o mensalão não é a agenda principal de Ayres Britto em seu curto período na Presidência, até novembro – quando completa 70 anos no dia 18 e será obrigado a se aposentar.

Essencial, na concepção dele, é dar cumprimento à função do STF de assegurar o cumprimento da Constituição, "o documento que põe o Estado e a sociedade nos eixos".

Nesse sentido será o discurso de posse que começa hoje a escrever no avião – "por isso trouxe o computador" – na viagem entre São Paulo e Brasília. "Vou fazer um chamamento à necessidade de que sejamos militantes obsessivos da Constituição", adianta.

É a maneira pela qual, diz o ministro, o Supremo se afirma "para compensar o déficit de legitimidade que temos pelo fato de não termos sido eleitos: não governamos, mas nossa função é impedir o desgoverno fazendo da Constituição um corpo vivo do qual emanam políticas públicas prioritárias".

Outro ponto a ser abordado no discurso de posse de Ayres Britto é o chamado "ativismo do Judiciário", por vezes chamado pejorativamente de "judicialização" da política. "Quando dizem que estamos interferindo em outros poderes não levam em conta que isso é inerente à atividade: quando a coisa fica feia, quando os dissensos se impõem, as partes recorrem ao Judiciário"

Há, na opinião dele, ativismo sim, "mas sem protagonismo" nem usurpação de poderes. O que tem acontecido de diferente "é a disposição do Supremo de enfrentar essas questões mais polêmicas e sensíveis com as quais o Legislativo muitas vezes evita se defrontar".

Isso pela própria natureza da atividade, originária de votos. "A instância política tende a recuar quando acha que suas decisões possam provocar prejuízos eleitorais, mas o Judiciário é imune a isso".

Portanto, não vê sentido na versão de que movimentos externos de desmoralização daqueles que os réus do processo veem como algozes possam influir no julgamento.

"Os juízes são vacinados contra qualquer tipo de pressão, o que não quer dizer que não deva considerar os anseios coletivos de modo a conciliar o Direito com a vida real".

Ayres Britto diz isso se referindo mais a questões que dependem da interpretação dos preceitos constitucionais do que propriamente ao caso específico do "caso rumoroso".

"O Supremo tem consciência da gravidade do problema, mas nem eu como condutor do processo nem quaisquer dos ministros nos investimos de nossas funções com a faca nos dentes ou vestidos em luvas de pelica."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

De volta ao futuro :: Eliane Cantanhêde

Para os céticos, o saldo visível da ida de Dilma Rousseff aos Estados Unidos limitou-se à certificação da cachaça brasileira e à criação de dois novos consulados em solo pátrio. Cá pra nós, muito pouco. Para isso, bastaria um encontro dos embaixadores ali na esquina.

Como dito aqui, porém, a importância da visita a Washington está menos no que foi dito e mais no que não foi dito, ou melhor, está no que foi dito diretamente entre Dilma e Barack Obama. E nas possibilidades abertas na economia, no intercâmbio, na cooperação, sobretudo nas áreas de energia e defesa.

Os temas mais espinhosos da política internacional foram claramente discutidos, mas deixados para Hillary Clinton e Antônio Patriota destrincharem em Brasília amanhã, alheios ao clima de CPI do Cachoeira e de guerra política interna.

Aos dois cabe ajustar um pouco mais as visões desfocadas sobre o Irã. Brasil e Turquia mediaram o fracassado acordo com o Irã, mas um foi excluído e se autoexcluiu da nova rodada, ontem, em Istambul, enquanto o outro é o anfitrião. Não será surpresa de Hillary e Patriota recolocarem o Brasil em algum lugar dessa história.

Já quanto a Síria, não tem muito jeito. Não tem lente que dê jeito, pois os dois países acham a situação grave, mas os Estados Unidos insistem em derrubar Al Assad, e o Brasil não quer saber de "interferência em assuntos internos".

No dia 24, chega o secretário de Defesa, Leon Panetta, para mergulhar nesse oceano de oportunidades do emergente Brasil, com renovação de caças, submarinos, navios e todo um sistema bilionário de vigilância de fronteiras terrestres e marítimas.

Dilma apoiou a reeleição de Obama não por ato falho, mas ostensivamente. E por um motivo cristalino: os dois países e seus atuais presidentes têm interesses crescentes e muito trabalho conjunto pela frente. Apesar das divergências.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Uma revolução na indústria global?:: José Roberto Mendonça de Barros

Em novembro publiquei neste espaço um texto ("Na crise, a indústria global se movimenta") no qual chamei a atenção para algumas mudanças na forma de operação do sistema de produção mundial. Em particular, mencionei uma revisão na extensão das cadeias globais de suprimento, buscando reduzir o risco de paradas súbitas na produção de certos insumos críticos (como determinados chips especializados), com efeitos graves na produção de integradores e montadores mais próximos do mercado.

O triplo acidente no Japão (com efeitos deletérios na montagem de automóveis) e a inundação na Tailândia, que afetou a montagem de computadores em várias partes do mundo, foram determinantes desse movimento. Os benefícios da concentração da produção de certos insumos em "clusters" continuam a pesar nas decisões de localização de plantas, mas certamente foram ajustados para determinados riscos, como os dos acidentes acima mencionados.

A segunda mudança importante foi o renascimento da indústria americana, resultado da elevação da produtividade, da redução de custos (como mão de obra) e da revolução da produção de gás natural, a preços muito baixos. O preço atual do gás equivale a um barril de petróleo de US$ 20! Com isso, indústrias, como a petroquímica e a de aço, vivem uma época de ouro, atraindo novos investimentos, como os realizados pela Braskem e pela Oxiteno. A operação americana da Gerdau também está sendo beneficiada. A constante elevação dos custos de produção na China reforça essa tendência.

Mencionei também naquele artigo as mudanças tecnológicas associadas à evolução da biotecnologia, da nanotecnologia e da robotização. A propósito desse último tema, Raquel Landim e Renato Cruz publicaram recentemente aqui no Estado uma extensa matéria sobre sua evolução no Brasil e no mundo. De fato, a automação e a robótica estão avançando muito rapidamente no mundo, particularmente como resultado da forte queda de preço dos equipamentos, algo especialmente decorrente de melhorias na área de software.

Antes de avançar, acho importante uma ressalva. Quando se fala de robotização o que vem à mente é um boneco com inteligência artificial tipo Guerra nas Estrelas. Entretanto, isso está longe da realidade, isto é, um equipamento com inteligência artificial ainda não existe. Alguém poderia perguntar se a máquina que vence o campeão mundial de xadrez não seria dotada de tal possibilidade; a resposta é negativa. O que o computador tem, ao contrário da inteligência, é o que Martin Ford chamou "de algoritmo da força bruta". A máquina ganha do enxadrista, que tem inteligência e criatividade, pela rapidez de examinar, em segundos, milhões de opções de jogadas, escolhendo a melhor.

A produção e venda de robôs industriais vêm crescendo rapidamente: superaram mais de 100 mil unidades/ano desde 2005, exceto em 2009, quando a crise reduziu a absorção para 60 mil. Estima-se que em 2011 a venda tenha atingido 141 mil unidades. Coreia (23,5 mil), Japão (21,9 mil), China (15 mil), EUA (14,3 mil) e Alemanha (14 mil) são os que mais compraram robôs. Por exemplo, o excelente Ethevaldo Siqueira visitou uma fábrica na Coreia, de telas de TV, totalmente automatizada. No mesmo ano, estima-se que o Brasil adquiriu 640 unidades. Estima-se ainda que o estoque mundial de robôs em operação seja algo entre 1,1 milhão e 1,3 milhão de unidades.

Do ponto de vista setorial, a indústria eletrônica e a automotiva são de longe os maiores consumidores. A demanda deverá continuar a crescer rapidamente nos países industriais líderes. Na área de serviços, o crescimento também tem sido muito rápido, destacando-se saúde, entretenimento e militar.

A expansão da automação é resultado de muitos fatores. A primeira causa é a redução de custos, especialmente de mão de obra, inclusive por menores riscos de acidentes no trabalho e pela preservação da saúde do trabalhador. Isso é especialmente verdadeiro em áreas como pintura e solda. Há redução também dos custos de energia e no consumo de materiais, em razão de menor desperdício. Ao mesmo tempo, a produtividade das fábricas se eleva pela possibilidade de produzir dia e noite, com uma cadência constante, pela precisão e qualidade do acabamento das peças, pela utilização do espaço da fábrica e pela maior flexibilidade na linha de produção, uma vez que a reprogramação do equipamento é muito fácil. Em resumo, a robotização permite produzir grandes volumes de produtos, com alta qualidade e menores custos. Como resultado, a expansão da nova tecnologia vai seguir crescendo velozmente, até mesmo, em países com limitações na oferta de mão de obra qualificada, como é o caso do Brasil. Todos os setores produtivos (indústria, mineração, agricultura, medicina, transportes, etc.) serão afetados.

Em paralelo, outra revolução avança, que é o desenvolvimento da impressora em 3D. Esse equipamento utiliza o conhecimento adquirido com base nas impressoras a jato de tinta (que trabalham em duas dimensões) e de inovações na eletrônica, na química e no laser. Trabalha com pó de metal ou de plástico e, comandada por um software, constrói uma peça, por exemplo, depositando o material camada por camada.

É, por isso, chamado de um processo aditivo (additive manufacturing), para se diferenciar da forma clássica de construir a peça, por exemplo, de um bloco de metal. Este é desbastado por um torno, sendo, portanto, um processo subtrativo. As impressoras em 3D têm, em consequência, uma grande economia de matéria-prima. O processo também utiliza menos energia. Quem vê, pela primeira vez, um equipamento desses construindo um bloco de motor fica muito impressionado, posso garantir.

Quando esses equipamentos surgiram, há pouco mais de uma década, eram utilizados para construir protótipos, de forma rápida e barata, acelerando as inovações. Por essa razão, um dos mais importantes efeitos da tecnologia é diminuir as barreiras à entrada na indústria, beneficiando realmente os bons projetos, que só se conhecem quando vão a mercado. Mais uma vez, o preparo e o conhecimento das pessoas e das empresas será o fator decisivo. A combinação dessas tecnologias inovadoras vai implicar uma revolução no mundo da produção industrial. Vale a pena destacar os seguintes pontos:

1. Os países com grande disponibilidade de mão de obra perderão parte de sua vantagem. As vantagens comparativas estarão nos países com menor custo de energia, de infraestrutura e maior oferta de pessoal altamente qualificado, dedicado à geração de novo conhecimento. É neste último item que os países bem-sucedidos na Ásia (China e Coreia, especialmente) investem tão furiosamente;

2. No que depender dessas tendências, a distribuição de renda vai piorar;

3. A qualidade dos produtos vai se elevar;

4. Muitas ocupações intermediárias serão substituídas pela automação;

5. O emprego industrial crescerá menos que o valor adicionado do setor;

6. As novas tecnologias ajudam a reduzir custos em elevadas escalas de produção. Ao mesmo tempo, viabilizam escalas menores, permitindo o que Peter Marsh chamou de massificação personalizada.

É o início de uma nova revolução na produção industrial. Nossa indústria, também por essa razão, será afetada.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO