sexta-feira, 29 de junho de 2018

Metas duvidosas: Editorial | Folha de S. Paulo

Governo fixa objetivo de reduzir a inflação, mas BC nem se aventura a sinalizar seus próximos passos

O resultado mais promissor dos ajustes econômicos dos últimos dois anos foi a queda da inflação a patamares mais próximos dos observados no mundo desenvolvido.

Graças à recuperação da credibilidade do Banco Central, à supersafra agrícola e —pelo lado negativo dos motivos— à permanência do desemprego elevado, o IPCA mostrou alta de apenas 2,95% em 2017, a menor taxa desde o 1,65% de 1998.

Há diferença sensível de circunstâncias entre os dois momentos. Vinte anos atrás, a estabilidade dos preços se amparava num controle insustentável da cotação do dólar, abandonado pouco depois da reeleição de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Agora pode-se crer, com algum otimismo, no amadurecimento da política monetária.

Está próximo de completar duas décadas o regime de metas de inflação, que, na maior parte desse período, fez-se acompanhar de seus princípios mais importantes: autonomia do BC para fixar os juros, livre flutuação do câmbio e divulgação transparente de resultados e projeções à sociedade.

Do ano passado para cá, deu-se o passo restante —e já tardio— de estabelecer objetivos mais ambiciosos para o IPCA. Em vez dos 4,5% anuais que vigoram desde 2005, o governo propôs buscar 4,25% em 2019, 4% em 2020 e, como se definiu há pouco, 3,75% em 2021.

Nada existe de extraordinário, ressalte-se, em tais percentuais. Nas economias maduras, trabalha-se em geral com 2%, e em países emergentes mais organizados, como Chile e México, com 3%.

Por um misto de ideologia e comodismo, esse movimento foi adiado pelos governos petistas —imaginava-se que, assim, seria possível adotar juros menos elevados. No entanto a tolerância com a inflação desorganiza o ambiente de negócios e não raro ocasiona consequências mais graves, como ocorreu na gestão de Dilma Rousseff.

Boas intenções à parte, restam dúvidas consideráveis quanto às condições objetivas de perseguir as metas fixadas para os próximos anos. Para início de conversa, não se sabe se o presidente a ser escolhido neste ano concordará com tal estratégia. Tampouco existe clareza acerca da evolução de fatores que podem influenciar os preços.

Neste momento, o BC nem mesmo se aventura a sinalizar os próximos passos de sua política, enquanto a cotação do dólar é impulsionada pelo mercado global e pela incerteza eleitoral doméstica.

Para o futuro, a incógnita é o reequilíbrio do Orçamento, do qual o país depende para dispor de uma moeda minimamente confiável.

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