quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Rosângela Bittar: O engano das aparências

• À força da economia junta-se o social definindo o voto

- Valor Econômico

Foi para Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição, a melhor notícia da pesquisa Datafolha publicada segunda-feira, a primeira após a morte de Eduardo Campos, com Marina Silva já virtual candidata a presidente: a avaliação positiva do governo subiu seis pontos em um mês.

A constatação é ainda melhor, para a candidata, porque é isso - avaliação do governo - o que vale para se traçar as perspectivas de um candidato à reeleição, que pede aos seus eleitores, mesmo se insatisfeitos, que o deixem no cargo. E, melhor ainda, porque o conceito subiu sem que fosse apontada nenhuma razão objetiva para isso. O eleitorado, de repente, se sentiu melhor, mais otimista e confortável. Nem os problemas da economia, que sempre definiram seu humor e que permanecem sem perspectiva de solução, foram decisivos.

A partir de duas semanas de programas intensivos e longos na propaganda eleitoral obrigatória, em que a candidata à reeleição tiver exibido ao país dois longas-metragem sobre o que fez no seu primeiro mandato, razão pela qual pede o segundo, a intenção de voto passará a ser mais importante, ou tão importante quanto a avaliação do governo. Dilma já segue em direção aos 40% básicos considerados um índice mínimo de avaliação necessário para a reeleição.

A segunda notícia importante é que a candidata Marina Silva, a ser oficializada hoje como tal em reunião da Executiva do PSB, aparece como instrumento de derrota da presidente candidata à reeleição que, na nomenclatura dos institutos de pesquisa ganha a antipática alcunha de incumbente. Marina venceria Dilma no segundo turno, o que registra um ineditismo entre as pesquisas desta eleição: pela primeira vez a oposição ao PT vence.

Analistas de pesquisa consideram, porém, que essas são duas constatações importantes, mas preliminares, o que significa que a eleição não está decidida e, sobretudo, que o candidato Aécio Neves, rebaixado a um terceiro lugar neste início, não tem sua eleição perdida.

A pesquisa foi realizada em um momento em que o nome e a imagem de Marina Silva, devido à morte do candidato a presidente na sua chapa e seu fiador como vice, estavam no auge. Além do recall da campanha presidencial anterior, Marina teve uma exposição privilegiada, maior do que a que terá ao longo de toda a campanha nos 45 dias à frente.

O que se observa é um certo cuidado na avaliação da tomada de posição de Marina Silva neste início. É claro que fez uma subida forte, ficou em segundo lugar, venceu o segundo turno, mas é incerto o que acontecerá com sua votação quando for reduzida a exposição natural e confrontar-se com a dificuldade em provar que pode ser presidente, tendo para isso tempo mais curto de propaganda que seus dois principais adversários.

Aécio Neves não recebeu as intenções de voto dos indecisos e dos que até agora se recusavam a responder, ao que parece todos definidos por Marina na pesquisa da semana, mas manteve a sua votação no nível anterior, não perdeu e está começando a campanha, quando pretende também tornar-se mais conhecido, condição para ser votado.

Não adianta querer definir agora o que vai acontecer, por enquanto só o que está acontecendo: Aécio não está fora do jogo, a avaliação do governo Dilma melhorou seis pontos em um mês, dando-lhe melhor condição de reeleição, e Marina Silva foi impulsionada, como era esperado, pela extrema exposição, emoção do eleitorado e definição de voto de um contingente que estava sem candidato até agora.

Desta forma se deve relativizar os dados da pesquisa de segunda-feira. Dos candidatos, deve-se esperar que passem a definir seus projetos e tenham um bom plano de comunicação para apresentá-los ao eleitor.

Por exemplo, nenhum deles deu uma palavra concreta sobre segurança, problema gravíssimo do Brasil que exige esforço intelectual, político e administrativo para ser resolvido. A promessa de levar UPPs a todo o Brasil foi feita esta semana pelo candidato Aécio Neves, mas de forma ainda insuficiente. Nenhum deles falou exatamente como vai vencer o problema que a sociedade aponta como principal em todas as enquetes, o indigente atendimento em saúde. A questão da corrupção no governo tem diagnóstico mas não os instrumentos para ser enfrentado. Não se tratou desse conjunto de ações necessárias para atender ao que se convencionou chamar de apelo das ruas, em que o transporte urbano também se destaca entre tantos problemas. Embora o governo, na sua vocação para a fuga, tenha identificado a reforma política como o eco preponderante daquelas vozes.

Estas questões, por sinal, definidas como "sociais", em contraponto às questões definidas como "econômicas", sempre consideradas de maior peso na definição do voto, foram didaticamente referidas pelo sociólogo Mauro Paulino, diretor geral do Datafolha, em entrevista segunda-feira ao programa Roda Viva, da TV Cultura, com um novo peso.

Os temas da economia - a carestia, o desemprego - mobilizam o voto, mas a novidade desta eleição é que os temas sociais, eclodidos em 2013, também vão definir posições. Não seria improvável, por exemplo, que Aécio Neves fosse o destino do voto insatisfeito com a economia, enquanto Marina Silva a opção do voto da insatisfação social. O que exigiria, de ambos, uma identificação inquestionável com a oposição ao governo.

No caso de Aécio isto já está claro, mas a condição oposicionista de Marina Silva ainda não é tão nítida quanto a que havia conseguido delinear Eduardo Campos para o seu campo político.

Da mesma forma que Aécio não está fora do segundo turno e que a votação de Marina Silva exige confirmação, a pesquisa da semana permite a especulação sobre a existência de chance para uma disputa sem Dilma no segundo turno.

Mas são poucos especialistas de quem se ouve essa avaliação, e por enquanto as hipóteses radicais estão na categoria de delírio e não de indefinição na embolada largada.

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