domingo, 22 de novembro de 2015

Samuel Pessôa: Debate na ciência política

- Folha de S. Paulo

É inegável que a gestão da política tem apresentado problemas. Estamos em meio a um impasse. O resultado do impasse é uma dívida pública que cresce de forma explosiva.

Por que chegamos até aqui? Como evitar que episódios de crises políticas profundas, como a atual, e seus impactos desastrosos sobre a economia se repitam? Esses questionamentos rondam boa parte do debate da ciência política atual.

Duas são as respostas que têm sido oferecidas. A primeira assevera que o PT é um partido hegemônico que não soube gerir de forma harmoniosa nosso complexo presidencialismo de coalizão.

Esse ponto de vista foi defendido por mim e por Carlos Pereira em nosso artigo publicado no caderno "Ilustríssima", desta Folha, em 11 de outubro.

Argumentamos que a gestão do presidencialismo de coalizão é feita a partir da construção de um programa comum –e, portanto, do compartilhamento do poder– e do uso de moedas de troca, o chamado "varejão" da política. Quem muito compartilha poder precisa menos do varejão e vice-versa.

O PT, partido muito mais à esquerda do que a média do Congresso Nacional, priorizou o varejão. Sempre teve dificuldade de compartilhar poder. Do presidencialismo de coalizão caminhamos ao presidencialismo de cooptação.

Segundo essa leitura, mensalão e petrolão são consequências daquela escolha. Ou seja, teria havido alteração (para pior) da relação promíscua e corrupta que tradicionalmente existe entre o setor privado e o Estado no Brasil.

A outra leitura possível é que os problemas são menos de escolhas de gestão e mais de desenho institucional do sistema político. Para essa visão, a agenda de reforma política é prioritária.

Não teria havido de FHC para o petismo alteração apreciável na forma de gerir a política, e a perda de funcionalidade seria consequência da evolução natural de nosso sistema político. As regras de funcionamento do sistema induzem o permanente aumento da fragmentação partidária, elevando continuamente o custo do presidente em gerir nosso presidencialismo.

A perda de funcionalidade seria consequência natural da dinâmica evolutiva do sistema político. Seria, portanto, essencialmente independente (ou exógena) em relação às escolhas de gestão do presidente do momento.

Para essa corrente, provavelmente mensalão e petrolão são frutos de uma assimetria das instituições de controle do Estado, Ministério Público e Polícia Federal, que são mais rígidas com o petismo e mais lenientes com os tucanos, por exemplo.

Evidentemente as duas histórias não são excludentes. É possível que as escolhas de gestão do petismo tenham agravado tendência natural de perda de funcionalidade do sistema. Adicionalmente, mesmo para aqueles que, como nós, enfatizam os erros de gestão do petismo, reconhece-se que algumas mudanças institucionais em nosso sistema político –a mais importante delas é a vedação da coligação para a eleição proporcional– são necessárias e reduziriam de fato a fragmentação.

Para a academia, esse é um bom debate. Espero que pesquisas futuras ajudem a esclarecer as dúvidas e iluminar os melhores caminhos a percorrer em busca do aperfeiçoamento institucional de nosso sistema político.

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