terça-feira, 5 de setembro de 2017

Economia deixa a recessão em baixa velocidade – Editorial | Valor Econômico

A economia brasileira saiu da recessão, mas por pouco. Depois de crescer 1% no primeiro trimestre, apresentou novo resultado positivo no segundo, com alta de 0,3% ante o mesmo trimestre de 2016 e de 0,2% sobre os três meses anteriores. A saída da recessão mais destrutiva da história contemporânea do país não será rápida, como poderia ser em outras condições. Todos os componentes do PIB pelo lado da oferta e da demanda têm limites evidentes e não devem se acelerar. Os analistas revisaram as projeções para melhor. No boletim Focus, o crescimento de 2017 chegou a 0,5%, enquanto que para 2018 as apostas se concentram em torno de 2%.

O consumo das famílias provocou a virada, em um trimestre em que a agropecuária, que avançara a um ritmo de dois dígitos nos três primeiros meses do ano pouco contribuiu agora para o resultado. Os motivos principais da a reação foram a rápida queda da inflação, o início da reversão do desemprego, com melhorias localizadas no trabalho informal, e, subsidiariamente, o estímulo de R$ 44 bilhões do FGTS.

As famílias conseguiram em parte reduzir seu endividamento com o dinheiro do FGTS, enquanto que a melhoria salarial decorrente do comportamento suave dos preços pode ter dado alguma folga inesperada no orçamento. A redução do desemprego funciona como um fator de confiança que empurrará as compras no futuro. Há, porém, dúvidas pertinentes sobre o fôlego do consumo nos próximos trimestres. Como observou Thiago Curado, da consultoria 4E, em artigo no Valorontem, o aumento da renda não foi causado por ganhos de produtividade, aumento dos investimentos - que continuaram declinando no segundo trimestre - ou evolução positiva dos termos de troca. Em consequência, a brusca freada da inflação, teria apenas transferido renda entre setores da economia. A continuidade e os efeitos dessa transferência sobre o crescimento seriam agora difíceis de prever.

Pelo lado da demanda, os demais componentes empurraram para baixo o resultado. Os investimentos dão os sinais mais preocupantes para a saúde futura da economia e os mais previsíveis. Há ainda uma enorme capacidade ociosa na indústria, que não desaparecerá tão cedo. A indústria automobilística saiu na frente, ajudada pelas exportações, mas ainda tem capacidade ociosa significativa. Em geral, as empresas têm se dedicado a reduzir seu elevado endividamento, esforço que já apareceu nos balanços trimestrais. A queda das taxas de juros aponta para condições mais benéficas para o pagamento das dívidas, ao passo que não há ainda motivos suficientes para direcionar recursos para investimentos. Como resultado, a formação bruta de capital fixo contraiu 6,5% no segundo trimestre, o 13º recuo consecutivo.

Dos gastos do governo nenhum alento virá. Eles encolheram 2,4% no segundo trimestre e 1,4% no primeiro. E a maior parcela do ajuste inconcluso e incerto das contas públicas se apoiou no corte dos investimentos. As exportações, por seu lado, vêm crescendo, mas as importações, se a recuperação se firmar, reduzirá o impulso positivo do setor externo para o PIB. No semestre, isso já ocorreu. As compras do exterior avançaram 2,9%, ante 2,2% das vendas externas.

Pelo lado da oferta, os serviços reagiram e avançaram 0,6% no semestre, um reflexo direto do aumento do consumo das famílias, com o destaque do comércio, o único setor positivo na comparação trimestre ante trimestre.

No acumulado do ano o PIB não cresceu e a indústria de transformação continua com queda (estável) de 1,1%. As previsões são mais otimistas agora. Segundo Braulio Borges, da LCA Consultores, o carregamento estatístico de dois trimestres positivos levarão o PIB a crescer pelo menos 0,4%, caso nos dois últimos trimestres a economia se estabilize no nível observado no segundo trimestre. Há previsão positiva para o comportamento da indústria, algo como 0,5% de crescimento no ano.

A recessão ficou para trás, mas a velocidade da retomada é lenta o suficiente para tornar possíveis os reveses. Ainda que a situação fiscal seja de extrema gravidade, os riscos para a economia tendem a vir do lado político. O programa de concessões e privatizações do governo teria o poder de sacudir a letargia dos investimentos, mas não é possível vislumbrar agilidade no processo com o presidente da República na iminência de ser atingido pela segunda leva de denúncias da Procuradoria Geral da República.

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