quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Celso Ming - Tempos de austeridade

- O Estado de S. Paulo

Na sua primeira reunião do Ministério deste seu segundo mandato, a presidente Dilma defendeu nesta terça-feira o plano de austeridade agora em marcha, na contramão do que fez ao longo de toda a campanha eleitoral.

Reconheceu que a obtenção de um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) de 1,2% do PIB, ou de cerca de R$ 66,3 bilhões, exigirá “um esforço brutal” da população. Mas tomou esse caminho, disse ela, em nome da criação de bases sólidas para a retomada do crescimento econômico.

A primeira pergunta está em saber por que não fez isso antes. Ela explica que teve de enfrentar dois fortes choques externos e um interno, com aumento das despesas públicas: “Absorvemos a maior parte das mudanças dos cenários nas contas fiscais”.

Os choques externos foram a derrubada dos preços das matérias-primas (commodities), que reduziu as receitas com exportações, e o aumento do valor do dólar. O choque interno foram os estragos produzidos pela seca. É curiosa a avaliação desse choque do dólar. Ao longo dos três primeiros anos, seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, denunciou o choque contrário, o da desvalorização do dólar, a que denominou de guerra cambial. O que se vê agora é que choque cambial há sempre, qualquer que seja o movimento do dólar nos mercados.

Se tivesse sido por esses fatores, então a presidente teria de insistir na política anterior, porque tanto os choques externos como o interno estão sendo reforçados. À baixa das matérias-primas, acrescenta-se agora o mergulho vertical dos preços do petróleo. E a alta do dólar em relação às outras moedas fortes vai se intensificar ainda neste semestre, quando se espera que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) comece a retirar os US$ 4,5 trilhões emitidos desde 2008 para reativar a economia americana.

A presidente Dilma apenas não quer reconhecer, como vem cobrando a senadora Marta Suplicy, que sua política anterior estava errada, até mesmo para os objetivos do seu partido. Se “a razão de ser da gestão responsável da política econômica é o crescimento”, como disse, é forçoso admitir que faltou responsabilidade a uma gestão que levou aos crescimentos econômicos medíocres dos últimos quatro anos.

No resto, foi até mais sincera do que se esperava e, além disso, correta. Foi sincera, por exemplo, ao reconhecer que tem um projeto de poder que é o de garantir as rédeas do governo para novas temporadas. Trata-se, portanto, de produzir o ajuste, corrigir o rumo da política econômica, alavancar o crescimento econômico e, com a casa em ordem, produzir as condições políticas para seguimento do seu projeto: “As (novas) medidas vão ampliar o projeto vitorioso nas urnas”.

Falta saber se a nova profissão de fé na solidez dos fundamentos da economia é produto de mudança das convicções da presidente Dilma ou se é apenas uma concessão tática destinada a ganhar um mínimo de confiança dos empresários e do consumidor.

Até agora, todas as manifestações da presidente Dilma foram na direção oposta. Quem pedia solidez fiscal e determinação no combate à inflação era acusado de fazer o jogo dos banqueiros contra o interesse dos pobres e da criação de empregos. Ainda não está afastado o risco de recaídas presidenciais.

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