quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Luiz Carlos Azedo: Melado é que é bom

O governo foi reativo em todos os momentos da Operação Lava Jato. Haja vista a forma como atuou durante a CPI da Petrobras

Correio Braziliense

O melado é um subproduto da cana, sem o valor comercial do açúcar refinado, do qual todos os bons nutrientes são retirados ao longo da produção para que fique branco. O açúcar tem calorias vazias, pobre em nutrientes, desequilibra a bioquímica do corpo. Pode causar nervosismo, TPM, problemas de pele, cansaço físico, má digestão e enfraquecimento do sistema imunológico. Seu poder energético é efêmero. Já o melado é terapêutico, harmoniza e fortalece o organismo. É bem absorvido pelas células e tem efeito sinergético. Ajuda no tratamento contra tumores, varizes, artrite, psoríase e na recuperação pós operatórias.

Graças a uma entrevista do ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, à Folha de São Paulo, descobrimos que o PT gosta de melado: “Talvez porque nunca foi treinado para isto, deve ter feito como naquela velha história: “quem nunca comeu melado, quando come, se lambuza”. Quem é treinado erra menos, talvez, né.” - disse. É um certo mea culpa por parte do ex-governador da Bahia, em relação ao profundo envolvimento do PT com os escândalos de corrupção no governo federal. Entretanto, a reação no PT não foi nada favorável ao ministro.

O ex-governador gaúcho Tarso Genro acusou Wagner de fazer coro com o antipetismo da direita e da extrema direita. No aparelho partidário, o ataque mais duro veio do representante da corrente Articulação de Esquerda, Valter Pomar: “Acho que em 1998, num encontro nacional petista, um determinado senhor disse que o problema do seu partido é que ele tinha que aprender a ser uma grande máquina eleitoral. Muitos anos depois, este mesmo senhor agora critica o seu partido porque se ‘lambuzou’”.

O problema do PT não foi se lambuzar, foi comer o melado. Ou seja, operar de maneira planejada e centralizada um esquema de financiamento eleitoral suspeito de desvio de recursos públicos em larga escala, com base no superfaturamento de obras e serviços do governo e de empresas estatais. E transformá-lo não mais em caixa dois eleitoral, como no caso do mensalão, mas, sim, em doações legais, como revela a Operação Lava-Jato.

É por essa razão que a cúpula petista estrila com a declaração. Adotou como linha de defesa, no caso do “petrolão”, a tese de que todas as doações feitas ao partido pelas empreiteiras e demais empresas investigadas pela Operação Lava-Jato foram legais. Em torno dessa tese, todos os que se beneficiaram eleitoralmente das doações estão unidos, até por uma questão de sobrevivência, o que inclui a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula.

Lambuzados
O ex-tesoureiro João Vaccari Neto, que está preso, é tratado como herói da classe operária pela cúpula da legenda. Ele matou no peito as denúncias e não aceitou acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal. Segue o mesmo padrão de comportamento de seu antecessor Delúbio Soares, que encarou o processo do mensalão, pelo qual foi condenado, de bico calado.

A presidente Dilma Rousseff tenta salvar as empreiteiras sob investigação da Lava-Jato. Alterou as regras dos acordos de leniência com empresas envolvidas em casos de corrupção por meio da MP 703, de 18 de dezembro de 2015. Mudou, assim, a Lei 12.846, de 2013, que durante a campanha eleitoral era apresentada bandeira contra os malfeitos, a Lei Anticorrupção.

A MP permite que mais de uma empresa assine o acordo de leniência — e não só a primeira a manifestar interesse, como ocorria antes. A empresa que assinar o acordo não sofrerá outro processo na esfera administrativa e poderá ter contratos com o governo, caso de praticamente todas as grandes empreiteiras envolvidas no escândalo da Lava-Jato. Os acordos seriam negociados diretamente pelo governo, sem a participação do Ministério Público, que apreciaria apenas o resultado final.

A MP 703 inviabilizaria a descoberta de corrupção na Petrobras, na escala em que aconteceu, caso estivesse em vigor no início da investigação. Por isso, a medida está gerando uma crise entre a Advocacia-Geral da União e a Controladoria Geral da União e o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União.

O corte de R$ 133 milhões no orçamento de 2016 da Polícia Federal é outro indício de que a Operaçao Lava-Jato incomoda o Palácio do Planalto. A reação dos delegados da Polícia Federal à redução dos recursos para suas operações foi de quase rebelião, o que obrigou o Ministério do Planejamento a anunciar a suplementação de verbas. Os cortes haviam sido negociados pelo governo no âmbito da Comissão Mista do Orçamento.

Trocando em miúdos, o governo foi reativo em todos os momentos da Operação Lava Jato. Haja vista a forma como atuou durante a CPI da Petrobras, quando protegeu o ex-diretor Internacional da estatal Nestor Cerveró, que a presidente Dilma havia acusado de enganá-la na compra da refinaria de Pasadena, no Texas. Na época, o discurso era defender o pré-sal e a engenharia nacional. A propósito, o que estava em jogo não era a produção de petróleo, era o melado.

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