quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Rosângela Bittar: Brasil, capital (re)baixada

• A disputa está entre a cara e a coroa da mesma moeda

- Valor Econômico

Nada a estranhar que o ministro da Saúde do Brasil largue sua responsabilidade no meio de uma epidemia de doenças mortais e corra para dar seu voto à recondução do líder que lhe deu o cargo de ministro. Nada a estranhar que a liderança do PMDB na Câmara tenha sido adquirida pelo governo na moeda corrente do Parlamento. Nada a estranhar que se dê a um o tratamento de político da alta política, e a outro, da mesma cepa, se atribua o diploma de baixa política, quando ambos são da produção (re)baixada da política.

A política brasileira está submetida à política do Rio, que está submetida a uma falsa disputa entre os deputados Eduardo Cunha e Leonardo Picciani. São do mesmo embornal, estão hoje falsamente em lados opostos mas até ontem estavam no mesmo lado, um elegendo o outro que substitui o um e assim seguem seu destino siamês. Cunha, ex-líder, fez Picciani ascender, e como toda criatura o por agora lider se rebelou quando viu que podia ter o que é seu sem intermediários. Se um estava afastado do governo, o outro correu a sentar-se no trono macio. Como seu contendor transformou-se no inimigo público exclusivo, embora haja muitos no time esquecidos pela propaganda, o novo rei virou santo.

A política brasileira está entre Cunha e Picciani. Admita-se, sem terrorismo, mas com tristeza. Pode-se dar um pelo outro sem pedir troco. Entre os dois nada há: autores de discursos, de propostas sérias, da negociação, do projeto de país.

A vantagem é de Picciani, que tem o arsenal da caneta e das verbas do governo Dilma, se é que ainda há verbas no governo Dilma e nos Ministérios que lhe foram doados. Briga doméstica, disputa entre a cara e a coroa da mesma moeda. É a política irrelevante de um Rio que aportou na política nacional e tornou o Brasil irrelevante.

Os dois, e seu grupo, influenciam tribunais, secretarias municipais, estaduais, cargos em geral, do leme ao pontal. O Rio está entregue a este PMDB, que tem também prefeito, eleito e reeleito, com uma gestão voltada para algo que não é ação sua e que ganhou de presente, a escolha da cidade para sediar a Olimpíada. E que resolveu retrucar marcando a escolha do candidato à sua sucessão com o selo da arrogância, ao insistir no carimbado por surrar a ex-mulher. Derrota encomendada, se o prefeito não estiver certo ao apostar num Rio que elege em protesto, por raiva ou pelo prazer da piada.

A gestão do PMDB no Estado foi um desastre já reconhecido pelo governador: Pezão declarou a inviabilidade da administração apesar do tratamento especial do governo federal de quem o PMDB do Rio hoje depende e a quem, por isso, apoia para o que der e vier. O problema de saúde, no Rio, foi sempre manipulado politicamente pelo governo federal em épocas de governos inamistosos no Estado, e não foi resolvido nem com terceirização. Lembre-se Humberto Costa, ministro, e Cesar Maia, no comando político, com uma eleição próxima: o governo federal não resistiu à campanha fácil. Quem se importava?

O PT não existe mais ali, os políticos com futuro, nos quais o eleitorado fazia apostas, como Alexandre Molon e Chico Alencar, saltaram fora. Não se ouve um pio de Jandira Feghali e seu PCdoB sobre a batalha do Rio no coração da política brasileira que se desenrola no Planalto Central. 

O PSB apostou numa política de celebridades com Romário, que depois provou não ser o caso, já está de saída. O PSDB também não existe mais, o brizolismo do PDT não tem Brizola, nem Darcy Ribeiro, nem Saturnino Braga. A principal frase da política sobre as pessoas honestas é do escritor Millor Fernandes sobre o Rio: Saturnino desmoralizou a honestidade. Nem assim foi possível gerir o Rio.

Marcelo Crivela faz uma política social desgarrada do partido, do Estado, lastreada na sua Igreja, com recursos que arrecada. Dizem que é o maior vendedor de discos na África.

E o curioso é que ninguém teme, pelo menos publicamente, a transposição desse calvário para a política nacional. Há exceções, claro, como tudo, algumas vindas da política que se fazia antigamente, na Guanabara. Moreira Franco virou um ideólogo do PMDB, coordenador de estudos, pesquisas e planos. Miro Teixeira incorporou uma característica dos políticos do Estado e começou a pipocar de partido em partido. Recolheu-se. Deve estar esperando passar a nuvem negra, mas será que passa? Fernando Gabeira fez algumas incursões mas depois viu que eram muitos golias para um só Davi e voltou à sua profissão original. O Luis Eduardo Soares, outra promessa, teve que sair correndo da política sob ameaças de milícias.

Essas exceções provam a vitalidade do Rio, mas têm sido um fenômeno cada vez mais raro. As ervas daninhas sufocam o broto.

Mercadante
O ministro Aloizio Mercadante (Educação) está cotado para assumir o cargo de representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional ou no Banco dos Brics, onde hoje estão, respectivamente, Otaviano Canuto e Paulo Nogueira Batista Junior.

Seria uma espécie de capitulação antecipada: o político não seria mais candidato em 2018 nem a presidente, nem a governador, nem a senador, iniciando desde agora uma carreira de relevância em organismo internacional. Não se pode dizer que já exista decisão e arrumação de malas, mas um forte início de negociação a se acompanhar nas definições das futuras candidaturas do PT.

Banco Central
Há os que estranharam a violência e agressividade do procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira, ao falar sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, em entrevista a Juliano Basile, nos Estados Unidos. Ataque mais forte até que os de Rodrigo Janot, e em tom muito mais alto do que qualquer um que tenha sido adotado por Luis Adams, o Advogado Geral da União que deixará o cargo até o fim deste mês. Portanto, um barulho excessivo, desproporcional, para o único cargo vago a que Isaac poderia estar se candidatando à escolha da presidente Dilma, a quem provavelmente pensa estar defendendo.

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