quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Temer vai ao limite

Ruralistas, a maior bancada, recebem agrado

Onze ministros devem se licenciar para votar

Deputados fizeram fila para negociar favores

O presidente Temer não economizou recursos públicos para tentar votar e rejeitar hoje a denúncia por corrupção passiva contra ele. É a primeira vez na História que um presidente é denunciado no cargo. Em um mês, desde que a denúncia foi protocolada na Câmara, Temer já recebeu pelo menos 117 deputados em audiências. Só ontem foram mais de 30, sem contar reuniões com bancadas e eventos nos palácios. Além da enxurrada de emendas liberadas nos últimos dias, editou MP para parcelar dívidas no campo, o que atende à bancada ruralista, a maior e mais poderosa, com 230 deputados. A sessão que decidirá o futuro de Temer está marcada para as 9h de hoje. Para que haja votação, será preciso quorum mínimo de 342 deputados, mesmo número necessário para aprovar o envio da investigação ao STF.

Ataque final

Temer faz ofensiva com ruralistas e devolve ministros à Câmara para barrar denúncia

Leticia Fernandes, Eduardo Barretto e Cristiane Jungblut | O Globo

-BRASÍLIA- O governo de Michel Temer lançou ontem um ataque final na estratégia de conquistar deputados para barrar a denúncia contra ele na Câmara dos Deputados, que terá de decidir hoje, pela primeira vez na História, se autoriza o Supremo Tribunal Federal (STF) a levar adiante a análise do processo contra um presidente da República em exercício do mandato.

Apenas no dia de ontem, véspera da data decisiva, Temer recebeu 31 deputados no Palácio do Planalto — que tiveram os nomes detalhados na agenda oficial — e mais representantes da bancada feminina, que não tiveram seus nomes divulgados pela assessoria do governo até a conclusão desta edição. Desde que a denúncia chegou à Câmara, no dia 29 de junho, Temer recebeu em seu gabinete ao menos 117 deputados federais para negociar cargos e emendas: uma média de quase quatro por dia, isso contando fins de semana.

Além desses encontros registrados na agenda oficial, o presidente participou de uma série de reuniões com congressistas em compromissos fora do Planalto, seja em residências de deputados, no Palácio do Jaburu ou no Alvorada. Sempre para tentar organizar a base e manter-se no cargo. Entre os grupos que receberam a atenção presidencial, um dos mais cortejados foi o dos ligados ao agronegócio, a chamada bancada ruralista, uma das maiores e mais poderosas da Câmara — e que sozinha tem número suficiente para derrubar a denúncia de Temer: são 230 deputados, 58 a mais do que o necessário para impedir o avanço do processo criminal.

Em outra frente para garantir votos, o Planalto preparou uma “invasão” dos “ministros-parlamentares” na sessão de hoje e reforçou o apelo para que todos os deputados compareçam. A estratégia de recolocar os ministros na Câmara tem dupla função: garantir votos a favor de Temer e contra a denúncia e mostrar coesão dos partidos que detêm ministérios em torno de Temer. Até a noite de ontem, o governo ainda estudava quais suplentes dos ministros que também são deputados eram considerados “confiáveis” e em quais casos era melhor fazer a substituição. No total, são 11 deputados que atualmente estão licenciados e com cargos na Esplanada de Temer.

ALMOÇO COM RURALISTAS
O peemedebista almoçou ontem com os ruralistas na sede da Frente Parlamentar Agropecuária, em Brasília, e anunciou benesses. Editou uma medida provisória reduzindo a taxa de contribuição do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) e parcelando dívidas do campo. O almoço contou com a presença de 52 deputados e oito senadores.
O presidente da frente dos ruralistas, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), elogiou o tratamento do governo aos deputados da bancada.

— Nós temos, sim, que pedir muito, mas temos também que saber agradecer aquilo que avançou para o Brasil. O Brasil hoje vive um novo momento. Tem que reconhecer isso politicamente — afirmou Nilson Leitão.

Em 28 de junho, um dia depois de Janot denunciar Temer ao STF, e também na véspera de a denúncia chegar à Câmara, o presidente recebeu representantes de duas frentes parlamentares ruralistas: Frente Parlamentar Agropecuária e Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético. A primeira tem 230 integrantes, enquanto a segunda, 218 — muitos deputados integram as duas frentes.

No dia mais intenso de encontros com deputados, 4 de julho, o primeiro da tramitação da denúncia na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o presidente passou das 8h30m até perto das 23h recebendo deputados no Planalto. Foram ao menos 22.

A Procuradoria-Geral da República apresentou a acusação contra Michel Temer por corrupção passiva que, se recebida pelo STF, levaria o presidente a virar réu e, assim, ser afastado do cargo por 180 dias. No entanto, apesar do aprofundamento da crise política a partir da revelação da delação da JBS pelo GLOBO, tanto a base aliada como a oposição eram unânimes ontem ao afirmar que não há 342 deputados favoráveis à autorização, o que significa que o caso não deve seguir para o STF.

O desafio de Temer passou a ser sobretudo mostrar o tamanho real de sua nova base aliada e se ela terá musculatura para aprovar as agendas prioritárias do governo, atropeladas pela crise política — sobretudo as reformas da Previdência e tributária.

“DESTRUIR” DECISÃO DA CCJ
O presidente acusou ontem a oposição de querer “destruir” o parecer final da CCJ, que, depois de uma manobra, recomendou o arquivamento da denúncia contra ele por corrupção passiva.

— Quem tem que votar são os que querem destruir aquilo que a CCJ decidiu. A CCJ já decidiu. Não há autorização. Agora é o plenário — declarou Temer, que foi questionado se estava confiante. — Sim — limitou-se a falar. Com as articulações a todo vapor, a grande dúvida dos governistas é se haverá quorum para votar a denúncia. O governo tem os votos, mas sabe que, sem a ajuda dos oposicionistas, não garante 342 deputados em plenário, número mínimo necessário para que a votação comece. O temor é o de que o governo fique sangrando permanentemente, enquanto a oposição não comparecer à votação, até que Janot ofereça uma nova denúncia, o que poderia mudar o xadrez da base aliada.

Temer disse aos aliados que, a partir de amanhã, começa uma “segunda fase do seu mandato”. Segundo o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), da tropa de choque de Temer, disse que a primeira fase foi marcada por um “banditismo pessoal” — crítica recorrente dele ao empresário Joesley Batista, que foi recebido no porão do Palácio do Jaburu para tratar de temas nada republicanos.

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