domingo, 20 de agosto de 2017

Almir Pazzianotto Pinto analisa política, economia e trabalho em livro

'A Falsa República' defende reforma trabalhista e trata de assuntos que ainda estão na pauta do dia

Sérgio Amad Costa*, Colaboração para o Estado / Aliás

A Falsa República, livro mais recente de Almir Pazzianotto Pinto, traz uma série de artigos escritos pelo autor e publicados na grande imprensa, durante 2016 e os primeiros meses de 2017. Os assuntos nele tratados versam sobre trabalho, política e economia e a maioria ainda está na pauta do dia.

No mundo da política, um deles é o parlamentarismo. Basta surgir uma crise no País e nos deparamos com várias propostas para implementar essa forma de governo. Almir Pazzianotto Pinto tece severas críticas a teses que buscam valorizar a sua adoção no Brasil, salientando que: “Não há sistema de governo eficiente quando, da base à cúpula, a pirâmide política está corroída pela má qualidade.”

Mas o autor não para por aí. Observando por outro ângulo, adverte sobre a inviabilidade da adoção do parlamentarismo como forma de governo no País. Trata-se da cultura presidencialista, sedimentada desde o início da República, marcada em todas as nossas Constituições. Afirma, assim, ser irreparável erro subestimar o peso da tradição.

A terceirização é outro tema na pauta do dia enfaticamente abordado na obra. Creio que as reflexões, nela apresentadas, contribuíram e muito para que tivéssemos, finalmente, um avanço significativo no assunto, com a Lei 13.429, de março de 2017.

Durante mais de 20 anos, quanto aos aspectos jurídicos, a terceirização no Brasil foi normatizada por uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (No 331, de 1993), tendo sido a única orientação disponível sobre o assunto, mesmo contando, nosso mercado de trabalho, com uma infinidade de empregados terceirizados.

Mediante aquela súmula só era permitida a terceirização de profissionais da atividade-meio da empresa. Definia-se, também, como deveria se processar o relacionamento do profissional terceirizado com a companhia contratante. Tal contexto, além de proibir a terceirização nas atividades-fim da empresa, gerou insegurança jurídica para as companhias, no sentido de elas não saberem se estavam terceirizando de maneira correta. Agora, com a nova lei, definiu-se um ordenamento legal, disciplinando as relações de terceirização no País.

O autor cita vários exemplos, mostrando que inibir a terceirização, na esfera da livre iniciativa, é tão insano quanto tentar influir na direção e na velocidade do vento. E demonstra, também, que esta divisão entre atividade-meio e atividade-fim, na terceirização, não faz sentido algum.

O principal argumento dos opositores à terceirização é de que ela gera a precarização do trabalho. Ora, a precarização pode ou não ocorrer com terceirizados ou com empregados efetivos da empresa. Conheço muitos profissionais que há anos trabalham como terceirizados, como prestadores de serviços, e que estão satisfeitos assim, não têm intenção de mudar de regime de trabalho.

Conheço, ainda, muitas empresas que contratam serviços de terceiros e estes não se sentem inferiorizados como profissionais, quando comparados aos empregados efetivos da companhia. Nessa linha de raciocínio, o autor sustenta: “O empregado da prestadora de serviços está sob o guarda-chuva da CLT, é registrado, tem direito a controle de horário, descanso semanal, férias, fundo de garantia, inscrição como segurado do INSS, tanto quanto o assalariado da tomadora de serviços.”

Um tema que não estaria fora desse livro, obviamente, diz respeito à CLT, à legislação trabalhista brasileira em geral. O autor, além de estudioso da área, conheceu, vivenciou, praticamente todos os lados desse ordenamento jurídico. Foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos no final dos anos 1970, Ministro do Trabalho (1985-1988), Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, (1988-2002) e nesses anos recentes tem atuado como advogado e consultor na área trabalhista.

Suas análises antecederam a edição da reforma trabalhista e são importantes para mostrar o porquê dessa mudança na legislação no País. Escreve o autor: “Três fenômenos caracterizam a economia do século 21: globalização, tecnologia e terceirização. É inútil ignorá-los, assim como é estúpido tentar acabar com a livre iniciativa. A legislação trabalhista brasileira, contudo, permanece alheia ou procede como inimiga dos três. Excessivamente intervencionista, ela retira do empresário, que suporta os riscos do negócio, o direito de administrar livremente a empresa. Não percebeu, até hoje, a globalização como fator de mudanças no mercado mundial de trabalho, ignora a tecnologia como força distribuidora e criadora de empregos e combate a terceirização com o falso argumento da precarização, mantendo-se indiferente ao pesadelo vivido por 12 milhões de excluídos do mercado.”

Além das análises contundentes, sobre o envelhecimento da CLT, o livro traz também números que revelam sua inadequação para os dias de hoje. De 1941 quando foi criada, até 2014, a Justiça do Trabalho acolheu 80.538.848 ações, das quais julgou 77.093.810. No período compreendido entre 2011 e 2014 deram entrada 13.370.697 feitos, sendo pagos aos reclamantes, R$ 73,96 bilhões. O número assustador de processos se eleva, ano após ano, independente do desempenho da economia.

A Falsa República é um contributo extremamente oportuno para compreender a história recente do País. Os textos apresentados tratam sobre temas complexos, escritos como muita clareza e objetividade. Isso só se consegue quando o autor conhece profundamente o assunto sobre o qual está versando.
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*Sérgio Amad Costa é professor de recursos humanos e relações trabalhistas da FGV-SP

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