quarta-feira, 10 de maio de 2017

Gilmar não deve se declarar impedido no caso Eike

Gilmar diz que não vai se declarar impedido, e caso deve ir ao plenário

Procurador-geral fez pedido contra o ministro, que rebateu: “O STF que resolva”

Cristiane Jungblut | O Globo

-BRASÍLIA- Um clima de guerra se instalou entre o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Gilmar Mendes não vai se considerar impedido no caso do empresário Eike Batista, apesar do pedido de Janot neste sentido. Em conversas com amigos, Gilmar disse que cabe ao Supremo se manifestar e resolver a questão. Janot solicitou ao STF que seja declarada a suspeição de Gilmar porque a mulher dele, Guiomar Mendes, integra o escritório de advocacia de Sergio Bermudes, representante de Eike em vários processos. O pedido de Janot terá que ser examinado pelo plenário do Supremo, mas sem data prevista.

Gilmar tem dito a outros ministros do Supremo que Janot faz confusão e que aplica de forma errada o Código de Processo Civil. O escritório de Bermudes atuaria em ações cíveis relacionadas a Eike e não junto ao Supremo.

— Estou muito tranquilo. De jeito nenhum vou me declarar impedido. O STF que resolva (sobre o pedido) — disse Gilmar, segundo amigos.

No Supremo, outros ministros têm ligação com pessoas que atuam em escritórios. Por isso, Gilmar teria apoio de colegas. De acordo com Janot, o ministro não poderia atuar como relator do habeas corpus por conta da atuação da mulher Guiomar na banca do advogado Sergio Bermudes.

FILHA DE JANOT ATUA PARA OAS
A assessoria de Gilmar negou, em nota, que haja impedimento de atuação do ministro porque o recurso de Eike não tem como advogado o escritório de Sergio Bermudes. “Cabe lembrar que no início de abril o ministro Gilmar negou pedido de soltura do empresário e, na oportunidade, não houve questionamento sobre sua atuação no caso”, diz comunicado da assessoria.

Em conversas com amigos, Gilmar disse que Janot também deveria se considerar impedido em vários casos, diante da situação que envolve a filha do procurador-geral. A advogada Leticia Ladeira Monteiro de Barros, filha de Janot, atua para a empreiteira OAS, empresa que tenta fechar um acordo de delação premiada no âmbito da LavaJato. Em nota, a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que Janot não participa das negociações com a OAS, que ainda não celebrou o acordo e que no ano passado as tratativas chegaram a ser suspensas por decisão dele.

As desavenças entre Janot e Gilmar mostram um embate dentro do Judiciário. Há ministros que avaliam que o procurador está preocupado com sua sucessão no comando do Ministério Público e que estaria “enfraquecido”. Janot costuma criticar o trânsito de Gilmar junto ao presidente Michel Temer. Nos finais de semana, Gilmar costuma se reunir com Temer. Em outras ocasiões, o ministro participa de jantares na residência do presidente.

Nos bastidores, Gilmar se mostra irritado com as acusações de Janot. O ministro tem em mãos, inclusive, uma manifestação do colega Edson Fachin com decisão em que o Código de Processo Civil não se aplica no caso das suspeições, como alega Janot.

O fato de outros ministros terem parentes trabalhando em escritórios faz o ministro acreditar que o pedido de Janot não vai prosperar no Supremo. Gilmar tem dito que se considerou impedido no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dos mandatos do governador do Amazonas, José Melo (PROS), e de seu vice, José Henrique de Oliveira (SD), justamente porque o escritório de Bermudes atuava.

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo, disse ontem que é “constrangedor” o desentendimento entre o colega Gilmar e o procurador-geral da República.

— É algo indesejável. Estou há 38 anos no Judiciário e nunca enfrentei uma exceção de suspeição, de impedimento de colega. É constrangedor e ruim para o Judiciário como um todo — disse Marco Aurélio sobre o pedido do PGR.

CÁRMEN LÚCIA DECIDE JULGAMENTO
Recentemente, Gilmar acusou a PGR de vazar informações de investigações sigilosas. Em resposta, Janot disse que o ministro sofria de “disenteria verbal”. O episódio de ontem só reforça o clima de inimizade entre os dois. Para Marco Aurélio, esse tipo de ação é “muito sério”.

— Já estava uma situação delicada quanto ao deslocamento do habeas corpus do Palocci. Agora então... Vamos ver. Que eles fumem o cachimbo da paz — desejou Marco Aurélio.

O ministro disse que caberá à presidente, ministra Cármen Lúcia, a decisão de levar a julgamento em plenário a ação de Janot contra Gilmar. Marco Aurélio lembrou que nunca houve esse tipo de processo no STF.

— Temos que aguardar. A hora é de temperança e serenidade. Vamos esperar os próximos capítulos da novela. Por enquanto, só estou na plateia — disse.

(Colaborou Carolina Brígido)

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