quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Cristiano Romero - Economia em tempos de dominância política

- Valor Econômico

• Crise política explica 80% da contração econômica

A área econômica do governo acredita que o país não resistiria, por mais duas semanas, à intensidade dos fatos que marcaram a semana passada. A combinação de redução drástica da meta fiscal com a exacerbação da crise política provocou enorme volatilidade nos mercados, impactando negativamente os preços dos ativos. A constatação é de enorme gravidade e dá uma ideia de como andam as coisas em Brasília.

Na opinião de um integrante da equipe econômica, o país vive neste momento sob "dominância política", uma alusão até certo ponto irônica ao conceito de dominância fiscal. Por esse conceito, diz-se que, por causa da situação fiscal delicada, o Banco Central (BC) não pode elevar os juros como necessita, com o objetivo de controlar a inflação, para não aumentar ainda mais a despesa pública.

"A economia vem sendo atingida pela política já há algum tempo. Sobre a questão econômica, embora ela não seja fácil, há um entendimento do problema", diz uma fonte graduada. "O problema é que a política não só não tem ajudado no que precisa ser feito, como também tem trazido essas pautas-bomba na área fiscal e criado esse ambiente de baixa confiança, mostrando que o governo perdeu capacidade de operar."

Interlocutores do governo, preocupados com a gravidade da crise política e seus efeitos nefastos sobre a economia, fizeram chegar a Brasília uma conta indigesta. Segundo eles, 80% da contração da atividade econômica tem a ver com eventos não econômicos.

Esses eventos são o (imprescindível e inadiável) combate à corrupção, que derrubou os investimentos no setor de óleo e gás e teve forte impacto nas empreiteiras envolvidas em contratos da Petrobras, a maior empresa do país, e a crise política, especialmente a conflituosa relação entre os poderes da República, que tem feito o Congresso aprovar medidas insustentáveis do ponto de vista fiscal.

Em reação a esse quadro, o Palácio do Planalto tenta retomar a iniciativa política, com a ajuda, inclusive, do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, cuja proposta de ajuste fiscal fracassou de forma fragorosa, tornando sua presença no governo uma questão - justiça seja feita, a culpa da ruína do ajuste não pode ser atribuída ao Congresso. A ideia de formular 27 projetos legislativos - a "Agenda Brasil" - para mostrar que o país pode ter uma agenda positiva neste momento se mostra inócua. O parlamento não está disposto sequer a votar o fim da desoneração da folha. Por que concordaria com uma medida impopular como a fixação de idade mínima para aposentadoria?

"Nós não resistimos à intensidade da semana passada por mais duas ou três semanas. Isso aí não dá. Não dá para conviver nesse nível de confronto entre os poderes. Tudo isso gera um nível de volatilidade complicado", desabafa uma fonte oficial.

Apesar de mais uma agência de classificação de risco - a Moody's -, ter decidido rebaixar a nota de crédito do país, o governo não vê a perda do grau de investimento como algo inevitável. A aposta é a seguinte: a principal questão hoje sobre o Brasil é a sustentação política do governo. "Se isso for superado, abre-se uma avenida [para a solução dos problemas fiscais]", explica um ministro. "Prevíamos 2015 como um ano de ajuste. O que saiu pior foi a dimensão política da crise."

Nesse ambiente conturbado, o Banco Central dá sinais de que vai perseguir o caminho traçado em sua comunicação com a sociedade: levar a inflação para a meta de 4,5% até dezembro de 2016. A expectativa é que o IPCA perca fôlego neste mês e no próximo, mas volte a subir um pouco no último trimestre. Na primeira metade do ano que vem mostraria uma queda mais acentuada, abrindo espaço, inclusive, para o início da redução da taxa básica de juros (Selic), hoje fixada em 14,25%.

O Comitê de Política Monetária (Copom) acredita que é possível reduzir os juros quando a projeção oficial de inflação (do chamado cenário de referência) apontar, por algum tempo, a inflação de 2016 abaixo da meta. Por outro lado, embora esteja comprometido neste momento em manter a Selic parada por um período "suficientemente prolongado", o Copom pode mudar de planos e voltar a elevar os juros.

Se houver desvios significativos da projeção de inflação em relação à meta de 4,5% em dezembro de 2016, o BC manterá o que chama de "vigilância". Em outras palavras, o Copom poderá aumentar a taxa Selic, caso o cenário de referência mostre a projeção do IPCA para 2016 novamente acima de 4,5%. No boletim Focus, a mediana das opiniões de mercado, por exemplo, prevê inflação de 5,43% no próximo ano, um índice longe, portanto, da meta oficial perseguida pelo BC - registre-se que, por causa da recente depreciação da taxa de câmbio, a projeção piorou, pois, uma semana antes apontava inflação de 5,40%.

Além do desafio de convencer os agentes econômicos de que não cederá na política anti-inflacionária, o Banco Central terá que enfrentar forças do próprio governo que já começam a achar que a política monetária foi longe demais. No Palácio do Planalto, esse raciocínio é corrente. "A crítica é a de que havia 'dominância monetária'. Balela! Isso valeria se a inflação estivesse em 2%, mas está em 9%", reage um técnico experiente do governo.

Outro desafio está na área cambial, a variável que sintetiza o que ocorre de relevante na economia. O câmbio reage prontamente, claro, às intempéries da política e da economia. Quando isso ocorre, a volatilidade aumenta e dificulta o controle dos preços, além de afetar negativamente as expectativas.

Não foi à toa que, na semana passada, o BC sinalizou ao mercado que voltará a rolar 100% dos contratos vincendos de swap cambial. Em julho, rolara 60% e, desde maio, avisou que passaria rolar as posições existentes de acordo com as condições de mercado e a demanda pelo instrumento". Como o nervosismo provocado pela redução da meta fiscal e o agravamento da crise aumentaram a insegurança dos agentes, as condições mudaram e a demanda por hedge (proteção) aumentou.

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