terça-feira, 20 de junho de 2017

Janot vai propor distinção do caixa 2

O procurador-geral, Rodrigo Janot, vai oferecer a suspensão condicional do processo a deputados e senadores que são acusados de usar, em campanhas eleitorais, o caixa dois não vinculado a atos de corrupção. O MPF considera diferentes os casos em que candidatos receberam doações não registradas sem oferecer contrapartidas aos doadores. Pelo menos 50 parlamentares poderão ser beneficiados. O STF decidirá amanhã se os ministros podem rever pontos específicos da homologação de delações premiadas, como a de Joesley Batista, dono da JBS.

Caixa dois sem corrupção terá punição mais leve

Regra pode ser utilizada em processos contra 50 parlamentares

Eduardo Bresciani e Jailton de Carvalho, O Globo

-BRASÍLIA- O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que ontem fez um duro discurso contra os críticos da Lava-Jato, inclusive no Judiciário, vai oferecer suspensão condicional do processo a deputados e senadores que estão sendo acusados de uso de caixa dois não vinculados a atos de corrupção, o chamado caixa dois simples, em campanhas eleitorais. O Ministério Público Federal entende como caixa dois simples os casos em que determinado candidato recebe doação sem oferecer qualquer contrapartida ao doador, mas, mesmo assim, não registra a movimentação financeira na prestação de contas à Justiça Eleitoral. Pelo menos 50 investigados a partir das delações da Odebrecht e JBS atenderiam as condições exigidas pela lei.

Se aceitarem as propostas, os investigados poderiam se livrar mais cedo de eventuais processos da Operação Lava-Jato. A possibilidade de o MPF oferecer a suspensão do processo foi divulgada pelo GLOBO em abril. A análise com vistas à suspensão condicional de processos começou logo após a homologação da delação dos 78 ex-executivos da Odebrecht e segue em andamento. Não está claro ainda quando as primeiras ofertas de suspensão de processos chegarão ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A simples decisão de Janot de adotar a medida, no entanto, deve diminuir a resistência dos meios políticos à LavaJato. Políticos que saírem da lista de investigados certamente vão diminuir a pressão contra as investigações. Investigadores explicam, no entanto, que não se trata de anistia ou perdão para crimes cometidos. Para obter a suspensão do processo, o investigado tem que reconhecer a culpa pelo crime e cumprir uma pena alternativa, em geral, prestação de serviços à comunidade. Ou seja, significa na prática uma antecipação da pena.

A vantagem para o investigado é que, caso cumpra todas as exigências fixadas no acordo de suspensão, se livra de uma vez por todas do processo e mantém a ficha limpa. Investigadores também sustentam não se tratar de medida estratégica para preservar a Lava-Jato. A explicação é que a suspensão condicional do processo está prevista na lei 9.099, de 1995. Portanto, é obrigação do investigador oferecer ao investigado o benefício.

Pelo artigo 89 desta lei, um processo pode ser suspenso por dois ou até quatro anos quando a pena mínima a ser aplicada não for superior a um ano de reclusão e o investigado atender a determinados requisitos, como ter a ficha limpa ou não responder a processo criminal. Do total de senadores e deputados da lista de Janot, pelo menos 50 poderiam poderiam ser contemplados com a medida. Pelas provas obtidas até o momento, eles só poderiam ser punidos com base no artigo 350 do Código Eleitoral.

‘CASTA PRIVILEGIADA SE REFESTELA’
Delatores mencionaram doações para campanhas eleitorais, mas não indicaram contrapartidas. Sem qualquer ato ou omissão para beneficiar os doares, restaria aos investigadores a indicação do crime de movimentação não declarada de recursos. Pela lei, o crime de omissão de dados à Justiça Eleitoral pode ser punido com penas que variam de zero a cinco anos de reclusão. Situação que se encaixaria nas regras da suspensão condicional do processo.

No pronunciamento de ontem, na abertura de um seminário promovido pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Janot afirmou que somente dois tipos de pessoas atacam a Lava-Jato, os ignorantes e os que desejam defender “castas”. Embora não tenha referência direta ao ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, as declarações foram dadas no mesmo dia em que o magistrado do STF criticou, em palestra em Pernambuco, abusos nas investigações.

— Há pessoas que acusam o Ministério Público e a Lava-Jato de abuso. Afirmam que o Brasil está se tornando um estado policial, um estado de exceção. Só dois tipos de pessoas adotam e acolhem esse tipo de discurso. Os primeiros, nunca viveram em uma ditadura, eu vivi. Não conhecem, por experiência própria, o que representa vida sem liberdade. Militam, portanto, na ignorância. Para esses, o esclarecimento dos fatos é mais do que suficiente. 

Mas há também aqueles que operam no engodo, os que não tem compromisso verdadeiro com o país. A real preocupação dessas pessoas é com a casta privilegiada da qual fazem parte. Empunham a bandeira do Estado de Direito, que vergonha, mas desejam defender os amigos poderosos com os quais se refestelam nas regalias do poder. Para essas figuras não há esclarecimento suficiente, porque a luz os ofusca, fogem da verdade com pavor dos que vivem no embuste. Escondem-se nas cavernas sombrias de seus mesquinhos interesses — afirmou o procurador-geral.

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