quarta-feira, 22 de março de 2017

Senado reage a juízes e promotores

O Senado, focando o Judiciário e o Ministério Público, voltou a discutir projetos polêmicos, como o que endurece a punição de crimes de abuso de autoridade. Uma das propostas que desfiguram o projeto do fim do foro privilegiado cria vara especial para o julgamento de autoridades.

Unidos contra o ‘abuso’

Senadores retomam projeto que pune autoridades e querem mudar regras do foro

Maria Lima | O Globo

-BRASÍLIA- O tão criticado projeto que muda a legislação para endurecer a punição de crimes de abuso de autoridade, visto por integrantes do Judiciário e Ministério Público como retaliação, voltou a ganhar força ontem no Senado. Usando como argumento os supostos excessos cometidos pela Polícia Federal na Operação Carne Fraca, senadores de vários partidos se revezaram na tribuna defendendo o escrutínio dos investigadores. Em outra frente, a discussão sobre o fim do foro privilegiado também marcou o dia na Casa, com propostas que podem alterar seu sentido original, como a criação de uma vara especial.

Coube à ex-ministra da Agricultura Kátia Abreu (PMDB-TO) a fala mais forte, dizendo que o projeto do abuso será votado “doa a quem doer”. Horas antes, a PF deflagrara mais uma fase da Lava-Jato, desta vez em busca de documentos em residências de pessoas e empresas ligadas a quatro senadores: o presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE); Renan Calheiros (PMDB-AL); Valdir Raupp (PMDB-RO) e Humberto Costa (PT-PE).

A proposta de emenda à Constituição que propõe fim do foro privilegiado para todas as autoridades, inclusive juízes e promotores, movimentou o Senado. Mas, sem a concordância de todos os líderes da Casa, como exige o regimento, e com discursos em defesa de votação concomitante do projeto de abuso de autoridade, o plenário não votou o requerimento do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que instituiria um calendário especial para agilizar a votação da PEC. O requerimento de Randolfe tinha o apoio de 47 senadores, maioria absoluta, mas não foi suficiente, já que vários líderes defenderam um debate aprofundado do projeto.

EMENDAS DRIBLAM FIM DO FORO
A PEC começará a ser discutida hoje no plenário, na primeira de cinco sessões de debate. Depois será feita uma sessão temática pública. Eunício convidará a presidente do STF, Cármen Lúcia, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e um representante do Executivo. Apesar do andamento dado à proposta, ontem mesmo parlamentares deram início a uma articulação para apresentar emendas que driblem o fim do foro privilegiado. No discurso em plenário, ao defender uma emenda que apresentará ao projeto, o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) disse que os senadores não podem “atropelar para fragilizar as prerrogativas de um Poder”.

— Acho que, no exercício do nosso mandato, tem que haver, sim, algum tipo de proteção, sobretudo no caso da denúncia. Um deputado federal, um senador da República ser denunciado por um promotor em primeira instância, acho que não é o correto. Acho que deveríamos preservar que a denúncia para os parlamentares ficasse ainda a título da Procuradoria-Geral da República. O Supremo analisaria a procedência ou não da denúncia. Caso fosse aceita, nós iríamos ser julgados como qualquer cidadão brasileiro pela Justiça de primeira instância — defendeu Fernando Bezerra, que é alvo de inquérito no STF, na Lava-Jato.

Álvaro Dias (PV-PR) considera que os líderes e o presidente Eunício Oliveira só concordaram em pautar para amanhã o início da discussão da matéria por causa da pressão “irresistível” da sociedade. Mas já foi comunicado que está sendo construída uma saída para o fim do foro, que seria a criação de uma vara especial para julgar casos de autoridades, o que, na prática, funcionaria como instância especial.

Mesmo saindo do STF, as autoridades dos três Poderes não seriam julgadas pelas instâncias correspondentes, mas por essa vara especial, com denúncia exclusivamente feita pelo procurador-geral da República. O senador Roberto Rocha (PSBMA) defendeu a proposta. Álvaro Dias, autor da PEC que acaba com o foro, considera que, por estarem sem saída, os líderes e o comando do Senado aceitaram pautar a PEC, mas que agora será preciso resistir às investidas que visam manter privilégios.

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