sexta-feira, 25 de maio de 2018

Marina sem rede: Editorial | Folha de S. Paulo

Retórica de pré-candidata esbarra na questão de como obter apoio para seu eventual governo

A ex-senadora Marina Silva (Rede) tornou célebre, há tempos, o contraponto entre o aspecto pragmático da atividade política e aquilo que, segundo seu vocabulário, corresponderia ao lado “sonhático” de sua própria trajetória como militante ambientalista.

Pré-candidata à Presidência da República, que já disputou outras duas vezes, ela reapresentou, na sabatina realizada nesta quinta (24) por Folha, UOL e SBT, o lado utópico sem extremismo a que sua figura continua associada.

No que tange à gestão da economia, por exemplo, não se mostrou radicalmente contrária às reformas previdenciária e trabalhista —discordando, aqui e ali, de alguns dispositivos mais indigestos.

Foi mais enfática em sua condenação ao congelamento, por até 20 anos, das despesas orçamentárias federais, que na prática tende a impedir a expansão de programas em educação, saúde e segurança. Admitiu, no entanto, que os gastos exigem rígido controle.

Pode-se situar sua candidatura em uma oposição moderada ao governo Michel Temer (MDB).

Obviamente crítica das fragilidades do Planalto no plano da ética e da sustentação social, a postulante da Rede mostrou-se, como se sabe, a favor do impeachment da petista Dilma Rousseff e não manifesta nenhuma complacência com a sorte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem foi ministra.

A própria bandeira ambientalista, nas mãos de Marina Silva, não se agita contra o agronegócio: a própria necessidade de integração do Brasil aos mercados internacionais impõe, como assegura a pré-candidata, um respeito crescente às normas da sustentabilidade.

Como ocorre com qualquer outro postulante que se exclui dos arranjos fisiológicos em vigor, a retórica marinista esbarra na questão de como obter apoio parlamentar para seu eventual governo.

A tese, com terminologia habitualmente vaga nesse gênero de respostas, é a de que seria necessário “dialogar com a sociedade” e construir apoios interpartidários “em termos programáticos”.

O “novo”, aqui, parece frágil: fruto, sem dúvida, de uma atuação política que, com hora marcada para aparecer nas disputas presidenciais, carece de empenho na construção gradual de um partido e de bases na sociedade civil.

À Rede Sustentabilidade, ironicamente, falta uma rede de sustentação: talvez nisso a candidatura Marina se mostre ainda “sonhática”, apesar dos cuidados que permeiam todo o seu discurso.

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