domingo, 6 de julho de 2014

Ferreira Gullar: Ainda bem que não adivinho

• Minha ansiedade na espera desse jogo foi ainda maior do que no anterior; quanto mais alto, maior a queda

- Folha de S. Paulo – Ilustrada

Você, leitor, já sabe o estado em que fico quando a seleção brasileira vai jogar e, pior ainda, quando está jogando. Pode, portanto, imaginar quanto me custou esperar pelo jogo com o Chile, que me parecia um bom time, com uma capacidade ofensiva preocupante.

É verdade que, como fazia 12 anos que os chilenos não conseguiram nos vencer, peguei-me nesse argumento para me convencer de que iríamos derrotá-los. Mas, como se sabe, essa foi uma convicção difícil de manter, particularmente depois que o Chile fez um inesperado gol de empate.

Senti o baque e a seleção também, porque, depois disso, parecia perdida em campo. Os chilenos mantinham a posse de bola e avançavam articulados para o nosso gol.

Embora insistisse em dizer a mim mesmo que a nossa vitória era inevitável, essa certeza foi se tornando cada vez mais difícil de manter. Para piorar a situação, os chilenos impediam Neymar de jogar, mantendo dois, três jogadores, em cima dele, que o empurravam, chutavam, derrubavam. Como se não bastasse, Fred recebeu uma bola em frente ao gol chileno, quando o goleiro estava caído do outro lado, e chutou para fora.

A sorte (isto é, o acaso) parecia conspirar contra nós e, além disso, o juiz da partida também se tornou nosso adversário. E que adversário, já que seu poder, dentro de campo, é absoluto. Assim foi que não marcou um pênalti indiscutível em Neymar e anulou um gol absolutamente legítimo do Hulk.

Naquele instante, eu havia saltado da cadeira e gritado "gol!", quando me dei conta de que algo estranho havia acontecido.

O gol fora anulado, porque o juiz achou que Hulk matara a bola no braço e não no ombro como de fato aconteceu. E além disso, ele, que estava errado, puniu quem estava certo, dando-lhe um cartão amarelo. Acreditem que não sou aquele tipo de torcedor que, quando perde, culpa o juiz por tudo, mas esse cara parecia querer nos derrotar a qualquer custo.

E ele não parou aí, passou a apitar falta toda vez que um jogador do Chile, ao disputar a bola, caía no chão. Os chilenos, vivos como são, passaram a se jogar assim que perdiam a bola. Nunca vi tantas faltas num jogo só. Daquele jeito, pensei, era impossível ganhar a partida.

Mas, justiça se faça, ele não foi o único árbitro, nesta Copa, a cometer tantos erros. Vários outros, também os cometeram e também influíram no resultado da partida, pois não precisa deixar de apitar um pênalti para que o resultado seja outro. Também apitar uma falta que não houve pode impedir que um gol aconteça. Enfim, acho que a equipe de árbitros da Fifa deve ser reciclada.

De qualquer modo ganhamos, graças a Júlio César, que Felipão convocou contra a opinião de muita gente. "Esse Felipão --me disse um desses entendidos de boteco-- já não sabe o que faz, do contrário não teria convocado para a seleção um goleiro decadente, como o Júlio César, que foi reserva de um time inglês de segunda categoria." Respondi-lhe que, na próxima Copa, o indicaria para ser o técnico da seleção brasileira.

Tudo bem. Hoje é domingo e sexta-feira passada, houve o jogo do Brasil contra a Colômbia, ou seja, depois que já tinha entregue esta crônica ao jornal. Notadamente, como você pode imaginar, minha ansiedade na espera desse jogo, foi ainda maior do que no anterior, não só pelo desempenho da Colômbia até então --ganhou fácil do Uruguai-- mas porque, como diz o ditado, quanto mais alto se sobe, maior a queda, desde que se caia, claro.

Se caímos ou não nessas quartas de final, não posso saber agora, quando escrevo esta crônica, pois não sou adivinho. Na minha insensatez de torcedor, porém, prefiro cair de mais alto que de mais baixo. De modo que, se tivermos passado pela Colômbia, iremos às semifinais e, se vencermos de novo, iremos à final. Estaremos, pois, quase no ponto mais alto a que se pode chegar nesta escalada. Portanto, se vencermos, o Brasil inteiro será uma festa mas, e se perdemos?

Já calculou o golpe que será repetirmos a derrota de 1950, perdendo de novo em casa a partida que, desta vez, nos tornaria hexacampeões? Não quero nem pensar. Mas, por outro lado, se formos derrotados antes (se é que já não o fomos), a Copa perderá toda a graça. Para mim, pelo menos.

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