segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Militares alinham-se à economia liberal

Por Andrea Jubé, Carla Araújo e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico

BRASÍLIA - No momento em que o país se prepara para um governo claramente liberal na economia, conduzida pelo time do futuro ministro Paulo Guedes, auxiliares do presidente eleito Jair Bolsonaro, com formação militar, já admitem um alinhamento com essa política econômica ortodoxa.

O "time de Chicago" deverá ganhar reforços: há mais dois nomes com a mesma formação no radar do futuro ministro: os economistas Roberto Fendt e Carlos Langoni. Até agora, são quatro os titulares da equipe econômica de transição com PhD em economia naquela universidade, incluindo Paulo Guedes. Quadros que ele, com bom humor, tem chamado de "Chicago Oldies".

Segundo um interlocutor de Guedes, o ministro tem no horizonte o nome do economista Roberto Fendt. Atual secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China, Fendt desponta como cotado para a presidência do banco do BRICS (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). No ano que vem, caberá ao Brasil indicar o novo presidente da instituição, cargo hoje ocupado pela Índia.

A eventual escolha de um economista responsável pela interlocução com empresários chineses soaria oportuna após as declarações anti-China de Bolsonaro, que geraram mal estar entre o Brasil e um de seus principais parceiros comerciais.

O segundo nome na mira de Guedes para reforçar a equipe, também com PhD em Economia pela Universidade de Chicago, é Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central no governo de João Figueiredo e consultor e analista econômico.

Num governo em que se consolidam dois grupos igualmente fortes - economistas liberais e militares, historicamente defensores da maior intervenção do Estado na economia, - caberá a Bolsonaro intervir, sempre que necessário, para equilibrar os interesses de ambos os lados. Há ressalvas da parte dos militares, por exemplo, quanto às privatizações.

O vice-presidente eleito general Hamilton Mourão é um dos quadros militares, com voz de comando no governo, que elogia a equipe de liberais de Guedes: "É um baita time, coerente com a nossa visão de mundo", disse ao Valor.

Lembrado do viés interventor na economia dos governos militares no passado, Mourão pondera que aquele era o modelo que prevalecia "na ocasião". O vice-presidente - que terá também papel de coordenador dos ministérios, - tem declarado, entretanto, que será preciso cautela nas privatizações, a serem feitas somente após estudos aprofundados, caso a caso.

Além de Guedes, Roberto Castello Branco, que comandará a Petrobras, e os presidentes indicados para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Joaquim Levy, e para o Banco do Brasil, Rubem Novaes, são formados na Universidade de Chicago, escola do monetarista Milton Friedman, que prega o livre mercado e a redução do Estado, com enxugamento da máquina pública e desestatizações.

É um contraponto aos 21 anos de governos militares, que foram marcados por uma política nacional desenvolvimentista, a qual proporcionou, com endividamento externo do setor público, grandes obras como a usina binacional de Itaipu, a rodovia Transamazônica, o complexo de usinas nucleares de Angra, além da criação da Embraer.

Um outro representante da ala militar do futuro governo também descarta confronto ideológico com a equipe de Guedes, alegando que os militares amadureceram sua visão de mundo. No entanto, diz que será exigida transparência absoluta nas privatizações. Cobra "honestidade de propostas" para evitar qualquer contaminação ou suspeita de favorecimento de empresas.

Este quadro militar pede, ainda, debates mais aprofundados nas hipóteses de privatizações de áreas estratégicas. "Não será uma sangria desatada nas privatizações", adverte. "Teve um tempo em que se considerava o Estado como o único capaz de fazer grandes obras, mas isso não é algo arraigado, temos a capacidade de evoluir", completa.

Instado pelo Valor a comentar se receava qualquer desconforto de seu time de Chicago Boys com a ala de militares, o ministro Paulo Guedes saiu-se com uma piada: "Estamos mais para Chicago Oldies". O chiste circula nos bastidores do gabinete de transição, e também foi replicado, na semana passada, pelo futuro presidente da Petrobras.

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