terça-feira, 23 de abril de 2013

Mensalão: "Mácula" na história do Brasil

O escândalo do mensalão foi classificado no voto do ministro Luiz Fux como o evento que “maculou a história recente do Brasil”. Embora tenha suprimido do acórdão todas as suas participações nos debates, o magistrado juntou ao documento de mais de 8 mil páginas a íntegra de seu voto, que não havia sido lida no julgamento. Em um dos trechos, Fux se refere ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu como o comandante de uma quadrilha que tinha um “projeto de poder de longo prazo de ilicitude amazônica”.

O ministro do STF detalhou a influência que Dirceu exercia e ainda exerce sobre o PT. “É imperioso reconhecer que o 1º réu possuía como ministro da Casa Civil diversas funções relevantes, como o próprio réu reconheceu em juízo, o que não o impedia de influenciar os rumos da sua agremiação partidária e nem mesmo criava obstáculos para erigir um audacioso projeto político de poder calcado em práticas ilícitas”, frisou Fux.

Em outro trecho do voto, Fux foi contundente contra o petista, que, recentemente, acusou o ministro de ter prometido absolvê-lo. “(Ele) passou a ter como uma de suas atribuições a formação da base aliada do governo federal dentro do Congresso Nacional, o que alcançou através de um projeto de poder de longo prazo de ilicitude amazônica.”

Já o presidente do STF e relator do caso, Joaquim Barbosa, descreve José Dirceu como a pessoa que estava à frente da “organização” e do “controle” das atividades criminosas. O nome do petista, condenado a 10 anos e 10 meses de prisão por corrupção ativa e formação de quadrilha, foi citado 1.963 vezes no acórdão. No entanto, o recordista de citações é o empresário Marcos Valério, apontado como o operador do mensalão, lembrado em 6.912 ocasiões. Ele pegou pena de mais de 40 anos de cadeia pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

As defesas de ambos adiantaram que vão recorrer contra as condenações de seus clientes. O prazo de 10 dias para que os advogados dos 25 réus condenados apresentem recurso começa a ser contado hoje e se encerra em 2 de maio, quinta-feira da semana que vem.

Controvérsias

O recurso cabível para contestar as decisões tomadas no julgamento do mensalão são os chamados embargos de declaração, instrumento voltado para contestar omissão, obscuridade ou contradição. No entanto, os réus prometem entrar também com embargos infringentes. Essa é uma das controvérsias que ainda deverão ser enfrentadas pelo Supremo. O regimento interno da Corte prevê os dois embargos: os de declaração e os infringentes, únicos com possibilidade de mudar o resultado do julgamento. Mas neste caso, é preciso haver pelo menos quatro votos favoráveis ao réu. Dos 25 condenados, 14 se encaixam nessa situação e poderiam então recorrer duas vezes.

O tema, porém, é controverso. A Lei nº 8.308/1990 não prevê a possibilidade de apresentação de embargos infringentes em ações penais. “Nunca apreciamos se a 8.308 revogou ou não o nosso regimento”, lembra Marco Aurélio Mello. A decisão a respeito do mensalão pode ter reflexos nas ações penais que tramitam em outras cortes, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, os embargos infringentes são “manifestamente inadmissíveis”. “Eles constam do regimento interno do STF, mas não são compatíveis com a regulação que se tem. Não tenho dúvida nenhuma do descabimento deles”, frisou Gurgel. O procurador-geral quer agilidade e firmeza na apreciação dos recursos e disse ter certeza de que “o Supremo velará para que sua decisão tenha eficácia e efetividade”. Ele defende que a execução das penas seja determinada tão logo o julgamento dos embargos de declaração seja concluído. O STF, no entanto, tem adotado o entendimento de que os decretos de prisão só podem ser expedidos depois do trânsito em julgado do processo — quando não há mais possibilidade de recorrer.

O advogado de Henrique Pizzolato, Marthius Sávio, é um dos defensores que já deram sinais de que, após os embargos de declaração, vai insistir nos infringentes. “Identificamos que há documentos nos autos que não foram devidamente analisados pelos ministros, o que poderia, sim, ter efeito diferente no que foi julgado”, destaca. “Quanto mais garantia de defesa, como alternativas e aumento de prazo, menor a chance de nulidade de um processo”, ressalta Leonardo Issac, advogado de Simone Vasconcelos. No acórdão, Joaquim Barbosa observa que a permanência dos deputados condenados no mandato é incompatível com as penas aplicadas pelo STF. (DA, HM, AC e EL)

"Quanto mais garantia de defesa, como alternativas e aumento de prazo, menor a chance de nulidade de um processo" - Leonardo Issac, advogado de um dos réus

Nos anais do STF

Confira a quantidade de vezes que os réus ou políticos são citados no acórdão do mensalão. A publicação tem 8.405 páginas e retrata as 53 sessões do julgamento da Ação Penal 470, o maior da história do Supremo Tribunal Federal. A palavra mensalão é citada 234 vezes, e escândalo, 122.

Marcos Valério
6.912
Delúbio
3.114
José Dirceu
1.963
João Paulo Cunha
1.724
Genoino
1.262
Lula
239
Dilma
3

Fonte: Correio Braziliense

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