segunda-feira, 4 de setembro de 2017

A década que se esvai – Editorial | Folha de S. Paulo

Mesmo com a melhora das projeções para o desempenho da economia, a renda média dos brasileiros, o PIB per capita, ainda encerrará o ano abaixo do patamar de 2010. Há razoável esperança de que a recuperação prossiga, mas o fantasma da década perdida dos anos 1980 ainda assombra o país.

Aquele colapso no caminho do desenvolvimento nacional, aliás, arrastou-se para além dos simbólicos dez anos. Da profunda recessão de 1981-1983 até o Plano Real, de 1994, a renda por habitante manteve-se praticamente estagnada —até onde permitem enxergar as estatísticas prejudicadas pela hiperinflação do período.

A repetição de uma crise intensa e prolongada dá mostras de quão acidentado e precário tem sido o progresso brasileiro depois do restabelecimento da democracia.

Desde a ruptura do modelo de industrialização e crescimento fomentados pelo poder estatal, que levou consigo o regime autoritário dos militares, o país pena para conciliar o atendimento de demandas sociais e a imprescindível criação de riqueza material.

Ampliou-se a distância que nos separa das nações ricas e dos emergentes mais bem-sucedidos, como demonstra a participação brasileira no PIB global —que, de 1980 para cá, minguou de 4,3% para 2,5%.

O desempenho da primeira década deste século, embalado pela conjuntura internacional favorável, sugeria um destino mais animador, apesar do descaso com mudanças institucionais necessárias.

Não parecia crível que danos posteriores, em grande parte autoinfligidos, pudessem causar tamanho e perigoso descaminho.

Atos de descomunal inépcia econômica e orçamentária, em especial nos anos derradeiros da administração petista, contaram com a conivência de grupos sociais e políticos relevantes, da esquerda à direita do espectro ideológico.

Mesmo com a recessão aparentemente superada, ainda faltam consensos políticos elementares para propiciar uma retomada econômica mais sólida —trata-se de como disciplinar as despesas públicas e dividir de forma equânime os custos do ajuste.

O país não está condenado a reviver a grande estagnação da década perdida. Mas dificilmente poderá prescindir do surgimento de lideranças que percebam a urgência de mudanças profundas na sustentação e orientação do Estado.

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