quinta-feira, 15 de março de 2018

Ribamar Oliveira: O desafio de fazer um déficit menor neste ano

- Valor Econômico

Receita em fevereiro teve forte alta, acima da previsão oficial

Neste início de ano, o comportamento da receita tributária continua surpreendendo o governo. Em fevereiro, a arrecadação de tributos administrados pela Receita Federal superou todas as expectativas e aumentou mais de 10%, em termos reais, na comparação com o mesmo mês do ano passado, de acordo com dados preliminares do Siafi, o sistema eletrônico que registra todas as despesas e receitas da União, aos quais o Valor teve acesso.

A arrecadação de tributos administrados pela Receita (excluindo a contribuição para a Previdência Social), líquida de restituições e incentivos fiscais, ficou cerca de R$ 3 bilhões acima da previsão do governo para o mês passado. A arrecadação bruta é a divulgada pela Receita Federal, geralmente na última semana de cada mês. A arrecadação líquida de restituições e incentivos fiscais é a que entra nos cofres do Tesouro Nacional para custear as despesas orçamentárias. Por isso, é ela que interessa ao governo.

O parcelamento de débitos tributários em condições vantajosas, conhecido como Refis, deu grande contribuição para a receita de fevereiro, como já havia ocorrido em janeiro. Mas a arrecadação do Imposto de Renda também aumentou muito, bem como a receita da Cofins.

Com o resultado de fevereiro, a arrecadação no primeiro bimestre deste ano apresentou forte alta real na comparação com o mesmo período do ano passado, ficando bem acima das projeções do próprio governo. Isto sinaliza que o governo poderá reduzir o contingenciamento de R$ 16,2 bilhões que promoveu, no início de fevereiro, nas dotações orçamentárias deste ano. Do total, R$ 8 bilhões se referem ao contingenciamento propriamente dito. Outros R$ 8,2 bilhões foram bloqueados porque a receita prevista no Orçamento com a privatização da Eletrobras é considerada incerta. Se a privatização for aprovada, o governo irá desbloquear as dotações.

O excelente desempenho da arrecadação tributária no primeiro bimestre anima o governo e indica que o déficit primário das contas da União poderá ser menor do que a meta fixada para este ano. Mas possíveis frustrações na estimativa oficial da receita precisam ser consideradas. Uma delas já aconteceu e não tem como ser revertida, pois a medida provisória que mudava a tributação dos fundos exclusivos de investimento não foi aprovada no ano passado.

Outras duas medidas estão na dependência do Congresso: a reoneração da folha de pagamento de vários setores da economia e a privatização da Eletrobras. Mesmo se o projeto que reonera a folha for aprovado, com mudanças que reduzem o número de setores atingidos, a receita a ser obtida neste ano será pequena por causa da noventena. Uma alteração em contribuição social só entra em vigor 90 dias depois de publicada. O governo esperava obter R$ 5,8 bilhões com a reoneração, em termos líquidos, neste ano.

O projeto de lei que privatiza a Eletrobras conta com o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que pretende colocá-lo em votação. Mas, quanto mais se aproximam as eleições, maior o risco de que o projeto se transforme em tema das campanhas, dificultando a sua aprovação. Há, portanto, um enorme risco de que a receita de R$ 12,2 bilhões prevista no Orçamento com a privatização da estatal não ingresse nos cofres públicos neste ano.

A área econômica precisa, portanto, compensar essas frustrações, com outras receitas. O mais provável é que o governo concentre esforços na realização do leilão do petróleo excedente dos blocos do pré-sal cedidos à Petrobras, no processo de capitalização da estatal - a chamada cessão onerosa. Há todo tipo de previsão para o valor que será obtido no leilão, variando de R$ 75 bilhões a R$ 100 bilhões.

Uma parte dessa receita, no entanto, poderá ser utilizada para ressarcir a Petrobras, que alega ter pago a mais pela exploração dos 5 bilhões de barris de óleo que lhe foram cedidos. Assim, ainda não se sabe qual será a receita líquida que ficará disponível nos cofres do Tesouro.

A arrecadação a ser obtida no leilão pode ajudar a reduzir substancialmente o déficit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) deste ano, fixado em R$ 159 bilhões pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A questão é de fundamental importância, pois quanto menor o déficit, menor será a dificuldade do governo em cumprir a chamada "regra de ouro" das finanças públicas neste ano.

O Tesouro estima que as operações de crédito estão excedendo em R$ 208,6 bilhões as despesas de capital (investimentos, inversões financeiras e amortizações da dívida pública) neste ano, o que é proibido pela Constituição. Para evitar que isso ocorra, o governo prepara uma série de medidas, entre elas a desvinculação de algumas receitas depositadas na conta única do Tesouro no Banco Central, o cancelamento de restos a pagar, e a extinção e liberação para a União dos recursos vinculados ao Fundo Soberano do Brasil (FSB) e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND). Além disso, o governo espera que o BNDES pague antecipadamente R$ 130 bilhões dos empréstimos que recebeu do Tesouro.

Quanto menor for o déficit primário deste ano e maior a receita a ser obtida com as medidas fiscais em estudo, menor será a dependência do governo do pagamento antecipado do BNDES. Como disse ao Valor uma autoridade do governo, se tudo der certo, será possível guardar cerca de R$ 100 bilhões para ajudar a cumprir a "regra de ouro" também em 2019. No fim de agosto, o governo precisa encaminhar ao Congresso uma proposta orçamentária para o próximo ano que demonstre o cumprimento da regra.
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Com a surpreendente execução orçamentária em 2017, quando a despesa total da União ficou R$ 50 bilhões abaixo do limite fixado para o ano, o mecanismo do teto de gasto "ganhou mais um ano de existência", avalia um integrante do governo.

Ou seja: acreditava-se que, sem a reforma da Previdência Social e a não aprovação de outras medidas de ajuste pelo Congresso, o governo não cumpriria o teto de gastos já em 2019. Com o espaço criado no ano passado, o entendimento agora na área técnica é de que dá para o governo ficar dentro do limite de despesa no próximo ano.

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