sábado, 25 de fevereiro de 2017

Crise política no governo Temer ofusca sinais positivos na economia

Gustavo Uribe, Marina Dias | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente Michel Temer apostava que terminaria a semana melhor do que começou. Com anúncio de queda dos juros e de melhora nas contas públicas, a expectativa era de uma reversão no desgaste de imagem causado pela concessão de foro privilegiado ao amigo e agora ministro Moreira Franco, citado na delação da Odebrecht.

Temer, um habilidoso negociador político, acreditava que sairia para o recesso de Carnaval surfando nos bons índices econômicos. Mas acabou mergulhando em uma crise política.

Em apenas dois dias, perdeu um aliado estratégico na equipe ministerial, criou um racha na bancada peemedebista da Câmara e teve seu ministro da Casa Civil envolvido em um episódio nebuloso revelado por um ex-assessor do próprio presidente.

E tudo isso em meio à expectativa de abertura dos sigilos da delação de 77 executivos da Odebrecht nas próximas semanas. Os depoimentos estão em poder da Procuradoria-Geral da República, que deve pedir abertura de inquéritos contra os citados, incluindo Padilha.

O primeiro revés ocorreu na noite de quarta (22), quando, por motivos de saúde, o tucano José Serra pediu demissão do Ministério de Relações Exteriores.

Temer foi pego de surpresa, afinal Serra tem sido um dos principais fiadores da aliança entre PMDB e PSDB no governo.

O presidente imediatamente procurou a cúpula tucana para negociar o nome do novo ministro, ainda a ser definido —o favorito, por enquanto, é o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), hoje líder do governo no Senado.

No dia seguinte, uma nova dor de cabeça: a insatisfação de parte da bancada do PMDB da Câmara com a escolha do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) para ministro da Justiça.

Na semana passada, quando o ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Carlos Mário Velloso recusou convite para assumir o ministério, Temer viu que não conseguiria nomear um jurista para o cargo.

Outro ex-ministro da corte, Carlos Ayres Britto, já havia sinalizado que não assumiria a vaga deixada por Alexandre de Moraes, indicado ao Supremo.

Momentos depois da negativa de Velloso, um auxiliar próximo do presidente dizia que a "opção parlamentar é o que lhe restou".

O nome do subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha, próximo a Eduardo Cunha (PMDB-RJ), chegou a ser ventilado, mas perdeu força.

Temer seguiu o caminho político, mas não sem ouvir reclamações. O vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (PMDB-MG), anunciou rompimento com o governo e avisou que sua vontade agora é impor seguidas derrotas ao Palácio do Planalto. Para parte da bancada, com a nomeação o PMDB deixa de ser o "partido do presidente" para tornar-se apenas um "partido da base".

MULA
Na noite de quinta (23), o advogado José Yunes, ex-assessor da Presidência, afirmou à Folha que que serviu de "mula" de Padilha.

Ele disse ter recebido a pedido do ministro um "pacote" em 2014, em seu escritório político em São Paulo, entregue por Lúcio Funaro, apontado como operador de Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Yunes prestou depoimento na semana passada aos procuradores em Brasília - sua versão tem semelhanças com o teor da delação de Claudio Melo, ex-diretor da Odebrecht, que contou ter enviado dinheiro ao escritório do advogado após pedido de Padilha.

O caso deve ser apurado pela Procuradoria-Geral da República e, segundo auxiliares e assessores presidenciais, torna a situação do chefe da Casa Civil "delicadíssima", aumentando a pressão para que ele deixe a pasta.

Padilha, que ainda não se manifestou sobre as revelações de Yunes, tirou licença do governo alegando problemas de saúde. Ele deve fazer ainda no fim de semana uma cirurgia para retirada da próstata.

Para o Palácio do Planalto, a partir de agora o presidente vive uma guerra de versões: ou o ministro da Casa Civil encontra uma boa explicação para se livrar da história, ou Michel Temer não terá muita escolha a não ser tirá-lo da Casa Civil.

ESCOLHAS
O presidente percebeu ainda nos últimos dias que é preciso lidar com a frustração. Mais do que isso. O inquilino do terceiro andar do Palácio do Planalto reparou que nem sempre a saída mais segura –ou a que mais lhe agrada– poderá ser sua opção final.

O presidente decidiu, por exemplo, que teria que agradar ao Congresso e a seu partido, o PMDB, que brigava com foice por mais espaço no governo.

Esboçou então enfrentar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e deixar o deputado André Moura (PSC-SE) na liderança do governo na Casa. Era um aceno ao centrão, que teria uma forma de interlocução com o Planalto sem precisar passar por Maia.

Mas não foi bem assim. Mais uma vez pressionado pelo PMDB –e pelo próprio Maia–, Temer demitiu Moura e entregou o cargo a Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Maia tinha acertado essa dança das cadeiras com Ribeiro para garantir o apoio do PP à sua reeleição ao comando da Casa.

Com o PMDB, ficou a liderança da maioria, cargo recriado pelo presidente para acomodar mais uma vez um parlamentar de seu partido. A vaga ficou com Lelo Coimbra (ES).

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