sexta-feira, 2 de setembro de 2016

"Não houve acordo do PMDB com o PT sobre o impeachment", diz Jucá

Por Andrea Jubé e Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - O novo presidente nacional do PMDB, senador Romero Jucá (RR), disse ao Valor que o PMDB deixará de ser um simples partido para se transformar numa força política.

"Governabilidade não é meta de partido político", afirma. Ele diz que a "Ponte para o Futuro", com propostas para a economia, "não é programa, é um pano de fundo". Além da recuperação da economia, o PMDB terá bandeiras na área social, como "o atendimento à primeira infância". O presidente Michel Temer lançará um programa com essa temática.

Maior partido do país, o PMDB hoje tem a Presidência da República e a presidência do Senado, sete governadores, 20 senadores, 68 deputados federais, além de 1.172 prefeitos. Na eleição municipal, serão 2, 3 mil candidatos a prefeito e 39 mil candidatos a vereador.

Jucá confirma que a proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos - prioridade do governo Temer - será aprovada até o fim do ano. Ele adianta que o governo logo anunciará a autorização para venda de terras a estrangeiros. Mas com uma contrapartida social: um percentual das terras terá de ser usado na reforma agrária.

Chamado de "ministro oculto" desde que deixou o Ministério do Planejamento, porque despacha com Temer com frequência, Jucá reafirma que não haverá aumento de impostos. "Eu não posso querer aprovar um limitador de gasto público e ao mesmo tempo aumentar impostos, eles são dissonantes".

Defensor de um candidato próprio do PMDB à eleição presidencial de 2018, Jucá acredita que uma aliança, por exemplo, com o PSDB depende da volta da confiança na classe política. "Se a gente não recuperar a política, não serão nesses candidatos que estão postos que a população vai querer votar", observou.

Alvo da Operação Lava-Jato, Jucá questiona a delação premiada. "Fica muito fácil fazer a acusação contra alguém e não ser provado. Sem prova, é ficção premiada".

Confirmado presidente da República, Temer renunciou ao comando do PMDB, cargo que ocupava desde 2001.

A seguir, os principais momento da entrevista ao Valor:


Valor: Qual o seu plano de recuperação do PMDB como partido político?

Romero Jucá: O PMDB é o maior partido do Brasil. A modelagem de partido político no estilo convencional se desgastou de um jeito que os partidos perderam conexão com o eleitor, todos eles. Isso quer dizer que os partidos que se mantiverem ainda nesse estilo anacrônico tendem a não sobreviver. O lema do PMDB agora é ser uma força politica. Não é mais ser o partido da governabilidade.

Valor: E qual seria esse formato de partido ideal?

Jucá: Vamos utilizar a capacidade instalada do partido. Para esta eleição de 2016, temos mais de 2,3 mil candidatos a prefeito, e mais de 1,7 mil candidatos a vice-prefeito, temos mais de 39 mil candidatos a vereador. A relação de confiança entre a política e o cidadão foi extremamente fragilizada. Nós vamos ter que recompor isso, sob pena de chegarmos em 2018 e a população buscar uma outra linha de saída que não seja a política estruturada, formal.

Valor: O caso do impeachment da ex-presidente Dilma é exemplo desse distanciamento entre eleitor e partidos que ficaram a reboque das ruas?

Jucá: O impeachment é filho das ruas, a gestão dos partidos não teria feito o impeachment na condição de representatividade que os partidos têm hoje perante a população.

Valor: O seu partido não se dividiu na questão do impeachment?

Jucá: No julgamento do Senado inclusive muitas pessoas podem dizer que o PMDB se dividiu, mas o PMDB não fechou posição. Porque essa questão do julgamento não era político-partidária-legislativa, era uma Corte, nós estávamos travestidos de juízes, você não fecha questões com juízes, você conquista o veredicto. Tanto é que tivemos 61 votos pela cassação, um número extremamente significativo, aliás é importante dizer que a cada votação o número cresceu, portanto o convencimento sobre o crime de responsabilidade cresceu.

Valor: O PMDB fez acordo com o PT para fatiar a votação e permitir que a ex-presidente mantivesse seus direitos políticos?

Jucá: Parte da base do governo fez uma cobrança de que poderia ter havido um acordo ou do governo ou do PMDB para fazer a separação da votação do impeachment da presidente Dilma. Não houve esse acordo, eu sou o presidente do partido. Eu não tratei em nenhum momento disso. E não quero dizer que estou condenando quem votou de outro jeito, porque era um julgamento de consciência. A questão relevante e central foi o impeachment, o afastamento, consumado legalmente, constitucionalmente.

Valor: O programa Ponte para o Futuro é o programa de governo?

Jucá: Aquilo é um pano de fundo. Você tem que traduzir em realidade. Por exemplo, uma bandeira forte do PMDB será o atendimento à primeira infância. Essa é uma prioridade nossa. Da gestação aos seis anos.

Valor: O PMDB é um partido de centro. Mas as ações econômicas pretendidas não são de um perfil de direita?

Jucá: Não. Vamos vender terra para estrangeiro. Mas o estrangeiro não vai levar terra daqui embora. Ele vai gerar atividade aqui. Agora, um percentual da terra que o estrangeiro comprar terá que ser destinada para reforma agrária.

Valor: Dilma, na saída, acusou o programa do PMDB de retirar direitos.

Jucá: Dilma tem que ter um discurso. Temos o "cheque reforma" [concede auxílio para reformar a casa da população de baixa renda]. Um componente do programa de regularização [de moradias], a recuperação de favelas. A faixa 1 [para população de renda mais baixa] do Minha Casa, Minha Vida será retomada com prioridade para pessoas em área de risco, invasão de áreas ambientais.

Valor: Para aprovar reformas consideradas impopulares é preciso ter apoio no Congresso. Qual é o tamanho da base do Temer hoje?

Jucá: A base está estruturada no Ministério. Cada votação vai ter uma base fixa e uma base móvel dependendo do assunto. Você tem que ter uma margem maior para ter efetivamente a condição de aprovar dependendo do assunto. A base do Temer será contextualizada agora. O governo até ontem era um governo provisório, a partir de agora o governo é permanente. A herança que o governo está recebendo é algo desastroso. Em 2014 havia 6 milhões de desempregados, em 2016 há 12 milhões. No ano que vem, o aumentos dos gastos com a Previdência vai ser de R$ 70 bilhões, que representa na criação de duas CPMF e um pouco mais para cobrir esse gasto.

Valor: Tem número para aprovar a proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento dos gastos?

Jucá: Vamos aprovar. E do jeito que foi enviada ao Congresso. Minha ideia é que até o fim do ano aprovamos a PEC aqui também no Senado. Reforma da Previdência, a primeira questão é fechar o modelo, em seguida vamos discutir. Essa será uma discussão que não poderá ser mistificada. Terá que ser responsável. Sob pena de daqui a 15 anos, se a gente não fizer o que tem que fazer por inteiro, teremos que reduzir as aposentadorias que estão sendo pagas.

Valor: Então o PMDB, contra sua trajetória, vai tomar medidas impopulares?

Jucá: Não são medidas impopulares. São medidas necessárias. É por isso que a postura da imprensa e o debate têm que ser francos. Deste ano para o ano que vem há um acréscimo de despesa na Previdência de mais de R$ 60 bilhões. Temos que discutir com a sociedade se ela está disposta a todo ano aumentar a carga tributária para suprir esse déficit e manter os padrões de aposentadorias atuais. Não estamos inventando isso. Estamos recebendo isso. Quando o Lula entrou, em 2003, o déficit do Regime Geral [da Previdência] era R$ 26 bilhões. O Michel está recebendo com R$ 150 bilhões. O governo não pode fazer é enganar a população. É endividar para o futuro e as pessoas achando que está tudo bem. Não vamos tergiversar. Essa é a diferença do governo do Michel para o de Dilma.

Valor: Para evitar o precipício, será preciso aumentar imposto? São duas CPMFs para cobrir o rombo da previdência.

Jucá: Por enquanto não, temos que mudar a direção. Eu não posso querer aprovar um limitador de gasto público e ao mesmo tempo aumentar impostos, eles são dissonantes, Então eu tenho primeiro que fazer o dever de casa no governo para depois avaliar o quadro.

Valor: O que seria mais fácil aprovar, aumento de imposto ou limite de gasto?

Jucá: Acho que temos que trabalhar em duas linhas paralelas e permanentes. De um lado melhoria do gasto público, e reforma estrutural nas grandes despesas, a começar pela Previdência, esse é um pilar. O outro pilar permanente é a animação da economia, ampliação de concessões, facilitação da relação de empregabilidade, que é a questão dos contratos de trabalho, parcerias público privadas. Somos um mercado potencial. Investimento no Brasil tem retorno acima da média. Tem crédito direcionado. O Estado tem que ser um Estado regulador, estimulador e garantidor de segurança jurídica. Esse é o perfil do novo Brasil.

Valor: É um modelo capaz de vencer em 2018?

Jucá: Temos primeiro que recuperar a economia. E recuperar um pouco da política para as urnas de 2018 se voltarem para os políticos. Se nós não conseguirmos reverter o quadro da economia e a melhorar um pouco da relação política, a eleição de 2018 não será para a política, será para os aventureiros.

Valor: É possível em dois anos recuperar a economia, a política e o Temer ser candidato à presidência da República?

Jucá: Temer não é candidato. Por isso, não está preocupado com a medição mês a mês da popularidade. Temer é candidato a recuperar o Brasil. Se ele fizer isso, entra pra história. Se a gente recuperar a politica, muitos candidatos virão de partidos da base. Isso é natural. Podemos ter uma modelagem como a eleição como a de 1989. E os partidos da base deverão ter vários candidatos.

Valor: Tem chance de alguma aliança PMDB e PSDB em 2018?

Jucá: Nós temos uma grande aliança agora para salvar o Brasil. Se dessa aliança vai sair alguma candidatura, com o PSDB ou com qualquer partido da base, isso vai depender do andamento, da colocação dos candidatos e principalmente da recuperação da política.

Valor: Na recuperação partidária está planejada renovação das bancadas do Senado e Na Câmara?

Jucá: Também vamos ter que renovar a maior bancada no Senado, para fazer o presidente do Senado. Vamos ter que fazer a maior bancada da Câmara para fazer presidente da Câmara. O PMDB tem que se preparar.

Valor: No Senado, o plano é eleger o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), como substituto de Renan Calheiros (AL)? E na Câmara?

Jucá: Na Câmara, eu não tenho detalhes. Aqui no Senado, a bancada está unida. Tem direito de indicar o presidente. Na hora certa vamos definir. Hoje o nome mais forte é o do líder.

Valor: No meio do caminho da refundação dos partidos, tem a Operação Lava-Jato...

Jucá: Todos têm inquérito. Não só do PMDB. Primeiro, eu queria aqui deixar claro que eu apoio a Lava-Jato. Eu lutei aqui no Senado para reconduzir o [Rodrigo] Janot [para a Procuradoria-Geral da República] para não parar a Lava-Jato. O que eu cobro é que a Lava-Jato diga quem tem culpa e quem não tem. Não dá para imobilizar a política. Sem a política não tem solução para o país. Vimos agora com a Dilma. Terminou sendo aventura porque não foi talhada para isso. Eu apoio delação premiada. De quem está preso e de quem está solto. Agora eu entendo que a delação só pode ter efeito depois de comprovada. Fica muito fácil fazer a acusação contra alguém e não ser provado. Sem prova, não é delação premiada; é ficção premiada.

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