terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Aécio Neves

O PT, pela primeira vez, enfrentará uma oposição que reflete o sentimento de uma sociedade. Agora, não vamos cometer o erro crasso de personalizar a oposição. A oposição tem que ter vários rostos. A Marina [Silva] é, o PSB é, e nós somos oposição. Vamos estimular as pessoas a ter uma militância pós-eleição. Esse é o maior ativo. É uma coisa viva. É isso que assusta o PT.

Aécio Neves, senador (MG) e presidente nacional do PSDB. Entrevista na Folha de S. Paulo, 22 de dezembro de 2014.

Dilma pedirá aprovação do MP para novos ministros

Ministério com aval do MP

• Dilma afirma que fará consulta ao órgão antes de definir nomeações para o governo

Catarina Alencastro – O Globo

BRASÍLIA- Com dificuldades para fechar o novo Ministério e com receio de que possa ter que explicar a entrada de denunciados em corrupção já no início de seu segundo governo, a presidente Dilma Rousseff revelou ontem que pretende submeter os indicados pelos partidos da base ao crivo do Ministério Público. A presidente afirmou que quer saber antes se o candidato a ministro tem algum envolvimento no esquema de desvio de dinheiro da Petrobras que está sendo investigado pela Polícia Federal e Ministério Público, já que na próxima fase das apurações da Operação Lava-Jato será revelada a participação de políticos nas irregularidades .

Em um café da manhã oferecido a jornalistas que cobrem o Palácio do Planalto, a presidente minimizou a possibilidade de prosperar alguma iniciativa da oposição sobre abertura de processo de impeachment contra ela. Segundo Dilma, não há crise , apenas uma investigação. A presidente disse que a ideia de impeachment que vem sendo aventada por grupos de manifestantes nas redes sociais e nas ruas é ultrapassada e não cabe no Brasil atual. A presidente fez também uma defesa veemente da presidente da Petrobras, Graça Foster , e anunciou sua manutenção no cargo junto com toda a diretoria da empresa.

A presidente afirmou não ver indícios de irregularidades na atual diretoria, mas que tr ocará o conselho administrativo da estatal. Quanto a Graça, Dilma questionou a quem interessa sua demissão e garantiu que não falta credibilidade a ela. A presidente disse que Graça tem sofrido grande pressão para sair e que chegou a colocar o cargo a disposição, caso a exposição que vem sofrendo por conta das investigações do bilionário esquema de desvio de dinheiro da estatal cause prejuízo ao governo ou a Petrobras. Dilma afirmou que quem praticou corrupção será punido, mas que a Petrobras não será destruída nesse processo. Sobre o vultoso montante de recursos desviados da empresa, Dilma disse achar absurdo.

Dilma minimizou as acusações da ex-gerente de Abastecimento da Petrobras Venina Velosa , de que Graça havia sido informada pessoalmente sobre irregularidades na empresa. Para a presidente, é preciso confirmar denúncias com provas. A presidente informou ainda que pretende nomear quase todos os integrantes de sua equipe até o próximo dia 29. E que a forma pode ser em duas etapas ou em uma só . O segundo escalão do governo, inclusive presidentes dos bancos públicos, só será formado , disse, depois que todos os ministros estiverem escolhidos. Leia trechos da entrevista:

Aval do MP para ministros
"Eu consultarei o Ministério Público mais uma vez. Qualquer pessoa que eu for indicar eu consultarei o que tem quanto à pessoa. Eu não quero que ele me diga o quê. Eu só quero que ele me diga sim ou não. Eu vou perguntar o seguinte: "há alguma coisa contra fulano que me impeça de nomeá-lo? Só isso que vou perguntar. Não quero saber o que ele não pode me dizer. Como disse outro dia o (José) Mujica (presidente do Uruguai), muito sabiamente, a gente não pede coisa que não podem dar nem pergunta coisas que não podem ser respondidas. Vocês (jornalistas) podem perguntar, nós, não.

Indicações políticas
"Eu não vou demonizar aqui indicação política. Não contem comigo. É de um simplismo grotesco em um país fazer isso. É não ver um palmo à frente do nariz no resto do mundo. O problema do Brasil não é se são políticos ou se são técnicos. Isso veio da ditadura. Eu sou da época que era assim, eu com 19, 21 anos, era assim: o que era límpido e bom eram os tecnocratas. O que era nefasto era esse povo subversivo que devia estar na cadeia. Aqui no Brasil não é uma questão de políticos versus técnicos. Ninguém está acima do bem e do mal. Então, essa categoria políticos são maus e técnicos são bons, a mim não convence e eu não farei isso . Não acho que a corrupção seja uma questão do lugar em que a pessoa está situada. É uma questão muito mais complexa. Essa história de a elite brasileira sempre achar que o estado era dela, deu no que deu e agora estamos saindo disso."

Impeachment
"Num regime democrático não é uma guerra, não tem vencido. Tem quem vai ser governo, quem vai ser oposição. E daí a quatro anos, muda. Muda ou se mantém. Quem ganha tem um desafio, tem de governar para todos, não pode ser mesquinho. Acho que tem de saber perder, essa história de querer provocar impeachment a cada virada do ponteiro do relógio, é um pouco ultrapassada, eu diria. É ultrapassado, porque cabia no Brasil dos anos 1980, dos anos 1990, não cabe no Brasil desta década.

Demissão da diretoria da Petrobras
"Eu não tenho nenhuma indicação de que falta credibilidade à Graça Foster para fazer isso (demiti-la). Não tenho essa indicação. E acho estranho porque eu li nos jornais, tem hora que eu olho nos jornais e fico meio perplexa, que eu teria de procurar um nome do mercado e botar dentro da Petrobras. Ora, a Petrobras não é uma empresa simples, não é uma empresa trivial."

"Venina tem que provar acusações"
"Como é que você tipifica uma alegação sem prova? Tem que ter alguma prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente Graça Foster. Eu conheço a Graça. Eu sei da seriedade dela. A Graça assumiu a gestão da Petrobras e mudou toda a diretoria. E abriu todas as investigações que estão em curso dentro da Petrobras."

Pressão sobre Graça Foster
"Ela recebe um nível de pressão que poucas pessoas seguram. Ela segura pelos compromissos que tem com a Petrobras e com o país. Agora, eu acredito que cria-se um clima sem apontar uma falha dela, cria-se um clima muito difícil pra ela. Agora, por isso eu vou tirar? Eu penalizo ela por algo que não é responsabilidade dela? A quem interessa tirar a Graça Foster? O que que tem por trás disso? Eu vou interromper o processo? A crise não é crise. Tem uma investigação sobre corrupção no Brasil que é fundamental que haja porque é a primeira vez que esse País muda a sua prática patrimonialista.

Sem irregularidades na diretoria
"Eu não vejo nenhum indício de irregularidade na conduta da atual diretoria da Petrobras. Não compactuo com indício de irregularidade. Acho que as pessoas que praticam irregularidades têm que ser punidas. Agora, quando eu não vejo corrupção e irregularidade , eu não posso querer punir ."

Montante desviado
"Acho absurdo os volumes de dinheiro (desviados por) alguns funcionários".

Não vão destruir a Petrobras
"Acho a investigação fundamental, isso não significa que a gente, ao punir, vai destruir a Petrobras. Não vai, não. Não vai acabar com modelo de partilha nem de conteúdo nacional. Não vai, não. No que depender do meu governo, não tentem achar que em algum momento nós compactuaremos com qualquer processo de fragilidade institucional da Petrobras."

Luta contra o rebaixamento
"Trabalhamos com o seguinte fato: com uma luta incansável para não rebaixarem a nota da Petrobras. Estamos em uma situação complexa na área de petróleo. Eu passei a campanha passada inteira dizendo porque não iria reduzir o preço do petróleo. A situação hoje do mercado de petróleo vai obrigar todas as médias e grandes empresas a fazerem revisão dos seus negócios. A Petrobras, do ponto de vista de sua atividade , vai muito bem, obrigada. Nós estamos atingindo produção de barris muito boa. Isso torna a situação da Petrobras muito boa. E ela vai melhorar bastante ."

Conteúdo das delações
"A Petrobras tem um caixa que permite a ela passar este ano sem recorrer ao mercado. Além disso é importante dizer porque não fecharam o balanço. É de todo oportuno que se saiba o teor das delações premiadas porque se não soubermos não sabemos o volume indevidamente re tirados dos cofres da Petrobras. Precisamos saber disso porque vamos ter que dar baixa. Nós vamos ter que lançar como prejuízo. A gente pede para o MP nos informar. Desde o início eles falaram que vão fazê-lo em algum momento quando informarem a todo o país. Nós estamos esperando."

Combate à corrupção
"Temos feito todas as investigações. Nós nunca dirigimos as investigações, não nomeamos para diretor da PF ninguém que seja vinculado a partido porque tem alguns cargos que não se pode colocar nem meia pessoa filiada. Então, a PF tem integral independência de fato."

Reforma política
"Ou nós temos um projeto de reforma política e transitamos ele ou não sairá reforma política. Eu sempre achei que para legitimar , por exemplo, o fim do financiamento privado de campanha, não pode ter a pessoa jurídica. Essa é a minha proposta. Mas será preciso criar um consenso para se levar adiante."

Porto de Mariel
"Foi ridículo a forma pela qual a campanha no Brasil tratou a questão de Mariel. A questão de Mariel foi tratada no Brasil com preconceito. Hoje quando os Estados Unidos reatam relações com Cuba mostra claramente que o Brasil estava certo em financiar o porto de Mariel. Agora que o porto é o mais próximo da Flórida, ficou o must."

Para oposição, Dilma e Graça sabiam de desvios

• "É surrealista essa discussão", diz Álvaro Dias; para Aécio, presidente da estatal perdeu condição de permanecer

Fernanda Krakovics e Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA- A oposição aumentou ontem a cobrança para que a presidente Dilma Rousseff afaste a presidente da Petrobras, Graça Foster , depois que, em entrevista ao "Fantástico ", da TV Globo, Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente da empresa, afirmou que avisou Graça pessoalmente , e não só por e-mail, sobre irregularidades em contratos. Integrantes do PSDB e do DEM também reagiram duramente às declarações da presidente em entrevista a setoristas do Planalto e classificaram como "inusitada" e "bipolar" a sua decisão de consultar o Ministério Público antes de anunciar seu novo Ministério . Tucanos também consideraram "surrealista" a discussão se Dilma e Graça Foster tinham ou não conhecimento do esquema de desvio de dinheiro na Petrobras.

Mesmo no PT, reservadamente, há quem defenda o afastamento de Graça como resposta à crise. A avaliação desses petistas é que a presidente da Petrobras perdeu as condições políticas de permanecer no cargo e não teria mais respaldo nem do corpo técnico da empresa. — Dilma sofre de bipolaridade. Ao mesmo tempo que diz que está tudo bem na Petrobras, afirma que vai consultar a mesma Procuradoria Geral da República que denunciou irregularidades na empresa na hora de montar seu Ministério- reagiu o líder da minoria no Congresso, deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO). Caiado disse que após os elogios de Dilma a Graça, a presidente puxou para si a responsabilidade pelo que aconteceu de errado na Petrobras: — Não temos mais nada a cobrar da presidente da Petrobras. Dilma atestou e puxou para si todas as denúncias e fatos de corrupção na Petrobras. Consequentemente, tudo que é feito de errado tem as bênçãos de Dilma. Todos os crimes descobertos têm agora que ser respondidos diretamente pela presidente Dilma.

"Discussão surrealista"
Em discurso na tribuna do Senado, Álvaro Dias (PSDB-PR) criticou Dilma por manter Graça Foster na presidência da Petrobras. Para ele, não há como as duas terem sido surpreendidas agora com as irregularidades na empresa, já que, ainda de acordo com ele, essas denúncias foram investigadas pela CPI da Petrobras realizada em 2009. — Essa discussão atual causa espanto: sabia a presidente Dilma ou não sabia do esquema de super faturamento na Petrobras? Sabia a presidente da Petrobras, Graça Foster , ou não sabia? O ex-presidente Lula não sabia? É surrealista essa discussão. A presidente Dilma diz que não há razão para demissão de Graça Foster . Talvez seja constrangimento. Graça foi informada, mas a presidente Dilma também foi. Álvaro Dias também afirmou que o MP não é um órgão auxiliar do Poder Executivo: — Essa é outra política inusitada, não vimos tudo nesse país, a cada dia nos surpreendemos.

O Poder Executivo tem mecanismos próprios para verificação e avaliação de nomes. O Ministério Público não é um órgão auxiliar do Poder Executivo, é uma instituição independente . Pega mal para a presidente esse procedimento. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (PSDB-MG), cobrou a substituição não só de Graça, mas de toda a diretoria da Petrobras, para resgatar a credibilidade da empresa: —Acho que a presidente da Petrobras perdeu todas as condições de ficar a frente da empresa. Cabe à presidente substituí-la e vai fazer isso no tempo. Talvez o estilo da presidente seja esse de tentar até o último minuto manter aquilo que a meu ver é impossível de ser mantido. Hoje não há capacidade da atual direção da empresa, eu me refiro a toda ela, de garantir o resgate da credibilidade para que a Petrobras estabeleça um novo portfólio de investimentos .

"Interesses escusos"
Petistas saíram em defesa da presidente da Petrobras e colocaram em dúvida as declarações de Venina. O líder do PT na Câmara, deputado Vicentinho (SP), cobrou provas e disse que pode haver interesses escusos por trás das denúncias: — Tem que ter provas concretas, a Petrobras não é qualquer empresa. Além das denúncias, que têm que ser apuradas, pode haver interesses escusos. Não podemos tomar decisões precipitadas. Eu defendo a presidente Graça Foster, que é uma mulher sincera, competente e que tem amor à Petrobras. O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), candidato à Presidência da Câmara, disse que a ex-gerente da empresa ter á que provar o que disse: — Cada um pode dizer o que quiser, mas a essa altura do campeonato, com delação premiada, ela vai ter que provar o que fala. Ninguém sabe quem tem razão.

Oposição diz ser 'surrealista' ideia de consultar Procuradoria antes de nomeações

• Possibilidade foi aberta pela presidente Dilma Rousseff após 'Estado' revelar lista de 28 políticos citados por delator da Operação Lava Jato

Ricardo Brito – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Lideranças da oposição no Congresso criticaram nesta segunda-feira, 22, a intenção da presidente Dilma Rousseff, anunciada esta manhã (22), de consultar o Ministério Público para confirmar a nomeação de novos nomes para seu ministério. Parlamentares afirmaram que a iniciativa é "surrealista" e "sem lógica".

"Isso revela que chegamos a uma situação surrealista em termos de ética na administração pública, porque para a presidente ter que se socorrer ao MP para nomear é realmente algo que estarrece", afirmou o vice-líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR). Para o tucano, a medida confirma que o governo está "apodrecido" em seu interior, uma vez que muitos governistas se envolveram no escândalo de corrupção que envolve a Petrobrás. Dias afirmou que o MP é um órgão independente e não auxiliar do Poder Executivo, que, destacou, tem seus próprios mecanismos para avaliar seus potenciais novos ministros.

O líder da Minoria na Câmara dos Deputados, Ronaldo Caiado (DEM-GO), disse que a sugestão de Dilma aponta para uma "atitude totalmente bipolar" da presidente. O deputado do DEM lembrou que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, cobrou a troca de toda a diretoria da Petrobrás e que, nesta segunda, Dilma fez um pronunciamento elogioso e de defesa da manutenção da presidente da estatal, Maria das Graças Foster.

"Agora ela diz que vai consultar o MP para nomear os ministros? Não tem lógica o que ela está falando, ela está totalmente desconectada", disse Caiado. "Ficou claro e evidente a falta de condições de ela exercer as funções de presidente da República, porque, na primeira crise, ela quer transferir sua nomeação para terceiros suas atribuições", completou.

Joaquim Barbosa: ‘Degradação institucional’

• Barbosa critica Dilma no Twitter e diz que ela "não dispõe de pessoas lúcidas para aconselhá-la"

- O Globo

O ex-presidente e ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa criticou ontem, em sua conta no Twitter , a decisão da presidente Dilma Rousseff de consultar o Ministério Público antes de nomear os ministros do seu segundo mandato, para evitar que sejam nomeados acusados de corrupção.

Segundo Joaquim Barbosa, a atitude demonstra uma "degradação institucional" a qual o Brasil está submetido. — Que degradação institucional! Nossa presidente vai consultar órgão de persecução criminal antes de nomear um membro do seu governo!!! —escreveu ele no primeiro dos quatro posts no Twitter .

Em seguida, Barbosa publicou: — Há sinais claros de que a chefe do Estado brasileiro não dispõe de pessoas minimamente lúcidas para aconselhá-la em situações de crise. Minutos depois, o ex-presidente do Supremo escreveu: — Onde estão os áulicos tidos como candidatos a uma vaga no STF, que poderiam esclarecer: Ministério Público não é órgão de assessoria!!!
E, por último, Barbosa concluiu, utilizando uma expressão em francês que significa algo inédito: — Ministério Público é órgão de contenção do poder político. Existe para controlar-lhe os desvios, investigá-lo, não para assessorá-lo. Du jamais vu!

Dilma diz que manterá diretoria da Petrobras

• Mudança iria interromper "choque de governança" na estatal, afirma petista

• Presidente diz que vai ouvir procurador antes de nomear ministros, mas não explica como a consulta será feita

Natuza Nery Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff disse nesta segunda (22) que não está "pretendendo alterar a diretoria da Petrobras", apesar de considerar um "absurdo" o valor desviado da estatal pelo esquema de corrupção descoberto pela Operação Lava Jato.

Em café da manhã com jornalistas, Dilma defendeu mais uma vez a presidente da companhia, Graça Foster, e insinuou haver interesses por trás das acusações de Venina Velosa, ex-gerente da Petrobras que diz ter alertado Graça sobre irregularidades anos antes das investigações.

A presidente afirmou que consultará o Ministério Público antes de empossar ministros para seu próximo mandato. O objetivo é saber se os nomes indicados por partidos estão fora da teia de investigações da Polícia Federal.
Dilma prometeu anunciar os novos integrantes do ministério dia 29 de dezembro.

Empreiteiras
Dilma afirmou que as empreiteiras acusadas de participação no esquema devem ser punidas, mas não "destruídas". "Temos de investigar e punir, isso não significa acabar com a empresa. Escutei inclusive que nós íamos chamar [estrangeiras]. Por que tem de chamar empresa estrangeira, empreiteira?", perguntou. "Temos de parar com essa história de quebrar tudo."

Graça
A presidente indicou que desaprova a ideia de um nome do mercado financeiro para comandar a Petrobras. "Não é uma empresa simples, trivial", disse. Para ela, não se pode contratar ninguém que interrompa todo o "choque de governança" que ela diz que Graça promoveu na estatal.
"Eu conheço a Graça. Sei da seriedade e da lisura dela. A Graça assumiu a direção da Petrobras e mudou toda a diretoria. Abriu todas as investigações que estão em curso."

Pressão
Dilma reconheceu que a executiva, de quem é amiga, enfrenta pressões. "É um nível que poucas pessoas seguram. Ela segura pelos compromissos que tem com a Petrobras e com o país. Cria-se um clima sem apontar uma falha dela, um clima muito difícil para ela. Agora, por isso vou tirá-la? Penalizo ela por algo que não é responsabilidade dela?"

Venina
A presidente exibiu irritação ao falar de Venina Velosa. "Como você tipifica alegação sem prova?", indagou. "A quem interessa tirar Graça Foster? O que está por trás?"

Diretores ficam
"Eu vou alterar o Conselho [de Administração] da empresa. Não estou pretendendo alterar a diretoria", disse Dilma, sem dar detalhes. Ela adiantou que o presidente do colegiado não necessariamente será o ministro da Fazenda, como hoje. Apesar do indicativo de manutenção da atual diretoria, auxiliares da presidente garantem que a troca de comando é só uma questão de tempo.

Balanço
Dilma cobrou do Ministério Público acesso aos depoimentos dos delatores do esquema, associando a divulgação do balanço da estatal à necessidade de saber os montantes desviados. Para o governo, as contas da Petrobras só terão o aval de uma auditoria independente se os valores desviados forem conhecidos. "[O Ministério Público] não pode demorar anos sob pena de comprometer o país", disse.

Ministério Público
Dilma prometeu consultar o Ministério Público antes de definir nomes para seu futuro ministério. "Consultaremos o procurador [geral da República, Rodrigo Janot]. Eu vou perguntar o seguinte: há alguma coisa contra fulano que me impeça de nomeá-lo? Só isso que vou perguntar. Não quero saber o que ele não pode me dizer." A presidente não explicou como fará a consulta, mas afirmou que não "demonizará" indicações políticas.

Rebaixamento
Dilma disse temer o rebaixamento da nota da Petrobras pelas agências internacionais de classificação de risco, o que poderia agravar suas dificuldades financeiras. "Trabalhamos com o seguinte fato: uma luta incansável para não rebaixarem a nota", afirmou.

Ajuste fiscal
A presidente afirmou que o ajuste fiscal próximo a R$ 100 bilhões, cogitado por sua equipe econômica, não passa de "chute", mas prometeu medidas mais "drásticas" para organizar as contas públicas, gesto crucial para retomar o crescimento do país.

Dilma diz que consultará Ministério Público para nomear novos ministros

• Presidente tomou a decisão após o 'Estado' revelar lista com 28 nomes de políticos supostamente envolvidos no esquema de corrupção na Petrobrás citados pelo ex-diretor da estatal à PF

Lisandra Paraguassu e Rafael Moraes Moura - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff afirmou na manhã desta segunda-feira, 22, que irá consultar o Ministério Público para confirmar a nomeação de novos nomes para seu ministério. Em café da manhã com jornalistas, Dilma disse que quer saber se há algo contra alguns nos nomeados.

"Eu vou perguntar: 'há algo contra fulano que me impeça de nomeá-lo?' Só isso. Eu não quero saber o que ele não pode me dizer", afirmou a presidente. "Eu consultarei o Ministério Público mais uma vez, para qualquer pessoa que eu for indicar".

Dilma disse ainda que não tem conhecimento da lista de nomes citados nos processos de delação premiada e lembrou que a lista publicada pelo Estado não é oficial. "Eu só vou achar que é oficial no dia em que o procurador me disser que é oficial", afirmou.

Conforme o Estado revelou na última sexta-feira, o ex diretor de abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa citou em depoimento 28 nomes de políticos que teriam recebido recursos do esquema de corrupção na Petrobrás. Entre eles, o atual ministro das Minas e Energia, Edison Lobão.

Ministério Público não é para assessorar poder político, diz Barbosa

• No Twitter, ministro aposentado do STF criticou presidente Dilma, que declarou fazer consulta antes de nomear para o primeiro escalão

Fábio Brandt – O Estado de S. Paulo

Brasília - Aposentado desde julho, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa criticou nesta segunda-feira, 22, a presidente da República, Dilma Rousseff, horas após ela afirmar que consultaria o Ministério Público Federal (MPF) antes de nomear os ministros de seu segundo governo. Em quatro mensagens publicadas em sua página no Twitter, Barbosa usou a ironia para afirmar que a medida serve para saber se os cotados para o primeiro escalão do governo foram citados em depoimentos da Operação Lava Jato.

"Ministério Público é órgão de contenção do poder político. Existe para controlar-lhe os desvios, investigá-lo. Não para assessorá-lo", reagiu Barbosa no Twitter. Antes de ser nomeado ministro do Supremo em 2003 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Barbosa era integrante de carreira do Ministério Público Federal.

Ministro aposentado do STF comentou o caso pelo Twitter
Em outra das mensagens, Joaquim Barbosa criticou indiretamente os cotados para assumir a cadeira vazia no STF desde sua aposentadoria. "Onde estão os áulicos tidos como candidatos a uma vaga no STF, que poderiam esclarecer: Ministério Público não é órgão de assessoria!!!". Nos bastidores de Brasília, circula a informação de que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, chefe do MPF, trabalha para ser nomeado.

Barbosa disse ainda que Dilma é mal assessorada. "Há sinais claros de que a chefe do Estado brasileiro não dispõe de pessoas minimamente lúcidas para aconselhá-la em situações de crise". Segundo ele, a atitude da presidente reeleita é sintoma de "degradação institucional". Também na rede social, ele explicou o motivo: "Nossa presidente vai consultar órgão de persecução criminal antes de nomear um membro de seu governo!!!"

Ao longo deste ano, Barbosa foi sondado por integrantes da oposição a Dilma para se filiar a um partido e disputar um dos cargos em jogo. Candidatos oposicionistas ao Planalto, como Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) chegaram a flertar com ele para obter apoio. Mas Barbosa não declarou apoio. Em eleições anteriores, ele admitiu ter votado em Lula e em Dilma. A assessoria da Presidência da República afirmou que não comentaria as críticas de Barbosa.

Para oposição, apoio põe Dilma no centro da crise

• Alvaro Dias, vice-líder do PSDB no Senado, vê blindagem de Graça como 'cumplicidade' da presidente com esquema

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Lideranças da oposição afirmaram ontem que a presidente Dilma Rousseff entrará no centro da crise de corrupção que envolve a Petrobrás ao ter saído em defesa da presidente da estatal, Graças Foster.

Em entrevista exibida anteontem pelo Fantástico, da TV Globo, a ex-gerente executiva de Abastecimento da Petrobrás Venina Velosa da Fonseca disse ter alertado pessoalmente Graça, quando a executiva máxima da companhia era diretora de Gás e Energia, sobre irregularidades.

Para o vice-líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), o comportamento da presidente de blindar Graça é de "conivência" e de "cumplicidade" com o esquema de corrupção na estatal. "Essa blindagem compromete a presidente, ela é reveladora de um fato: Dilma também tinha conhecimento de tudo e o constrangimento em afastar a Graça é porque, afastando-a, ela (Dilma) também deveria ser afastada (da Presidência). A Dilma também sabia."

O líder da Minoria no Congresso, deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), disse que o apoio de Dilma a Graça mostra que a presidente atestou e puxou para si "todas as denúncias e atos de corrupção da Petrobrás". "Consequentemente, tudo o que feito de errado na empresa tem a bênção de Dilma. Todos os crimes descobertos tem agora de ser respondidos diretamente pela presidente da República."

Para o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), é muito estranha a insistência da presidente em manter a atual diretoria. "Esse comportamento da presidente Dilma expressa todo o descrédito de uma empresa jogada em um verdadeiro mar de desvios e irregularidades. Qual missão a diretoria está cumprindo? Quem estão querendo proteger, o que estão escondendo?"

O líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR), chamou de "piada pronta" o fato de a presidente ter dito, em entrevista a um jornal chileno, que o país não vive uma crise de corrupção. Ele defendeu que a próxima legislatura do Congresso crie uma nova CPI para aprofundar as investigações das denúncias que envolvam a Petrobrás.

Dilma vai adotar ‘medidas drásticas’

• Em café da manhã com jornalistas que cobrem o Planalto, presidenta admite necessidade de forte ajuste para retomada do crescimento e defende Graça Foster na Petrobras

Mariana Mainenti – Brasil Econômico

A nova equipe terá de adotar algumas "medidas drásticas" na economia no segundo governo Dilma Rousseff. A afirmação foi feita ontem pela própria presidenta, que participou de café da manhã com jornalistas que cobrem o Palácio do Planalto. Segundo ela, a retomada do crescimento mundial está demorando mais do que o previsto e, por isso, o Brasil precisará fazer outros ajustes a exemplo do término dos subsídios ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), anunciado na última sexta-feira. A nova orientação será dada pelo futuro Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que é doutor em Economia pela Universidade de Chicago, um templo do pensamento monetarista, e difere substancialmente da formação Keynesiana da presidenta.

Contudo, Dilma afirmou que será possível conciliar as duas vertentes. "Vamos organizar mais uma vez a casa para nos preparar para a retomada", afirmou Dilma, após ser questionada pelo Brasil Econômico sobre as diferentes formações econômicas dela e do novo ministro. Segundo ela, qualquer governo que faça uma reorganização da economia, o faz almejando uma recuperação. "Você tem sempre um movimento cíclico e poderemos retomar (o crescimento). Mas, para isso, de fato, você tem de ter algumas medidas mais drásticas. E não significa de forma nenhuma que vamos reduzir os programas sociais. É compatível." A presidenta da República voltou a responsabilizar a prolongação da crise internacional. "Tivemos um processo de crise muito mais longo do que todos esperavam.

O que temos visto é que essa recuperação da economia internacional anda de lado. Os Estados Unidos têm demonstrado (sinais de recuperação), porque têm uma economia muito dinâmica, com grande capacidade de inovação, mas mesmo ela (a economia norte-americana) tem andado de lado no que se refere a recuperar os índices de consumo anteriores. Mas, de qualquer jeito, tem um desempenho melhor. No restante, você tem um quadro de queda no crescimento do Japão, para não dizer também da Europa", disse a presidenta, acrescentando que, apesar disso, o Brasil terá uma recuperação "mesmo sem a recuperação internacional".Ela também não antevê uma deterioração maior do cenário econômico nos demais países que compõem o grupo chamado de Brics. "Eu não acredito que a Rússia esteja à beira de uma crise econômica. Não acho que os Brics terão grandes problemas. Os problemas dos Brics não são financeiros.

Não há nenhum dos Brics à beirado fracasso. Todos têm reservas,têm uma situação estável".Dilma afirmou que, no caso brasileiro, para atravessar a crise econômica internacional, o governo terá de fazer cortes e reformas,mas não especificou quais medidas seriam adotadas. Ao ser questionada por jornalistas quanto ao teor delas, disse que não responderia porque ainda estão em discussão: "Sou bem treinada em técnicas de interrogatório", brincou,referindo-se à época da ditadura militar, em que foi torturada. Durante o café com os jornalistas, que teve uma duração demais de duas horas, Dilma foi praticamente sabatinada sobre os escândalos envolvendo a Petrobras.

A presidenta demonstrou determinação em não afastar a presidente da estatal, Maria das Graças Foster. "Tem que ter prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente (da Petrobras). Eu conheço a Graça Foster, sei da sua seriedade e lisura. É importante saber qual é a prova. Não vejo nenhum indício de irregularidade na diretoria da Petrobras", declarou. Ela confirmou que Graça chegou a dizer a ela que seu cargo estaria à disposição. "Eu disse que isso era desnecessário", acrescentou. "É uma situação difícil para ela. Ela segura a pressão por contados compromissos que tem com a Petrobras e com o país. Cria-se um clima muito difícil para ela. Agora, por isso vou tirá-la? Penalizá-la por algo que não é responsabilidade dela?", questionou.

Segundo Dilma, colocar alguém de fora da estatal no comando da empresa interromperia o processo de investigação e de gestão realizados pela atual diretoria."Eu queria a Maria das Graças Foster presidente. Levei um ano para construir as condições. Como é que você tipifica uma alegação sem prova? Tem alguma prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente da Petrobras?A quem interessa tirar Graça Foster? O que há por trás disso?" Dilma também defendeu que sejam feitas indicações políticas de alguns cargos: "Eu não vou demonizar indicações políticas. É de um simplismo grotesco. O problema do Brasil não é se são políticos ou técnicos. Ninguém está acima do bem e do mal". Ela também considerou "absurdos" os volume de recursos desviados por alguns funcionários da Petrobras e disse que os responsáveis precisam ser punidos.

A presidenta antecipou que fará uma consulta ao Ministério Público antes de anunciar os novos ministros — o que deve ocorrer até o dia 29. "Eu vou perguntar (ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot) o seguinte: há alguma coisa contra fulano que impeça de nomeá-lo? Eu consultarei o Ministério Público mais uma vez. Para qualquer pessoa que for indicar, eu consultarei. Eu só quero que me diga sim ou não. Não quero saber o que eles não podem me dizer", explicou, referindo-se à possibilidade deque algum ministeriável esteja na lista dos delatados na operação Lava Jato, ainda não divulgada oficialmente.

Dilma criticou os pedidos de impeachment feitos por manifestantes. "Tem que saber perder. Essa história de quer pedir impeachment a cada virada do ponteiro do relógio é algo ultrapassado. É algo do Brasil da década de 80", disse.Na conversa com os jornalistas, a presidenta confirmou ainda que irá abrir o capital da Caixa Econômica Federal (CEF), mas que será um processo demorado, e chamou de ridícula a forma pela qual a campanha no Brasil tratou a questão do Porto de Mariel. "Foi tratada no Brasil com preconceito. Hoje,quando os Estados Unidos reatam relações com Cuba, mostram que o Brasil estava certo em financiar o Porto de Mariel. Agora, que o porto é o mais próximo da Flórida, ficou o "must" (máximo)", disse,bem-humorada, ao final do café.

Mercado vê inflação fora da meta

Inflação e juros em alta

• Pela primeira vez, analistas projetam que IPCA vai superar teto da meta de 6,5% em 2015

Gabriela Valente – O Globo

BRASÍLIA- Os economistas do mercado financeiro traçaram um cenário pior para o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Pela primeira vez, espera-se que a inflação vai estourar o teto da meta em 2015 (de 6,5%) e não voltará para o centro (4,5%) nos dois anos seguintes. O reajuste de tarifas dos serviços públicos será significativo, e o dólar — que deve subir mais que o estimado anterior mente — vai pressionar ainda mais os índices de inflação. Os analistas estão prevendo que a inflação fique em 6,54%. Há uma semana era 6,5%. No horizonte avistado pelos analistas, o Banco Central não poderá aumentar tanto os juros para conter a inflação para não frear ainda mais economia, que deve ter crescimento quase zero neste ano e no ano que vem.

Mas os bancos já reajustaram várias taxas. A do cheque especial voltou a bater recorde: a maior dos últimos 15 anos, alcançando 191,6% ao ano. Nessa modalidade de crédito, o devedor paga quase o triplo do que pegou emprestado. E juro alto freia mais ainda a economia. Segundo a pesquisa Focus que o Banco Central faz mais de cem analistas das maiores instituições financeiras, o Brasil crescerá apenas 0,13% neste ano e 0,55% no ano que vem. E, na inflação, além de prever o estouro da meta, os analistas do mercado projetam que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE que serve de referência para as metas de inflação, fique em 5,7% em 2016 e, no ano seguinte, deverá ser de 5,5%.

Previsão de dólar a r$ 2,75 em 2015
Um dos motivos da persistente inflação é a alta do dólar . A previsão para este ano é que a moeda americana chegue a R$ 2,65. Na semana passada, era de R$ 2,60. Para 2015, a aposta para a divisa saltou de R$ 2,72 para R$ 2,75. Há quem espere que a subida possa ser ainda maior . —O dólar já está subindo e não só no Brasil, mas lá fora também, por causa da previsão de crescimento dos Estados Unidos e da alta de juros por lá. A moeda americana pode chegar até nos R$ 3 — teme o ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas. Além da alta do dólar, os economistas preveem reajustes maiores de tarifas públicas no ano que vem. A estimativa para os chamados preços administrados, segundo o levantamento do BC, passou de 7,48% para 7,60%. Para tentar conter os preços, o Brasil só voltará a crescer mais forte a partir de 2016. — Não vai ser em 2015 que vamos assistir a uma reviravolta em termos de crescimento.

Alta da inflação e crescimento baixo é o retrato de 2015. É o remédio que vamos ter de tomar — prevê o ex-secretário do Tesouro Carlos Kawall. As previsões dos economistas podem ser ajustadas hoje. Pela manhã, o Banco Central divulgará o relatório de inflação e deverá revisar o seu cenário para o ano que vem já com as mudanças previs tas pela nova equipe econômica, que promete meta de superávit primário (economia do governo antes do pagamento de juros) de 1,2% para 2015, e 2% para 2016 e 2017. Uma guinada nesse sentido é a alta dos juros básicos para controlar a inflação, que começou imediatamente após a eleição. A expectativa do mercado é que o BC suba a taxa básica de juros (Selic) dos atuais 11,75% ao ano até 12, 5% ao ano até o fim de 2015. Isso deve frear o consumo para tentar conter a subida de preços no país. E essa alta dos ju ros já afeta as transações financeiras das famílias. Os juros cobrados das famílias quebraram novo recorde.

A taxa que deu o maior salto foi a do cheque especial: passou de 187,8% ao ano para nada menos que 191,6% ao ano no mês passado. A média do custo financeiro de empréstimos com recursos livres (os que as instituições financeiras têm liberdade para escolher como emprestar) subiu de 44% ao ano para 44,2% ao ano em novembro. É o maior já visto desde quando o BC passou a registrar os dados, em 2011. Em média, os bancos cobravam 103,7% ao ano em empréstimos de crédito pessoal como, por exemplo, o crédito direto ao consumidor . É a maior taxa já registrada desde 2011. Mesmo com um cenário adverso, o Banco Central manteve a previsão de crescimento do crédito no Brasil de 12% neste ano. E aposta no mesmo ritmo de expansão no ano que vem, mas com mudanças na concessão de empréstimos. Em 2014, por exemplo, os bancos públicos devem aumentar suas carteiras em 17%, mas no ano que vem esse número deve ser de apenas 14%.

São as instituições públicas as grandes responsáveis pelo aumento do crédito no Brasil desde a grande crise financeira de 2008 e 2009. Já os bancos privados nacionais devem ampliar os empréstimos em apenas 5% este ano. Essa projeção foi revisada para baixo pelo BC. Era de 6%. A autoridade monetária, entretanto, aposta num desempenho mais otimista em 2015: alta de 9%. Os bancos estrangeiros devem expandir o crédito em 7% neste ano. Antes, a previsão era aumentar a carteira em 9%. Em 2015, a projeção também é crescer 7%. Na avaliação do Banco Central, depois de um crescimento forte na concessão de financiamentos no Brasil, ele agora aumenta de forma mais sustentável. Para o chefe do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel, o que chama a atenção é a manutenção de níveis baixos de in adimplência ao longo de 2014.

— Um aspecto que me parece relevante foi o comportamento da inadimplência. Uma alta era esperada e isso não se concretizou. Isso reflete uma série de fatores, entre eles, os impactos da educação financeira nos últimos anos. Entramos em 2014 olhando a inadimplência com cautela e ela continuou em patamares baixos — afirmou Maciel. Ao considerar créditos livres e direcionados (habitacional, rural e do BNDES), a inadimplência da pessoa física está em 1,7%. Já a de pessoas jurídicas ficou em 0,5% em novembro. Ao todo, o crédito deve representar 58% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e ser viços produzidos no Brasil em um ano). A expectativa do BC é que chegue a 61% do PIB no ano que vem.

Luiz Werneck Vianna - Relatos selvagens

- O Estado de S. Paulo

Será que é por falta dos gansos do Capitólio romano que, com o alarido do seu grasnar, advertiram os soldados que faziam sua guarda da presença ameaçadora do inimigo prestes a invadir a cidade, e assim puderam se defender? Que sinais ainda aguardamos para nos precaver dos riscos que rondam a nossa democracia tão duramente conquistada? A crônica política, desde que a sucessão presidencial, a partir da morte trágica do candidato Eduardo Campos, deixou de ser uma passarela por onde a candidata à reeleição cumpriria seu trajeto triunfal, parece ter-se convertido em mais um episódio do extraordinário filme argentino Relatos Selvagens, em que seus personagens, mesmo à custa da sua ruína pessoal, se entregam ao domínio da cólera e da agressividade irracional contra quem lhes contrarie.

Essa síndrome se instalou com o terror experimentado pelas hostes da candidatura governista quando o cenário de uma derrota eleitoral surgiu no radar, hipótese antes não cogitada a sério por gregos e troianos e que ganhou plausibilidade com a fulminante ascensão de Marina Silva nas primeiras pesquisas. A estratégia adotada pelas forças governistas foi, como sabido, a da desconstrução metódica da campanha da oponente, o que se cumpriu, é verdade, ainda nos marcos de uma argumentação racional. Mas, com o crescimento da candidatura de Aécio Neves, vinda no vácuo de Marina, foi levada ao paroxismo. A disputa eleitoral foi, então, nomeada como uma manifestação de luta de classes, que, por soar ridículo no cenário que aí está, foi logo renomeada como entre pobres e ricos a fim de explorar o tema funesto do ressentimento social.

Sob esse registro malévolo, a campanha da candidata Dilma destampou a arca onde jaziam velhas assombrações, como a do populismo, que, finda a sucessão, resistem a retornar a seu lugar de origem. Não se faz pacto com o diabo impunemente, ele sempre cobra a conta. Se o passado deveria ser trazido à tona em estado bruto, sem crítica e elaboração reflexiva, ele nos foi devolvido com o que nele havia de pior: manifestantes bradando nas ruas pelo retorno do regime militar e outros, com um roqueiro de caricatura à frente, pelo impeachment; ecoam no Parlamento relatos selvagens dos discursos do deputado Jair Bolsonaro; e até ministros, como Gilberto Carvalho, tecem considerações públicas sobre adversários políticos com a linguagem de cafajestes de turmas de esquina.

O escândalo da Petrobrás, por sua vez, traz de volta ao noticiário a expressão mar de lama, de nefasta memória, para tratar das incestuosas relações mantidas entre as esferas do público, incluindo partidos políticos em posições de governo, com as do privado, como as que ocorreram na administração dessa estatal. E, agora, quando não se conta mais no governo com o ex-ministro Nelson Jobim, o ex-deputado Aldo Rebelo e o ex-deputado José Genoino, que acumularam expertise no trato com a questão militar, nada inverossímil a possibilidade de que eventuais intervenções desastradas, na condução dos rumos a serem dados ao relatório da Comissão da Verdade, venham a desatar episódios do tipo dos narrados no filme argentino.

Mas nem o diabo nos trará de volta aos idos do pré-64 que nos levaram, irrefletidamente, ao golpe militar. Em primeiro lugar, porque foi a própria presidente eleita quem desarmou o petardo que esteve em suas mãos durante a campanha ao propor um diálogo com as forças políticas, sobretudo quando indicou suas opções para os ministérios responsáveis pela condução dos destinos econômicos em sua nova administração. A breve súmula que os indicados por ela apresentaram publicamente à Nação, longe de expressar uma regressão populista alardeada nos tempos da campanha, cortou secamente com ela. Por fas ou nefas, o PT foi ao encontro do programa econômico da oposição. Não é por aí que os pescadores de águas turvas terão como prosperar.

Mas, em meio a tantos fios desencapados, de ciência certa para sairmos dessa confusão em que estamos envolvidos, contamos com o mapa da Carta de 1988, filha das lutas pela democracia travadas contra o regime autoritário dos Atos Institucionais, que tem passado com bravura por graves crises políticas, como no impeachment do presidente Collor e no episódio conhecido como mensalão. A ela devemos um Poder Judiciário autônomo dotado da capacidade de impor limites, em nome dos direitos da cidadania, ao poder político, e, muito particularmente, na institucionalização de um Ministério Público independente do Estado com a missão de defender as instituições da democracia, uma criação original do Direito brasileiro.

Pois é para esse lugar, refratário às manifestações selvagens, que agora convergem tanto a controvérsia suscitada pela Comissão da Verdade sobre a Lei da Anistia quanto a dos resultados das investigações da chamada Operação Lava Jato, conduzida pela Polícia Federal, pela Procuradoria-Geral da República e pela Justiça Federal do Paraná. Da primeira, esperam-se a pacificação e um sinal de advertência para que todos não reincidam nos erros do passado, que atrasaram por miseráveis 20 anos nosso encontro com o moderno, que ainda tarda, como se constata com este vozerio populista que nos ronda.

Da segunda, cujos relatos parciais e provisórios já se fazem públicos, e que, mais uma vez, revelam - agora sob a jurisdição de um juiz de primeira instância, o que é de comemorar - as perversas relações que cultivamos entre o poder e o dinheiro, espera-se, além da punição dos culpados, a abertura de um debate público sobre a necessidade de uma reforma política, a partir do qual os partidos políticos, sob regime de urgência, encontrem no Legislativo uma solução que ponha fim nesta raiz funda dos nossos males.

Uma última frase: quem ler Jurisdição Constitucional como Democracia, obra de 2004 do juiz Sergio Fernando Moro, saberá reconhecer que ele é a pessoa certa no lugar certo.

* É cientista social da PUC-Rio

Raimundo Santos - Os 50 anos do golpe de 1964

Os 50 anos da destituição do presidente da República João Goulart foram lembrados neste 2014 por um variado conjunto de atividades, eventos, matérias preparadas pela mídia televisiva e pelos jornais; debates, mostras, publicações diversas, incontáveis artigos e vários livros sobre o regime de 1964 e sua repressão. A ditadura cassou mandatos de parlamentares, governadores e prefeitos, suspendendo os direitos políticos de muitos deles e de lideranças político-partidárias, demitiu funcionários públicos jubilou estudantes com base no decreto 477, e fechou o Congresso Nacional. A ditadura prendeu, provocou um grande número de exilados, torturou presos e desapareceu com opositores de diferentes filiações partidárias, ideologias e crenças religiosas.

Ao se encerrar 2014, vem em boa hora o lançamento, no final de outubro passado, na reunião anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-graduação em Ciências Sociais), da coletânea chamada 1964 – As armas da política e a ilusão armada, sob o selo da Fundação Astrojildo Pereira, de Brasília. O livro, de 505 páginas, tem como foco principal a natureza política da resistência à ditadura e o seu objetivo de recuperar as liberdades democráticas. Muitos dos seus textos versam sobre os anos do governo de João Goulart e sobre o caráter do regime de 1964; e discutem a eficácia da estratégia de luta contra a ditadura por meio da política e o equívoco da luta armada daquele tempo.

Essa ida ao passado, em 2014, revela que reflexões sobre os anos de João Goulart, e particularmente sobre a resistência política à ditadura, têm muita relevância para pensarmos o presente momento. Essa ida ao passado traz até nós as histórias políticas – hoje esmaecidas – de cada uma dessas épocas. A do tempo democrático e reformista de João Goulart chama a atenção para o cenário de conspiração golpista, de radicalização das esquerdas e dos impasses com que se deparou o presidente. O seu isolamento político precipitou sua destituição em março de 1964. A história política do período ditatorial traz até nossos dias as adversidades da luta contra a ditadura, suas experiências e seus ensinamentos. E relembra a repressão dura e violenta daqueles anos autoritários, para que não volte nunca mais.

As mais numerosas e diversas atividades desenvolvidas neste ano de 2014 são oportunas no momento atual. O Brasil vive, sob o Estado democrático de direito pleno, amplas liberdades e tem instituições democráticas. Mas ainda falta consolidar entre nós uma cultura política democrática, cujas raízes estão nos 21 anos da resistência política ao regime de 1964.

Raimundo Santos, professor da UFRRJ. Rural Semanal, UFRRJ, 1 a 7 de dezembro de 2014.

Marcus Pestana - Política, moral e ética: o desafio brasileiro

- O Tempo (MG)

A opinião pública brasileira assiste indignada aos desdobramentos do maior escândalo da história. Ver a maior empresa brasileira mergulhada no pântano da corrupção, as ações despencarem e a credibilidade da economia ser abalada mexe com os brios da sociedade e coloca em xeque a eficácia da democracia.

Isso tudo é fruto de uma visão distorcida que se instalou na cúpula do PT, partido que nasceu em nome da ética e do trabalhador, de que “os fins justificam os meios”, ou seja, tudo é válido em nome da sustentação de um suposto projeto de transformação da sociedade.

Mas sabemos que os meios são indissociáveis dos fins. Os resultados não podem ser alcançados a qualquer preço. O PT no poder assumiu um pragmatismo amoral diante das armadilhas da governabilidade apresentadas pelo nosso débil sistema político. O presidencialismo de cooptação chegou a sua expressão máxima na obtenção da maioria parlamentar com base no “é dando que se recebe”, comprometendo a qualidade da gestão nos ministérios, nas estatais e agências reguladoras. Quando a misteriosa Rose tem o poder de indicar diretores de agências essenciais para o desenvolvimento, é porque as coisas vão muito mal.

O escândalo da Petrobras faz o mensalão parecer uma história da carochinha, uma brincadeira de escoteiros e normalistas. Um mero gerente da empresa se dispor a devolver cerca de US$ 100 milhões revela a dimensão do problema. Outra gerente denunciar à direção superior que graves problemas ocorriam mostra leniência e quase conivência com os malfeitos. A Petrobras lida com cifras estratosféricas, muitos zeros, e as “tenebrosas transações” ocorriam aqui, nos Estados Unidos e na África. É ultrajante para o Brasil ser objeto de investigações nos EUA e na Holanda e de processos de acionistas minoritários internacionais.

Permitam-me algumas digressões teóricas. Fala Max Weber: “Se fizermos qualquer concessão ao princípio de que os fins justificam os meios, não será possível aproximar uma ética dos fins últimos (de convicções) e uma ética da responsabilidade, ou decretar que fim deve justificar os meios”.

Como diz FHC, Weber tinha desprezo pelo político que dá de ombros para as consequências de seus atos, jogando a culpa na mesquinhez dos outros ou do mundo. Novamente Weber: “A política é como perfuração lenta de tábuas duras... Certamente, toda experiência histórica confirma a verdade, que o homem não teria alcançado o possível se repetidas vezes não tivesse tentado o impossível”. Mas não a qualquer custo. Não com o sacrifício dos princípios fundamentais.

Noberto Bobbio qualifica Maquiavel: a licença moral dada era para realizar “grandes feitos”, “grandes coisas”. E não para destruir a autoestima nacional e a maior empresa brasileira.

Muitos assaltaram bancos, sequestraram embaixadores e cometeram crimes em nome de uma suposta boa causa. Financiar um projeto político pela corrupção certamente não é uma boa causa.

Marcus Pestana, deputado federal e presidente do PSDB em Minas Gerais

Luiz Carlos Azedo - Caneta cheia de tinta

• A presidente da República adiou a formação do novo ministério para a véspera da posse, mantém distância dos envolvidos no escândalo da Petrobras e pretende segurar Graça Foste na Petrobras

- Correio Braziliense

No seu tradicional encontro com os repórteres que cobrem o Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff garantiu que está com a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, e não abre: ela ficará no cargo. Ou seja, corroborou a declaração da amiga de que permaneceria à frente da estatal. Apesar de a empresa atravessar a maior crise de sua história, mergulhada num mar de “malfeitos”, para usar o jargão oficial e evitar uma outra expressão, que lembra a crise que levou ao suicídio o presidente Getúlio Vargas.

Segundo Dilma, a executiva não cometeu nenhum deslize e tem plenas condições de enfrentar a crise da companhia. Mas suas declarações em relação à Petrobras também devem ser interpretadas pelos aliados como uma espécie de nem vem que não tem, quem manda aqui sou eu.

Com a caneta cheia de tinta e popularidade maior do que a do dia da eleição, a presidente da República adiou a formação do novo ministério para a véspera da posse, mantém distância dos envolvidos no escândalo da Petrobras e pretende segurar Graça Foster enquanto não surgir um fato novo que a comprometa. Pode ser um grande equívoco, mas ninguém é capaz de convencê-la do contrário. Nem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O fato é que Dilma decidiu não levar em conta muitos dos conselhos do ex-presidente da República. A grande concessão foi feita ao indicar Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e defenestrar o ministro Guido Mantega, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, e a ministra do Planejamento, Míriam Belchior, que empurraram com a barriga o ajuste fiscal e gastaram o que foi preciso para manter os empregos e os níveis de renda durante a campanha eleitoral. Dilma é a mãe da “nova matriz econômica”, que fracassou.

Os partidos da base estão sendo toureados, ninguém envolvido na Operação Lava-Jato fará parte da nova equipe ministerial. Ontem, Dilma anunciou que consultará o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre o real envolvimento de aliados cotados para a Esplanada no esquema de propina investigado pela Operação Lava-Jato. A permanência de Graça Foster, porém, ainda confunde os políticos da base.

O presidente da Câmara, Henrique Eduado Alves (PMDB-RN), que perdeu a disputa pelo governo potiguar, está convencido de que vai para o Ministério da Previdência. Confidencia aos amigos que foi sondado para o posto depois de ter o nome vazado pela primeira vez; por essa razão, argumenta, não estaria descartado. Na mesma situação está o presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), outro integrante da lista atribuída ao ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto da Costa. Nenhum dos dois foi convidado formalmente para o ministério até agora.

Há uma guerra de versões quanto ao escândalo da Petrobras. A estratégia do PT é a mesma do julgamento do mensalão: negar sua existência. Os caciques do PMDB e do PP optaram pela mesma linha. A situação, porém, é muito diferente. Marcos Valério, o operador do esquema, comeu o pão que o diabo amassou na cadeia e assumiu a condição de grande vilão do esquema. Na Operação Lava-Jato, já são 12 as delações premiadas, as mais importantes de Paulo Roberto da Costa e do doleiro Alberto Youssef.

Saidão de Natal
Os executivos presos temem condenações longas, como a da ex-presidente do Banco Rural Katia Rabelo, que teve sua pena fixada em 16 anos e 8 meses de prisão, mais multa de R$ 1,5 milhão, por formação de quadrilha, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Enquanto a maioria dos políticos condenados no mensalão goza de prisão domiciliar ou regime semiaberto, com direito a passar o Natal com a família, os diretores de seis das maiores empreiteiras do país verão o ano-novo chegar na carceragem da Polícia Federal em Curitiba.

Há esperança de que o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, conceda-lhes um habeas corpus. Houve um “tour de force” dos advogados neste recesso para tirá-los do xadrez. Alegam que eles estão sofrendo torturas psicológicas para aceitar a delação premiada. Os presidentes da OAS, José Aldemário Pinheiro, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, acusado de ser o chefe do cartel de empreiteiras, seriam os mais pressionados.

As famílias estão resignadas, foram convencidas de que é preciso aguentar o tranco. Dois personagens, porém, andam com os nervos à flor da pele: o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli e o ex-diretor de Serviços e Engenharia Renato Duque. O primeiro teme ser preso, o segundo não quer voltar pra cadeia. Ambos eram quadros do PT no comando da Petrobras.

Bernardo Mello Franco - O procurador no Coliseu

- Folha de S. Paulo

Dilma Rousseff informou ontem que não terá a palavra final na montagem de seu novo ministério. A nomeação de cada auxiliar dependerá do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Pelos planos da presidente, ele fará hora extra no fim do ano como avalista dos escolhidos para a Esplanada.

A ideia é simples: a cada vez que um partido indicar um ministeriável, Dilma ligará para Janot. Ele consultará sua lista e dirá se o aliado está entre os suspeitos de desviar dinheiro da Petrobras. Assim, a presidente se verá livre do constrangimento de nomear um ministro e ter que demiti-lo logo depois, quando a denúncia da Operação Lava Jato vier a público.

"Para qualquer nomeação, nós pelo menos consultaremos o procurador", explicou Dilma, no tradicional café da manhã natalino com jornalistas no Palácio do Planalto.

"Qualquer pessoa que eu for indicar, eu consultarei o que tem quanto à pessoa. Eu não quero que ele me diga o que. Eu só quero que ele me diga sim ou não, mais nada."

Se Brasília fosse a Roma Antiga, o procurador seria o César no Coliseu. A sorte de cada indicado dependerá de seu gesto da tribuna. Polegar para cima, ministro nomeado. Polegar para baixo, ministro dispensado.

Está claro que o objetivo de Dilma não é prestigiar Janot, e sim usá-lo como escudo contra a fúria de aliados incômodos. Aquele deputado do PMDB não será ministro da Previdência? Culpa do procurador. O ex-governador bonachão não vai controlar o orçamento do Esporte? Sinto muito, foi o Janot que não deixou.

Conveniências à parte, é curioso que a presidente recorra ao Ministério Público para escolher o primeiro escalão de sua equipe. Em tese, o Planalto já paga as contas da Abin para evitar surpresas desagradáveis, como a prisão de auxiliares recém-nomeados. A experiência do primeiro ano do governo, quando Dilma foi obrigada a demitir seis ministros suspeitos de corrupção, sugere que esse filtro não é tão confiável assim.

Miriam Leitão - Medidas drásticas

- O Globo

A economia precisa de fato de “medidas drásticas”, as que foram postergadas porque era ano eleitoral, as que durante as entrevistas e debates a presidente Dilma disse que não eram necessárias. São urgentes para corrigir os erros cometidos durante o primeiro mandato e sobre os quais inúmeros analistas alertaram que trariam consequências graves para a economia.

O mundo tem problemas, com um crescimento desigual e áreas de crise, mas nada explica o que houve no Brasil, só mesmo a persistência nos erros da política econômica que, espera-se, esteja agora no seu ocaso.

Difícil saber o que entende por “medidas drásticas” quem até recentemente dizia que o Brasil não precisava delas. O governo ampliou despesas e a arrecadação caiu. Em novembro a queda foi de 13%, mas a Receita explicou que o pagamento antecipado de dívidas tributárias, o Refis, foi muito mais alto em novembro de 2013. Ao longo do ano, no entanto, o país teve queda de arrecadação, mas os gastos cresceram. Em vários meses houve inclusive déficit primário e a meta fiscal só foi fechada a marteladas dadas com a ajuda do Congresso. O fato é que o Brasil é um país cujo governo não consegue pagar as contas de cada mês — mesmo não contando o que tem que pagar aos seus credores — apesar de aumentar a carga de impostos anualmente.

É preciso medidas diferentes das adotadas no passado recente para que o país volte a crescer, porque o governo aumentou as isenções fiscais para setores escolhidos e mesmo assim não conseguiu incentivar o crescimento. O país abriu mão, de janeiro a novembro, segundo a Receita, de quase R$ 93 bilhões para estimular setores. A economia não cresceu e tampouco há sinais de que a renúncia tenha reduzido a carga tributária geral da economia. Em 2013, a isenção fiscal foi de R$ 70 bilhões no mesmo período de 11 meses, e a carga tributária ainda assim subiu.

É preciso medidas drásticas para restabelecer a confiança nos dados fiscais do governo, porque houve tanta alquimia que os analistas têm dificuldade de separar dos indicadores a parte contaminada com as manobras que transformaram dívida em receita, em que empresas estatais tiveram que antecipar dividendos de lucros que não tiveram.

A mesma palavra serve para definir as decisões necessárias para que se possa evitar o rebaixamento da economia brasileira. Esse risco não é imediato, mas os sinais já foram dados. Ela seria rebaixada porque a dívida pública aumentou, o déficit nominal cresceu, o superávit primário desapareceu e o déficit em transações correntes está em 4% do PIB. E é preciso trabalhar duramente para levar a inflação de volta à meta de 4,5%. Com tudo isso, só mesmo tomando medidas drásticas, como a presidente Dilma disse ontem aos jornalistas com quem tomou um café da manhã.

Ela não disse o que são as medidas, mas nada é fácil quando os problemas aparecem juntos e são negados por muito tempo. O remédio para a estagnação seria estimular a economia, o que não pode ser feito pela precária situação das contas públicas e pela inflação já alta. Combater a subida do IPCA com os remédios clássicos pode derrubar mais a atividade. Por isso os candidatos de oposição alertaram durante toda a campanha que a situação econômica era complicada e exigiria uma série de medidas amargas. A presidente acusou os adversários de quererem beneficiar os bancos, empobrecer os pobres, e acabar com conquistas sociais. Aos jornalistas ela garantiu que o único problema brasileiro era a crise mundial.

No dia 25 de setembro, Dilma respondeu ao economista Alexandre Rands, da campanha de Marina Silva. Ele havia dito que o governo precisaria fazer um “ajuste fiscal grande e profundo”. Dilma respondeu: “não precisamos de um choque fiscal”. E disse que quem sugeria cortes de gastos estava na verdade propondo que o dinheiro fosse para “pagar os bancos”. Aproveitou para alfinetar Marina: “o grande problema da candidata é que ela diz uma coisa num dia e no outro, diz outra”. É o caso de se perguntar, agora, a quem se aplica a frase dita pela então candidata Dilma.

Não faz bem à democracia esse exercício de negar o que sabe que terá que fazer. Isso ilude, confunde os eleitores e os joga num falso debate.

As palavras e os fatos – O Estado de S. Paulo / Editorial

Desde 2003, quando Lula chegou pela primeira vez à Presidência da República, o poder tornou-se uma obsessão para os petistas, que para garanti-lo não hesitaram em aliar-se ao que há de pior na política brasileira - que até então combatiam ferozmente. Passaram a apelar para qualquer recurso capaz de produzir votos, tudo envolto numa retórica populista composta pela soma de algumas meias-verdades com muita ficção, para criar uma realidade imaginária cultuada como obra suprema daqueles que detêm o monopólio da virtude e só pensam no bem do povo.
Dois exemplos recentes:

Lula, em seu palanque eletrônico na internet, sob os auspícios do instituto que leva seu nome: "A lição que ficou (da eleição presidencial) foi a seguinte: o povo quer mais democracia, mais participação, mais esperança, mais ética. O povo quer ser mais ouvido e continuar sonhando".

Dilma, em entrevista ao jornal chileno El Mercurio, respondendo a uma pergunta sobre os efeitos do escândalo da Petrobrás em seu segundo mandato: "O Brasil não vive uma crise de corrupção, como afirmam alguns. Nos últimos anos começamos a pôr fim a um largo período de impunidade. É um grande avanço para a democracia brasileira".

Nos anos 70, Lula subiu num palanque na Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, e nunca mais desceu. Aprendeu a dizer o que "o povo" gosta de ouvir e se tornou um craque no assunto, um campeão do populismo. Ninguém jamais ouviu ou ouvirá dele apelos a coisas que não sejam necessariamente agradáveis de serem ouvidas. Isso fica a cargo de quem não precisa de votos. Para Lula, o povo, essa entidade mítica da qual, avalizado por suas origens humildes, ele se proclama defensor exclusivo e perpétuo, precisa "continuar sonhando".

E nas entrelinhas de obviedades (quem é que não acha lindo ouvir falar de "mais democracia, mais participação, mais esperança, mais ética"?) Lula vai dando seu recado: "Se a Dilma fizer uma relação com a sociedade tal como foi o segundo turno das eleições (quando, segundo ele, "o povo saiu às ruas" para garantir a vitória petista), terá toda possibilidade de fazer um governo exitoso e fazer com que o povo sinta que valeu a pena fazer a campanha e eleger a Dilma". Quanto a como fazer "uma relação com a sociedade", Dilma não precisa se preocupar. O grande eleitor de postes ensina.

A presidente da República, por sua vez, parece cada vez mais preocupada com a repercussão das denúncias de corrupção que lhe mordem os calcanhares. De fato, o escândalo da vez, o da Petrobrás, assume proporções assustadoras.

Não é justo afirmar, como tem sido reiterado neste espaço, que o PT inventou a corrupção. Movidos por sua obstinada determinação de permanecer no poder indefinidamente, alguns petistas apenas cederam à constatação pragmática de que para conquistar votos é preciso dinheiro, muito dinheiro, e meteram a mão na massa, compartilhando o butim com seus prestimosos "aliados". O mensalão foi apenas o começo da lambança. O escândalo em curso é a confirmação de que, no que depender deles, a corrupção veio para ficar. A não ser que Dilma decida, como já prometeu, passar das palavras à ação, o que implicaria a improbabilidade de combinar com o núcleo duro do PT que está na hora de acabar com a festa.

Mesmo quando fica nas palavras, porém, Dilma dá uma no cravo e outra na ferradura. Na entrevista ao El Mercurio declarou-se "indignada" com as denúncias de corrupção na Petrobrás. Mas fez questão de minimizar a responsabilidade do PT no episódio. "Essas investigações têm levado ao desmantelamento de um esquema que é suspeito de ter décadas de existência, antes dos governos do PT". Sobre as "décadas de existência" da corrupção, não há duvidas. Mas nunca houve nada igual, tão generalizado e profundo, como agora. Não obstante, a presidente garantiu: "No Brasil não há intocáveis. Qualquer um que não trate o dinheiro público com seriedade e honestidade deve pagar por isso. É um compromisso do meu governo".

Esquece-se a presidente Dilma - ou disso ela nunca soube - que acabar com a corrupção não é um compromisso de seu governo ou do PT. É obrigação elementar de qualquer governante, um dever de Estado.

Arnaldo Jabor - 'Roubar é uma arte'

- O Globo / Segundo Caderno

"O Natal está aí. E quero vos dar um presente de Papai Noel, contando traços de minha vida às margens do Poder, para que entendam que a finalidade do roubo da coisa pública não é apenas a fome de grana, o amor ao tutu, ao vil metal. Não; roubar é uma aventura épica, é uma corredeira de sustos e vitórias, a delícia do risco assumido. Com essas descobertas dos chamados escândalos da Petrobrás, comecei a ficar preocupado - mas meu nome ainda não foi citado. Talvez nem seja, porque o que levei foi uma mixaria diante dos milhões de dólares de gorjeta. Levei pouco, pois sou da época dos '10%' , que durou até que o falecido Orestes Quércia lançou a máxima eterna: '10% é para garçom'.

Aí começou a inflação da corrupção. Sou gatuno, mas cheguei a ver com espanto propinas de US$ 40 milhões. Isso nunca houve na face da Terra; fico até humilhado com minhas modestas mãos na cumbuca - eu, que sempre assumi minha condição de corrupto ativo e passivo (sem veadagem..., claro). Não sou um ladrão de galinhas, mas já roubei galinhas do vizinho e até hoje sinto o cheiro das penosas que eu agarrava. Ha, ha, ha...

Mas não roubo mais só por necessidade; é tesão, prazer mesmo. Tenho sete fazendas imaginárias, mando em cidades do Nordeste, tenho tudo, mas confesso que sou viciado na adrenalina que me arde no sangue na hora em que a mala de dólares voa em minha direção; vibro, vendo os olhos covardes do empresário, suas mãos trêmulas me passando a propina; delicio-me quando o juiz me dá ganho de causa, ostentando honestidade e finge não perceber minha piscadela marota na hora da liminar comprada (está entre US$ 50 mil a US$ 100 mil, hoje). Me sinto 'superior' assim. Roubar me liberta. 

Eu explico: roubar me tira do mundo dos 'obedientes' e me faz 'excepcional'. Gosto da doce volúpia em salões de caretas - me xingam pelas costas, mas me invejam pela liberdade cínica que imaginam que tenho. Suas mulheres me olham excitadas, pensando nos brilhantes que poderiam ganhar de mim.

Adoro sentir o espanto de uma prostituta, quando eu lhe arrojo US$ 1.000 sobre o corpo, fazendo-a caprichar em carícias. É uma delícia rolar, nu, em cima de notas de US$ 100 na cama, sozinho, comendo chocolates do frigobar de um hotel vagabundo da cidade onde descolei a propina de um canal de esgoto superfaturado. 

Tenho orgulho de mim como profissional insensível até quando roubo verbas de remédios para criancinhas; domino a vergonha e transformo-a na bela frieza que constrói o grande homem. Sei muito bem os gestos rituais da malandragem brasileira: sei fazer imposturas, perfídias, sei usar falsas virtudes, ostentar dignidade em CPIs, dou beijos de Judas, levo desaforo para casa sim, sei dar abraços de tamanduá e chorar lágrimas de crocodilo...

Eu já declarei de testa alta na Câmara: 'Não sei nem imagino como esses milhões apareceram em minha conta na Suíça. Como? Que conta? Apesar desses extratos todos, não tenho nem nunca tive conta no exterior!'. Esse grau de mentira é tão sólido que deixa de ser mentira e vira uma arte. Vejam o exemplo do grande mestre Paulo Maluf - conseguiu desmoralizar nosso Código Penal e vai ser deputado de novo!

Aliás, saibam que isso vai acontecer também com os 'petrolões' - são tantos processos que tudo vai se congestionar e, com o tempo, nada será feito.

No Brasil, há dois tipos de ladrões de colarinho branco: há o ladrão 'extensivo' e o 'intensivo'. Não tolero os ladrões intensivos, sem classe... Falta-lhes elegância. Roubam o que lhes aparece na frente, para se vingarem de passadas humilhações, dores de corno, porradas na cara não revidadas, suspiros de mãe lavadeira.

Eu, não. Eu sou cordial, um cavalheiro; tenho paciência e sabedoria, comecei pouco a pouco, como as galinhas da infância que de grão em grão enchiam o papo... Eu sou aquele que vai roubando ao longo da vida política e, ao fim de décadas, já tem 'Renoirs' na parede, iates, helicópteros, esposa infeliz (não sei por que, se dou tudo a ela) e infelizmente filhos estroinas... (mandei estudarem na Suíça e não adiantou).

Eu adquiri uma respeitabilidade altaneira que confunde meus inimigos, que ficam na dúvida se me detestam ou admiram. Considero-me um técnico, um cientista da corrupção nacional...

Ouso mesmo dizer que estou defendendo uma cultura! São séculos de hábitos e cacoetes sagrados que formam um país. Trata-se da beleza do clientelismo ibérico, em que a amizade cordial é mais importante que essa bobagem de 'interesse nacional'! O que meus inimigos chamam de irresponsabilidade e corrupção é a resistência da originalidade brasileira, é a preservação do imaginário nacional! Eu estou no lugar da verdade. Este país foi feito assim, na vala entre o público e o privado. Há uma grandeza insuspeitada na apropriação indébita.

A bosta não produz flores magníficas? O que vocês chamam de 'roubalheira', eu chamo de 'progresso', o doce progresso português que formou esse adultério entre o público e o privado. Eu sempre fui muito feliz... Sempre adorei os jantares nordestinos, com moquecas e sarapatéis, os cálidos abraços das máfias rurais...

Outro dia, um delegado que comprei me convidou para ver uma execução. Topei, por curiosidade; podia ser uma experiência existencial interessante. Era um neguinho traficante pé de chinelo que levaram para um terreno baldio. Ele implorava quando lhe passaram o fio de nylon no pescoço e apertaram devagar até ele cair estrangulado, bem embaixo de uma placa de financiamento público. Na hora, até me excitei; mas quando cheguei em casa, com meus filhos vendo Bob Esponja na TV, fui tomado pelo mal-estar que chamam de 'sentimento de culpa'...

Mas isso vai passar logo; sei combater essas fraquezas dos pobres de espírito.

Tem muita verba pública aí, muita emenda no orçamento, empreiteiros me ligando sem parar... Tenho de continuar minha missão."

João Cabral de Melo Neto - Cemitério pernambucano

(Nossa Senhora da Luz)

Nesta terra ninguém jaz,
pois também não jaz um rio
noutro rio, nem o mar
é cemitério de rios.

Nenhum dos mortos daqui
vem vestido de caixão.
Portanto, eles não se enterram,
são derramados no chão.

Vêm em redes de varandas
abertas ao sol e à chuva.
Trazem suas próprias moscas.
O chão lhes vai como luva.

Mortos ao ar-livre, que eram,
hoje à terra-livre estão.
São tão da terra que a terra
nem sente sua intrusão.

In: MELO NETO, João Cabral de. Morte e Vida Severina e outros poemas