sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Rombo de julho - Míriam Leitão

- O Globo

Contas públicas tiveram um forte rombo em julho. O governo anunciará no fim de agosto que o déficit primário de julho cresceu muito em relação ao mês anterior. As contas não estão encerradas, mas devem fechar com um dado negativo entre R$ 16 bilhões e R$ 18 bilhões, mais do que o dobro do número de junho. Em parte, porque a conta de subsídios ficou em R$ 9,4 bilhões, com os financiamentos a juros baixos concedidos a empresários e agricultores.

Apesar de mais esse dado ruim, o governo diz que continua comprometido com a meta de R$ 170,5 bilhões de déficit este ano. Nos meses de maio e junho, houve forte frustração de receita — R$ 8,8 bilhões — e houve também aumentos inesperados de despesa, como o gasto com o estado do Rio. Já em julho, não houve frustração de receita; ela ficou dentro do esperado, só que continua em tendência declinante.


O déficit primário será alto em julho em grande parte pela conta de subsídios aos empresários através dos programas do BNDES (PSI) e do Banco do Brasil (Plano Safra), que pela lei tem que ser paga a cada semestre, em julho e dezembro. Como sabem todos os que acompanham as sessões do impeachment no Congresso, não dá para deixar de quitar esses valores com os bancos públicos. No caso do BNDES, são subsídios concedidos pelo governo Dilma, no caso do Plano Safra, são benefícios que existem há décadas aos empresários do agronegócio.

Apesar do mar vermelho de julho, os técnicos do governo dizem que a meta será cumprida. Se houver risco isso ficará claro nos próximos dois relatórios fiscais bimestrais e, então, o governo vai contingenciar o gasto para evitar o estouro desse limite.

Nos últimos dias começou a se espalhar a impressão de que o governo pode estourar a meta fiscal e que fez concessões demais aos estados. Fontes do Ministério da Fazenda negam que a meta vá ser superada e admitem que o contingenciamento não é o ideal, mas será usado se houver esse risco. Quanto aos estados, admitem que o ideal seria que tivesse sido aprovado o congelamento do salário dos servidores. Alguns governadores pediram que esse mecanismo fosse incluído para que tivessem mais força para resistir às pressões em seus estados. O problema é que, na hora da votação, os governadores não se mobilizaram.

— Poucos vieram a Brasília e só a secretária de Fazenda de Goiás, Ana Carla Abrão, se mobilizou mais fortemente para tentar convencer os parlamentares. Ao fim, esse inciso foi retirado. Porém, como 60% dos gastos são com pessoal, o teto (que limita o aumento da despesa à inflação do ano anterior) acaba, indiretamente, controlando os salários também — disse uma dessas fontes.

Além disso, os estados têm um controle extra sobre suas contas através dos PAFs (Programa de Ajuste Fiscal) que cada estado tem com o Tesouro. Esse pode ser o instrumento de maior controle sobre o crescimento das despesas. A preocupação em Brasília é que os estados aproveitem o benefício — mais 20 anos de prazo para a dívida e dois anos de abatimento nas prestações mensais — para regularizar o pagamento em 2018.

O governo diz que a exigência de teto para o crescimento das despesas que ele faz aos estados é a mesma que faz para si próprio.

— Havia uma impressão de que a PEC do teto de gastos fosse fraca, mas agora, que ela começou a tramitar, as reclamações estão ficando cada vez mais fortes porque as pessoas passaram a entender que a emenda vai realmente disciplinar as despesas. Teremos que trabalhar duramente no convencimento dos parlamentares sobre a importância dessa medida — diz um integrante do governo.

O governo sabe que até agora teve o benefício da dúvida que recebe toda administração que começa. E essa começou de forma provisória. Hoje o governo Temer completa três meses e tem a chance real de permanecer após o julgamento do impeachment da presidente. As cobranças serão maiores.

A crise fiscal é muito séria, como mostra o mês de julho. Ele não surpreendeu negativamente na arrecadação. O governo teve uma receita próxima da que havia previsto, mas os dados continuam sendo de queda em relação ao ano passado, que já era recessivo. Os compromissos assumidos pelo governo anterior, como os subsídios aos empresários, e a sempre crescente despesa previdenciária, tornam difícil a tarefa de equilibrar as contas públicas. Tudo isso pesou em julho.

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