sexta-feira, 17 de junho de 2016

A cada novo escândalo – Editorial / Folha de S. Paulo

Na breve carta com que se desligou do Ministério do Turismo nesta quinta-feira (16), Henrique Eduardo Alves (PMDB) manifestou um desejo impossível: "Não quero criar constrangimentos ou qualquer dificuldade para o governo".

Tarde demais. A queda de Alves representa inevitável fonte de desconforto para o presidente interino, Michel Temer (PMDB) —e não só porque nenhuma administração poderia enfrentar sem embaraço a perda de um ministro suspeito de receber recursos ilícitos.

Não se trata apenas de lembrar que já se sabia, quando o peemedebista potiguar passou a integrar o governo Temer, que a Operação Lava Jato estava no seu encalço.

Nem de mencionar que, na semana passada, o presidente interino manteve o correligionário no cargo apesar do noticiário. Segundo informou esta Folha, o procurador-geral da República disse ao Supremo Tribunal Federal que Alves atuou para obter dinheiro desviado da Petrobras em troca de favores à empreiteira OAS.


Tendo atravessado esses dois obstáculos, o peemedebista não resistiu à delação premiada de Sérgio Machado. O ex-presidente da Transpetro afirmou que, de 2008 a 2014, intermediou o pagamento de R$ 1,55 milhão em propina para Alves. Foi a gota d'água.

Somados, esses episódios já bastariam para levar constrangimento e dificuldade à porta do presidente interino. Há mais, contudo.

Alves não é o primeiro nem o segundo ministro a deixar o governo Temer em meio a circunstâncias desabonadoras ou escandalosas, mas o terceiro —e isso para uma administração que ocupa o Planalto há apenas cinco semanas.

Para completar o quadro, na manhã desta quinta, o presidente interino fez um pronunciamento duro, com o qual decerto pretendia se desvencilhar, tanto quanto possível, da delação de Sérgio Machado.

Irresponsável, leviana, mentirosa e criminosa: essas as palavras de Temer para se referir à acusação de que teria negociado o repasse de R$ 1,5 milhão à campanha de Gabriel Chalita (ex-PMDB) à Prefeitura de São Paulo, em 2012.

Ocorrendo horas depois, a demissão de Henrique Eduardo Alves impediu que o tom indignado do presidente interino reverberasse por muito tempo.

Ao montar um gabinete parlamentarista e restringir os nomes de excelência sobretudo à área econômica, Michel Temer aceitou correr um risco. Fez vista grossa em troca de maior governabilidade no Congresso, apostando que seus notáveis manteriam sob controle ao menos os mercados.

A estratégia, por enquanto, mostra-se acertada. Cada vez mais, contudo, cresce a percepção de que tudo o que Temer faz no Palácio do Planalto é administrar o escândalo de hoje apenas para enfrentar o de amanhã.

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