quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Efeitos do comércio - Míriam Leitão

- O Globo

O forte saldo comercial do país é reflexo da recessão que derrubou as importações. Mas essa entrada de dólares ajudou a diminuir o déficit nas transações correntes, ao menor patamar desde maio de 2008. O ajuste externo produz vários alívios na economia. Segura o dólar, o que diminui a pressão sobre a inflação e permite a queda dos juros. Também facilita investimentos via captações de recursos no exterior.

O déficit em conta-corrente chegou a 4,51% do PIB em abril de 2015 e caiu para 1,12% em novembro de 2016, último dado divulgado. No passado, a escassez de dólar era o calcanhar de Aquiles da nossa economia. Desde a forte acumulação de reservas, no governo Lula, diminuiu bastante o risco de uma crise cambial. Mesmo assim, o país sabe que para enfrentar qualquer incerteza ou crise é melhor ter um alto volume de entrada de dólares através do comércio.

A balança comercial sozinha produziu um superávit de US$ 47 bilhões em 2016, o número mais alto da série histórica, que começou em 1989. As importações caíram muito mais do que as exportações, e por isso o saldo foi tão alto. Enquanto as importações despencaram 20%, de US$ 171 bilhões para US$ 137 bi, as exportações caíram 3,2%, de US$ 191 bilhões para US$ 185 bi. Com isso, a corrente de comércio caiu 11%, o que é mais um dado que mostra a magnitude da recessão. O fato de as exportações terem caído tão pouco em contexto difícil, com quebra de safra na agricultura, mostra que houve grande esforço do exportador brasileiro, ajudado também pela alta do dólar.

O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) destaca alguns pontos positivos das exportações. Enquanto as vendas de produtos básicos recuaram 9,2%, em grande parte pela queda dos preços nos mercados internacionais da soja e do minério de ferro, as exportações de semimanufaturados subiram 5,7%, e as de manufaturados, 1,6%.

“Não fossem os bens básicos, as vendas externas do Brasil teriam crescido, pois tanto manufaturados como semimanufaturados tiveram alta nas exportações. Com isso, mesmo que muito lentamente, a participação dos manufaturados na pauta exportadora do país vai se recompondo. Entre 2015 e 2016 passou de 38% para 40%, mas continua muito aquém dos seus níveis históricos”, escreveu o Iedi em relatório.

Apesar da forte queda das vendas internas de automóveis, as exportações de veículos de passageiros aumentaram 38%, enquanto os de carga saltaram 27%. Açúcar refinado teve crescimento de 23%, e o suco de laranja, 9,5%. As importações de combustíveis tiveram queda de 43% no ano, o que ajudou o balanço da Petrobras, mas a diminuição de 21% nos bens de capital mostrou que o ano foi de forte retração nos investimentos das empresas.

Como a taxa de poupança no país é muito baixa, a redução do déficit em conta-corrente facilita as captações de recursos no exterior, e isso vai ajudar na retomada da economia.

A aposta do Brasil no comércio internacional tem que ser maior e mais profunda, na verdade. O saldo cairá quando o país retomar o crescimento, e o ideal é que aumentem exportações e importações, com maior integração nas cadeias globais de suprimento. Esse ano, aumentarão as exportações do agronegócio, porque a expectativa é de uma safra maior, mas é importante que o setor de manufaturas continue reforçando sua capacidade de exportar, mesmo que isso signifique importar mais também. O Brasil precisa aumentar sua corrente de comércio. Isso é que trará benefícios duradouros para a economia.

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