quinta-feira, 6 de julho de 2017

A voz da política – Editorial | O Estado de S. Paulo

Avança na Câmara dos Deputados o procedimento relativo à denúncia contra o presidente Michel Temer, feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Na terça-feira passada, o deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) foi escolhido relator da denúncia na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O deputado afirmou que analisará a acusação formal contra o presidente Michel Temer com total independência e assegurou que seu parecer será “predominantemente jurídico e, possivelmente, com um viés político”.

Uma denúncia contra um presidente da República é, por si só, um assunto grave, que desperta especulações sobre os seus possíveis desfechos e, naturalmente, gera consequências na economia, na política e na governabilidade. No caso em questão, a despeito das evidentes fragilidades da peça de acusação, a denúncia agrava a crise nacional, produzindo, além dos políticos, efeitos econômicos de monta. Não é de estranhar, portanto, que o País tenha pressa em resolver o assunto o quanto antes.

Em razão de suas inconsistências, a peça apresentada por Rodrigo Janot mais parece um pedido de investigação do que uma acusação formal. Por exemplo, a Procuradoria-Geral da República não apresenta provas da corrupção passiva nem indica as circunstâncias do recebimento pelo presidente da República da alegada propina da JBS. Sendo assim, não deixa de ser exasperador ver o destino do País pendente de um documento juridicamente tão falho.

Diante desse quadro, é especialmente importante que as instituições envolvidas trabalhem diligente e serenamente, dentro de suas atribuições constitucionais. Um cenário como o atual é propício a oportunismos e protagonismos indevidos, que pouco contribuem para o interesse nacional. É hora de seguir a cartilha institucional, ciente de que esse é o único caminho apto a levar o País a bom porto.

No final do mês de junho, o processo na Câmara dos Deputados relativo à denúncia contra o presidente (Solicitação para Instauração de Processo – SIP 1/2017) foi encaminhado à CCJ, conforme dispõe o Regimento Interno da Casa. A comissão deverá apresentar um parecer sobre a autorização da denúncia, que depois irá à votação pelo plenário da Câmara.

A CCJ é uma comissão permanente da Câmara e seu papel é apreciar as matérias que lhe são encaminhadas tendo como critério firme a Constituição. Cabe-lhe, portanto, desvelar ao País, sem medo de pressões, o exato valor jurídico da denúncia feita por Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer.

Mais do que mero procedimento formal, a tarefa da CCJ pode contribuir para desmistificar o conteúdo da denúncia, dando-lhe sua real dimensão. Além disso, o parecer da comissão, se bem feito, pode ir muito além das consequências imediatas relativas ao futuro pessoal do presidente Michel Temer. Ele pode ser a oportunidade para o Congresso esclarecer alguns temas importantes e atuais, que andam um tanto confusos sob a batuta exclusiva do Ministério Público.

A CCJ poderá mostrar ao País, por exemplo, que o combate à corrupção e à impunidade não comporta desleixos com as garantias individuais nem é sinônimo de apoio incondicional a práticas avessas a nosso Direito. O critério deve ser a lei, e não a interpretação que alguns fazem dela.

Ao analisar a SIP 1/2017, a Câmara tem a oportunidade de apresentar uma resposta responsável e equilibrada aos múltiplos anseios da população, que não deseja corrupção, mas também não quer o arbítrio nem tampouco a estagnação do País na crise. Atualmente, muitos querem calar os políticos, todos os políticos. Mas é a Constituição que confere às instituições políticas o direito – e também o dever – de se manifestarem livremente. A Câmara dos Deputados tem uma importante missão a cumprir. Devemos estimular seus membros a cumprir fielmente seus deveres. Afinal, quando as instituições trabalham bem, dentro de suas atribuições, as crises arrefecem e os conflitos se pacificam.

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