terça-feira, 28 de junho de 2016

Para todos os discursos

• Perícia atesta ação de Dilma em decretos, mas não em ‘pedaladas’; os dois lados exploram laudo

Eduardo Bresciani - O Globo

A perícia feita por técnicos do Senado no processo de impeachment concluiu que houve violação à legislação tanto nas chamadas “pedaladas fiscais” quanto na edição de decretos de crédito suplementar, mas não identificou ato direto da presidente afastada, Dilma Rousseff, no primeiro caso. O laudo vai subsidiar a decisão dos senadores, e foi explorado tanto pela defesa de Dilma quanto pela acusação.

O documento reconheceu como operações de crédito os atrasos de pagamentos do Tesouro ao Banco do Brasil por despesas relativas ao Plano Safra de 2015, prática que viola a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Esse é o único caso de “pedaladas fiscais” do ano passado que consta da denúncia original. A lei do impeachment enquadra como crime de responsabilidade “efetuar operação de crédito sem autorização legal”.

“Os atrasos de pagamentos devidos ao Banco do Brasil constituem operação de crédito, tendo a União como devedora, o que afronta ao disposto no art. 36 da LRF”, diz trecho do laudo.


Os peritos, porém, dizem não ver, nesse caso, participação da presidente. “Pela análise dos dados, dos documentos e das informações ao Plano Safra, não foi identificado ato comissivo da Exma. Sra. Presidente da República que tenha contribuído direta ou indiretamente para que ocorressem os atrasos de pagamentos”, afirmam.

Ao responder questionamento do relator, Antonio Anastasia (PSDB-MG), os peritos ressalem tam que nem no envio do projeto de Lei Orçamentária de 2015, nem na sanção do projeto após a tramitação no Congresso, os recursos alocados para o pagamento da equalização de juros do Plano Safra seriam suficientes para quitar o débito que havia com o Banco do Brasil. Em janeiro de 2015, a dívida era de R$ 10,9 bilhões, enquanto o Orçamento, que incluía novas operações, reservou R$ 8,4 bilhões.

Em relação aos decretos, os peritos apontam que três dos quatro que estão em análise descumpriram o artigo da Lei Orçamentária que permitia a edição apenas quando fossem “compatíveis” com a meta fiscal. Nesse caso, houve ato da presidente “sem controvérsia” sobre a autoria.

“Nesse cenário, dos quatro decretos não numerados, que abriram crédito suplementar, três deles promoveram alterações na programação orçamentária incompatíveis com a obtenção da meta de resultado primário vigente à época da edição dos decretos”, afirmam os peritos.

Dilma considera que o laudo constatou que ela não praticou crime.

— Hoje ficou caracterizado pela própria perícia feita pelo Senado que os motivos pelos quais eles me acusam não caracterizam crime. A própria perícia disse que não são seis decretos, são três. E nesses três decretos não foi constatada nenhuma participação dolosa minha. Ou seja, não há em nenhum momento um alerta ou um parecer técnico, uma avaliação que diga: olha, presidente, se você assinar esse decreto você estará comprometendo a meta fiscal. A cada dia que passa, fica mais claro que esse processo de impeachment não tem base legal e por isso se caracterizaria como golpe — afirmou Dilma, entrevista à Rádio Guaíba.

Na resposta à pergunta da acusação, o laudo aponta que os decretos provocaram uma expectativa de aumento do déficit nas contas públicas. “Dessa maneira, considerando a edição dos quatro decretos ora analisados, o efeito negativo sobre o resultado primário esperado foi de R$ 1,75 bilhão”, afirmam. Ao responder pergunta da defesa, os peritos reconhecem que não há impacto direto na meta, mas apontam que eles criam dificuldade em se alcançar o objetivo. Ressaltam que foi possível mapear a existência de alguns pagamentos com base nos recursos liberados pelos decretos com a análise da execução orçamentária, o que seria mais um instrumento a corroborar o descumprimento da legislação.

Os peritos responderam a 99 questionamentos feitos por defesa, acusação e senadores. O laudo tem 223 páginas. As partes e os senadores terão até as 10h de hoje para apresentar pedidos de esclarecimentos. Os peritos terão até sexta-feira para responder às dúvidas. A partir daí, defesa e acusação terão até o dia 4 de julho para apresentar seus laudos. No dia seguinte, a comissão ouvirá o coordenador da perícia e um assistente técnico indicado por cada parte. Esse trâmite da perícia é a última diligência prevista. Por isso, está marcado para o dia 6 de julho o depoimento de Dilma.

(Colaborou Catarina Alencastro)

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