terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Míriam Leitão: De olho na política

- O Globo

Se os juízes do TRF-4 votarem de forma unânime confirmando a condenação do ex-presidente Lula, os recursos que os advogados do ex-presidente apresentarem não terão efeito suspensivo da pena. Sendo assim, ele estará, muito provavelmente, fora da disputa. Na ligação intensa entre economia e política, o próximo dia 24 está marcado em vermelho no calendário.

A economia sempre tem efeito sobre as eleições. Este ano será o oposto. A disputa eleitoral deve produzir momentos de muita volatilidade cambial e provocar adiamento das decisões de investimento. A política também tornará o ano fiscal muito ruim. No fim de janeiro, o governo divulgará que as contas públicas de 2017 fecharam com alguma folga em relação à meta, mas aumentaram os temores sobre 2018.

Uma das primeiras más notícias nas contas públicas deve ser o anúncio de um contingenciamento de R$ 20 bilhões. E isso porque na política nada andou. O Congresso não aprovou as medidas de ajuste que permitiriam o Orçamento como ele foi pensado. Uma delas, a que adia o reajuste dos funcionários, foi barrada pelo ministro Ricardo Lewandowsky e isso eleva em R$ 5 bilhões as despesas. A receita com a taxação dos fundos exclusivos foi perdida porque a MP não foi aprovada.

A análise de cada um dos indicadores mostra melhora, mas a economia não está isolada. Ela faz parte de um contexto de extrema incerteza política. A primeira dúvida é quem estará concorrendo para presidente, o que só ficará claro ao longo dos primeiros meses. A segunda é como o Congresso vai se comportar diante da rigorosa agenda fiscal do país, que tem medidas impopulares e a reforma da Previdência para ser votada em fevereiro.

As projeções dos economistas são de que o ano terá o crescimento em torno de 3%. O governo ainda está com a projeção de 2,5%. Isso é melhor do que os últimos quatro anos em que houve estagnação, dois anos recessivos e um ligeiro crescimento. Mesmo assim é menos do que o país precisa para consertar a devastação que houve no mercado de trabalho. O desemprego deve cair na média do ano, ainda que tenha sempre a oscilação natural de um começo com alta da taxa e uma queda nos últimos meses. A inflação ficará baixa, mas subindo um pouco em relação ao ano de IPCA bem reduzido que foi 2017. A safra será boa, mas não tão abundante. Os juros devem continuar baixos, e um período prolongado de Selic reduzida ajudará a economia.

O que marcará o ano não será um ou outro indicador, mas sim o quadro político de uma forma geral. E a ligação será imediata. Por exemplo: o governo está contando com a privatização da Eletrobras. Se ela não acontecer serão R$ 12 bilhões a menos de receita e o governo terá que fazer outro corte nos gastos. A tensão interna, entre quem quer gastar mais por ser ano eleitoral e os que tentam controlar o caixa de um país em crise fiscal, vai aumentar ainda mais.

O que afetará mais diretamente a economia será o quadro da disputa eleitoral. Nos momentos em que estiverem na frente candidatos com discursos populistas e radicalizados, os ativos em bolsa e o dólar vão oscilar fortemente. A alta do câmbio sempre tem efeito na economia real porque contamina a inflação. A boa notícia é que o Banco Central está preparado, com reservas e baixa exposição ao dólar, para atuar no mercado, revertendo momentos de tensão e de alta exagerada.

Todas as eleições são incertas, mas essa será mais incerta que as outras. Por isso tem sido tão frequentemente comparada à de 1989. Mas até aquele ano inaugural das eleições diretas, pós-ditadura militar, não reflete inteiramente o grau de incerteza de 2018. Desta vez a dúvida será ainda maior. Se o ex-presidente Lula estiver concorrendo, a eleição será naturalmente polarizada desde o início. Num quadro de polarização, pode haver demanda por uma pessoa de centro, longe dos polos. O beneficiário dessa ida do eleitor em busca do centro não está definido. Se o ex-presidente Lula não estiver na disputa, os votos lulistas não serão transmitidos todos para a pessoa que ele apoiar. Devem se dispersar, formando o quadro fragmentado parecido com o de 1989. A economia passará este ano de olho na política, porque ela é que vai definir o cenário atual e futuro.

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