quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Diferentemente do que disse Lula, familiar de juiz não matou Antônio Conselheiro em Canudos

Rodrigo Vizeu / O Globo

Não é verdadeira a declaração de Lula de que um parente do presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, matou Antônio Conselheiro, líder da revolta de Canudos, no fim do século 19.

Em ato na terça (16), o petista afirmou: “Esse cidadão é bisneto do general que invadiu Canudos e matou Antônio Conselheiro. Talvez ele ache que eu seja cidadão de Canudos”.

Foram três as incorreções do ex-presidente da República.

Segundo o TRF-4, Flores é na verdade sobrinho trineto de Tomás Thompson Flores.

Ele era coronel, e não general, quando foi morto em combate durante tentativa do Exército de subjugar o arraial baiano.

O militar, que também foi deputado federal no começo da República, foi morto em junho de 1897.

Conselheiro só morreria em setembro daquele ano.

Em “Os Sertões”, obra que tornou célebre o conflito em Canudos, Euclydes da Cunha escreveu sobre o trisavô do juiz: “Era um lutador de primeira ordem. Embora lhe faltassem atributos essenciais de comando e, principalmente, esta serenidade de ânimo, que permite a concepção fria das manobras dentro do afogueamento de um combate –sobravam-lhe coragem a toda a prova e um quase desprezo pelo antagonista por mais temeroso e forte, que o tornavam incomparável na ação”.

Em seguida, Cunha faz o relato que levou à morte do militar, que, impetuoso e descuidado, avançou sobre os inimigos identificado como oficial, tornando-se alvo fácil.

“A sua brigada investiu, batida em cheio pelos fogos diretos do inimigo entrincheirado; e, quase cem metros da posição primitiva, a vanguarda desenvolveu-se em atiradores. O coronel Flores que, a cavalo, lhe tomara a frente, descavalgou, então, a fim de pessoalmente ordenar a linha de fogo. Por um requinte dispensável, de bravura, não arrancara dos punhos os galões que o tornavam alvo predileto dos jagunços. Ao reatar-se, logo depois, a avançada, baqueou, ferido em pleno peito, morto.”

Tendo à frente Conselheiro e seu rígido messianismo católico, o movimento de Canudos ficou famoso não apenas graças a Euclydes da Cunha, mas pela façanha dos revoltosos miseráveis de rechaçar seguidas ofensivas do Exército brasileiro.

A então jovem República ganhou a opinião pública ao vender Conselheiro e seus seguidores como fanáticos ligados a um plano para restaurar a monarquia.

O experimento comunal de Canudos, que atraiu sertanejos empobrecidos da região, e a repressão dele pelos militares fez com que, décadas depois, o líder da revolta fosse resgatado como ícone na esquerda brasileira.


AVÔ NO SUPREMO
Além de parente do coronel de trágico fim, o presidente do TRF-4 é neto do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Thompson Flores.

Nomeado para a corte pelo presidente Costa e Silva, segundo militar a comandar o país sob a ditadura militar, o ministro Flores guarda em sua biografia críticas ao regime.

Em 1977, ano em que assumiu a presidência do STF, ele defendeu o fim das restrições contidas nos atos institucionais. Voltou ao tema no ano seguinte, quando disse esperar para breve o fim do AI-5.

Nenhum comentário:

Postar um comentário