terça-feira, 14 de junho de 2016

Os riscos da atual política econômica - Yoshiaki Nakano

• A esperança mudou porque os indicadores sinalizam que talvez o "fundo do poço" tenha sido atingido em abril

- Valor Econômico

Após um mês de governo Temer, a avaliação da opinião pública não mudou substancialmente. A maioria da população se mantém cautelosa não acusando mudanças no país. Entretanto Michel Temer tem uma avaliação menos negativa do que Dilma Rousseff. No mundo empresarial, com a nomeação de uma equipe econômica menos intervencionista e mais pró-mercado, a reação foi positiva, mas ainda com cautela diante das incertezas políticas e no aguardo de medidas mais concretas do governo. Aguardam uma definição melhor, principalmente da estabilidade cambial, redução nas taxas de juros e medidas para aliviar a crescente perda de caixa e pressão do endividamento sobre a solvência das empresas.


Portanto, voltou alguma esperança, mas a crise de confiança e queda nos investimentos não foram revertidas. A esperança mudou porque os indicadores sinalizam que talvez o "fundo do poço", em termos de nível de atividade econômica, tenha sido atingido em abril. Em maio e junho, a queda no nível de atividade sofreu uma desaceleração. Portanto, a reversão, se ocorreu, aconteceu ainda no governo Dilma. Somente medidas mais concretas de estímulo à economia poderão trazer maior confiança de que o pior já tenha passado.

A análise dos episódios bem sucedidos de ajuste fiscal mostram que é necessário um forte corte, e rápido, nas despesas correntes do governo. Neste caso, os efeitos negativos da contração fiscal são menores e a recuperação econômica mais rápida. Ajustes fiscais com aumento de impostos, em geral, não são bem sucedidos, no sentido de que em cerca de três anos as despesas continuam crescendo e, com isto o endividamento público.

O que é mais importante é observar que em muitos episódios fiscais, além de fortes e críveis medidas de ajuste nas despesas correntes, há medidas adicionais sincronizadas de estímulo econômico. Tais como a desvalorização cambial e queda na taxa de juros, que recompõem a confiança de imediato, com retomada dos investimentos e do consumo, com consequente retomada do crescimento.

Este é o modelo que deveria ter sido adotado há pelo menos três anos. Agora é tarde, após dois anos de recessão e contração no PIB de mais de 8% e taxa de desemprego ultrapassando a casa dos 11%, um programa que envolva forte ajuste fiscal necessário para estabilizar a dívida pública em relação ao PIB é politicamente inviável. Vale lembrar que o déficit global do governo brasileiro é gigantesco. A definição relevante é o déficit nominal global isto é, a necessidade de financiamento do setor público, que alcançará este ano entre R$ 550 e R$ 600 bilhões, que é a quantia que a dívida pública aumentará este ano, pressionando o mercado financeiro num quadro econômico em que a taxa de poupança vem caindo.

No quadro atual, no curto prazo, o ajuste fiscal terá que ser gradual. Em compensação é fundamental que medidas de reforma institucional, com efeitos no longo prazo, sejam tomadas o mais rapidamente possível. Estas últimas medidas poderão recompor a confiança de imediato, pois os agentes econômicos tendem a antecipar as medidas. Se juntamente com estas reformas de controles fiscais tivermos medidas críveis de estímulos à atividade econômica, como a estabilização da taxa real de câmbio num nível competitivo, capaz de alavancar o início de recuperação industrial com recuperação das exportações e a redução na taxa de juros, teremos um programa de ajuste fiscal viável.

Tanto a estabilização da taxa de câmbio como a redução na taxa de juros são perfeitamente justificáveis num quadro de política macroeconômica consistente. A taxa de câmbio já oscilou entre R$ 3,80 a R$ 4 por dólar, por período suficientemente prolongado, para ter seus efeitos inflacionários. A apreciação cambial que estamos assistindo é contrária ao interesse nacional, pois coloca em dúvida a recuperação iniciada na indústria com aumento de exportações e não está trazendo a taxa de inflação para baixo. A taxa elevada de desemprego e controle fiscal controlam as expectativas inflacionárias. Uma taxa de juros de 14,25%, como a que temos hoje, abortará qualquer possibilidade de recuperação.

A volta da taxa de câmbio para níveis mencionados acima daria um grande impulso às exportações, particularmente se houver uma garantia institucional da sua estabilização, sem comprometer a inflação, sobretudo se a regra de expansão dos gastos nominais proposta pelo governo for aprovada. A rigor, uma regra de expansão dos gastos públicos, no máximo igual à inflação do ano anterior, significa a imposição de uma nova âncora nominal para a taxa de inflação.

Esta medida teria uma eficácia e credibilidade maior se fosse concebida com um programa fiscal, que num prazo de quatro ou cinco anos estabelecesse como meta a neutralidade fiscal, isto é, zerar o déficit global (déficit primário + gastos de juros) no sentido estrutural. Com isto, o país se comprometeria com uma política fiscal, que quando a economia atingisse o PIB potencial, a política fiscal seria neutra, com déficit zero. Política fiscal ativa, isto é, déficit público seria justificado se a economia estiver abaixo do seu potencial.
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Yoshiaki Nakano, com mestrado e doutorado na Cornell University, é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

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