terça-feira, 24 de novembro de 2015

João Cabral de Melo Neto: Terras de Limoeiro

Vou na mesma paisagem
reduzida à sua pedra.
A vida veste ainda
sua mais dura pele.
Só que aqui há mais homens
para vencer tanta pedra,
para amassar com sangue
os ossos duros desta terra.
E se aqui há mais homens,
esses homens melhor conhecem
como obrigar o chão
com plantas que comem pedra.
Há aqui homens mais homens
que em sua luta contra a pedra
sabem como se armar
com as qualidades da pedra.

Dias depois, Limoeiro,
cortada a faca na ribanceira.
É a cidade melhor,
tem cada semana duas feiras.
Tem a rua maior,
tem também aquela cadeia
que Sebastião Galvão
chamou de segura e muito bela.
Tem melhores fazendas,
tem inúmeras bolandeiras
onde trabalha a gente
para quem se fez aquela cadeia.
Tem a igreja maior,
que também é a mais feia,
e a serra do Urubu
onde desses símbolos negros.

Porém bastante sangue
nunca existe guardado em veias
para amassar a terra
que seca até sua funda pedra.
Nunca bastantes rios
matarão tamanha sede,
ainda escancarada,
ainda sem fundo e de areia.
Pois, aqui, em Limoeiro,
com seu trem, sua ponte de ferro,
com seus algodoais,
com suas carrapateiras,
persiste a mesma sede,
ainda sem fundo, de palha ou areia,
bebendo tantos riachos
extraviados pelas capoeiras.

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