segunda-feira, 13 de junho de 2016

Empresários veem saída da crise, mas esperam medidas

Por Marta Watanabe, Ligia Guimarães e Marina Falcão - Valor Econômico

SÃO PAULO E RECIFE - A economia brasileira, em recessão há dois anos, pode ter chegado ao "fundo do poço". Relatos de empresários e associações do setor produtivo ouvidos pelo Valormostram que boa parte das empresas já se ajustou e há sinais de melhora da confiança, o que pode levar ao início de um ciclo de recuperação econômica a partir do segundo semestre.

Os empresários, porém, ainda demonstram cautela para retomar os investimentos e esperam medidas mais concretas do governo. Aguarda-se uma definição melhor do cenário político, além de estabilidade cambial, redução dos juros e maior disposição dos bancos para emprestar. Quase todos os segmentos reclamam de problemas de crédito, seja pelo custo ou pela escassez.

"A confiança só não melhorou mais por causa das incertezas na esfera política", diz Flávio Rocha, presidente da rede de lojas Riachuelo. Para ele, houve 100% de acerto na escolha da equipe econômica. "É a volta do protagonismo da livre iniciativa, superando o protagonismo do Estado. É uma mudança ideológica", afirmou o empresário.

Rocha acredita que o "fundo do poço" foi em abril, quando uma sondagem com 600 executivos de compras apontou queda de 10,8% das vendas na comparação anual. Em maio, a retração caiu para 7%, em junho para 6% e tudo indica, pelo levantamento preliminar, que o número voltará a ficar positivo em agosto.

Indicadores de confiança dos empresários começam também a melhorar. "Após acomodar em torno de 70 pontos desde setembro passado, o Índice de Confiança Empresarial (ICE) dá sinais de descolamento. Por enquanto, a melhora é concentrada nas expectativas", diz Aloisio Campelo, superintendente Adjunto de Ciclos Econômicos do Ibre/FGV.

No caso do consumidor, explica Campelo, os resultados ainda são dúbios. "Claro que a melhora na ponta abre uma brecha para a interpretação de 'recuperação'. Mas uma leitura honesta do gráfico não permite muito otimismo por enquanto", observa.


Empresário já enxerga 'estabilização', mas quer mais sinais para investir
O "fundo do poço" da crise pode ter sido atingido e a recuperação da economia parece estar sendo conduzida pelo rumo certo pela equipe econômica do governo interino de Michel Temer. Os relatos de empresários e associações do setor produtivo mostram que boa parte das empresas já fez ajustes de estoque e estrutura e vê sinais de melhora da confiança, o que poderia levar a um ciclo melhor a partir do segundo semestre. No entanto, eles ainda demonstram cautela para retomar os investimentos e aguardam medidas mais concretas do governo e uma acomodação maior de alguns riscos no horizonte, como questões do próprio cenário político e o nível do câmbio.

Uma definição melhor da visibilidade também poderia, quem sabe, ganhar ajuda de uma taxa de juro mais baixa e de uma disposição maior dos bancos a emprestar. Isso porque quase todos os segmentos ainda reclamam de problemas de crédito, seja pelo alto custo ou pela escassez. Os próximos meses deverão ser, dessa forma, cruciais para definir se o governo será capaz de coordenar ações que estimulem uma volta mais alentada da produção ou se haverá apenas uma espécie de estabilização, na qual a atividade para de piorar mas não se recupera de forma mais significativa.

"A confiança só não melhorou mais por conta das incertezas na esfera política", diz Flávio Rocha, presidente da rede de lojas Riachuelo. Para Rocha, houve 100% de acerto na escolha da equipe econômica. "É a volta do protagonismo da livre iniciativa superando o protagonismo do Estado. É uma mudança ideológica", afirmou o empresário. Rocha, que também é vice-presidente do Instituto de Vendas no Varejo (IDV), acredita que o fundo do poço foi em abril, quando a sondagem da entidade com 600 executivos de compras apontou queda de 10,8% das vendas na comparação anual. Em maio, a retração caiu para 7%; em junho para 6% e, tudo indica, pelo levantamento preliminar, que o número voltará ao azul em agosto.

Para Rocha, o único temor é de que a crise política contamine a estrada econômica. E ele não é o único com essa preocupação. "Já conseguimos enxergar uma luz no fim do túnel. A incerteza agora está na questão política, mas a economia está encaminhada com as pessoas certas nos lugares certos", afirma Paulo Sales, presidente executivo do grupo pernambucano Baterias Moura, fabricante da baterias automotivas. Ele cita como exemplo as nomeações de Pedro Parente para a condução da Petrobras e de Henrique Meirelles para o ministério da Fazenda. "Quem está tocando a economia não são mais políticos", diz.

Os índices de confiança monitorados pela Fundação Getulio Vargas também mostram sinais nesse sentido. "Após acomodar em torno de 70 pontos desde setembro passado, o Índice de Confiança Empresarial (ICE) dá sinais de descolamento. Por enquanto, a melhora é concentrada nas expectativas", diz Aloisio Campelo, superintendente Adjunto de Ciclos Econômicos do Ibre/FGV. "No caso do consumidor, os resultados são ainda dúbios. Claro que a melhora na ponta abre uma brecha para a interpretação de 'recuperação'. Mas uma leitura honesta do gráfico não permite muito otimismo por enquanto", completa ele.

Marcos Guimarães, dono da fabricante de produtos farmacêuticos Divcom, também de Pernambuco, diz que tem um sentimento de que "o pior já passou", embora uma mudança de atitude do consumidor ainda não possa ser sentida no setor. "Acho que o consumidor pode começar a reagir no segundo semestre. É natural que a confiança volte primeiramente no meio empresarial, que tem mais informação sobre o mercado", afirma o empresário. "O crédito com juro a 24% ao ano é uma preocupação geral. Qual o segmento que tem um retorno desses?", diz Guimarães, que aposta numa tendência de queda da Selic. As condições de crédito estão entre os pleitos feitos por empresários na semana passada em encontro com o presidente interino (ver matéria abaixo).

Na visão de Walter Cover, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), a confiança das famílias e dos investidores ainda precisa de sinais positivos do governo Michel Temer para dar indícios de retomada. Após acumular em 2016 até maio queda de quase 16% nas vendas de materiais de construção no varejo e de quase 14% nas vendas para as construtoras, o setor vive um momento "estável no fundo do poço", com algum viés de melhora em maio, segundo a entidade.

Sondagem da Abramat entre as indústrias de material de construção indica que 22% das empresas estão otimistas sobre as ações do governo para o setor da construção civil nos próximos 12 meses. Em abril, 6% das empresas estavam otimistas. A sondagem indica ainda que 50% das indústrias de materiais pretendem investir nos próximos 12 meses. No mês anterior, 39% das empresas pretendiam investir. "Pode ter sido pela mudança de governo. Quero esperar um pouco para ver se isso se reverte em investimento", disse.

Para o presidente da fabricante de brinquedos Estrela, Carlos Tilkian, o novo governo interino já deu "sinais positivos" e melhorou as expectativas, principalmente pela qualidade da equipe econômica e pelo foco no ajuste fiscal, aliado à perspectiva de um início da redução de taxa de juros, "extremamente importante para se voltar a ter um aumento de consumo". "Medidas reais? Não, não aconteceu nada ainda. Mas a minha percepção é de que existe uma perspectiva mais favorável", diz.

Como, para a produção de brinquedos, as datas mais importantes são o Dia das Crianças e o Natal, ambas no segundo semestre, "até lá a coisa tende a estar mais definida. O jogo estará jogado, seja qual for, e as pessoas têm que se concentrar em tocar a vida para frente", diz. A expectativa mais positiva, diz o empresário, também estimula, vagarosamente, empresas a não mais adiarem investimentos. "E a, pelo menos, estancar o processo de desemprego". A expectativa é elevar a produção no segundo semestre, graças ao espaço deixado pelas importações.

Em meio à crise, a Marcopolo conseguiu garantir uma fatia de mercado de 40%, mas viu sua produção física cair na mesma proporção da produção total de ônibus no mercado doméstico, que saiu de 32 mil para 9 mil unidades ao ano de 2014 até agora. A expectativa para o ano, diz Paulo Corso, diretor de operações comerciais da empresa, é ainda de produção total de 9,2 mil ônibus no mercado doméstico. Com o cenário, a empresa cortou 20% do quadro de pessoal de 2014 para o ano passado. O forte ajuste permitiu que a empresa mantivesse estável o número de funcionários desde então e as demissões não estão no horizonte neste ano. A sensação, diz o executivo, é que a economia chegou ao 'fundo do poço', com expectativa de início de recuperação gradual somente para os próximos dois anos.

"A economia não deve se recuperar em 2016 e teremos problemas em 2017. Em 2018, teremos lentamente uma melhoria". Segundo Corso, a expectativa de recuperação mais remota da economia deixa de lado novos projetos de investimento. Ele ressalta que, no primeiro trimestre, a Marcopolo investiu R$ 34,1 milhões na fábrica da Volare, na cidade capixaba de São Mateus. Essa aplicação se deu porque o investimento já havia se iniciado anteriormente. Com exceção desses casos, afirma, os investimentos no curto prazo estão restritos ao necessário. "É preciso acompanhar os movimentos do novo governo e ver o que ainda acontecerá politicamente."

Após nove meses de quedas profundas na produção mês a mês, a Associação Brasileira de Papelão Ondulado (ABPO) vê certa estabilidade em maio. "O pior momento foi o segundo semestre do ano passado inteiro, em que todos os meses houve queda de 4% sobre o ano anterior. E os três primeiros meses do ano, em que a demanda veio caindo mês a mês. Agora se estabiliza, o que sugere que pode ter chegado ao fundo do poço, e com uma recuperação lenta", diz Sergio Ribas, diretor da ABPO.

Em maio, a associação registrou a expedição de 271 mil toneladas de caixas, acessórios e chapas de papelão ondulado, indicador usado para medir a atividade da indústria. O dado é estável tanto em relação a abril, quando a expedição ficou em 270 mil toneladas, quanto em relação a um ano antes, 272 mil. A base de comparação é baixa - os segundos trimestres de 2014 e 2015 foram péssimos, com Copa do Mundo e agravamento da crise. "Esse ano estamos vendo um segundo trimestre ruim, mas nos mesmos níveis", diz. "Eu imagino que pare de cair agora e a gente pode até começar a ver alguma recuperação tímida", diz Ribas, que não vê retomada de investimento, porque as empresas têm parques ociosos e alto endividamento.

Beneficiada pelo processo de substituição de importações propiciado pela valorização do real frente ao dólar, a Döhler, indústria têxtil de cama, mesa e banho, tem conseguido manter produção em plena capacidade e chegou a empregar 170 pessoas dentro do quadro atual de 3 mil funcionários.

Mesmo assim, diz o diretor comercial da empresa, Carlos Alexandre Döhler, o olhar para os próximos meses é de cautela. A empresa, ressalta, conseguiu manter sua produção física no primeiro trimestre do ano, com alta de 8% no faturamento, mas o resultado da empresa ficou praticamente igual pela impossibilidade de repassar a pressão de custos com inflação e câmbio ao preço. Isso fez cair a margem das vendas ao mercado doméstico. Há uma preocupação em relação ao quadro político. "O processo de impeachment já foi iniciado, mas e se houver o retorno de Dilma?", diz.

A expectativa por enquanto é de um segundo semestre melhor do que o primeiro, mas Döhler afirma que esse prognóstico se baseia na sazonalidade, porque historicamente a segunda metade do ano traz mais resultados que a primeira. Há um otimismo maior, diz ele, por conta da transição política, mas isso ainda não se reverteu em encomendas que possam prever uma economia doméstica mais vigorosa para os próximos. "Nós batemos o fundo do poço e levará um tempo para sair dele."

Com o plano de recuperação judicial aprovado em julho do ano passado, a fabricante de eletrodomésticos Latina tem a metade da capacidade de produção de 2014, mas conseguiu elevar a margem em 3% depois de mudança de estratégia para reduzir custos, segundo o presidente da empresa, Valdemir Dantas.

As vendas, porém, enfrentam ainda a cautela do consumidor, que desacelerou o ritmo de renovação de eletrodomésticos. "Hoje corre-se o risco de ficar sem o produto na loja em vez de ficar com o produto parado no estoque". Neste ambiente, diz, não há como investir: "Não temos reação da demanda. O bom humor precisa chegar mais ao consumidor, ao varejo e, por último, à indústria." (Colaborou Tainara Machado)

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