quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Nova fase da Lava-Jato requer instituições fortes- Editorial / O Globo

• A primeira prisão da História de um senador em cumprimento de mandato e a detenção de pessoa próxima a Lula voltam a dar força ao desbaratamento do petrolão

Énum momento de relativa baixa da Operação Lava-Jato, quando se espera que um recurso do Ministério Público ao Supremo reveja o fatiamento de seu trabalho, que, na sua 21ª fase, ela aprofunda as investigações da organização criminosa montada no lulopetismo para drenar recursos públicos em estatais, com o objetivo de financiar campanhas de políticos, projetos de poder e de enriquecimento pessoal. Na terça-feira, a primeira ação desta fase, batizada sintomaticamente de Passe Livre, deteve em Brasília o pecuarista José Carlos Bumlai, cujo nome constava da portaria do Planalto, na gestão Lula, para ter acesso sem burocracias ao presidente.

Segundo o lulopetismo, Bumlai se aproveitou da proximidade de Lula para usar o nome dele em negócios. O ex-presidente nega laços tão estreitos no relacionamento entre os dois. A prisão de Bumlai pela Polícia Federal tem a ver com um desses negócios, a exótica operação pela qual um empréstimo de R$ 12,1 milhões feito pelo banco Schahin a Bumlai foi quitado num troca-troca em que o Grupo Schahin, sem qualquer experiência no ramo, assinou com a Petrobras um contrato de US$ 1,6 bilhão para operar um navio-sonda por 20 anos. Algo que extravasa todos os limites da sensatez. Tudo, segundo a acusação, para Bumlai transferir o dinheiro ao PT, a fim de o partido saldar dívidas. Mais um caso de privatização criminosa de recursos públicos.

A fase Passe Livre da Lava-Jato aproxima as investigações do ex-presidente Lula, contra quem, alerta um cauteloso Sérgio Moro, juiz de Curitiba que trata do caso, não há qualquer prova. Mas existe desconforto no lulopetismo e no próprio governo Dilma, amplificado pelas prisões da manhã de ontem: a primeira da História de um senador da República, Delcídio do Amaral (PT-MS), líder do governo; do banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, de perfil empresarial agressivo, tendo feito negócios bilionários na área da Petrobras; e do advogado Edson Ribeiro, contratado pelo exdiretor internacional da estatal Nestor Cerveró. Ribeiro estava ontem no exterior. Também foi preso o chefe de gabinete de Delcídio, Diogo Ferreira. Delcídio e grupo são acusados de tentar impedir as investigações da PF e do Ministério Público, em torno da atuação de Cerveró, preso em Curitiba, um personagem central na escandalosa compra pela Petrobras da refinaria de Pasadena, uma das fontes de dinheiro para a distribuição de propinas.

A detenção específica do senador, protegido por foro especial, foi aprovada pelo ministro Teori Zavascki, da 2ª Turma do Supremo, e relator dos processos da Lava-Jato que chegam ao STF. Depois, os ministros restantes avalizaram a decisão de Zavascki — Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Celso de Mello. Teve impacto a divulgação da gravação feita pelo filho do ex-diretor da Petrobras, Bernardo Cerveró, de conversas de Delcídio sobre a trama para que Nestor não prestasse “colaboração premiada”, nada dissesse e saísse do país ao ser libertado. São citadas gestões junto a ministros do Supremo, como o próprio Teori e Edson Fachin, contra a Lava-Jato. Também se discutem a rota de fuga de Cerveró por jatinho rumo à Espanha e uma mesada de R$ 50 mil para o ex-diretor. O voto por unanimidade da 2ª Turma pode ser decifrado como uma resposta dos ministros aos conspiradores. Muita coisa mais, porém, deve vir por aí, numa fase da Lava-Jato em que o ex-presidente Lula é tirado do segundo plano e começa a ficar mais visível em toda essa história.

Do impeachment do presidente Collor, em 92, até hoje, as instituições não pararam de ganhar músculos. Neste sentido, o mensalão também foi um momento especial. E mais ainda tem sido no petrolão, em que estão envolvidos muitos políticos em cargos importantes e de folha corrida de peso. Não pode haver recuo nesse processo de afirmação da República no país. O desfecho de tudo precisa servir de divisor de águas, a partir do qual não haverá mesmo dúvidas de que todos são iguais perante a Constituição.

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