segunda-feira, 3 de setembro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Carlos Ayres de Britto: ‘o mensalão maculou a República’ (XXX)

O avanço no patrimônio público e o fazer do patrimônio público um prolongamento da casa, da copa, da cozinha são coisas antigas neste Brasil.

Carlos Ayres Britto, ministro, presidente do STF em seu voto no processo do mensalão, citando o padre Antonio Vieira, 29/8/2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Violência na campanha já matou mais que em 2010
Com crise da dívida de 82, Brasil correu risco de racionar gasolina
Mensalão: defesa de réus faz apelo para evitar penas maiores
Em sábado festivo, Lewandowski casa a filha e Joaquim diz que políticos o odeiam

FOLHA DE S. PAULO
Ranking universitário tem 7 federais entre as 10 melhores
Dilma quer nome de perfil discreto para vaga no STF
Cruz Vermelha faz repasse a ONG ligada a dirigente

O ESTADO DE S. PAULO
Agronegócio faz Centro-Oeste liderar crescimento no País
Propostas ocupam só 17% da campanha na televisão
Falcão vê PT e PSB separados em 2014
Relator do mensalão julga empréstimos do Rural ao PT

VALOR ECONÔMICO
Juro em queda traz cruzada por eficiência nos bancos
TV analógica sem prazo para acabar
Mato Grosso paga todos os precatórios
Demografia joga contra a oferta de mão de obra

BRASIL ECONÔMICO
Cresce 25% ao ano a entrada de trabalhador estrangeiro no país
“Lula não será decisivo na campanha de Belo Horizonte”
Governo procura parceiros para fortalecer Infraero
CVM aperta cerco aos intermediários
Fundos se ajustam à queda dos juros

CORREIO BRAZILIENSE
Esplanada: Dilma obtém boa relação com militares

ESTADO DE MINAS
Mutirão contra impunidade
Caindo aos pedaços
Preço da carne surpreende consumidor
Campanhas quase sem doações

ZERO HORA (RS)
Busca por tecnologia empurra Expointer a recorde de R$ 2 bi
Indiferença de Dilma com julgamento frustra o PT

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Acordo com o Panamá reforça Suape

Uma utopia realista - Gabriel Cohn

Filósofo alemão revaloriza a prática política na Europa e resiste a toda sedução de concentrar o foco na economia

Jürgen Habermas é conhecido como autor caudaloso, que, uma vez posto em movimento, nada pode deter. Mas aqui, neste pequeno volume, é diferente. Nele encontramos dois ensaios, relativamente independentes (que podem ser lidos separadamente, embora se apresentem como formando um só). O livro pode ser lido como uma espécie de condensação da longa reflexão do autor, na sua incessante busca do entrelaçamento das grandes questões do dia com o universo conceitual que lhes possa conferir sentido, no pensamento e na ação.

Mesmo aqueles que em algum momento tenham sentido uma ponta de impaciência com as idas e vindas de um pensamento que se questiona sem descanso e não oferece atalhos, esse livro é precioso. É verdade que uma leitura mais cuidadosa poderá detectar sinais inquietantes na combinação dos dois ensaios, como faz na sua apresentação Alessandro Pinzani - ele próprio autor de importante livro sobre o conjunto da obra de Habermas. Pinzani sugere a possibilidade de que, nesses trabalhos recentes (do alto dos seus oitenta e tantos anos) Habermas tenha recuado em relação à sua fundamental ênfase numa razão discursiva que, no âmbito da política, se realiza dispensando quaisquer fundamentos e impondo todo o peso da legitimação democrática (a única que importa) à livre deliberação racional. Esse recuo se daria no papel que Habermas atribui à dignidade como categoria que precede os direitos humanos, ao lhes garantir uma referência universal. Significaria isso uma âncora fixa, que acaba amarrando o intercâmbio discursivo e funcionando como fundamento normativo dos direitos (o que Habermas sempre quis evitar, ao concentrar a atenção em processos e procedimentos)? Esse cuidado, na própria apresentação, em fazer o que Habermas tanto aprecia, ou seja, debater, mostra quanto essa edição brasileira é séria. Não é pouca coisa, aliás, que três dos quatro integrantes da comissão encarregada pela editora da Unesp do grande projeto de edição integral da obra de Habermas num padrão exigente de qualidade assinem a tradução; ainda mais sendo todos eles representativos de uma nova geração de estudiosos dessa obra no Brasil.

Na concepção de Habermas a dignidade relaciona-se com os direitos de maneira "genealógica". Ou seja, não como fundamento, mas como a "fonte moral da qual os direitos fundamentais extraem os seus conteúdos". A partir dessa posição básica torna-se possível a construção de uma "utopia concreta" dotada de conteúdo político. "A perspectiva de uma sociedade mundial constituída politicamente perde algo de sua aparência de utopia quando nos lembramos que, há poucas décadas, a retórica e a política dos direitos humanos desenvolveram efetivamente uma eficácia global", sustenta ele, para concluir: "Essa pretensão cosmopolita significa que o papel dos direitos humanos não pode se esgotar na crítica moral das relações injustas de uma sociedade mundial altamente estratificada. Os direitos humanos dependem de sua incorporação institucional em uma sociedade mundial constituída politicamente". Este é o ponto, é aqui que se manifesta o cerne da sua posição. Consiste ele em buscar a fonte das exigências efetivas de direitos na ligação entre direitos e moral mediante a exigência matriz de dignidade, para dar sentido à ligação entre direitos e política mediante novas formas de legitimação no único âmbito possível: o da constituição (em ambos os sentidos) de uma democracia transnacional com ímpeto cosmopolita. "A tensão entre ideia e realidade que com a positivação dos direitos humanos se introduziu na própria realidade nos confronta hoje com a exigência de pensar e agir de modo realista, sem trair o impulso utópico. Mas essa ambivalência pode nos levar muito facilmente à tentativa de ou assumir uma posição idealista, mas desvinculada, a favor do conteúdo moral transcendente, ou adotar a pose cínica dos assim chamados realistas". O resultado é uma posição que valoriza a prática política e resiste a toda sedução, afirmativa ou não, a concentrar o foco na economia. Falando dos estragos causados pelo capital financeiro, ele não permite dúvidas: "A política se torna irrisória se ela moraliza em vez de apoiar-se no direito de coerção do legislador democrático. Ela, e não o capitalismo, é responsável pela orientação do bem comum".

Eis, portanto, um livro no qual se articulam dois temas de eminente atualidade. Por um lado, a questão que se reacende no debate brasileiro, sobre os direitos fundamentais, suas perspectivas, seus riscos e os efeitos das suas violações; pelo outro, a questão da constituição/configuração da Europa no momento em que o projeto da união européia faz água por todos os cantos, mas se impõe como grande experiência histórica (de "aprendizado", lembra Habermas).

Habermas escreve para remover o "bloqueio mental que impede olhar para a frente". Não é possível ficar indiferente ao esforço desse pensador intrépido que, embora temperado por todas as cautelas críticas, não consegue resistir ao papel que escolheu, de ser um iluminista à altura do nosso tempo.)

FONTE: ALIÁS / O ESTADO DE S. PAULO

Mensalão: defesa de réus faz apelo para evitar penas maiores

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

Numa das últimas cartadas para evitar penas mais duras, advogados dos réus do mensalão vão encaminhar hoje aos ministros do Supremo Tribunal Federal os chamados memoriais, uma espécie de apelo extra para tentar sensibilizar a Corte. Márcio Thomaz Bastos e José Carlos Dias, advogados do Banco Rural, vão contestar pontos dos votos de Joaquim Barbosa. O advogado de José Dirceu, José Luís Oliveira, apresentará o memorial contestando mais uma vez o procurador Roberto Gurgel.

Advogados tentam cartadas para evitar novas condenações

Votos de Barbosa serão contestados pela defesa do Banco Rural

Evandro Éboli, André de Souza

BRASÍLIA Diante da possibilidade de endurecimento das penas ao núcleo político, numa última cartada, os advogados de defesa dos réus do mensalão encaminharão, a partir de hoje, novos memoriais a favor de seus clientes aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Impactados pelo voto do relator e pelo já demonstrado entendimento flexível de alguns ministros sobre existência de prova para condenação também por lavagem de dinheiro, os advogados, principalmente os do ex-ministro José Dirceu, lançam mão de todos os recursos possíveis.

O memorial tem um peso relativo, não é parte do processo. É uma grita extra dos advogados para tentar sensibilizar os ministros na hora do voto. O alvo de quase todos são a peça de acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e o voto do ministro relator Joaquim Barbosa.

Nenhum ministro, até agora, mostrou-se sensível a qualquer dos memorais apresentados desde o início do julgamento. Os advogados do Banco Rural - os ex-ministros da Justiça Márcio Thomaz Bastos e José Carlos Dias - deixaram o tribunal na sexta-feira, anunciando que apresentariam o memorial contestando pontos do voto de Joaquim Barbosa.

Eles devem apresentar hoje o memorial, com os seguintes argumentos: que os empréstimos concedidos às empresas de Marcos Valério foram periciados pela Polícia Federal por solicitação do ministro Joaquim Barbosa e considerados verdadeiros; que o valor global dos empréstimos era proporcional à capacidade dos tomadores e correspondiam a menos de 1% da carteira do Rural em 2003; que, em janeiro de 2005, antes do estouro do mensalão, o banco recusou-se a renovar os empréstimos das empresas Graffiti e SMP&B; e que os empréstimos ao PT e a Marcos Valério não foram concedidos originalmente por nenhum dos executivos acusados na Ação Penal 470 (os responsáveis morreram: José Dumont e Júnia Rabello).

José Luís Oliveira, advogado de José Dirceu, é um dos mais inconformados com os rumos do julgamento. Ele afirmou que apresentará memorial, amanhã, a favor de seu cliente. Vai rebater outro memorial, de Roberto Gurgel, apresentado em meados de agosto. José Luís está indignado com declaração de Gurgel, na última sexta, de que, com o andar dos entendimentos dos ministros, todos devem ser condenados, inclusive seu cliente.

- Acho assustador que um chefe do Ministério Público Federal defenda uma condenação desprovida de provas nos autos. Mais uma vez, o procurador assumiu a inexistência de provas contra José Dirceu - disse ontem Oliveira.

Já Luiz Fernando Pacheco, advogado do ex-presidente do PT José Genoino, jogou a toalha e diz que não pensa em levar documentos novos ao Supremo:

- Eu levei um memorial há dez dias. E, a princípio, não vou levar mais nada. Já esgotamos o que tínhamos para dizer.

Marthius Lobato, advogado do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato - já condenado por peculato, lavagem de dinheiro e corrupção passiva pelo STF -, afirmou que, havendo possibilidade de recursos, isso será feito. Mas ressaltou que é preciso, primeiro, esperar a publicação do acórdão, após o fim do julgamento.

FONTE: O GLOBO

Relator do mensalão julga empréstimos do Rural ao PT

O relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, retoma hoje o julgamento com a análise dos empréstimos feitos pelo Banco Rural à direção do PT e às agências do empresário Marcos Valério. As operações, iniciadas em 2003, jogaram o então presidente do partido, José Genoino, no centro do escândalo de pagamento de parlamentares da base aliada. Barbosa dá indícios de que condenará os réus.

Relator julga empréstimos bancários que colocaram Genoino na berlinda

Felipe Recondo, Eduardo Bresciani

BRASÍLIA - O relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, retoma hoje o julgamento - iniciado há exatamente um mês e um dia - com a análise dos empréstimos feitos pelo Banco Rural à direção do PT e às agências do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza.

As operações financeiras iniciadas em 2003, primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva, jogaram o então presidente do partido, José Genoino, no centro do escândalo de pagamento de parlamentares da base aliada lulista. Segundo a Procuradoria-Geral da República, o dinheiro dos empréstimos foi usado para comprar apoio de deputados. Os réus petistas dizem ter havido apenas caixa 2 de campanha.

O relator analisará nesta fase do processo a conduta de dirigentes e ex-dirigentes do Rural - o caso de Genoino será julgado numa etapa posterior. Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral, os empréstimos foram feitos para não serem pagos. O principal argumento da acusação é que não havia garantias tanto do PT quanto das agências de Marcos Valério de que a quitação poderia ocorrer.

Pelas expectativas de advogados que atuam na causa e, conforme reservadamente adiantam os ministros da Corte, dificilmente os ex-dirigentes do Rural serão absolvidos da acusação de gestão fraudulenta. A pena pelo crime varia de 3 a 12 anos de reclusão.

Barbosa deve condenar os quatro réus (veja quadro). Na quinta-feira passada, ele já indicava a condenação afirmando que os empréstimos foram "fictícios".

Ainda na quinta-feira, Barbosa afirmou que as operações de crédito não seguiram as normas estabelecidas pelo Banco Central. "O Banco Rural (...), sobretudo no que diz respeito às operações realizadas com o Partido dos Trabalhadores, a SMPB Comunicação Ltda. e a Graffiti Participações Ltda., não cumpria as prescrições do Banco Central", afirmou o relator do mensalão.

Depois de Barbosa será a vez dos outros ministros darem suas sentenças sobre esse item do julgamento. Não há expectativa de grandes divergências neste item, diferentemente do que ocorreu na primeira "fatia" do julgamento, que analisou os contratos firmados entre as agências de Marcos Valério e o Banco do Brasil, o fundo Visanet e a Câmara dos Deputados. Os ministros protagonizaram duros embates e o clima pesou em algumas sessões. No fim, acabaram condenados o ex-presidente João Paulo Cunha, que posteriormente veio a renunciar a sua candidatura à prefeitura de Osasco, Marcos Valério e seus sócios nas agências e o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Também réu, o ex-ministro Luiz Gushiken foi absolvido.

Fatias futuras. Genoino, que assinou os empréstimos com o Banco Rural, será julgado apenas nas próximas semanas, quando o STF começar a analisar os integrantes do chamado "núcleo político" do mensalão - o relator decidiu dar suas sentenças do caso por itens sob o argumento de "organizar" o julgamento.

Na defesa de Genoino, o advogado Luiz Fernando Pacheco alega que o cliente não controlava as finanças dos partido. Segundo ele, a tarefa competia ao tesoureiro da legenda na época, Delúbio Soares. O advogado disse que o nome de Genoino consta dos contratos de empréstimo apenas porque era presidente do PT. "Embora seja tarefa exclusiva do Secretário de Finanças a obtenção de recursos financeiros, competia também ao presidente do partido, por condição estatutária, a assinatura de tais empréstimos", acrescentou.

O Banco Rural sustenta que os empréstimos eram legais. A instituição destaca que o PT quitou o débito neste ano, após um acordo, e atribui a inadimplência das empresas de Marcos Valério à falência após o escândalo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Indiferença de Dilma com julgamento frustra o PT

Silêncio de Dilma decepciona petistas

Presidente se mantém distante do julgamento do mensalão no STF

Fábio Schaffner e Guilherme Mazui

BRASÍLIA - O rigor com que o Supremo Tribunal Federal (STF) está condenando os réus do mensalão disseminou pessimismo no PT e expôs uma decepção do partido com a presidente Dilma Rousseff.

Nos bastidores, expoentes da legenda não escondem o desgosto com a indiferença de Dilma e com os votos dos ministros indicados por ela: Luiz Fux e Rosa Weber.

Nas sabatinas a que foram submetidos antes da indicação ao STF, Rosa e Fux foram consultados sobre o mensalão, o que gerou uma expectativa por absolvições. Para a direção da sigla, Dilma poderia ao menos ter tentado influenciar os dois ministros, cujas decisões foram consideradas extremamente duras. Os dirigentes esperavam da presidente um comportamento semelhante ao de Lula, que indicou José Dias Toffoli ao STF já tendo em vista o julgamento do mensalão. Em seu voto, Toffoli inocentou o deputado João Paulo Cunha (PT) de todas as acusações.

– O PT queria que ela desse uma letra, intercedesse junto aos ministros que nomeou. Ela poderia ter ajudado mais – resume um interlocutor da cúpula do partido.

Dilma, contudo, quer seu governo distante do julgamento. A presidente nem sequer assiste às sessões e proibiu os assessores próximos de perderem tempo diante da TV. A ordem é mostrar independência e passar a ideia de que o governo não está parado.

Para tanto, nos dias em que as sessões tiverem algum simbolismo especial, o Planalto irá criar um fato político. Foi assim na última quarta-feira. Enquanto os ministros condenavam Cunha por corrupção e peculato, Dilma sancionava, em uma cerimônia improvisada na sala anexa ao seu gabinete, a lei de cotas nas universidades, que reserva 50% das vagas a estudantes de escolas públicas.

O afastamento de Dilma e os placares elásticos na condenação de todos os réus da primeira etapa do julgamento deixaram no partido o sentimento de terra arrasada. Já há quem tema por um destino semelhante para José Dirceu. Isso porque a maioria dos ministros dispensou a necessidade do ato de ofício para comprovar a culpa – ou seja, a ação do agente público que teria beneficiado os corruptores. Com isso, abre-se um precedente perigoso para Dirceu, cuja principal tese de defesa é de que não há provas de seu envolvimento com a "sofisticada organização criminosa" citada na denúncia.

– Vendo o tribunal com essa coesão imagino que se delineie uma condenação para ficar na história – disse o ministro Marco Aurélio Mello.

Com o presságio de novas punições, os advogados calculam as possibilidades de penas prescritas (nos casos de condenação de até dois anos de reclusão) e preparam recursos para protelar eventuais prisões. Representante de Cunha, Alberto Toron estuda ingressar com embargos infringentes para o crime de lavagem de dinheiro, no qual o placar parcial da condenação está em 6 a 4. Alguns réus, contudo, já admitem passar uma temporada na cadeia.

– Todo revolucionário se prepara a vida inteira para a possibilidade de ser preso – diz o advogado de uma estrela petista.

FONTE: ZERO HORA (RS)

Um crime com pena branda

Supremo julga 21 pessoas por formação de quadrilha, mas juristas ressaltam que a chance de prescrição é grande porque a punição chega a, no máximo, três anos de cadeia

Ana Maria Campos, Diego Abreu

A Procuradoria Geral da República trata do mensalão como uma "sofisticada organização criminosa" que se estruturou para desviar recursos públicos destinados a comprar apoio político no Congresso, tendo como mentor o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu. O suposto chefe, no entanto, mesmo que seja condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), dificilmente sofrerá punição por essa conduta. O crime de formação de quadrilha, previsto no artigo 288 do Código Penal, tem penas baixas, o que deverá levar à prescrição.

Além de Dirceu, outros 20 réus respondem por esse ilícito, entre os quais o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-presidente do partido José Genoino e o empresário Marcos Valério. As penas previstas para formação de quadrilha variam de um a três anos de reclusão. Como os acusados são primários, a chance de pegar a pena máxima é remota.

De acordo com o Código Penal, uma pena de até dois anos é extinta quatro anos após o recebimento da denúncia. O STF aceitou a acusação em 2007. Portanto, qualquer pena do mensalão que não supere o prazo de dois anos de cadeia estará prescrita desde o ano passado. Nem o ministro Cezar Peluso, que se aposentou na última sexta-feira, estabeleceu penas superiores à metade do que é permitido no seu rigoroso cálculo de dosimetria.

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra, avalia que os ministros da Suprema Corte não aplicarão penas acima da mínima permitida. "Sendo réu primário, o juiz não costuma aplicar uma pena que supere o mínimo previsto no Código Penal. Com isso, acaba-se tendo que proclamar a prescrição", destacou.

O procurador da República Hélio Telho, que tem acompanhado o julgamento pela repercussão que as decisões do STF terão para todos os processos criminais do país, concorda que o risco de prescrição para as acusações de formação de quadrilha é grande. "Isso mostra como é necessário mudar a lei. Se a pena num processo como esse, no STF, com um relator que tem tomado todas as medidas para dar celeridade ao julgamento, já há risco de prescrições, imagina nos demais processos que tramitam na primeira instância", analisa.

Para o advogado criminalista Antonio Nabor Bulhões, será uma exceção se o Supremo aplicar penas superiores a dois anos para a formação de quadrilha. Ele, porém, não descarta tal hipótese. "Levando em consideração a circunstância do crime e outras circunstâncias judiciais, a pena pode ser superior a dois anos e o tribunal pode elevá-la para além do mínimo legal", afirmou. Bulhões observou, porém, que se a condenação se der exclusivamente por este crime o réu não ficará preso. "A pena seria convertida de privativa de liberdade em restritiva de direitos."

Próximas etapas

O julgamento do capítulo dois que descreve a participação de Dirceu como chefe do esquema do mensalão será o último item a ser julgado pelos ministros do STF, de acordo com o cronograma estabelecido pelo relator, Joaquim Barbosa. Hoje ele dará continuidade à leitura de seu voto em relação ao capítulo cinco, que trata do crime de gestão fraudulenta e envolve os ex-diretores do Banco Rural.

Encerrada essa etapa, os ministros vão analisar o capítulo quatro, relacionado aos crimes de lavagem de dinheiro. Em seguida, entrarão no item seis, um dos mais importantes, no qual serão discutidos os crimes de corrupção. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem por corrupção ativa. Presidentes de partidos e parlamentares teriam sido corrompidos. A pena para esses crimes varia de dois a 12 anos de prisão.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Data vênia... - Ricardo Noblat

"O Brasil quer um Judiciário independente, um juiz que não tema pressões" Ricardo Lewandowski, ministro do STF

É com gosto de jiló no céu da boca, de mandioca-roxa e de berinjela crua, que passo a contar a história nada edificante de um prefeito do PT cassado pela Justiça Eleitoral do seu estado. E de dois ministros do Supremo Tribunal Federal que, por omissão, palavras e obras, contribuíram até aqui para que o prefeito permanecesse no cargo, dando-se até ao luxo de concorrer a novo mandato em outubro próximo.

O prefeito atende pelo nome de Francisco Antônio de Souza Filho, o Chico do PT. E a cidade que ele governa se chama Esperantina. Com menos de 40 mil habitantes, ela existe há 90 anos e fica no norte do Piauí, a 174 quilômetros de Teresina. Seu orçamento anual é de quase R$ 56 milhões, sendo que R$ 36,5 milhões são repassados pelo governo federal.

Quando o atual senador Wellington Dias (PT) se reelegeu governador do Piauí em 2006, Chico foi nomeado secretário de Articulação e Gestão. De longe era o secretário mais poderoso. Ambicionava governar Esperantina a partir de 2008. E, para facilitar sua eleição, arrancou de Dias dinheiro e obras para a cidade.

Esperantina ganhou pontes, poços artesianos e ruas asfaltadas. Os programas de assistência social do governo estadual foram ampliados ali para atender o maior número possível de pessoas — de preferência eleitores. Chico derrotou meia dúzia de adversários — entre eles o prefeito da época, candidato à reeleição.

A porta do inferno se abriu para Chico assim que ele tomou posse. O Ministério Público Eleitoral pediu sua cassação por abuso do poder político e prática de conduta vedada. As obras feitas às pressas na cidade configuraram abuso de poder político. E o fato de Chico ter alardeado que era o pai das obras, prática de conduta vedada.

No dia 28 de fevereiro de 2011, por quatro votos contra três, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Piauí cassou os diplomas de Chico e do seu vice. Afastado do cargo de imediato, Chico entrou com ação cautelar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Pediu a concessão de liminar para reocupar o cargo enquanto recorria da decisão do TRE.

A liminar foi concedida pela ministra Nancy Andrighi, no dia 30 de junho daquele ano. Quase seis . meses depois, o TSE começou a julgar o recurso especial impetrado por Chico contra a decisão do TRE. Nancy acatou o recurso. Um a zero para Chico. O ministro Gilson Dipp, não. Um a um. O ministro Marcelo Ribeiro pediu vista do processo.

Em 28 de fevereiro deste ano, ao devolver o processo, Ribeiro acatou o recurso. Os ministros Cármen Lúcia e Arnaldo Versiani, não. Placar no fim da sessão daquele dia: três votos contra a pretensão de Chico de reaver o mandato cassado um ano antes pelo TRE do Piauí; dois votos a favor. Aí foi a vez de o ministro Marco Aurélio Mello pedir vista do processo.

São sete os ministros titulares do TSE. Com quatro votos se decide qualquer parada. Um mês depois, Marco Aurélio devolveu o processo e rejeitou o recurso, cassando Chico. O voto que faltava ser dado não faria a menor diferença. O dono do voto que faltava, ministro Ricardo Lewandowski, era o então presidente do TSE.

O que ele fez? Pediu vista do processo no dia em que Marco Aurélio o devolveu — 29 de março. No dia 18 de abril, esgotou-se o mandato de Lewandowski à frente do TSE. Ele passou o cargo para a ministra Cármen Lúcia. E foi embora sem votar o recurso de Chico. Reunido no dia 8 de maio, o TSE despachou o recurso para o ministro que ocuparia vaga de Lewandowski.

Quem mesmo? José Dias Toffoli, ministro substituto no TSE, que costumava votar na ausência de algum titular. Toffoli estava familiarizado com os assuntos tratados ali. O recurso de Chico lhe foi entregue no dia 11 de maio. E esquecido por Toffoli até hoje no fundo de alguma gaveta. Enquanto isso...

Enquanto isso Chico lidera as pesquisas de intenção de voto para prefeito. Diz que vencerá a batalha no TSE. Só haveria uma chance de isso acontecer: se algum ministro que recusou o recurso mudasse o voto. Difícil. E se Toffoli acatasse o recurso. Bem...

FONTE: O GLOBO

À sombra de uma sentença - Wilson Figueiredo

Decisão do Supremo não se discute: cumpre-se. Mas, é bom lembrar, não se trata de medida autoritária. O aspecto restritivo deixado no ar não ultrapassa o campo jurídico. Ao Supremo Tribunal Federal cabe dizer a última palavra na área de competência legal. Mas a palavra é de quem a pede ou a toma pela convicção. A democracia tem a sua dinâmica e nada está imune à razão e à emoção.

Daí para baixo, juízos de valor não são privativos de ministros do Supremo e também estão ao alcance da cidadania. A sociedade é um campo fértil onde a democracia viceja com o vigor que a tonifica nas variações ao longo da História. Decisões do Supremo podem e devem ser debatidos livremente pelos cidadãos.

Não custa lembrar, no caso brasileiro, que a liberdade de opinião está calibrada para o exercício do contraditório e não se confina à paixão do futebol. Opiniões pairam acima de eleições e de governos, dos municípios à República, e, onde quer que se apresentem, dizem respeito à democracia que vem sendo lapidada aos poucos, à medida que os costumes nacionais trocam seu avesso tradicional pela modernidade.

A oportunidade de reavaliar o mensalão, sob seus múltiplos aspectos, não pode ser desperdiçada e, se não tiver efeito exemplar, o saldo da política brasileira vai apenas trocar a beira do abismo retórico pelo o risco de disparar ladeira abaixo, e que não seria a última instância.

A ordem inversa favoreceria o entendimento democrático da frase portadora de uma sombra juridicamente óbvia, mas sem familiaridade com a cidadania. Nada impede a discussão popular sobre o julgamento do mensalão, que merecia atender por um nome mais explícito do que o aumentativo sem conteúdo. Do ponto de vista da cidadania e da democracia, devia-se acreditar que decisões do Supremo estão acima de recursos, mas podem e devem ser discutidas pelo proveito de que, nas divergências de opinião, pouco se perde na hora e alguma vantagem se resgata com o tempo. E se dissiparia o efeito residual de sotaque autoritário, que soa mal aos ouvidos como sentença definitiva: o Supremo falou, está falado.

Mutatis mutandi, a verdade é que, fora do domínio jurídico, a oportunidade de comentar decisões do Supremo, como está ocorrendo com suficiente teor de amadorismo, ganharia sotaque brasileiro se, depois do essencial, uma adversativa ressalvasse que os cidadãos podem e devem discutir à vontade decisões dos ministros, com inegável proveito para a credibilidade da democracia que já não é a “plantinha tenra” a que se referia Octavio Mangabeira na passagem da ditadura anterior à legalidade democrática em 1945.

Desenha-se imperdível a oportunidade de esterilizar na vida pública os hábitos que levaram a democracia a ser via de enriquecimento pessoal, mediante desempenho do mandato representativo ou exercício de responsabilidades públicas. O efeito geral pode dissuadir em tempo os que tomaram esse caminho como se fosse um ato de distração cometido pelos que pedem aos cidadãos um voto para servir, passam ao verbo pronominal e se servem com falta de cerimônia digna de algo mais do que figurar em lista de aproveitadores como se fosse exercício de cidadania.

É insuficiente o destaque em que o ex-presidente Lula, sem se dar conta das palavras e movido pela incapacidade de ficar calado, nem esperou o espetáculo terminar para depor contra ele próprio: no seu entender, não houve mensalão, e omitiu o resto com que está engasgado desde que deixou o poder. Se, por princípio, a História não se repete, Lula, por falta de princípios, não faz outra coisa senão chover no molhado.

O que tem faltado, da parte dele, Luiz Inácio Lula da Silva, é a coragem de assumir a responsabilidade política que o episódio do mensalão lhe reservou, e ele delegou ao chefe de seu Gabinete Civil na hora do aperto, mas à maneira de Pilatos. Se não houve o mensalão, por que não aplicou sua certeza na manutenção (ou na volta) de José Dirceu?

A ordem dos fatores altera o produto. Se fosse dito que “decisão do Supremo cumpre-se, mas se discute”, as cabeças não cederiam à timidez. Onde ficaria o centro de gravidade da sentença, num país em que a liberdade de divergir não fosse suspeita? No centro, acrescentaria o conselheiro Acácio, como avalista do óbvio. Que se cumprissem decisões do Supremo, mas fosse admitida como natural a liberdade de discuti-las, nos efeitos e conseqüências a que ficariam expostas. O resto viria por gravidade.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

Lula, os dragões e o poder dos fracos - Roberto Da Matta

Um imperador chinês adorava dragões. Colecionava suas imagens e os reverenciava. Os dragões, que ocupavam o lugar mais alto na hierarquia dos animais na China e eram associados ao próprio imperador - a palavra dragão em chinês produz o som do trovão -, ficaram felizes quando, nas montanhas onde viviam exilados, souberam que ele os admirava. Rompendo o confinamento, eles resolveram visitá-lo. Desajeitados, rastejaram, galoparam e voaram para o palácio imperial. Foram recebidos com insultos. O imperador até tentou encarar a visita como uma cortesia. Mas, quando se viu diante daqueles bichos escamosos e fedorentos, que, enquanto falavam, provocavam labaredas que queimavam plantações, deixou de lado a admiração que sentia e os expulsou do palácio.

Ouvi essa história de um cientista político chinês, durante uma palestra numa universidade americana. Como se sabe, disse com ironia o colega chinês, todo mundo ama e admira a democracia desde que ela, como os dragões, permaneça nas montanhas. Quando a democracia chega cuspindo o fogo da liberdade -com seu poder de reduzir ricos e pobres, fracos e fortes à igualdade perante seus poderes -, há em toda parte uma forte reação. Hoje, os dragões são bons símbolos das confusões permanentes da competição eleitoral e da igualdade de todos perante as leis, porque a vida numa democracia liberal é tão complexa e difícil quanto a desses seres que, de repente, podem botar fogo pela boca.

Como domesticar os dragões no caso de países como o Brasil? Aqui, eles correspondem não ao ideal de democracia, mas a outra idealização: a enorme diferença entre o que se diz e o que se faz com nossos companheiros e com nosso partido quando chegamos ao poder. Aí está o mensalão, armado por aficionados desses monstros, que não me deixa mentir. O dragão pergunta: será que o voto deve ter o mesmo valor para todos? Se sabemos a solução para os problemas do Brasil, não seria legítimo comprar votos e políticos, e até mesmo partidos inteiros - para permanecer no poder resolvendo, a nosso modo, os problemas do povo brasileiro? Não se trata de tomar partido, trata-se de condescender com a desonestidade como um meio para permanecer no poder.

Lula, sem sombra de dúvida, foi o político simbolicamente mais forte da história do Brasil. Ele não precisava adorar dragões, porque dentro dele conviviam o dragão da miséria, da fome, do abandono e da pobreza, com todos os seus terríveis coadjuvantes. Jamais se viu um presidente ou líder político com tanto poder de aglutinação simbólica como Lula. Ele atraía os ricos pela culpa e pelas novas oportunidades de ganhar dinheiro com - e não contra - os trabalhadores sindicalizados; era amado pelos subordinados e ressentidos; era incensado pelos intelectuais - sobretudo os chegados a um despotismozinho inocente -, porque, como Platão, supunham que ele poderia ser educado ou convertido; era idolatrado pelos fanáticos pelo poder porque, com Lula, algo novo ocorreria com seus donos. E, finalmente, Lula dragava na sua figura os cristãos porque, nascido no centro da opressão, ele sofreu, mas não desistiu.

Sua fala repleta de erros crassos de português e de imagens simplórias não era, como pensavam os letrados, um demérito. Era o mais sincero testemunho de sua origem popular, porque essa fala confirmava o "pobre" iletrado (e explorado) no papel do presidente que pode tudo. Lula foi premiado com a Presidência por suas virtudes e por algo que a teoria política burguesa dos Hobbes, Rousseaus, Lockes e Mills jamais perceberam: aquilo que alguns antropólogos chamaram de "poder dos fracos". O poder dos miseráveis nas sociedades intransigentemente desiguais, como a nossa, que tem a ilegítima legitimidade de transformar o assalto à mão armada em distribuição de renda. Esse poder dos fracos é o velho poder das ciganas que vivem miseravelmente no presente, mas predizem o futuro. Lula foi a imagem da redenção do Brasil pelo Brasil.

Nem a Revolução Francesa, nem a Russa, nem a Americana tiveram um ator com tais atributos. Pois Lula é a metáfora viva do que uma democracia pode fazer e do que só pode ser feito numa democracia construída por meio de uma imprensa livre e da competição eleitoral. Nas revoluções que romperam as realezas e inauguraram a democracia como uma forma de vida, esse dragão feio, imperfeito, inclassificável - porque é ave, réptil e é também um mamífero -, não há nenhum líder como Lula. A Revolução Gloriosa e a Francesa foram feitas por pensadores burgueses. Nem mesmo Mandela, negro e advogado, se iguala a ele. Nenhum deles veio tão de baixo - nem mesmo na Revolução Americana, onde se fundou a primeira sociedade civicamente igualitária do planeta, como tão bem percebeu um deslumbrado Alexis de Tocqueville.

Medir o que Lula representa simbolicamente é mais fácil hoje porque o tempo e a vida - e, mais que isso, a presença do petismo nas engrenagens paradoxais do poder - revelaram, logo no primeiro governo, a impossibilidade de seguir à risca o projeto ideológico de permanência, hoje em julgamento pelo Superior Tribunal Federal. Lula perdeu parte de sua atração ideológica quando se filiou ao projeto brasileiro perene de manter nossas desigualdades confiando ao Estado (não à sociedade) seu projeto de revolução. E tome roubo e recursos públicos, e tome funcionalismo acima das leis.

Está Lula hoje, como um ex-presidente profissional que sabe como ninguém jogar com a dramaticidade de sua trajetória e com os anseios messiânicos do povo brasileiro, ainda desejoso de ter um dragão que tudo resolva? É certo que Lula tem um papel ímpar no processo político nacional. Mas também é seguro que ele não goza mais aquela ausência de verniz que o cobria como um presidente messias - um pobre governando os pobres. A aura de pureza e de inocência dos fracos e destituídos desmanchou-se diante da fieira de roubalheiras que é parte de sua era.

As eleições são o teste. Veremos se Lula continua com o mesmo poder de transferir carisma ou se o desfrute do poder concreto tem mesmo a capacidade destrutiva de transformar dragões em lagartos. Quem viver verá. E quem viver também verá se ainda precisamos de messias populistas que são pais (e mães) do povo - ou se começamos a exigir um estilo de governo mais impessoal, menos mendaz, mais democrático, que gerencia em nome do povo o que só a ele pertence.

FONTE: REVISTA ÉPOCA

Infecção generalizada - Melchiades Filho

O julgamento do mensalão é um marco no combate à impunidade. Haverá, no mínimo, o impacto intramuros. O STF deverá dar celeridade a processos que envolvam políticos e contratos públicos. Como a Folha revelou no início do ano, mais de 250 inquéritos contra parlamentares estão na fila.

É precipitado, porém, apostar em um efeito desinfetante instantâneo e amplo. Os próprios políticos têm dado provas ostensivas de descaso às firmes respostas do Judiciário.

Tome-se o depoimento de Luiz Antonio Pagot à CPI do Cachoeira.

Ex-diretor do Dnit (órgão que cuida de obras em estradas), ele admitiu ter ajudado o comitê eleitoral de Dilma Rousseff a arrecadar dinheiro. Contou que, a pedido do tesoureiro da campanha, procurou empresas que prestam serviços ao governo e têm interesse em novos contratos. Candidamente, revelou o fabuloso retorno: R$ 6 milhões em doações, mediante recibo. Disse isso tudo um dia depois de o STF ter explicado e reforçado seu entendimento sobre o crime de peculato.

Outro exemplo: as declarações do ministro Gilberto Carvalho de que o Planalto quintuplicará os investimentos em Franco da Rocha (SP) apenas se a população escolher um petista para a prefeitura da cidade.

E o que dizer de outros três ministros dilmistas, que conseguiram cavar tempo em sua agenda para gravar vídeos de apoio ao primeiro político condenado no mensalão? Nem Miriam Belchior (Planejamento), às voltas com os servidores em greve, nem Pepe Vargas (Desenvolvimento Agrário), desafiado por uma onda de protestos de sem-terra, nem Aldo Rebelo (Esporte), envolvido em nova rodada de inspeções da Fifa, viram problema em pedir votos para João Paulo Cunha antes de a Justiça se pronunciar.

O STF resgatou a força do Código Penal. Falta o Ministério Público, menos combativo nas Presidências do PT, se apresentar para o jogo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Para que nunca mais aconteça - Paulo Brossard

Embora não se deva emitir juízos acerca de julgamento inconcluso, parece-me que, dentro dos devidos limites, pode-se dizer alguma coisa, dado que desenhado o quadro choveram opiniões, algumas precipitadas. Ora, o que se pode mencionar no momento é que a decisão até agora conhecida e longe do que muitos previram, longe de ser "política", vem sendo um julgado em termos jurídicos. Com isto, o Supremo Tribunal Federal prestou valioso serviço à nação ao mostrar, até aqui, que é um tribunal à altura do caso a ser julgado, que pelo número de envolvidos e a natureza deles o faz singular.

Não seria fácil conduzir um processo envolvendo 38 denunciados por delitos vários e abarcando pessoas de alta expressão na administração em setores de particular importância. Quando isso não bastasse, se o chefe do governo pedia desculpas pelo fato do seu partido ter sido participante do episódio escabroso, algum tempo depois, em Paris, desconversou, em gravação destinada a ser divulgada aqui, e na véspera de deixar o governo, anunciou que ia dedicar-se a demonstrar que o mensalão seria uma lorota e, hoje, em declaração ao New York Times, subestimando a inteligência de milhões de brasileiros, asseverou que o escândalo dos escândalos não existira, enquanto o STF estava a julgar pessoas nele envolvidas mercê da monumental engendração.

Vale insistir, o sucesso não é honroso às pessoas que tentaram negar a existência do denominado mensalão, a começar pelo ex-presidente que não se constrangeu em negar o fato público e notório, enquanto a mais alta Corte da nação não hesitou em processar e julgar os denunciados pelo procurador-geral da República.

A condenação criminal do ex-presidente da Câmara dos Deputados me deixou triste. Fiquei a lembrar-me de que foram presidentes daquela casa pessoas que deixaram nome na história do país, como Carlos Peixoto e Antônio Carlos, Pedro Aleixo e Ulysses Guimarães. Também foram parlamentares, e depois juízes do Supremo Tribunal Federal, Prado Kelly, Aliomar Baleeiro, Oswaldo Trigueiro, Bilac Pinto, Célio Borja e, exceção de Prado Kelly, os demais também presidiram a Corte. Devo confessar, contudo, que mais triste teria ficado eu se outro viesse a ser o juízo do Tribunal Supremo. Ele cresceu aos olhos da nação. Os meus votos são no sentido de que ele continue a crescer.

O processo penal em causa está sendo acompanhado por milhões a partir da minuciosa denúncia do procurador-geral da República, seguida da variada defesa dos acusados, do voto do ministro relator e do ministro revisor e por fim os dos demais ministros, assim como das divergências entre eles aparecidas, e as conclusões que começaram a tomar corpo. O ponto mais relevante talvez tenha sido a espécie de surpresa diante da facilidade com que muitos duvidavam pudesse suceder a condenação de alguns figurões. Não sei e não posso fazer previsão acerca do que vai acontecer até o termo do julgamento, mas suponho que já se pode entrever um saldo moralizador ou pedagógico de alta expressão, na medida em que aumente a confiança na Justiça e nas instituições. Por fim, espero que essa penosa situação não venha a se repetir, mas também espero que os fatos que vieram a ensejar seu ajuizamento nunca mais voltem a ocorrer.

Tendo sido juiz do STF, resisti a grande número de indagações principalmente feitas por órgãos de divulgação.À vista de dados idôneos já conhecidos, disse agora o que podia dizer, sem a pretensão de interferir nas decisões do egrégio Tribunal.

*Jurista, ministro aposentado do STF

FONTE: ZERO HORA (RS)

O caixa 2 - Everardo Maciel

Fiquei estarrecido quando tomei conhecimento, pela mídia, de que a mais alta autoridade da República, à época que eclodiu o denominado escândalo do mensalão, alegara tratar-se de um mero caixa 2.

Uma autoridade fiscal chegaria ao limite da perplexidade ao ouvir de um contribuinte que praticara crime de sonegação por omissão de receita, por exemplo, a justificação de que fora tão somente um cândido exercício de caixa 2. Pois bem, esse mau contribuinte poderia acrescentar que se inspirara em discurso de autoridade.

O advogado, no exercício de uma função essencial ao Estado Democrático de Direito, tem a obrigação de buscar a absolvição ou, ao menos, a redução das penas que, em tese, seriam aplicáveis a seus clientes. O que espanta, todavia, é ver políticos e advogados festejarem o crime do caixa 2, diante da possibilidade de prescrição. Bradam solenemente: Foi apenas caixa 2! É a banalização da indecência.

Crime deve ser confessado de forma compungida e envergonhada, de cabeça baixa, com um mínimo sinal de arrependimento. Somente criminosos doentios se vangloriam de suas iniquidades.

Essas condutas funcionam como uma espécie de cupins da frágil estrutura de valores da sociedade brasileira. Somadas a outras, que de tão pequenas às vezes não são percebidas, vão minando as convicções das pessoas e arruinando o processo civilizatório.

A alegação do caixa 2 é um episódio neste processo de aviltamento dos valores. Não é, todavia, fato isolado. O ovo da serpente há muito se encontra instalado no Estado brasileiro.

A redemocratização no Brasil, infelizmente, revigorou a condenável prática do fisiologismo. Não tendo sido decorrente de uma ruptura institucional, mas de um processo conciliatório, a redemocratização trouxe à mesa do governo personagens antes abrigados na oposição.

Os novos protagonistas da cena política exigiram, legitimamente, que fossem representados na administração, já sobrecarregada pelos oriundos da velha ordem. A Nova República iniciou a temporada das "indicações". Foi a festa do velho fisiologismo.

A arena política passou a ser povoada por uma miríade de partidos e tendências, em que prevaleceram interesses localizados, pretextando o que foi chamado de presidencialismo de coalizão. O clássico fisiologismo, então, se sofisticou.

Se antes as postulações dos partidos políticos se limitavam às "indicações", num novo estágio elas se direcionaram para despudoradas demandas por "diretoria que fura poço" e tesouraria de estatais.

Mais recentemente, surgiu o que se chamou de aparelhamento, em que se vislumbrava um comprometimento ideológico dos indicados. Não é nada disso, entretanto, ainda que, em alguns momentos, se escutassem murmúrios de teses obscuras, cada vez mais subjugadas pelo pragmatismo. Aparelhamento é apenas outra denominação do fisiologismo, aplicável à ambição de grupelhos políticos não tradicionais. Qualquer que seja o nome, o que fica evidente é o propósito de manter-se no poder e dele se servir.

Chegou-se à ousadia de cobrar fidelidade da toga ao poder. Muitos se espantam quando magistrados decidem de forma diferente da expectativa dos que os nomearam. Marianne, símbolo da República desde a Revolução Francesa, deve estar ruborizada.

Essas práticas pouco edificantes se combinam com barganhas e negócios que têm por base as emendas parlamentares ao Orçamento. Serão elas, mantido o modelo existente, uma fonte inesgotável de escândalos. Não raro, os acusadores de hoje se convertem nos acusados de amanhã. A maldição está num sistema completamente vulnerável à corrupção.

O afrouxamento moral do Estado tem outras faces. Qual o respaldo moral para cobrar as dívidas dos contribuintes, se o Estado não paga precatórios, atrasa tanto quanto possível restituições e compensações de tributos e faz uso de todos os recursos procrastinatórios para evitar a liquidação de sentenças em que foi condenado? Essa assimetria de conduta, tão recorrente, é um desserviço à República.

Não me surpreendo, embora deplore, quando vejo cidadãos, publicamente, dizendo que não pagam impostos porque os políticos são corruptos. É o império da torpeza bilateral.

O que impressiona, de mais a mais, é constatar que essa crise axiológica, que não é recente, vem crescendo continuadamente, sem que nada interrompa sua execrável trajetória.

Há uma novidade, todavia. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos réus do mensalão, independentemente das decisões que venham a ser tomadas, trouxe a lume alguns conceitos alentadores, superando o ranço positivista que pretende a supremacia do formalismo sobre os fatos. O que se colhe fora do juízo, ainda que não sejam provas cabais, robustece as evidências extraídas no rito judicial. Nenhuma destinação, por mais meritória que seja, sacraliza dinheiro oriundo de peculato. Deve-se alegar caixa 2 em tom contrito e penitente. Como contraponto, pessoas inocentes têm o direito de ser declaradas inocentes. É uma réstia de esperança, até mesmo para os céticos, como eu.

Everardo Maciel, consultor tributário, foi secretário da Receita Federal (1995-2002)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Márcio Lacerda: “Lula não será decisivo na campanha de Belo Horizonte”

Prefeito Márcio Lacerda, candidato à reeleição pelo PSB,diz ao BRASIL ECONÔMICO que o programa do PT é agressivo e garante que o senador Aécio Neves transfere tantos votos quanto o ex-presidente

“O ex-presidente Lula não será decisivo na eleição de Belo Horizonte”

Para candidato à reeleição na capital mineira, o senador tucano Aécio Neves e o governador Antonio Anastasia transferem tantos votos quanto Dilma Rousseff e seu antecessor no Palácio do Planalto

Na eleição municipal de 2008, em Belo Horizonte, o Brasil foi apresentado a Márcio Lacerda. Dois anos antes de Lula eleger a “técnica” Dilma Rousseff para o Palácio do Planalto, o empresário e secretário de Governo de Aécio Neves venceu com folga o pleito na capital mineira. Seu palanque surpreendeu o mundo político quando conseguiu unir no mesmo lado os antagonistas PSDB e PT. Para muitos, aquele era o laboratório de uma promissora aliança.

Quatro anos depois, Lacerda disputa a reeleição em um cenário completamente diferente. Agora, ampla-mente conhecido do eleitorado, ele não precisa mais colar sua imagem no padrinho Aécio Neves. No embate da campanha, ele também já não é mais visto como um quadro 100% técnico. “Não sou assim um técnico tão puro. Fui militante político na juventude e na minha vida empresarial durante 30 anos. Nunca fui militante de aparelho partidário, mas sempre fui um político”, diz nessa entrevista exclusiva ao BRASIL ECONÔMICO. Filiado ao PSB, Lacerda se viu diante de uma encruzilhada às vésperas de formalizar sua candidatura. Depois de uma intensa crise entre os aliados PSDB e PT, o grande acordo construído em 2008 implodiu. Perfilado ao lados dos tucanos, ele viu o antigo aliado se converter em seu principal inimigo político. E uma eleição que já estava ganha teve contornos dramáticos. Para conseguir renovar seu mandato, Márcio Lacerda terá que derrotar duas potências: Lula e Dilma Rousseff.

A dupla decidiu investir pesado para que o PT volte a comandar Belo Horizonte, o que enfraquece-ria o projeto de poder de Aécio Neves. Apesar de estar em sua segunda disputa por votos, a militância do prefeito começou durante o regime militar no Partido Comunista Brasileiro e na Aliança Libertadora Nacional (ALN). Em 1975, ele fundou, com a esposa, Regina, a empresa Construtel, que atuava na construção de redes telefônicas. Em 1979, fundou o segundo empreendimento, a empresa Batik. Nas décadas de 80 e 90, seus negócios tiveram um crescimento vertiginoso. Como empresário, ele participou da direção de entidades empresariais, como a Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) e a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Em 2001, passou a integrar a direção da Federação das Indústrias de Minas Gerais, presidindo os conselhos de Desenvolvimento Tecnológico e Desenvolvimento Regional. Em 2003, assumiu a secretaria executiva do Ministério da Integração Nacional do governo Lula na gestão de Ciro Gomes. Quatro anos depois, aceitou o convite do então governador Aécio Neves para assumir a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais. Nesse cargo, foi o responsável pela atração de investimentos de R$ 30 bilhões para Minas e levou para a então ministra Dilma Rousseff a proposta para viabilizar a expansão do metrô de Belo Horizonte. Foi assim que Márcio Lacerda cacifou-se entre tucanos, socialistas e petistas para disputar a prefeitura de Belo Horizonte. Em junho de 2008, deixou a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico para se candidatar a prefeito. Foi eleito com 60% dos votos válidos.

Pedro Venceslau

Qual tem sido o papel do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e do governador Antonio Anastasia (PSDB) na sua campanha em Belo Horizonte?

Até agora o senador Aécio apareceu em comerciais durante dois ou três dias logo depois do Lula entrar na campanha. No programa, ele ainda não apareceu. O governador Antonio Anastasia também não.

Em 2008, Aécio estava colado na sua campanha. Agora que o sr. é conhecido, isso não é mais necessário?

Vamos usar a imagem dele de forma dosada porque em 2008 o excesso de exposição dos apoiadores deixou o candidato em segundo plano. Isso me prejudicou muito. Não vamos repetir esse erro agora.

Por que prejudicou?

É aquela história... Afinal, quem é o candidato? Onde ele está? Se o apoiador aparece muito, isso prejudica. Tanto é que, no segundo turno em 2008, nós mudamos isso. Minha exposição foi muito maior.

Acha que esse mesmo efeito pode acontecer com seu adversário, Patrus Ananias, que está fazendo campanha colado no ex-presidente Lula?

Não sei como eles vão atuar. Ontem, eles vieram com um programa muito agressivo. Isso significa a tentativa de encontrar uma linguagem.

Gostou do resultado da pesquisa divulgada na última quinta-feira, onde o sr. aparece com 46%, contra 30% do Patrus?

A pesquisa está dentro daquilo que estamos apurando há algum tempo e reflete uma boa avaliação da nossa gestão em Belo Horizonte. O Datafolha deu ótimo e bom de 59% para a gestão. Isso já é reflexo da televisão. Em muitos casos, até pessoas, que dizem votar no adversário por questões políticas e ideológicas, acham o nosso governo bom ou ótimo.

Achou que Patrus Ananias estaria mais forte nesse momento?

Nunca achei que ele teria mais força. O PT tem 20% de simpatia do eleitorado em Belo Horizonte. Isso somado ao recall dele de ex-prefeito daria natural-mente algo entre 20% e 30%.

Em Belo Horizonte, quem transfere mais votos: o ex-presidente Lula ou o senador Aécio Neves?

As pesquisas mostram desde muito tempo que é igual. Aécio e Lula transferem a mesma coisa. Anastasia e Dilma idem.

Então, o Lula não será decisivo na campanha em BH?

Não será. Existe aqui um contra-peso.

Como explica o rompimento inesperado entre PT e PSB em Belo Horizonte?

O presidente do PT, Rui Falcão, disse que houve uma traição... Isso é a interpretação dele. O PT rompeu porque nós e os outros partidos não aceitamos fazer uma coligação proporcional. Não se pode falar em traição porque não havia esse compromisso. O que havia era uma conversa e um documento escrito e assinado dizendo que a questão da coligação proporcional seria discutida depois que o PT indicasse o candidato a vice-prefeito. O PT levou dois meses para isso. Entre os dias 10 e30 de junho não conseguiram chegar a um entendimento. Aí o PT municipal, que é controlado por uma pessoa que sempre foi a favor de que o partido tivesse uma candidatura própria, votou pelo rompimento da aliança.

Havia um projeto de longo prazo de manutenção dessa aliança entre PSDB, PSB e PT?

Eu fui o maior defensor e advogado da repetição dessa aliança. A impressão que fiquei é que o Fernando Pimentel e o senador Aécio Neves queriam isso. Mas a agressividade desse grupo dentro do PT, que comanda o diretório municipal, inviabilizou o processo. Isso é simples. Não tem nenhuma explicação complexa. Foi a disputa interna do PT que levou a isso.

A campanha está muito agressiva em BH?

Da nossa parte não. Mas da parte do adversário está. Estão dizendo muitas inverdades e falsidades cheias de adjetivos. Há muita incoerência. Isso revela um certo desespero.

O sr. teme que a presidente Dilma Rousseff entre com tudo na disputa?

Não sei se ela entra. Talvez não. Eu diria que existe só 50% de chance de isso acontecer..

A presidente conta com o seu partido, o PSB, em sua base no Congresso Nacional. Se ela entrar na campanha de Patrus, isso teria consequências?

Na nossa coligação de 19 partidos, 16 deles são apoiadores do governo do nível federal. Só três não são da base dela.

O sr. era considerado em 2008 um quadro técnico. Quatro anos depois, podemos dizer que agora o sr. virou um quadro político?

Eu não sou assim um técnico tão puro. Fui militante político na juventude e na minha vida empresarial durante 30 anos. Trabalhei no governo Lula como secretário executivo de ministério. Fui também secretário do governo Aécio Neves. Em política, você tem dois entendimentos: planejamento de implantação de políticas públicas e a militância partidária orgânica. O segundo ponto existe para você colocar as suas teses. Esse debate existe o tempo todo. O processo eleitoral é o ápice da disputa de espaço para colocar em prática suas políticas públicas. Eu nunca fui militante de aparelho partidário, mas sempre fui um político.

O PSB, que é presidido pelo governador Eduardo Campos, rompeu com o PT também em Fortaleza e Recife. Esse movimento pode abalar a aliança nacional para 2014 ou no Congresso Nacional?

O PSB tem uma identidade forte, conta com bons quadros e é leal à presidente Dilma no apoio ao governo federal. Mas o partido tem o seu limite. Não temos que conviver com determinadas práticas dos aliados. O rompimento aconteceu em Recife, Fortaleza e Belo Horizonte por causa da dificuldade do PT em manter a unidade e fazer um diálogo de igual para igual com seus parceiros.

Então foi o PT que pisou na bola?

Sim. A minoria que defendia candidatura própria derrubou a proposta.

Considera o governador Eduardo Campos um bom nome para disputar o Palácio do Planalto em 2014?

É um bom nome, mas o senador Aécio também. O futuro vai resolver isso. Vamos cuidar de 2012 e deixar 2014 para vocês, que são analistas e bruxos da política (risos)..

É possível que seja formada uma aliança em 2014 entre PSB e PSDB?

Não faço a menor ideia. Isso é pura especulação e exercício de futurologia.

Tem planos de disputar o governo mineiro em 2014?

Quero realizar meu sonho de ser um dos melhores prefeitos da história.

Acha que quatro anos é muito pouco tempo para deixar um legado?

Acho que os mandatos deviam ser de cinco ou seis anos sem reeleição. As eleições gerais no país todo deveriam ser no mesmo ano, mesmo que divididas em dois semestres diferentes.

Como estava a situação financeira de Belo Horizonte quando o sr. tomou posse?

Era uma situação equilibrada. E continua sendo equilibrada. Estamos dentro de parâmetros saudáveis.

Como está a dívida de Belo Horizonte com o governo federal?

A dívida é de 40% da receita corrente líquida. O máximo admitido é 120%.

O parâmetro de negociação da dívida com o governo federal devia mudar?

Há quem chame de agiotagem o modelo atual... Estamos negociando um empréstimo com o Banco Mundial de US$ 200 milhões para pagarmos toda a dívida com o governo federal de curto prazo e juros elevados. Isso já está negociado. Só depende do governo brasileiro liberar.

O sr. hoje dialoga mais com quem: o governador Eduardo Campos, o senador Aécio Neves ou o ex-ministro Ciro Gomes?

Estou muito próximo do governador Aécio Neves. Ele está envolvido na minha campanha. Nosso contato é muito frequente, mas está focado na eleição de 2012. Não estamos discutindo 2014 nem em nível estadual, nem em federal. Não existe essa preocupação nesse momento.

Por causa dos reflexos do julgamento do mensalão?

É difícil dizer. Empresário não fala muito, mas tem também a questão da crise internacional. Isso deixa os empresários sempre mais cautelosos. Não é um momento de euforia e de crescmento acelerado. O PIB terá um crescimento muito modesto esse ano. O empresário procura se preservar.

Como avalia a qualidade do seu diálogo com o governo federal?

É muito bom. Há umas duas semanas foram incluídas no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), de R$ 800 milhões, obras contra enchentes em Belo Horizonte.

O diálogo com Dilma é melhor do que era com Lula?

O diálogo hoje está mais organizado, mas tivemos também boas parcerias com o presidente Lula.

Mais organizado como?

Está mais claro qual é o papel de cada ministério e qual deve ser o tipo de reunião técnica em cada caso. Essa tendência veio do governo Lula com a então ministra Dilma Rousseff. Com mais poder, ela tornou essa negociação mais técnica e organizada, na medida em que temos bons projetos.

Como avalia a gestão Dilma?

Ela está enfrentando bem essa turbulência internacional. Tem tomado diversas medidas na área econômica que eu considero adequadas. Sua gestão é muito transparente. Ela está em um bom caminho. A questão é saber até que ponto essa crise internacional vai atrapalhar os planos brasileiros. Espero que não atrapalhe.

O sr. sempre foi muito próximo do ministro e ex-prefeito de BH Fernando Pimentel. A relação entre vocês ficou abalada com o rompimento entre PSB e PT?

Não temos nos falado. Espero que depois da eleição a gente volte a conversar.

Qual é o maior gargalo em Belo Horizonte para a realização dos jogos da Copa do Mundo de 2014?

As questões do estádio e da mobilidade estão bem equacionadas. A questão dos hotéis era uma dificuldade, mas estamos com quase 30 em construção. Temos um problema que é o aeroporto. Ele está saturado. O governo federal atrasou muito as obras. Não sei até que ponto isso poderá ser um problema. Não sei o que a Infraero está planejando. Pelo menos algum terminal provisório estará pronto até a Copa.

Qual a situação do transporte público em Belo Horizonte?

Vamos terminar até o final do ano que vem o nosso projeto de 22 quilômetros de BRT. As vias ligando o centro e o aeroporto ao estádio estarão prontas. Estaremos bem. Belo Horizonte tem sido colocada pela Fifa (Federação Internacional de Futebol) e pelo governo federal como a cidade mais adiantada nas obras de mobilidade urbana.

Quantos secretários uma prefeitura precisa ter para funcionar bem?

Isso é muito teórico. Depende muito da quantidade de funcionários e da complexidade da cidade. Fiz um estudo em 2010 sobre a estrutura das dez maiores cidades do Brasil. Cada uma é de um jeito. Às vezes, tem menos secretaria, mas tem mais empresas. E institutos cumprindo o papel. Em algumas cidades, o subprefeito é secretário. Em outras não é assim. Nós por exemplo temos nove secretários regionais. Cada região tem 250 mil ou 300 mil habitantes..

Defende a parceria público-privada também na saúde?

O SUS funciona contratando hospitais privados e filantrópicos. Então, essa parceria já existe. O que defendemos são parcerias para construir hospitais e centros de saúde e operar a infraestrutura deles. A saúde era e continuará sendo uma atividade pública.

Acha que o estado de Minas Gerais está bem representado na Esplanada dos Ministérios?

Acho que não. Tem lá sete ou oito gaúchos, 13 ou 14 paulistas e só um ministro mineiro. É um desequilíbrio. Embora não exista um critério legal para definir isso, do ponto de vista político não é muito justo.

E o PSB está bem representado no governo federal?

Acho que não. Acredito que o partido deveria ter um pouco mais de espaço.

Quantos ministérios o partido deveria ter?

Não sei... Não falo necessariamente só de ministérios.

Apesar do rompimento na capital, a relação entre PSDB, PSB e PT continua forte no interior do estado?

Continua. Os partidos são parecidos na ação política e nos princípios que defendem.

Um dia, PSDB e PT podem caminhar juntos nacionalmente?

Muito difícil. As divisões acontecem muitas vezes por motivos irracionais.

Pretende colocar o governador Eduardo Campos no seu programa na TV?

Não sei. Conversei com ele e disse que vamos aguardar um pouco para ver se seria necessário ou não.

O petismo então ainda é muito forte em BH?

Já foi mais forte.

FONTE: BRASIL ECONÔMICO

Jarbas Vasconcelos, ao lado do PSB, acirra crise com PT

Em Recife, peemedebista refuta crítica de Lula sobre traição socialista

Letícia Lins

RECIFE Aliado recente do governador Eduardo Campos (PSB) - com quem passou 20 anos rompido - o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) começou ontem a participar da campanha eleitoral do PSB em Recife e ajudou a acirrar a crise entre PT e PSB. O senador refutou as acusações de "traição" feitas por caciques petistas contra o PSB, que rompeu com o PT ao lançar candidato pelo próprio partido à sucessão municipal deste ano.

- A questão de Lula falar de traição de Eduardo é uma coisa totalmente extravagante, inusitada, e custa a crer que ele vá repetir isso aqui em Recife. Não acredito que fará isso - disse Jarbas, referindo-se à anunciada visita do ex -presidente para reforçar a campanha de Humberto Costa (PT) .

Na semana passada, o ex-presidente Lula se referiu ao PSB, afirmando que "aqueles que o PT ajudou a chegar ao poder não querem mais ficar com o PT", e disse que o partido "não vai ficar chorando, é importante que eles saibam que não estariam no governo se não fôssemos nós".

Enquanto Campos preferiu silenciar sobre as críticas, Jarbas Vasconcelos jogou lenha na fogueira.

- Nosso adversário é o PT. Ficava mais fácil para nós, do PMDB de Pernambuco, ter um entendimento aqui com quem nunca tivemos entendimento. Eu próprio e nossos companheiros precisávamos definir quem era o nosso adversário. Mas nosso adversário sempre foi o PT e todos são testemunhas disso. Nem o PT me apoiou nem eu nunca apoiei o PT. Votei em Lula uma só vez, porque não podia ter votado em Fernando Collor - afirmou, criticando ainda o PT local, que há doze anos controla a prefeitura de Recife.

Senador: prefeito não presta

Vasconcelos e Campos compareceram a um encontro do candidato do PSB, Geraldo Júlio, com artistas recifenses.

- Nós (ele e Campos) já vínhamos conversando sobre 2014. Mas o desmantelo praticado pelo PT em Recife chegou a tal grandeza, que nos obrigou aqui a nos juntarmos (com o PSB) para tentar salvar Recife. Este prefeito que está aí foi apresentado há quatro anos, como João (da Costa) é João, que era bom, competente. Com dois meses de mandato, o João já não prestava.

FONTE: O GLOBO

Jarbas ataca PT em evento de Geraldo

Senador se incorpora à campanha da Frente Popular no Recife durante um ato com artistas plásticos e reage às críticas afirmando que os petistas estão em “desespero”

Sheila Borges

Pode até ter demorado, mas o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) entrou de vez na campanha do candidato do PSB a prefeito do Recife, Geraldo Julio. A 35 dias do primeiro turno, em um evento de campanha, ontem, no ateliê do artista plástico Ferreira, o peemedebista disse que o PT entra na reta final da campanha dando sinais de “desespero e insegurança”. “A principal demonstração é quando querem pautar o adversário. Numa candidatura estável, isso não acontece”, falou, referindo-se ao discurso petista contra a sua presença no palanque de Geraldo.

Com tranquilidade, o senador afirmou não se preocupar com a campanha promovida pelo PT, que ressalta, dentro e fora do guia eleitoral, seu papel de opositor do ex-presidente Lula e da presidente Dilma Rousseff. Como Lula tem forte penetração no eleitorado do Recife e apoia o candidato do PT, Humberto Costa, os petistas apostam que o discurso pode tirar votos de Geraldo. “Quem não gostaria de ter o apoio de Jarbas?”, indagou o governador Eduardo Campos (PSB), no evento de ontem, ao lado do senador, seu ex-desafeto político.

“Estamos recebendo o apoio de Jarbas, um apoio importante na cidade, a uma chapa encabeçada pelo PSB, que tem como vice o PCdoB. Apoio que, no passado, o presidente Lula já teve do próprio Jarbas. Eu vi várias vezes, em altos dirigentes do PT, a tentativa de atrair Jarbas para um projeto em 2006. E isso era dito com todas as letras. Se Jarbas serviu (para o PT) no passado, se tentaram um apoio dele recentemente, ele só não serve para apoiar o candidato do PSB, é? Isso é uma incoerência”, disse Eduardo.

Apesar da estratégia adotada pelo PT, Jarbas não acredita que Lula venha ao Recife e acuse Eduardo de tê-lo “traído” ao lançar um candidato próprio do PSB e de ter recebido o senador peemedebista de volta na Frente Popular. “Eduardo é um correligionário de Lula, faz parte da base. Querer chamar Eduardo disso e daquilo não tem propósito”, ponderou Jarbas. “O peso de Lula já foi mais forte, a administração do PT está desaprovada. Por isso, a influência de quem vem de fora é reduzida”, acrescentou.

Para Jarbas, o eleitor não quer uma campanha nacionalizada, quer discutir o Recife. E como Geraldo tem feito isso, o senador acredita que a Frente pode ganhar no primeiro turno. Se houver uma segunda etapa, ele garante que todos já estão “preparados”. Uma reunião da cúpula da coligação decidirá hoje onde Jarbas fará a primeira caminhada com Geraldo. Dois percursos estão sendo estudados: o centro do Recife e os mercados públicos. Ontem, no ato com artistas plásticos, Jarbas gravou depoimentos para os guias eleitorais de TV e rádio, que serão exibidos a partir de hoje. E frisou que foi ele quem pediu ao deputado Raul Henry (PMDB) para aparecer no guia de Geraldo sugerindo propostas para “ocupar” o espaço do PMDB.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Falcão vê PT e PSB separados em 2014

Em entrevista, o presidente do PT, Rui Falcão, prevê o rompimento de seu partido com o PSB nas eleições presidenciais de 2014. Diz que o atual aliado almeja voo solo e deve atrair o PSDB.

"PSB coloca rompimento para 2014 na ordem do dia"

Presidente do PT diz que tradicional aliado poderá estar, inclusive, numa aliança com o PSDB nas eleições presidenciais

Julia Duailibi, Fernando Gallo e Conrado Corsalette

O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirma que o partido já vê um eventual rompimento com o PSB nas eleições presidenciais de 2014. Isso porque, na sua análise, o tradicional parceiro indicou, via o presidente da legenda e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que pretende alçar voo solo e poderá, inclusive, estar ao lado dos tucanos. "Acho que há uma disposição do PSB de se fortalecer, colocando na ordem do dia a possibilidade de disputar 2014 fora do nosso bloco", disse Falcão, em entrevista concedida na semana passada, antes que o deputado João Paulo Cunha (PT) desistisse de concorrer à prefeitura de Osasco após ser condenado pelo mensalão - Falcão trabalhava então com a hipótese de absolvição.

O PT já avaliou onde tem mais chance de vencer nas eleições municipais deste ano?

Temos mais chance nas cidades médias e pequenas. Nas cidades grandes estamos para avaliar o impacto da campanha televisiva. Porque no retrato de hoje só estamos liderando no Recife. E temos expectativa de crescer bastante em Salvador.

Qual reflexo dessa eleição em relação às alianças nacionais? Há estranhamento com o PSB em Belo Horizonte, Recife e Fortaleza, onde a aliança se desfez.

Vamos manter parceria estratégica com o PMDB, que é o nosso principal parceiro. As outras disputas são locais, não são elas que estão pautando necessariamente alguma mudança de postura em relação ao PSB, por exemplo. Acho que no Recife houve um rompimento provocado pelo PSB. Belo Horizonte foi um episódio local, mas a direção nacional do PSB não interveio para corrigir. Ela ameaçou, mas recuou e permitiu que a aliança fosse rompida por uma falta de palavra do prefeito Marcio Lacerda, que não honrou um compromisso escrito, inclusive.

O estremecimento excluiu a chance de Eduardo Campos em uma chapa com o PT em 2014?

Primeiro precisa ver se ele estava incluído.

Ficou algum ressentimento?

Não misturamos disputa política com questões pessoais. Não tenho nenhum ressentimento. Acho que há uma disposição do PSB de se fortalecer, o que é legítimo, mas também colocando na ordem do dia a possibilidade de disputar 2014 fora do nosso bloco.

Já trabalha com esse cenário?

Temos que analisar a hipótese. Ela não está posta agora, mas ela pode ser posta a partir de rearranjos partidários que possam ocorrer. Fala-se muito em reorganizações partidárias depois da eleição municipal. Fusão e surgimento de outros partidos.

O sr. vê alguma possibilidade de fusão do PSB com o PSD?

Não. Acho que pode surgir algum tipo de aglutinação, mas não do PSD com o PSB. O PSD se consolidou depois que ganhou tempo de televisão e fundo partidário.

Além de um eventual voo solo, o sr. vê alguma possibilidade de o PSB estar com o PSDB?

É uma possibilidade que não podemos descartar. Isso pode vir a ocorrer.

O que o PT fará para manter o PSB em seu arco de alianças?

Ele continua a participar do nosso governo federal e vamos nos empenhar pra que isso continue a ocorrer. Não queremos misturar o rompimento na eleição municipal com a questão nacional.

Por que o comportamento do governador Eduardo Campos foi diferente em São Paulo?

Primeiro porque ele tinha um compromisso pessoal com o Lula. Ainda assim, ele cobrou várias contrapartidas. E nós atendemos. Até demos a mais. Caso, por exemplo, de Aracaju, que não tinha sido pedido e retiramos a candidatura para apoiar o candidato do PSB. Tudo o que ele pediu nós atendemos.

Quais são os desafios do candidato petista Fernando Haddad para crescer em São Paulo?

Uma boa exposição na televisão, que ele está tendo agora, a participação do Lula e da Marta, isso vai ajudar muito, e os debates que virão. E a identificação dos eleitores do PT com ele.

O que o sr. achou de o candidato José Serra ter chamado a ideia do Bilhete Único Mensal de "bilhete mensaleiro"?

É a repetição do estilo de campanha que ele fez contra a Dilma: baixaria. Embora ele não assuma pessoalmente, mas a campanha dele está fazendo. Nós devíamos discutir mais propostas para a cidade, mais ideias, e não entrar em baixaria.

O assunto mensalão tem influenciado nas campanhas?

Tirando essa afirmação do Serra, pelo País, nas cidades que tenho visitado, essa questão não entrou na disputa.

O PT entende que o julgamento no Suprmeo é técnico?

Já se tornou lugar comum dizer que decisão do Supremo a gente não discute, cumpre. Pelo que tenho visto, se houver a hipótese de condenar alguns réus, os advogados ainda podem lançar mão de uma série de recursos, agravos.

O mensalão do PSDB deveria ser julgado em 2014?

Acho que já deveria ter sido julgado pelo prazo que está lá. E também foi desmembrado, um tratamento diferente. Agora, não acho que a gente deve pensar nisso como revanche. Há prazos. E de preferência que não julgue em ano eleitoral, que julgue antes. Não sou favorável a jogar para 2014 para a gente se vingar do PSDB. O STF já deveria ter julgado. Houve tempo para isso. E seguiu outro caminho. O Supremo deve ter suas razões, mas as formas foram distintas. Inclusive um precedeu o outro, né? A denúncia dos fatos que envolvem o senador Eduardo Azeredo é anterior a 2005. Não sei por que não foi julgado.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO