domingo, 4 de setembro de 2016

Somos todos responsáveis

• Elegemos Dilma e elegemos o Congresso que cassou a presidente. Todo o drama do impeachment decorre, em essência, dessas duas escolhas

João Gabriel de Lima - Época

O dia 31 de agosto de 2016 começou, na verdade, em outubro de 2014. Naquele mês, no dia 26, os brasileiros reelegeram Dilma Rousseff para a Presidência da República. Três semanas antes, no dia 5, havíamos escolhido o Congresso que iria cassá-la.

Toda a cadeia de fatos que desembocou no impeachment decorre, em essência, dessas duas escolhas. Em seu primeiro governo, Dilma implantara um programa – chamado por ela de Nova Matriz Econômica – que levou o país à pior recessão de sua história. Os efeitos dessa recessão apareceram, com toda a força, em seu segundo mandato, e atingiram principalmente a população mais pobre, na forma de inflação e desemprego. Por causa disso – e também do envolvimento dos partidos de sua coligação em escândalos de corrupção – Dilma perdeu sua popularidade. Sem o apoio das ruas e tendo de enfrentar a crise que ela própria criara, Dilma precisava da ajuda do Congresso que havia sido eleito junto com ela. Não conseguiu. Para resumir uma ópera de vários atos, faltou humildade de um lado e boa vontade do outro.


O Brasil que o presidente Michel Temer governará por dois anos e quatro meses herda dois traumas. O da recessão, criado pelo governo Dilma. E o do impeachment, a solução encontrada pelo Congresso para resolver a crise econômica e de governabilidade (o futuro dirá se foi a melhor solução, a pior solução ou a solução possível). As acusações de que Dilma cometera crimes contra a Lei de Responsabilidade Fiscal forneceram a base jurídica de um processo que, por definição, é também político.

O novo governo enfrentará vários desafios difíceis. Terá de recompor a base aliada, fraturada no impeachment. Precisará recompor a economia e implantar uma cultura de responsabilidade fiscal. Por último, e talvez mais importante, terá de retomar o debate público – a essência da democracia – num país radicalizado. A agenda emergencial de Temer não traz, num primeiro momento, nada muito diferente das soluções consensuais que foram tentadas, ou aplicadas, em governos anteriores – inclusive do PT.

Impeachments são sempre traumáticos . Achar que o que aconteceu no Brasil se deve a uma gangue de marcianos que aterrissou de disco voador – o “perigo vermelho”, diriam os radicais de um lado, ou os tais “golpistas”, diriam os radicais de outro – é, no entanto, um equívoco com laivos paternalistas. Numa democracia, devemos assumir a responsabilidade por nossas escolhas. Nunca é demais repetir: escolhemos Dilma e escolhemos o Congresso que a cassou. Há quem ache que fizemos a coisa certa. Há quem se arrependa de ter escolhido esta presidente, ou este Congresso, ou ambos. Podemos errar em nossas escolhas – este é o drama das eleições. Podemos corrigir no pleito seguinte – esta é a beleza da democracia. O governo que agora assume terá um desafio difícil pela frente. Os que perderam seus empregos, seus planos de saúde e suas esperanças na crise – e os brasileiros que são solidários a eles – torcerão para que Michel Temer tenha algum sucesso em sua empreitada.

Que tudo isso tenha sido um aprendizado – e que em 2018, mais que nunca, encaremos nossas escolhas eleitorais com a seriedade que elas merecem.

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