domingo, 12 de março de 2017

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Não vejo nenhum político capaz de pensar o Brasil. Eles terão que descobrir o caminho caminhando. Não poderá ser o programa de antes, tem que ser o programa de agora, e o programa de agora tem que considerar Trump no governo. Não é só o Trump nos Estados Unidos, mas o mundo de Trump, e quem sabe quem vai estar ao lado dos Estados Unidos. Marine Le Pen estará ao lado dele? É um mundo difícil, e me lembra muito o mundo dos anos 1930, só que os anos 1930 culminaram com a guerra. Talvez seja uma coisa ingênua da minha parte, mas acredito que a guerra não virá, porém o clima de competição por mercados, tal como os anos 1930, vai continuar, vai ser forte, e isso é perigoso.

Nesse contexto, o Brasil não pode observar o mundo através de binóculos, o Brasil tem que ser protagonista desse mundo: lutar pela paz, pelos direitos, pela defesa de suas conquistas sociais. O Brasil é um país extraordinário, muito bem-sucedido, enérgico, vibrante. Ele tem conflitos, não encontrou ainda sua forma política, mas vai encontrar, porque está procurando.

Nós também estamos com um déficit de pensamento muito grande, os nossos intelectuais recuaram, estão defensivos. Se olharmos para a inteligência de outros momentos, ela era irrequieta, ativa, criativa, mas ela tem que renascer agora, porque ficou muito anestesiada nesses anos de governo do PT, como se o paraíso já tivesse sido alcançado.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo e professor da PUC-Rio. Entrevista à IHU On-Line.

Ministros vão levar ao TSE debate sobre caixa 1 ilegal

Decisão do Supremo será analisada no julgamento da chapa Dilma-Temer

Tribunal Eleitoral já colheu 52 depoimentos no processo iniciado em dezembro de 2014

Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) disseram ao GLOBO que, no julgamento da chapa Dilma-Temer, deverá ser levado em consideração o entendimento da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de que doação oficial de campanha não legaliza dinheiro de propina. Para esses ministros, ouvidos por Carolina Brígido a chapa poderá ser cassada se for comprovado o recebimento pelo caixa 1, na eleição de 2014, de dinheiro do esquema de corrupção na Petrobras.

TSE de olho no caixa 1

Corte vai analisar se houve uso de dinheiro ilícito em doações oficiais à chapa Dilma-Temer

Carolina Brígido | O Globo

-BRASÍLIA- Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) devem levar em consideração o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre propina disfarçada de doação legal de campanha no julgamento da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer. Na semana passada, a Segunda Turma do Supremo, que julga os processos da Lava-Jato, decidiu que pode ser considerado crime receber dinheiro de origem ilícita e, para “lavar” os recursos, declarar à Justiça Eleitoral como doação. Caso o mesmo entendimento seja adotado pelo TSE, e se ficar comprovado no processo que a campanha presidencial de 2014 recebeu dinheiro desviado da Petrobras, a chapa pode terminar cassada.

TSE aguarda dados do computador da Odebrecht

Detalhamento de doações vai ajudar julgamento da chapa Dilma-Temer

Cristiane Jungblut e Carolina Brígido | O Globo

-BRASÍLIA- Dados do computador que armazenava informações sobre o Departamento de Operações Estruturadas, conhecido como o setor da propina na Odebrecht, vão ser usados no processo que investiga a chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As informações, aguardadas pelos investigadores e em poder da Polícia Federal, estão prestes a ser juntadas ao processo, e podem trazer novos indícios sobre doações declaradas ou em caixa 2 para a chapa que venceu as eleições em 2014 .

Os advogados dos partidos dizem que as novas planilhas serão fundamentais para esclarecer os valores dos repasses em 2014. O problema, segundo eles, é que os dados fornecidos pela Odebrecht nos depoimentos vão até março de 2014, e o detalhamento de todo o ano eleitoral está no computador da empresa.

— Ficou visto que ninguém tem os números. A última planinha existente é de março de 2014. Falta a planilha da Suíça — disse um dos advogados que acompanhou as acareações na última sexta-feira entre ex-dirigentes da Odebrecht.

DEFESA PEDE SIGILO DE VÍDEOS
O relator do caso da chapa Dilma-Temer no TSE, ministro Herman Benjamin, disse na abertura da sessão de acareação que eles estavam ali não para confrontar versões, mas para esclarecer alguns pontos.

As defesas de executivos da Odebrecht que firmaram acordos de delação premiada pediram ao ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), que mantenha sob sigilo os vídeos dos depoimentos prestados pelos seus clientes. Pelo menos 18 pedidos chegaram ao tribunal até agora. Os advogados alegam que a divulgação dos vídeos pode representar excesso de exposição dos delatores.

Candidatura de Lula deve ser lançada antes de depoimento a Moro

Petista pretende anunciar em abril que concorrerá ao Planalto pela sexta vez

Mariana Sanches e Sérgio Roxo | O Globo

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está decidido a disputar pela sexta vez a Presidência, e o PT se organiza para fazer um evento de lançamento da candidatura, provavelmente no mês que vem.

Com esse cronograma, Lula já sentaria na condição de précandidato diante do juiz Sérgio Moro, no dia de 3 de maio, para depor na fase final do processo em que é acusado de ter sido beneficiado pela construtora OAS na compra de um apartamento tríplex no Guarujá (SP).

Petistas avaliam que o anúncio da intenção de disputar a eleição de 2018 cria um fato político e, em caso de condenação, reforça o discurso de vitimização e perseguição que o ex-presidente tem adotado desde que passou a ser investigado na Lava-Jato. A condição de pré-candidato ajudaria ainda a mobilizar os simpatizantes do ex-presidente a irem a Curitiba para acompanhar a audiência. A CUT planeja organizar caravanas para fazer um espécie de vigília na frente do prédio da Justiça Federal.

— Na minha avaliação, o Lula tem que ser lançado o mais rapidamente possível. Temos que apresentar um projeto alternativo e mostrar que o país pode voltar a crescer — afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que tenta viabilizar a sua indicação para presidir o PT e nega a intenção de constranger Moro.

A ideia de Lula é fazer o anúncio da candidatura junto com uma crítica dura às medidas econômicas do governo do presidente Michel Temer. O petista tem feito uma série de reuniões com economistas.

Sem plano B para disputar o Planalto em 2018, o PT avalia que é preciso apostar as fichas em Lula mesmo com o risco de o ex-presidente ser enquadrado na lei da Ficha Limpa. Isso aconteceria se, além de ser condenado em primeira instância em um dos cinco processos que responde, o petista visse a decisão ser referendada na segunda instância.

Rigoroso, ministro que julga Dilma e Temer quer chegar ao Supremo

Letícia Casado, Marina Dias | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Não era sua especialidade, mas o ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Herman Benjamin decidiu fazer desta a ação de sua vida.

E não era para menos. Aos 59 anos, o paraibano Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin é o relator do maior processo da história do tribunal, que pode cassar, por abuso de poder político e econômico, a chapa presidencial composta por Dilma Rousseff e Michel Temer nas eleições de 2014.

Precisou deixar de lado causas de direito ambiental e do consumidor, áreas nas quais é referência, para se debruçar com rotina quase acadêmica –com inúmeras horas de estudo e levantamento de detalhes– ao financiamento eleitoral.

Seu voto será histórico, e ele sabe disso. A amigos confidenciou recentemente que apresentará seu parecer em abril, antes do fim do mandato dos ministros Henrique Neves e Luciana Lóssio.

Os dois deixarão o TSE neste ano e especulações de que Temer os substituirá por magistrados alinhados ao governo incomodou Benjamin.

Quem o conhece aposta que ele vai votar pela cassação sem a separação das contas da campanha –oposto do que deseja a defesa do presidente peemedebista.

Partidos usam fundo para bancar de bebida a jatinhos

Fundo Partidário banca de jatinho a contas pessoais

Siglas receberam R$ 3,57 bilhões em contas ainda não analisadas pelo TSE; recursos públicos financiam gastos obscuros e técnicos apontam falta de transparência

Pedro Venceslau e Daniel Bramatti | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Os recursos públicos repassados aos partidos brasileiros pelo Fundo Partidário representam uma “caixa-preta” de R$ 3,57 bilhões e financiam gastos obscuros e, em muitos casos, questionados pela Justiça Eleitoral. Entre as despesas estão viagens de jatinho, bebidas alcoólicas, jantares em churrascaria e até contas pessoais de dirigentes.

O valor se refere ao total recebido pelos partidos entre 2011 e 2016, corrigido pela inflação, e está nas prestações de contas à espera de julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A estimativa da corte é que o passivo some aproximadamente 560 mil páginas, divididas em centenas de pastas. As legendas costumam apresentar notas fiscais sem especificar como, quando, onde e para qual finalidade foi gasto o recurso público.

Técnicos do TSE ainda tentam avaliar as contas referentes a 2011, que foram entregues em abril de 2012. O julgamento desse material vai ocorrer no dia 28 de abril, dois dias antes da prescrição, cujo prazo é de cinco anos – a partir daí, não é mais possível punir os partidos por eventuais irregularidades.

Siglas negam irregularidades nas despesas

PSDB diz que jatos foram usados para cumprir agenda partidária; PRP devolveu dinheiro de vinho

Pedro Venceslau | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Os partidos que usaram recursos do Fundo Partidário para realizar viagens em jatos fretados, comprar aparelhos televisores de alto valor, custear o consumo de bebida alcoólica ou apresentaram notas com informações incompletas nas prestações de contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negaram qualquer irregularidade.

Questionado sobre a contratação de empresa que pertence a dirigentes, o PSDC disse que em seu estatuto “não há nenhuma vedação” para que a sigla possa usufruir prestação de serviços de empresas da qual participem seus membros. O PSDC afirmou que a Constituição assegura aos partidos “autonomia para definir sua estrutura interna”. Na prestação de contas de 2011, os técnicos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) questionaram a contratação da Maxam Serviços Administrativos e a 74 Propaganda por pertencerem a filiados.

Banco Mundial defende a ampliação do Bolsa Família

Fernanda Perrin – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O governo precisa ampliar o Bolsa Família para evitar o aumento da pobreza na recessão, defendeu o Banco Mundial em estudo publicado em fevereiro.

Ao propor o incremento no programa social, a instituição "fez seu papel de advogar pelos pobres", disse seu economista Emmanuel Skoufias.

"Se isso é possível, o Brasil que tem que decidir", afirmou à Folha, ao ser questionado sobre a viabilidade da proposta em um momento em que cortar gastos é o mote do governo.

Segundo o Banco Mundial, deter o avanço da pobreza durante a crise depende de aumento do investimento no programa social de R$ 28 bilhões em 2016 para R$ 30,4 bilhões neste ano. A previsão do governo é gastar R$ 29,3 bilhões em 2017.

Esse seria o modo mais efetivo de impedir que o país some 2,5 milhões de novos pobres entre 2015 e 2017 –um retrocesso no combate à desigualdade da última década.

Entre 2004 e 2014, mais de 28 milhões de brasileiros saíram da linha abaixo da pobreza, de acordo com o relatório da instituição.

Sem esse investimento, o banco calcula que a proporção de pessoas em situação de extrema pobreza (com renda per capita inferior a R$ 70) subiria de 3,4% em 2015 para 4,2% em 2017. Com a ampliação do programa, o número em 2017 cairia para 3,5%.

Considerando a faixa de pobreza (renda per capita de até R$ 170), a proporção subiria de 8,7% para 9,8% em um cenário sem elevação do orçamento do programa, ante 9,5% caso o investimento seja feito.

Na corte do Rei Artur - Fernando Gabeira

- O Globo

As revelações dos dirigentes da Odebrecht inauguram a fase da tsunami que deverá levar o Brasil a reformar seu sistema político. Não podia dar certo. A Odebrecht deu R$ 10,5 bilhões aos políticos. De um modo geral, ela ganha quatro vezes o valor de suas propinas. Uma só empresa, portanto, deve ter faturado R$ 42 bilhões de vantagem nessas operações. Janot decidiu não quebrar o sigilo da ação internacional da Odebrecht: é o que dizem os jornais. Isso esconderia um pedaço do Brasil por algum tempo. É um pedaço tão sinistro que, no futuro, de alguma forma, o país terá que se desculpar por ele. Interferência em seis processos eleitorais estrangeiros, compra de ministros e até de presidentes, como no Peru — tudo isso é um escândalo sem precedentes. Ele vai se tornar muito mais grave se concluirmos que a Odebrecht foi financiada pelo BNDES. A corrupção no continente e na África era movida com dinheiro oficial, um eufemismo para dinheiro do povo.

Os danos à imagem do Brasil, infelizmente, não se esgotam nessa trama que Janot, aparentemente, quer manter em sigilo. O jornal “Le Monde”, numa reportagem de grande repercussão, afirmou que o Brasil teria comprado a escolha do Rio para a Olimpíada. Um empresário brasileiro depositou cerca de US$ 1,5 milhão na conta de um dirigente do COI. Nesta semana, um dos envolvidos no episódio, Frank Fredericks, pediu demissão. Ele monitorava o sorteio e levou US$ 300 mil. O mais interessante da história é o personagem que surgiu como o corruptor ativo, o empresário brasileiro Arthur César de Menezes Soares Filho, velho conhecido da política fluminense: o Rei Artur. Ele era dono da Facility e tinha amplos negócios com o governo Cabral. Eram amigos. Lá fora, isso não importa. O que as pessoas guardam é a ideia de que o Brasil comprou a Olimpíada.

Pressão estrutural por gastos públicos (1) - *Pedro S. Malan

- O Estado de S. Paulo

Corremos o risco de um 'futuro adiado' se não nos erguermos à altura dos desafios do presente

Este é o primeiro de uma série de três artigos sobre três processos de mudanças de longo prazo que marcaram nossa experiência ao longo de décadas passadas e continuarão a marcar décadas vindouras. Muito além dos debates de 2017-2018 e dos próximos mandatos presidenciais de 2019-2022 e 2023-2026.

As três mudanças de longo prazo estão na raiz da pressão estrutural por maiores gastos públicos no Brasil. Uma pressão que acabou por tornar imperativa a emenda constitucional sobre limites à expansão continuada desses gastos e da reforma da Previdência, ora no Congresso, sem a qual, entre outras, o Brasil não terá condições de retomar o crescimento sustentado com inflação sob controle e maior justiça social.

O primeiro processo, como pano de fundo, é o elo crucial entre mudanças demográficas e urbanização: o Brasil é hoje a terceira maior democracia de massas urbanas do mundo. O Brasil será um “case” (estudo de caso) de relevância e interesse global, dada a sua extraordinariamente rápida transição nessa área.

Índios em perigo – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

O alerta é de Marina Silva: os direitos dos índios estão ameaçados pelo avanço dos ruralistas no Congresso e no governo Temer. A preocupação da ex-senadora aumentou após a nomeação do novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio. Ligado ao agronegócio, ele disse à Folha que a demarcação de terras não "enche barriga" de ninguém.

"A não demarcação das terras indígenas é que condena essas comunidades à fome e destrói seu modo de vida", reage Marina. "O agravamento do retrocesso já é patente, e o maior temor é o de aumento da violência contra os índios", acrescenta.

Uma reação datada - Sérgio Besserman Vianna

- O Globo

Há uma onda histórica forte de rejeição aos aspectos frágeis da globalização
A física contemporânea ainda está longe de compreender o tempo. Mas, séculos atrás, Santo Agostinho já disse algo muito interessante sobre o tempo dos humanos: “Existem três tempos, o tempo presente das coisas passadas, o tempo presente das coisas presentes e o tempo presente das coisas futuras.”

Vivemos no tempo presente, mas ele contém o passado e as memórias, falsas ou verdadeiras, e as expectativas, sonhos e investimentos sobre o futuro.

A eleição de Donald Trump, o Brexit, os autoritarismos na Rússia, China, Turquia e muitos outros, além da ascensão eleitoral da extrema-direita na Europa, levaram muitos analistas a considerarem revertida a tendência acelerada de globalização que vem de 1945 e que se acentuou muito dos anos 1980 até os dias de hoje.

Mitos - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

Criam-se mitos e deturpa-se a verdade, mas a Operação Lava Jato está firme e forte

É inacreditável a capacidade da política brasileira (ou seria da política em qualquer lugar do mundo?) de criar mitos, endeusar ou demonizar líderes, falsear a realidade e manipular dados, tudo isso potencializado pelo marketing e agora pelas redes sociais.

“Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”, descobriu, usou e abusou Joseph Goebbels, orgulhoso por ajudar a transformar Hitler em Hitler. Na adaptação feita no Brasil, também com enorme sucesso, ficou assim: “Se os fatos não correspondem à versão, danem-se os fatos”.

E assim se multiplicam “verdades absolutas” que não passam, ou não deveriam passar, por simples mecanismos de checagem, por uma avaliação banal ou pelo velho bom senso. Elas surgem de um papo, uma reunião, um interesse, e ganham asas sem contestação. Quem não conhece alguém capaz de defender apaixonadamente teses absurdas e ídolos de pés de barros?

Sempre haverá Casablanca - Cacá Diegues

- O Globo

Num momento em que a América, país feito por refugiados, parece estar sendo ensinada a odiá-los, todos nós devemos dar uma nova olhada em ‘Casablanca’

Em tempo de intolerância nos EUA, todos devemos rever “Casablanca” Independentemente do valor artístico, certas obras se tornam referências culturais para se entender determinado tempo e seus costumes. No cinema, elas podem ou não ter valor cinematográfico, mas são um marco para se desvendar o lugar e a época em que foram feitas, uma espécie de contribuição decisiva ao dado histórico.

“Casablanca”, produzido em 1942, é um destacado exemplo disso. Um filme que custou a ter reconhecimento artístico (que ainda se duvida que mereça), nunca perdeu o interesse de cinéfilos, cronistas e curiosos de todas as tendências e idades. A ponto de tornar de domínio público expressões criadas por seus roteiristas, os gêmeos Julius e Philip Epstein, e Howard Koch, um escritor engajado, coisas como “Here’s looking at you, kid”, “Round up the usual suspects”, “Play it, Sam” (sem o “again” acrescentado por Woody Allen), e outras irreverências, pensamentos cínicos e melancólicas declarações de amor. Segundo David Mikics, essas frases acabaram por se tornar parte da cultura popular americana como, por exemplo, o discurso de Lincoln em Gettysburg.

PT e PSDB, mensalão e acordão - Vinicius Torres Freire

- Folha de S. Paulo

Quase todos os partidos querem uma passagem para o trem da alegria da anistia para o caixa dois e para dinheiro "legal" de campanha com origem suja. A negociação anda frenética.

Essa paz dos cemitérios começa a receber apoio de gente de fora do universo paralelo da política politiqueira. Gente da direita à esquerda; letrados, causídicos e capitalistas. Dão ares de armistício de interesse nacional à tese de Aécio Neves: se pegam os menos piores, fica tudo de lambuja para forasteiros suspeitos.

Dado o momento histórico (ironia), convém lembrar a semelhança da tese do acordão de 2017 com os argumentos a que PT e PSDB (sic) recorriam para se defender no mensalão, em 2005. Recordar é viver. Ou não.

Entre o quebra-galho e a política da eficiência - Rolf Kuntz

- O Estado de S. Paulo

O comércio exterior pode ser um teste do alcance e do sucesso da pauta de reforma

Quebra-galho em tempos de aperto, quando a clientela nacional fica arredia: essa continua sendo a principal serventia do mercado externo para boa parte das indústrias brasileiras. Com a recessão brava no ano passado, empresários mais uma vez saíram atrás de negócios no exterior. É preciso levar em conta esse dado para explicar a participação das vendas externas no faturamento industrial, em 2016. Outros fatores, como o câmbio mais favorável, podem ter pesado, mas a contração das operações locais foi certamente um estímulo importante.

A variação foi medida num levantamento periódico da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Entre 2014 e 2016 o coeficiente de exportação passou de 14,3% a 19,3%, a preços correntes, e de 12,1% a 16,3% a preços constantes. O aumento das vendas de manufaturados já havia sido mostrado nas estatísticas oficiais de comércio exterior. Mas as notícias seriam muito mais animadoras se indicassem uma tendência. É cedo, no entanto, para apostar nisso.

Desafio é do país - Míriam Leitão

- O Globo

O Brasil tem que fazer a reforma da Previdência. Não por este governo ambíguo e de transição, mas pelo país. Já deveria ter feito e todas as propostas foram sendo aguadas pela tibieza dos políticos, e pela força de grupos de pressão que, mesmo sendo minoritários, têm mais acesso ao poder. O então deputado Michel Temer ajudou a enfraquecer a reforma sugerida por Fernando Henrique.

Temer foi o relator da reforma que ficou tão fraca que precisou da gambiarra do fator previdenciário. Agora, ele é que enfrenta a pressão de sua base para enfraquecer a proposta que apresentou. Nenhuma reforma é isenta de defeitos, mas o que está errado na atual exigiria mais reforma e não menos. Um ponto necessário seria sua ampliação para os militares. Nada, a não ser a velha covardia dos líderes civis diante das Forças Armadas, explica a exclusão dos militares de uma proposta que deveria incluí-los. Eles não são uma casta superior.

A falsa escolha de Temer - Vera Magalhães

- O Estado de S. Paulo

Temer nunca enxergou a possibilidade de chegar, pelos braços do povo, à Presidência

Em entrevista recente ao semanário britânico The Economist, o presidente Michel Temer disse, ao defender as reformas propostas por seu governo, que prefere ser impopular a agir como um populista. No caso do peemedebista, não se trata, porém, de uma opção republicana, e sim de uma completa impossibilidade.

Nas vezes em que tenta usar linguajar popular ou agir como um político populista, indo aonde “o povo está”, Temer invariavelmente parece um alienígena.

Segurar uma caneca de chope cercado de misses da Oktoberfest e inaugurar uma obra no sertão nordestino cercado de políticos aliados parecem ser para o presidente tarefas mais penosas e maçantes do que escrever epístolas recheadas de citações em latim ou enfileirar mesóclises em longos e enfadonhos discursos.

E por que é assim? Pelo simples fato de que Temer, diferentemente de outros políticos como Lula ou José Serra, nunca enxergou como uma possibilidade concreta de evolução da carreira política chegar à Presidência da República pelos braços do povo.

O peemedebista foi um político tardio. Sua filiação ao PMDB se deu aos 40 anos. Assumiu seu primeiro cargo no primeiro escalão de um governo depois disso. A primeira candidatura, a deputado federal em 1986, veio só aos 45, e só lhe assegurou uma suplência. Mesmo tendo assumido o mandato e desempenhado papel importante na Constituinte, em 1990 obteve esquálidos 32 mil votos, que lhe renderam de novo apenas a suplência.

Atingiu o ápice eleitoral em 2002, já presidente do PMDB e depois de ter ocupado duas vezes a presidência da Câmara, quando obteve 252,2 mil votos. A partir daí, novo declínio na popularidade nas urnas: se meteu numa empreitada desastrosa de ser vice de Luiza Erundina na eleição para a Prefeitura de São Paulo em 2004. Ficaram em quarto lugar. E na última eleição para a Câmara que disputou, em 2006, foi o menos votado do PMDB e só chegou ao posto pelo coeficiente eleitoral.

Foi a ascensão a dirigente partidário que garantiu fôlego político a Temer, não sua popularidade ou algum traço de pendor populista. Só pelo fato de estar no comando do PMDB foi ele o escolhido para ser vice de Dilma Rousseff em 2010, uma vez que sua relação com Lula, o patrono da candidatura, nunca foi das melhores.

Mesmo internamente, seu comando no PMDB sempre esteve sujeito a questionamentos, na maioria das vezes vindos da ala do Senado. Foi para se blindar a eles e se manter no poder que Temer se cercou do grupo que o ajudou a pavimentar a estrada do impeachment de Dilma Rousseff e, agora, compõe o núcleo político que é uma das causas da impopularidade do presidente.

Portanto, não se trata de escolha – populismo versus impopularidade. A popularidade seria algo difícil de alcançar pelos atributos pessoais ou pela trajetória de Temer, que sempre foi mais cioso de sua imagem como constitucionalista ou articulador político do que preocupado em ser um líder carismático.

É verdade que Temer poderia fazer opções populistas no poder para ao menos mitigar essa impopularidade atávica? Em tese, sim. Mas é preciso lembrar que a conjugação de forças que tornou viável o impeachment envolveu um compromisso do então vice com a volta aos fundamentos de ortodoxia econômica que permitissem corrigir os desatinos fiscais de Dilma Rousseff. Portanto, não há esta escolha.

Resta a ele tentar fazer de tanto limão uma limonada azeda. Aprovar as reformas – tão impopulares quanto ele – seria um feito e tanto para um presidente acidental. Retomar ao menos o caminho do crescimento também. Já na política há pouco ou nada a fazer diante de uma Lava Jato e uma entourage política que nunca o deixarão ser bem avaliado. Melhor ir costurando mesóclises e esperar que 2018 chegue logo.

Um truque para salvar planos quebrados - Elio Gaspari

- Globo

O deputado Ricardo Barros é aquele engenheiro que o ministro Eliseu Padilha mencionou como o “notável” do Partido Popular, que substituiu o médico Raul Cutait durante o processo de escolha do ministro da Saúde de Michel Temer. O maior doador de sua campanha eleitoral, com um cheque pessoal de R$ 100 mil, foi o empresário Elon Gomes de Almeida, dono do plano de saúde Aliança.

Barros entrou atirando. Criticou a amplitude do SUS e disse que estimularia a adesão de novos fregueses aos planos de saúde privados. Disse isso numa época em que há grandes planos de saúde quebrados, outros na fila e todos sofrendo um dreno de 1,5 milhão de fregueses, 192 mil só em janeiro passado.

Para resolver o problema dos planos, e só deles, Barros lançou a ideia de um plano popular no qual os clientes fingem que pagam e os maganos fingem que atendem. Um sistema de medicina privada que produz bilionários (em dólar) está precisando de dinheiro e quer buscá-lo no fundo do tacho do andar de baixo. É o populismo alternativo. Com a novidade, será mais fácil aumentar as mensalidades, mais difícil marcar uma consulta e até impossível ter acesso a procedimentos mais complexos. Se os planos caros atendem mal, é fácil imaginar o mafuá que Barros produzirá.

A porta principal - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Há dois tipos de políticos: os que veem a política como negócio e os que defendem o bem comum. Essa era diferença entre a direita e esquerda no Congresso, até o PT assumiu o poder

Eis uma velha canção tropicalista que surgiu após os protestos de 1968 e a nuvem negra do Ato Institucional nº5, da lavra de Jards Macalé, com sua voz rouca e levada forte de violão: “Aos 15 anos eu nasci em Gotham City / Era um céu alaranjado em Gotham City / Caçavam bruxas nos telhados de Gotham City / No dia da independência nacional / Cuidado! Há um morcego na porta principal / Cuidado! Há um abismo na porta principal”. Foi lançada em 1969, no 4º Festival Internacional da Canção, e faz parte do disco Só Morto”. Uma alegoria da ditadura, o morcego era o Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.

Lembrei do morcego ao conversar com o líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), que denuncia: “Estão preparando um golpe dentro do golpe!”. O petista põe a culpa no presidente do PSDB, Aécio Neves (MG). “Ele criou essa situação ao não aceitar o resultado da eleição”, uma alusão à ação dos tucanos que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer. É que o ministro Herman Benjamin prepara o relatório sobre o caso para o julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com a tomada dos depoimentos dos delatores da Operação Lava-Jato, nove entre 10 juristas do país apostam no pedido de cassação de Temer.

500 anos da 'Utopia' de Thomas More

Livro de Thomas More lançado em 1516 descreve o sistema político ideal de uma ilha imaginária

Antonio Gonçalves Filho | O Estado de S. Paulo

Primeiro lançamento da coleção Clássica da Editora Autêntica, Utopia, de Thomas More, que completou 500 anos em 2016, chega às livrarias num momento de turbulência política e recessão econômica no Brasil, exatamente o que não existe na ilha modelar imaginada por More – uma sociedade em que tudo pertence a todos e a busca do bem comum é lei. Como no Brasil tudo funciona ao contrário – o que é um bem comum é de ninguém –, a palavra distopia parece fazer mais sentido aqui, lembrando apenas que, como escreveu o autor (de ficção científica) China Miéville num artigo publicado pelo jornal The Guardian, o utopismo não é esperança, muito menos otimismo, mas uma necessidade e um desejo.

O desejo, claro, é o mesmo que motivou More a escrever seu clássico sobre os antípodas, traduzido no Brasil diretamente do latim por Márcio Meirelles Gouvêa Júnior, que considerou não só os aspectos políticos como os literários e históricos presentes na obra. Logo no início do primeiro livro de Utopia, assinala o tradutor, no trecho em que o narrador descreve seu encontro com o navegador português Rafael Hitlodeu, uma alusão literária aos primórdios da literatura ocidental revela esse desejo mimético de More, o de replicar os antigos relatos de viajantes (de Ulisses na Odisseia, por exemplo).

CLT é uma fábrica de conflitos judiciais – Editorial | O Globo

O resultado de se manter uma legislação trabalhista arcaica e onerosa é o desestímulo ao emprego formal e o incentivo a um improdutivo contencioso jurídico

Desembarcar de forma desavisada no longo debate que se trava sobre a modernização da anacrônica legislação trabalhista pode levar a equívocos. Motivos para atualizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não faltam. Na sua essência, trata-se de uma legislação forjada na década de 40, no Estado Novo de Getulio, inspirada no controle da sociedade pelo fascismo de Mussolini.

Assim tem sido, mesmo que o Brasil pouco industrializado daquela época haja mudado de patamar de desenvolvimento — e também de problemas. O próprio avanço econômico e a urbanização do pós-guerra teriam de levar a adaptações naquele modelo paternalista e, com o passar do tempo, desincentivador do emprego formal. Não foram feitas reformas de peso, e, para tornar tudo mais difícil nas relações trabalhistas, a revolução da microeletrônica e a internet, bases da fragmentação das linhas de produção, pulverizaram o que restava da ideia de emprego embutida na CLT, sob a proteção do Estado. Eis por que a legislação trabalhista foi convertida numa usina de litígios, dada a sua inadequação crescente à forma como funcionam os mercados globalizados. Mesmo com Trump na Casa Branca.

No mesmo bolo – Editorial | Folha de S. Paulo

Às vésperas da divulgação de uma nova lista de pedidos de inquérito contra políticos e autoridades, uma decisão do Supremo Tribunal Federal deu passo fundamental para o desenrolar dos processos da Lava Jato.

Os ministros da Segunda Turma do STF tornaram o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. No julgamento admitiu-se, pela primeira vez na corte, que doações legais de empresas a candidatos poderão ser consideradas formas disfarçadas de propina.

Raupp recebeu R$ 500 mil da Queiroz Galvão para sua campanha ao Senado em 2010. Conforme indícios apresentados pela Procuradoria-Geral da República, os recursos seriam oriundos do esquema de desvios na Petrobras, tendo como contrapartida o apoio à permanência de um aliado da empreiteira na diretoria da estatal.

O erro de antecipar o processo eleitoral – Editorial | O Estado de S. Paulo

É compreensível que Lula da Silva queira antecipar o processo eleitoral de 2018, manifestando desde já sua disposição de concorrer uma vez mais à Presidência da República. Com tal gesto, o ex-presidente evidencia o duplo desespero que o move: o medo de ser condenado e preso e o temor de ver extinto o seu partido político, afogado no mar de lama que ele mesmo criou.

É estranho, no entanto, que essa antecipação do processo eleitoral também esteja sendo promovida por políticos que fazem parte da base aliada do governo federal. Recentemente, o governador Geraldo Alckmin afirmou sua pretensão de ser candidato à Presidência da República, ressaltando o óbvio: que a efetivação desse desejo depende da vontade do partido. Já tem ao menos um aliado para seu objetivo, pois, no mesmo dia, o prefeito João Doria disse que o governador de São Paulo é seu candidato ao Palácio do Planalto em 2018.

Um Ferreira Gullar íntimo e engraçado

Bolívar Torres | O Globo

O poeta em sua intimidade, descontraído e cheio de histórias engraçadas para contar. Este é o Ferreira Gullar capturado, há mais de 20 anos, pelo cineasta Zelito Viana no documentário “O canto e a fúria”. Em um dia de 1994, Zelito recebia o autor maranhense em casa; ao ouvi-lo conversando com amigos, teve a ideia de registrar o momento. Sem planejamento, sem microfone, quase numa operação de guerrilha, ele e o fotógrafo Walter Carvalho se apressaram para pegar uma câmera mini DV e se alternaram na gravação.

Durante 50 minutos, Gullar, morto em dezembro do ano passado, fala sobre sua arte, suas emoções e visão de mundo, repassando todas as fases de sua carreira. Editado e reunido em DVD, o depoimento informal passou apenas no Canal Brasil e só agora está sendo comercializado, como encarte de uma reedição especial, limitada e artesanal do último livro de Gullar, “Autobiografia poética e outros textos”, da editora Autêntica. Assim como o documentário, a obra, publicada originalmente em 2015, também revisita o universo do poeta através de um depoimento e duas entrevistas, uma de 1965 e outra de 2014.

— Durante os 50 minutos do documentário, é só a cara do Gullar o tempo inteiro, contando a vida dele — brinca Zelito. — E é um Gullar no auge da forma, falando na minha casa no Cosme Velho. Ele estava lá dando sopa, contando várias histórias para uma “plateia” de amigos, e eu e o Waltinho (Carvalho) resolvemos gravar. Algumas histórias são engraçadíssimas. Acho que as pessoas não conhecem esse lado engraçado dele.

Trem de Alagoas – Ascenso Ferreira

O sino bate,
o condutor apita o apito,
Solta o trem de ferro um grito,
põe-se logo a caminhar…

— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Mergulham mocambos,
nos mangues molhados,
moleques, mulatos,
vêm vê-lo passar.

— Adeus!
— Adeus!

Mangueiras, coqueiros,
cajueiros em flor,
cajueiros com frutos
já bons de chupar...

— Adeus morena do cabelo cacheado!

Mangabas maduras,
mamões amarelos,
mamões amarelos,
que amostram molengos
as mamas macias
pra a gente mamar

— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Na boca da mata
há furnas incríveis
que em coisas terríveis
nos fazem pensar:

— Ali dorme o Pai-da-Mata!
— Ali é a casa das caiporas!

— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Meu Deus! Já deixamos
a praia tão longe…
No entanto avistamos
bem perto outro mar...

Danou-se! Se move,
se arqueia, faz onda...
Que nada! É um partido
já bom de cortar...

— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Cana caiana,
cana roxa,
cana fita,
cada qual a mais bonita,
todas boas de chupar...

— Adeus morena do cabelo cacheado!

— Ali dorme o Pai-da-Mata!
— Ali é a casa das caiporas!

— Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...