• Procuradores acreditam que as doações eleitorais serviram para “lavar” dinheiro de propina. A tese é polêmica e contestada por todos os envolvidos
- Correio Braziliense
Quando parecia que a situação estava se acomodando em relação à Operação Lava-Jato, uma nova borrasca surgiu no horizonte: o acordo de delação premiada do empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC e da Constran, assinado ontem com a Procuradoria-Geral da República em Brasília, depois de quatro horas de reunião com Rodrigo Janot e procuradores da força tarefa que investiga o caso.
No trato, ele prometeu revelar tudo o que sabe sobre pagamentos de suborno na Petrobras e em outras estatais, o que ameaça trazer para o olho do furacão o Palácio do Planalto e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de uma grande empreiteira que até agora não foi denunciada. Pessoa se comprometeu a pagar uma multa de R$ 55 milhões, a segunda mais alta entre os delatores da Operação Lava-Jato. O ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco devolveu US$ 97 milhões, o equivalente hoje a R$ 295 milhões.
O Palácio do Planalto volta à berlinda. Pessoa disse que deu R$ 7,5 milhões à campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT) no ano passado, negociados com o tesoureiro Edinho Silva, atual ministro de Comunicação Social do governo. No acordo, o empresário afirma que a doação se deu sob ameaça de retaliações em contratos com a Petrobras, acusação que o ministro repudiou de pronto, em nota à imprensa, e que o PT também desmente. Em visita à Câmara, o ministro disse que o valor foi declarado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “O que eu fiz foi arrecadar dentro da legalidade enquanto tesoureiro de campanha. As doações foram legais, declaradas ao TSE”.
A nomeação do ex-deputado e ex-prefeito de Araraquara para a pasta da Comunicação Social serviu como uma espécie de blindagem contra as investigações conduzidas pelo juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, ao lhe garantir foro especial. Saiu, porém, da panela de pressão para cair numa frigideira quente. Tudo, porém, vai depender das provas materiais e de investigações a cargo da Polícia Federal que comprovem as acusações do empresário. Procuradores acreditam que as doações eleitorais serviram para “lavar” dinheiro de propina. A tese é polêmica e contestada por todos os envolvidos.
Encarcerado de 14 de novembro a 28 de abril, Pessoa agora está em prisão domiciliar por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), com tornozeleira eletrônica. Era o coordenador do cartel de grandes empreiteiras que se beneficiou do esquema de propina na Petrobras. Seu acordo de delação premiada precisa, ainda, ser homologado pelo ministro do STF Teori Zavascki. A colaboração do empresário com as investigações vinha sendo negociada há meses. Ele vazou muitas informações sobre o escândalo, fez várias ameaças, acabou fazendo o acordo.
Lula reage
Quem anda subindo nas tamancas por causa da Lava-Jato é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que começa a ser citado por envolvidos no escândalo da Petrobras em depoimentos da CPI. O escândalo desgastou o PT, motivou mobilizações de rua e panelaços contra a presidente Dilma Rousseff e já começa a desgastar a imagem do líder petista, que parecia revestida de teflon.
Na terça-feira, o ex-deputado federal Pedro Corrêa (PP-PE) — condenado no mensalão e preso pela Operação Lava-Jato — afirmou à CPI da Petrobras que foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que colocou Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento. “O diretor de Abastecimento da Petrobras, que se eu não me engano, era um tal de Manso; ele se atritou com a diretoria e o presidente Lula convidou o Paulo Roberto Costa para ser diretor de Abastecimento”, afirmou, ao comentar a nomeação do delator ao cargo, em 2004.
“Isso era a notícia que chegou para mim. O presidente Lula, depois de achar que o Paulo deveria ser diretor de Abastecimento, disse então que ele ficaria na cota de autoridades que poderiam ter a chancela do Partido Progressista”, afirmou Pedro Corrêa. Segundo ele, o acordo teria sido negociado diretamente com Lula pelo ex-deputado José Janene, envolvido no mensalão, que já faleceu.
Lula já havia reagido nas redes sociais ao depoimento do doleiro Alberto Youssef, que também dissera que o petista tinha conhecimento do esquema, segundo alguns ex-ministros. O ex-presidente da República lamentou que “parte da imprensa venha tratando bandidos como heróis”, quando “se prestam a acusar, sem provas, os alvos escolhidos pela oposição; quando se prestam a difamar lideranças que a oposição não conseguiu derrotar nas urnas e teme enfrentar no futuro”.
Pedro Corrêa é acusado de receber R$ 5 milhões do esquema de corrupção e propina na Petrobras, por intermédio do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto da Costa e do doleiro Alberto Youssef, peças centrais das investigações.
Repasse ao doleiro
O ex-vice-presidente da Mendes Júnior Sérgio Cunha Mendes confirmou ter repassado R$ 8 milhões ao doleiro Alberto Youssef. O pagamento foi feito em parcelas, a partir de contratos frios firmados com as empresas de fachada GFD Investimentos e Empreiteira Rigidez, controladas por Youssef.
Apesar de realizado na segunda-feira, o teor do depoimento de Mendes foi divulgado ontem. O empreiteiro classificou de “extorsão” a exigência do pagamento feita por Youssef. Ele também afirmou como o valor da propina era definido. “Era um valor que ele colocou, de R$ 8 milhões e alguma coisa, e foi pago relativo aos aditivos a serem aprovados, da Replan (Refinaria de Paulínia) e do TABR (Terminal Aquaviário de Barra do Riacho)”, afirmou.
Mendes, que declarou ter acertado o pagamento da propina na sede da empreiteira, em São Paulo, afirmou aos investigadores da Lava-Jato que se reuniu com Yousseff a pedido do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa. “Nesta relação que nós temos com a Petrobras, foi feito um pagamento em cima de um pedido, mas, mais que um pedido, uma espécie de pressão”, declarou.
Já o engenheiro da Mendes Júnior José Humberto Cruvinel Rezende declarou, também em depoimento no último dia 11, ter se sentido enganado por ter assinado um contrato com o GFD Investimentos. Ele garantiu à Justiça desconhecer que a empresa era de fachada.
Ontem, em Curitiba, os investigadores ouviram, mais uma vez, o doleiro Alberto Youssef, dois dias depois de ele ter confirmado à CPI da Petrobras ter entregue R$ 6 milhões a Fernando Baiano, considerado o operador do PMDB na Lava-Jato.
O teor dos depoimentos não foi revelado. Baiano, a exemplo do comportamento adotado na CPI, permaneceu calado. Aos deputados, ele afirmou preferir falar as coisas “em juízo”. Seria a primeira vez que Baiano prestaria depoimento à Justiça, desde que se tornou réu. O lobista foi preso em novembro de 2014.