sábado, 11 de agosto de 2018

Propostas de candidatos na economia têm difícil execução

Especialistas alertam para desafios implícitos nas medidas apresentadas durante o debate

Danielle Nogueira / Marcello Corrêa | O Globo

RIO — No primeiro debate entre presidenciáveis, temas econômicos dominaram as poucas propostas apresentadas. Mas muitas das sugestões são de difícil implantação, avaliam especialistas. Entre as mais improváveis, estão a de zerar o déficit público em dois anos apenas cortando despesas, e a promessa de tirar os 63 milhões de endividados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Uma depende de crescimento robusto. Outra, de uma ampla negociação com bancos, que nunca foi feita.

No encontro, Geraldo Alckmin (PSDB), Ciro Gomes (PDT), Henrique Meirelles (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) chegaram a expor metas ou medidas concretas. Outros candidatos, como Jair Bolsonaro (PSL), Marina Silva (Rede), Alvaro Dias (Podemos) e Cabo Daciolo (Avante) apenas esboçaram ideias, sem compromisso com números ou resultados.

A ideia de limpar o SPC é de Ciro Gomes (PDT). A medida seria uma forma de estimular o crescimento. Menos endividados, esses brasileiros poderiam voltar a tomar crédito, consumir e, assim, girar a economia.

Durante o debate, Ciro não detalhou a medida. Ontem, em agenda em São Paulo, ele explicou que uma das possibilidades seria liberar recursos dos depósitos compulsórios, que os bancos são obrigados a manter no Banco Central, para que as instituições financeiras reduzissem juros.

O analista Luis Miguel Santacreu, de bancos da Austin Rating, considera o plano de difícil aplicação:

— Seria uma interferência nas negociações. Dependeria da boa vontade dos bancos.

André Perfeito, economista-chefe da Spinelli Corretora de Valores vê outra via: oferecer desconto de dívidas dos bancos com o governo, para que as instituições repassem esse perdão aos endividados.

Na área fiscal, Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro afirmaram que vão zerar o déficit público em dois anos. O candidato do PDT afirmou que isso será possível se o “deixarem trabalhar”, mas não deu pistas de como será esse trabalho. Já Alckmin prometeu alcançar esse objetivo cortando despesas, sem aumentar impostos.

Na avaliação do ex-secretário de finanças da cidade de São Paulo Amir Khair, é inviável sair do vermelho num tempo tão curto só reduzindo gastos. A situação fiscal do país, diz, é impactada por três fatores: despesas, arrecadação e juros. Para acabar com o rombo nas contas, é preciso mexer nas três pernas.

— Um dos principais problemas é a pouca margem para cortes. O Orçamento da União é engessado. Só cerca de 10% dos gastos podem ser mexidos — afirmou Khair.

A meta fiscal deste ano é de déficit de R$ 159 bilhões, embora o governo já trabalhe com a possibilidade de ser um pouco menor.

Todos os candidatos destacaram a importância de gerar empregos. Ciro chegou a dar um número: 2 milhões de postos no primeiro ano. Neste século, essa marca só foi atingida em 2010 e 2011, quando a economia cresceu 7,5% e 4%, respectivamente.

— Seria uma previsão audaciosa, considerando a previsão de crescimento — observa Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil.

A reforma tributária é a proposta mais defendida, independentemente de posições ideológicas. Guilherme Boulos defendeu a atualização da tabela de IR para pessoa física e a criação do impostos sobre grandes fortunas. Embora previsto na Constituição, este último nunca saiu do papel, o que revela a dificuldade para regulamentá-lo.

Alckmin propôs a crianção do IVA, que reuniria outros tributos — ICMS, ISS, IPI entre outros. Ciro também defendeu essa proposta em outros eventos. Mas não será fácil aprovar a medida no Congresso. O IVA não está previsto na Constituição. Assim, para ser criado, o imposto único precisaria do apoio de dois terços dos parlamentares.

— Estados e municípios não estão dispostos a perder a autonomia para legislar sobre seus tributos — afirma Bianca Xavier, do escritório Siqueira Castro.

A criação de um fundo de estabilização para amortecer reajustes de combustíveis enfrentaria menos resistência. A ideia foi levantada pelo ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, candidato do MDB. A redução do preço do diesel foi a principal reivindicação da greve dos caminhoneiros.

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