terça-feira, 30 de agosto de 2016

Dilma em estado puro - Ricardo Noblat

- O Globo

Na manhã de ontem, houve um momento que, em resposta a um senador, a presidente afastada, Dilma Rousseff, comentou uma lei do governo Fernando Henrique Cardoso. Sopraram-lhe ao ouvido que a lei era do governo Itamar Franco. E Dilma corrigiu-se: “A lei do governo Itamar, em transição para o governo Fernando Henrique...”

Era Dilma em estado puro. Arrogante como de hábito. Incapaz de reconhecer erros. Pronta para atribuir à crise internacional a mais grave recessão econômica que o Brasil já viveu dos anos 30 do século passado para cá. Disposta a valer-se, no seu depoimento, do meio que encontrou para sobreviver às torturas quando presa: mentir. Mentir sempre.

Frustrou-se quem esperou a aparição de uma nova Dilma, mais emotiva, falsamente modesta, sorridente se fosse necessário. Fora aconselhada a se comportar assim para ganhar a simpatia de senadores ainda capazes de absolvê-la. Dilma preferiu-se exibirse como é. E não foi bem-sucedida, como alguns de seus correligionários reconhecem.


No discurso inicial, retomou tudo o que vem dizendo desde que foi afastada do cargo. Chamou o impeachment de golpe de Estado. Acusou a oposição de ter sabotado seu governo. Atacou as elites e a mídia. E antecipou a decisão de recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso acabe condenada. Ela só aceita ser absolvida.

Perguntaram-lhe como um golpe de Estado poderia estar sendo comandado em seu desfecho pelo ministro Ricardo Lewandowisk, presidente do Supremo. Ela driblou a pergunta. E, diante de seus juízes, os senadores, e dos brasileiros que a assistiam na TV, repetiu que a democracia entre nós está ameaçada.

Dilma não foi ao Senado atrás de votos. Foi atrás de uma tribuna, amplificada pelo rádio e pela televisão, para falar ao país e burilar a imagem que gostaria de deixar de presidente (ou melhor, “presidenta”) da República reeleita com 54 milhões de votos e derrubada sem que tivesse cometido crime algum.

Até semana passada, ela ainda hesitava em comparecer ao Senado para defender-se. Foi convencida a fazê-lo. Há três filmes de pessoas simpáticas a ela que precisavam de tais imagens. E ela não deveria perder essa oportunidade, mais ainda tendo assegurado o direito à última palavra no debate com os senadores.

Hoje à noite, ou na madrugada de amanhã, terá seu mandato cassado e seus direitos políticos suspensos por oito anos.

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