sábado, 14 de outubro de 2017

Chamada de risco | Míriam Leitão

- O Globo

Solução para a Oi não pode envolver recurso público. Qualquer solução para a Oi que signifique colocar dinheiro público ou vantagens especiais no pagamento de dívidas com credores estatais é inaceitável. A empresa tem no seu DNA o intervencionismo estatal e isso é parte do problema. Apesar de a companhia estar arruinada, salários e bônus de diretores superam os de concorrentes mais saudáveis. Sua dívida é tal que estoura qualquer limite aceitável.

O assunto se arrasta. A quem interessa tanta demora? Nos formulários que a companhia entrega à CVM há alguns indícios. Os ocupantes das três diretorias estatutárias receberão neste ano R$ 45,8 milhões, incluídos aí R$ 21,6 mi em bônus. Levarão para casa 50% a mais do que no ano passado, quando a Oi registrou prejuízo líquido de R$ 7 bilhões. A Telefonica, dona da líder Vivo, pagará bem menos, R$ 10,9 mi. Uma mudança na gestão da Oi é uma medida tão urgente quanto o acordo com credores.

A dívida é astronômica: R$ 64,5 bilhões contando os cerca de R$ 20 bi devidos a bancos públicos e à Anatel. Para honrar os compromissos, a companhia precisa de 10 anos de geração operacional de caixa, que está em R$ 6,5 bi, nos números da consultoria Economatica. Em empresas saudáveis, a relação entre dívida e Ebitda chega a, no máximo, três vezes.

Ontem, credores contestaram os termos do acordo apresentado. O plano é que um grupo, que detém R$ 32,5 bi em dívidas da Oi, troque seus títulos por ações. Se a proposta prosperar, o grupo terá que aportar R$ 3,5 bi para investimentos, e os atuais acionistas investiriam apenas R$ 2,5 bi. A crítica é que, desse modo, os acionistas atuais seriam beneficiados. A assembleia decidirá sobre a proposta dia 23. Se aprová-la, os que detém ações serão diluídos. Nesse grupo está a BNDESPar, que ainda mantém 4,6% do capital da operadora. O BNDES, o BB e a Caixa tinham créditos de R$ 10 bi com a Oi no início da recuperação judicial; a empresa responde por 17,8% de todo o saldo inadimplente no banco de fomento. Um movimento de acionistas pressiona o Planalto para transformar as multas de R$ 11 bi com a Anatel em investimentos. A Advocacia Geral da União diz que nenhuma hipótese foi descartada, nem a intervenção. Fundos acompanham o caso.

O uso de dinheiro público seria mais uma vez para proveito privado. Tem sido assim na longa história de erros da Oi. Ela começou apelidada de “Telegangue” quando foi arrematada no leilão por um consórcio formado às pressas por empreiteiras e empresas que não eram do ramo. Depois, no governo Lula houve um esforço direto para transformá-la na grande tele brasileira. Foi o pior erro. Em 2008, o governo mudou a lei que impedia a concentração e empurrou bancos públicos para financiar a compra da Brasil Telecom. Em 2010, a Portugal Telecom comprou parte da companhia e levou seus próprios problemas para dentro da Oi. A dívida continuou a crescer e no ano passado foi feito o pedido de recuperação judicial, o maior da história do Brasil.

— A reestruturação não deve se resumir à dívida. A Oi precisa melhorar sua operação. Hoje, ela é uma fábrica de prejuízos. A demora no acordo faz a dívida aumentar e deixa o plano de recuperação ainda mais caro — diz Luiz Alberto de Paiva, da Corporate Consulting.

Uma das possibilidades seria a venda de ativos, de partes da Oi. A lei de recuperação judicial, inclusive, prevê que “unidades produtivas isoladas” possam ser negociadas no processo, sem carregar as dívidas trabalhistas e tributárias da empresa em apuros. Mas nada parecido foi proposto até agora.

— Ao menos dessa vez, a solução tem que passar longe do dinheiro público. Ajuda do governo já não é recomendável em tempos de bonança. Hoje não há sequer espaço fiscal — alerta Sergio Lazzarini, do Insper.

A empresa ainda é grande, mas tem perdido participação no mercado e é campeã de reclamações. Perdeu a liderança na rede fixa para a Vivo. Em São Paulo, tinha 17% das linhas móveis e agora tem 12,5%. Mesmo assim a companhia é relevante em vários mercados. Entre as 10 maiores capitais, a Oi é líder na telefonia móvel em Salvador, Fortaleza e Recife. Pelo interior, há centenas de cidades só atendidas por sua rede. Mas a crise ameaça a qualidade do serviço. Na tecnologia moderna de internet móvel, a 4G, a Oi atende a apenas 284 cidades, pouco mais de 10% da líder TIM. Em um mercado tão competitivo, a necessidade de investimento é intensa. E a empresa está parada no tempo.

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