terça-feira, 30 de agosto de 2016

À espera da fase mais difícil do governo - Fernando Exman

• Temer deve manter aliados à frente da Câmara e do Senado

- Valor Econômico

Assim que for confirmada pelo Senado a interrupção do mandato de Dilma Rousseff na Presidência da República, acredita Michel Temer, terá início o período mais difícil do seu governo. Com uma menor complacência dos mercados, assim como dos eleitores que ocuparam as ruas para apoiar o processo de impeachment mas nem por isso estão ao lado do presidente interino, será a hora de o Executivo começar a apresentar resultados concretos no ajuste fiscal e em suas ações voltadas à recuperação da economia. Sem previsibilidade e estabilidade política, Temer não conseguirá atingir esses objetivos. Além de dar agilidade à sua agenda legislativa, ele precisará trabalhar para garantir que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal permaneçam sob o controle de aliados de sua confiança a partir de fevereiro de 2017.

O cenário é desafiador, sobretudo porque as expectativas da maioria da população e do mercado em relação aos gastos do governo tendem a ser conflitantes a curto prazo.


Temer terá de recuperar a esperança das famílias de que a economia e o emprego voltarão a crescer. Não poderá também deixar dúvidas em relação ao seu compromisso com o combate à corrupção. Em paralelo, precisará convencer empresários e investidores do seu comprometimento em sanar as contas públicas. Isso tudo num pequeno espaço de tempo: concluídas as eleições municipais de outubro, o Parlamento também passará a se concentrar nas articulações para a escolha das suas próximas mesas diretoras. Oposição e setores da coalizão governista dificilmente aceitarão que o partido de Temer acumule as chefias do Executivo e das duas Casas do Legislativo. Mas o Planalto, pelo menos a princípio, não pretende ver o PMDB abrir mão das presidências da Câmara e do Senado no ano que vem.

Temer precisará lidar com as divisões de seu partido e o risco de ficar refém de aliados com interesses diferentes do seu no processo sucessório de 2018. No Senado, onde o partido detentor da maior bancada indica o presidente, o PMDB deve permanecer na presidência. Um postulante ao cargo hoje ocupado por Renan Calheiros (AL) é o senador Eunício Oliveira (CE), atual líder do PMDB na Casa. Articuladores políticos do Palácio do Planalto não teriam resistências à possibilidade de emergir a candidatura de Romero Jucá (RR), caso ele não retorne ao Ministério do Planejamento. O parlamentar, que passará a presidir o PMDB quando Temer assumir definitivamente a Presidência, é visto no Executivo como um senador com grande traquejo para manejar os interesses do governo no Congresso.

A disputa com maior potencial de desarranjar a base, contudo, é a eleição na Câmara. Deputados já se queixam da falta de atenção dada pelo Palácio do Planalto nos últimos meses, quando o governo passou a voltar-se mais para o Senado, depois que aprovaram o impeachment e remeteram o caso para os senadores.

O governo tem enfrentado maiores problemas para reunir o quórum necessário à aprovação de projetos de seu interesse justamente na Câmara dos Deputados. Não conseguiu concluir com rapidez a votação da proposta de renegociação das dívidas dos Estados com a União. Também precisará correr contra o tempo para evitar que a medida provisória relativa à modelagem do Programa de Parcerias de Investimentos perca a validade, o que ocorrerá já no dia 8 de setembro. O PPI é a iniciativa responsável pelos projetos de concessão e privatização do governo Temer, aposta para a atração de investimentos.

No Senado, por outro lado, o governo conseguiu acelerar a votação da proposta que prorroga e amplia a Desvinculação de Receitas da União (DRU). Também tem conseguido impor um ritmo rápido o suficiente no próprio processo de impeachment a fim de garantir que Michel Temer consiga desembarcar na China, no fim desta semana, já como presidente da República efetivo.

No entanto, é também no Senado onde o PSDB apresentou as principais críticas ao governo interino. Para senadores tucanos, a administração Temer não tem repelido da forma desejada iniciativas que possam comprometer o ajuste fiscal. Auxiliares de Temer avaliam que tal postura tem como objetivo minar a eventual candidatura à Presidência do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em 2018. E consideram ainda que ela está relacionada a uma tentativa do PSDB de vincular as articulações para a próxima eleição na Câmara dos Deputados às conversas que buscam consolidar a base aliada, num momento em que o PMDB não tem um nome natural para a vaga.

O PSDB quer emplacar o atual líder do partido na Câmara, deputado Antonio Imbassahy (BA). Uma solução à qual o Planalto não se oporia é a reeleição do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Essa saída evitaria surpresas, uma vez que Temer e Maia estão em sintonia, mas dependeria de uma alteração na Constituição. Na última vez que o assunto entrou em pauta na Câmara, proposta nesse sentido perdeu por apenas cinco votos. Patrocinada em 2004 pelo então presidente João Paulo Cunha (PT-SP), a ideia teve como obstáculo Renan Calheiros, que não queria ver José Sarney (PMDB-AP) reeleito no Senado.

Nos próximos anos, o presidente da Câmara exercerá na prática o papel de vice-presidente da República. Assumirá a chefia do Executivo toda vez que Temer, hoje animado com a perspectiva de intensificar sua agenda internacional para promover o Brasil, deixar o país. Também será ele quem decidirá se aceita eventuais novos pedidos de impeachment, e a experiência de Dilma com o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é mais um exemplo de que é arriscado demais para um presidente da República ver um adversário à frente da Câmara.

Integrantes da banca de defesa da presidente afastada acreditam que novas ondas de denúncias na Operação Lava-Jato podem abalar o governo que se inicia. Talvez só assim a proposta defendida há meses por Dilma de um plebiscito sobre a antecipação das eleições gerais, hoje considerada até pelo PT algo difícil de prosperar, ajude-a a melhorar a forma em que será descrita nos livros de história.

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