quarta-feira, 25 de março de 2015

Câmara derrota Dilma e aprova redução de dívidas

Desajuste com o Congresso

• Dilma faz apelo por ajuste fiscal, mas Câmara aprova projeto que força redução de dívidas

Júnia Gama, Cristiane Jungblut e Luiza Damé - O Globo

Acerto de contas

BRASÍLIA - A Câmara impôs ontem nova derrota à presidente Dilma Rousseff ao aprovar em votação-relâmpago um projeto para forçar o governo a reduzir as dívidas de estados e municípios. Dilma aprovou uma lei no ano passado que mudava o cálculo dos débitos com as administrações, mas, diante do agravamento da crise econômica, decidiu voltar atrás e adiar a alteração da regra. Ontem, afirmou que o governo não tem condições de renegociar as dívidas, para não comprometer o ajuste fiscal.

O Congresso reagiu rápido à decisão de Dilma. A Câmara aprovou primeiro a votação em regime de urgência e depois o projeto em si obrigando o governo a adotar as regras que reduzem as dívidas em até 30 dias. Hoje, o Senado deve votar este mesmo projeto, em uma ação combinada entre os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Do outro lado, o advogado Geral da União, Luis Inácio Adams, avisou que o governo vai brigar na Justiça para derrubar ações impetradas por governadores e prefeitos. A Frente Nacional de Prefeitos também estuda entrar com uma ação na Justiça.

O confronto acentua o momento de dificuldade nas relações entre governo e Congresso, agora estendido a governadores e prefeitos aliados.

Aprovado por unanimidade, em votação simbólica, a urgência pegou muitos deputados de surpresa, entre eles o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), que não estava acompanhando a votação. Horas depois, Cunha colocou o mérito do projeto em votação, com o apoio de todos os líderes e a liberação de Guimarães, para evitar uma provável derrota. Agora, o projeto vai para o Senado, antes de seguir para sanção presidencial. Já se trabalha na Câmara com a possibilidade de a presidente Dilma vetar o projeto e o Congresso derrubar esse veto rapidamente.

Foram 389 votos favoráveis e duas abstenções. Até o PT votou a favor, alegando solidariedade ao prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que precisa de um alívio nas dívidas para ter alguma capacidade de investimento.

Ontem, o Planalto decidiu entrar na briga jurídica com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, que obteve decisão liminar na Justiça para fazer valer as novas regras. O recado foi dado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, em reunião na noite de segunda-feira com Paes e a cúpula do PMDB. Dilma foi informada sobre o impasse na reunião e, segundo interlocutores, teria demonstrado muita irritação com o prefeito. A presidente ressaltou que o governo federal sempre tratou o município e o estado do Rio como parceiros preferenciais nos repasses do governo e que a ação de Paes poderia comprometer o ajuste fiscal e provocar descontrole nas contas públicas. Em entrevista, afirmou:

- Nós estamos fazendo um imenso esforço fiscal. Agora, não temos condições de fazer essa despesa. Obviamente, assim que melhorar, nós teremos todo o interesse em resolver esse problema. Estamos, dentro da lei, tentando resolver essa questão, em acordo com os estados. Isso é problema momentâneo - disse Dilma.

Em 2013, o Tesouro estimou que o projeto que muda o indexador das dívidas de estados e municípios teria um impacto fiscal para a União de R$ 187,4 bilhões ao longo dos próximos 26 anos.

Sob a justificativa de que a União "não tem cumprido a norma legal", o projeto aprovado ontem na Câmara diz que a União terá prazo de até 30 dias da data da manifestação do devedor, protocolada no Ministério da Fazenda, para promover os aditivos contratuais, independente de regulamentação. Diz ainda que, vencido o prazo, estados e municípios poderão recolher o montante devido, com a aplicação da lei sancionada no ano passado.

Renan e Cunha se reuniram à tarde para fechar as brechas ao texto sancionado por Dilma, que, na opinião de técnicos da equipe econômica, não obriga automaticamente a aplicação do novo indexador.

- Está havendo um equívoco de interpretação da burocracia do governo, que acha que a lei depende de regulamentação para ser aplicada. Não dá agora para ela ser interpretada. Tem que ser executada. Como não estão executando, vira uma interferência do Executivo no Legislativo - disse Cunha.

- Fizemos um acordo. A troca do indexador foi consequência desse acordo. Deixamos, a pedido do governo, para votar depois das eleições, para não impactar as contas públicas. Tirar dinheiro dos estados falidos não é ajuste, é desajuste. Como você pode punir estados e municípios a continuar pagando taxa de juros escorchante - afirmou Renan.

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