segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Questões atuais – Raimundo Santos

A primeira questão do momento político é o fracasso do projeto de governo dos ex-presidentes Lula e Dilma Roussef. O seu objetivo era hegemonizar a sociedade a partir da sua divisão em dois lados. Mas iria esbarrar com uma sociedade altamente diferenciada, com parte da classe política e instituições. 

Os protestos de junho de 2013 mostraram a grande distância que havia entre o Estado e o conjunto da sociedade, expondo a olho nu a profunda crise do Congresso, dos partidos, das esquerdas e do governo Dilma. As manifestações de mais de quatro milhões de pessoas deste ano ampliaram a diversidade dos que saíam às ruas reiterando que aquela estratégia dos governos petistas de simplificação da sociedade não tinha como seguir adiante. As ações e mobilizações do campo alinhado com o governo em incontáveis frentes cada vez mais foram se voltando para dentro de uma lógica de sua reprodução. 


Essa radicalização, como ocorre em todo regime populista, também iria se expressar no desprezo dos seus líderes e teóricos pela busca permanente do desenvolvimento como condição para encaminhar soluções sustentáveis às desigualdades sociais.

A reorientação do governo Dilma se impusera com a crise econômica e as denúncias de corrupção em 2015, mas a Presidente não se dispôs a encaminhá-la. Deixou-se conduzir pelos fatos, terminando no impeachment. A mudança da situação veio por força dos acontecimentos. A política, que em tempos difíceis nos levou a caminhos seguros, como durante a Resistência à ditadura, hoje tem sua função construtiva limitada por conta do enfraquecimento dos partidos ainda crescente e agravado pelas revelações da Lava-Jato já feitas e as que estão por vir.

A segunda questão é a transição pacífica em curso desde o afastamento provisório de Dilma Roussef. O governo Temer emerge em um quadro instável, mas pode, se ultrapassar sua vulnerabilidade, vir a ser não apenas uma travessia até 2018. Sustentado por boa parte da classe política, assim aberto às negociações, ele tem condições de dar continuidade ao que de melhor vem se desenvolvendo no país desde o governo Itamar Franco.

A terceira questão é a avaliação das esquerdas até há pouco governantes. O seu projeto de governo fracassou por sua própria pretensão de hegemonizar tudo. Elas estão diante da exigência principal: assumir a responsabilidade por terem levado o país à situação a que chegamos. E dizerem para aonde estão querendo ir e, mais precisamente, que contribuição se dispõem a dar neste momento para baixar a tensão no país.

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Raimundo Santos, professor da UFRRJ e autor do ensaio “Reformismo e camponeses no pensamento de Celso Furtado, Revista Estudos sociedade e agricultura vol. 24, n. 1, abril de 2016 [http://r1.ufrrj.br/esa/index.php].

[FONTE: Rural Semanal, Seropédica, 05/09/2016].

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