terça-feira, 4 de abril de 2017

Cartas na mesa | Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Os partidos políticos, porém, estão sendo pautados pela necessidade de sobrevivência eleitoral de seus parlamentares

Com as principais lideranças do Congresso assediadas pela Operação Lava-Jato, a reforma política ganhou pernas longas e começou a andar bem rápido. Ontem, o relator da reforma, Vicente Cândido (PT-SP), tratou de antecipar os termos de sua proposta, que prevê lista fechada, voto distrital, 30% de financiamento eleitoral de pessoas físicas e o fim dos cargos de vice-presidente, vice-governador e vice-prefeito já no pleito de 2018.

Na véspera, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, num artigo intitulado Apelo ao bom senso, apresentou também suas sugestões, depois de analisar alguns inconvenientes de propostas mais audaciosas, como o parlamentarismo e o voto distrital misto. “Melhor sermos realistas e começarmos com mudanças menos ambiciosas”, avalia. Eis a proposta do líder tucano:

“Como há limites de prazo para definir novos procedimentos eleitorais (eles devem ser aprovados até setembro para terem vigência em 2018), creio que o indispensável é aprovar logo a “cláusula de barreira”. Neste caso, seriam necessários x por cento de votos, distribuídos por um número mínimo de Estados, para que os partidos pudessem ter representação institucional no Legislativo (menos para o Senado, no qual o voto é no candidato), acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de televisão. Também é indispensável aprovar a proibição de coligações nas eleições proporcionais, para evitar que, ao votar num deputado de um partido, se eleja alguém de outro.”

Para abreviar o parto, FHC propõe que o fundo partidário seja distribuído com os mesmos critérios da cláusula de barreira e que, para baratear o custo os custos de campanha, os programas de tevê não tenham “marquetagem”. Além disso, que se adote o voto distrital para as eleições de vereadores e o voto distrital misto nas eleições de 2022. Seria uma maneira de reduzir as resistências ao fim do atual voto proporcional uninominal.

Todas as propostas buscam uma saída para a crise política, pois a sociedade não se sente representada pelo Congresso. Os partidos políticos, porém, estão sendo pautados pela necessidade de sobrevivência eleitoral de seus parlamentares. O pânico é maior, entretanto, quando o desgaste é diretamente causado pela Lava-Jato, porque as investigações em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) não vão deixar de pautar a mídia enquanto os julgamentos dos réus não forem concluídos.

Bumerangue
A condição de réu na Lava-Jato, mesmo que o processo corra em segredo de Justiça, pelo sistema atual, representará uma derrota eleitoral quase certa. Além disso, a consequente perda do direito ao foro privilegiado implicará mudança de curso do processo do não-eleito na Lava-Jato, que passaria à esfera do juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba, onde os julgamentos costumam acontecer muito mais rápido. Foi o caso, por exemplo, do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já condenado a 15 anos de prisão num único processo.

A adoção do voto em lista abriria a possibilidade de evitar a derrota, pois eliminaria a concorrência dos setores dos partidos que desejam sua renovação, lançando candidatos novos e não “queimados” pela Lava-Jato. É esse o raciocínio atribuído à proposta do petista Vicente Cândido, mas ele rebate isso: “O investigado na Lava Jato vai ficar em evidência estando na lista ou fora da lista. Ele poderá ser eleito numa carona de puxador de voto às vezes despercebido pelo eleitor. Então, não é isso. Se ele estiver na lista, o partido vai ter que explicar o porquê, vai ter que apresentar currículo”, argumenta.

Vicente Cândido se inspirou no caso do México, que acabou com a eleição de vice-presidente em 2017, para propor a simples extinção do cargo. Argumenta que isso representará grande economia de gastos e, ao mesmo tempo, o fim das conspirações para destituir presidentes, governadores e prefeitos. O primeiro argumento é válido; o segundo, não, porque a conspiração tende a ser maior ainda, se o chefe do parlamento for de oposição.

O efeito bumerangue do voto em lista, que não permite ao eleitor escolher a pessoa que vai eleger, pois ela pré-ordenada, é uma rejeição ao partido como um todo e não apenas contra os candidatos enrolados. Isso pode enfraquecer bastante os partidos envolvidos na Lava-Jato e, em alguns casos, até provocar o desaparecimento deles, como aconteceu com a antiga Arena, o partido criado pelo regime militar, que já foi “o maior do Ocidente”.

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