terça-feira, 29 de novembro de 2016

Ministério Público quer ter acesso às conversas gravadas por Calero

• Janot vai analisar as provas antes de decidir sobre possível inquérito

Jailton de Carvalho - - O Globo

A Procuradoria-Geral da República pediu à PF os áudios das conversas que teriam sido gravadas e entregues pelo ex-ministro Marcelo Calero (Cultura). Além do ex-ministro Geddel Vieira, Calero teria gravado Eliseu Padilha (Casa Civil) e o presidente Michel Temer. -BRASÍLIA- O procurador-geral da República em exercício, José Bonifácio de Andrada, requisitou ontem à Polícia Federal os áudios das conversas gravadas pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero com o presidente Michel Temer, o ex-ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil). A partir da análise dos diálogos, a Procuradoria-Geral deverá decidir se endossa o pedido de abertura de inquérito contra Geddel, e se o eventual inquérito sobre o assunto será extensivo a Temer e Padilha.

Antes de deliberação final sobre o caso, a PGR chamará Padilha para dar explicações preliminares sobre o teor das conversas que teve com Calero, como revelou o GLOBO sábado. Depois de pedir demissão, há 11 dias, Calero acusou Temer, Padilha e Geddel de pressioná-lo a atropelar um parecer técnico do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e liberar as obras do La Vue, um prédio de luxo em Salvador, onde o ex-ministro Geddel comprou um apartamento.

TRECHOS QUASE INAUDÍVEIS
Pouco antes de pedir demissão, Calero gravou conversas com Temer, Geddel e Padilha. Em entrevista à TV Globo, o ex-ministro da Cultura disse que registrou alguns diálogos por recomendação de amigos da Polícia Federal. O registro das conversas daria suporte às acusações sobre as pressões que ele afirma ter sofrido para liberar as obras do La Vue. Calero disse que, num determinado momento, Temer o aconselhou a fazer uma “chicana” para entregar o caso à Advocacia-Geral da União (AGU).

Andrada requisitou as gravações, mas a decisão sobre pedido e alcance de um eventual inquérito caberá ao procurador-geral, Rodrigo Janot, que está participando de encontro de representantes do Ministério Público dos Brics (grupo de países que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) na China e só deve retornar a Brasília na próxima semana. É a partir da decisão de Janot que o Supremo Tribunal Federal (STF) deverá decidir o que fazer com as denúncias de Calero.

A PF começou a degravar as conversas do ex-ministro na semana passada. Não está claro ainda se os peritos concluíram ou não o trabalho. Alguns trechos dos diálogos estavam quase inaudíveis, o que exigiu esforço redobrado da equipe destacada para transcrever as conversas. Em depoimento à PF, Calero relatou a suposta pressão de Geddel, Padilha e Temer em favor da liberação das obras.

Calero disse que o embate começou quando Geddel cobrou dele a liberação das obras do La Vue com o argumento de que era dono de um dos apartamentos no prédio. Calero considerou descabido o pedido e a justificativa do então colega de Ministério e foi se queixar ao presidente. Na primeira conversa, Temer o teria autorizado a ignorar o pedido de Geddel. Mas, no dia seguinte, o chamou ao Palácio do Planalto e, numa mudança de perspectiva, reforçou a pressão.

Temer teria dito que a decisão do Iphan causou “dificuldades operacionais” no gabinete dele, e que Geddel estava irritado. Então, Calero deveria entregar o processo para a AGU, que já tinha uma “solução” para o caso. Padilha também teria engrossado a pressão para o caso ir para a AGU. Dizendo-se decepcionado, Calero pediu demissão e denunciou a suposta pressão.

Domingo, Temer classificou as gravações de Calero de indignidade e cobrou a divulgação dos áudios, dizendo não ter nada a temer. O presidente negou que tenha defendido interesses particulares de Geddel e disse que apenas arbitrou um conflito administrativo entre duas partes do governo.

— Não patrocinei interesses privados, data vênia — disse.

A bancada do PSOL protocolou ontem na Câmara pedido de impeachment de Temer por crime de responsabilidade no caso de suposto tráfico de influência. Pouco depois, senadores e deputados de PT e PCdoB protocolaram na PGR uma representação contra Temer por crime comum. Os parlamentares querem que Temer seja investigado pelos crimes de concussão e advocacia administrativa no caso Geddel-Calero.

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