quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Sem onda conservadora - Roberto Freire

- O Globo

• É equivocado dizer que todos aqueles que se opõem ao PT são direitistas

Após verem sepultada a narrativa de que Dilma Rousseff foi apeada do Planalto por meio de um “golpe”, o PT e seus satélites tentam justificar a acachapante derrota nas eleições municipais com uma outra tese igualmente desprovida de qualquer sentido. A palavra de ordem entoada pelo núcleo duro do lulopetismo é de que o Brasil teria sido tomado, nas urnas, por uma “onda conservadora”.

Na realidade, o eleitorado rejeitou o projeto de poder representado pelo PT e pelos governos de Lula e Dilma, que nos levaram a uma das maiores crises econômicas de nossa história. Os maiores vitoriosos nas disputas municipais foram os partidos que votaram pelo impeachment e hoje compõem a base de sustentação do presidente Michel Temer — e aqui cabe ressaltar o êxito das legendas que integram o campo da social-democracia e dos partidos da esquerda democrática brasileira, como o PSB, o PPS e o PV. A exceção talvez seja o PDT, partido de esquerda e aliado dos governos petistas, que também experimentou um crescimento eleitoral. Mais uma prova de que a “onda conservadora” é uma narrativa enganosa.

A avaliação precipitada sobre os resultados eleitorais levou um jornalista a cometer a estultice de dizer que o PSDB é um partido de “ultradireita”. Trata-se de um raciocínio equivocado, segundo o qual todos aqueles que se opõem ao PT são direitistas e, alguns, até traidores. Além de interditar o debate, tal postura é de uma desonestidade intelectual atroz. O PSDB, afinal, tem uma visão predominantemente social-democrata – e assim seria rotulado em qualquer país do mundo democrático.

No Rio, alguns apregoam que a vitória de Marcelo Crivella seria um indicativo de que a “onda conservadora” veio para ficar. É evidente que não se pode tomar um caso isolado como um retrato do que ocorreu por todo o Brasil. A cidade sentiu falta de alternativas políticas mais amplas e teve de escolher entre duas candidaturas fundamentalistas, uma de cunho religioso e outra politicamente dogmática. Uma de viés mais conservador e outra também sectária, de uma extrema-esquerda que muitas vezes serviu como linha auxiliar do lulopetismo. Basta ver o comportamento do candidato do PSOL que, quando confirmado no segundo turno, excluiu a possibilidade de diálogo com as correntes políticas que considerava “golpistas”.

Outra falácia é de que a “não política” teria sido a marca dessas eleições. É certo que houve uma forte rejeição aos políticos tradicionais, mas não à política em si. Em São Paulo, João Doria se apresentou como um empresário, mas em nenhum momento deixou de destacar que é filho de um político cassado pelo golpe militar de 1964.

Assim como a tese do “golpe” havia sido enterrada, a narrativa da “onda conservadora” foi desmentida pelo resultado das eleições. Basta analisar o desempenho das forças políticas vitoriosas. Mesmo que algumas tenham contradições internas, nenhuma delas se confunde com a direita nacional. Todas estão no campo democrático e, em especial, honrando a esquerda democrática brasileira.

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Roberto Freire é presidente nacional do PPS

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