sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Murillo de Aragão:Nem Quadros nem Collor

Revista ISTOÉ

A história se repete como farsa, como disse Marx. Mas Bolsonaro não pode deixar de observar o que se passou com Quadros e Collor. Quando o passado fala, o presente deve ouvir e analisar para poder construir um futuro melhor.

A vitória de Jair Bolsonaro (PSL) nas urnas guarda relação com a eleição de dois ex-presidentes no Brasil: Jânio Quadros (1960) e Fernando Collor (1989). Características na trajetória política de ambos lembram a de Bolsonaro: surpreenderam o mundo político e eram percebidos pelo eleitorado como outsiders da elite política da época.

Ambos também chegaram ao poder com bases políticas não tradicionais e discursos que capturaram os anseios dos eleitores. Quadros fez um governo de apenas sete meses. Em meio a uma crise temperamental, renunciou achando que o povo forçaria o seu retorno ao cargo com poderes ampliados. Não aconteceu. Collor fez um governo de pouco mais de dois anos até sofrer um impeachment por conta de graves acusações de corrupção.

Nos dois casos, apesar de os motivos da saída do poder terem sido diferentes, houve uma raiz comum: a falta de apoio no Congresso Nacional. Problema que também vitimou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que, tal como Collor, sofreu impeachment em 2016.

Considerando as identidades de trajetória com Quadros e Collor, Bolsonaro corre o risco de sofrer impeachment? Ou de ter sua governabilidade fortemente tolhida a ponto de o país viver nova crise institucional?

Apesar das características em comum, Bolsonaro parte com uma base de apoio significativa no Congresso. Cerca de 260 deputados e 39 senadores devem apoiar, de início, o seu governo. Portanto, o novo presidente deve encontrar condições bastante razoáveis para usar bem o período de graça que os parlamentares e a sociedade oferecem aos presidentes recém-eleitos. Bolsonaro conhece os meandros do Congresso e sabe como transitar por lá. Tal fato o diferencia em muito dos demais.

Outro fato positivo é que Paulo Guedes, o ministro da Fazenda de Bolsonaro, tem melhor equipamento para gerir a economia do país do que os ministros dos presidentes mencionados. E o Brasil de hoje tem, sem dúvida, aspectos estruturais mais sólidos dos que os da época de Quadros e Collor. Caso a economia reaja positivamente já no início do governo, as chances de êxito aumentam significativamente.

Assim, tanto na política quanto na economia Bolsonaro sai em vantagem e com um horizonte positivo. Porém, seu sucesso como presidente vai depender de suas respostas a três desafios: organizar o governo e sua base política com pessoas capazes e competentes que tenham credibilidade perante os agentes econômicos e o Congresso; saber se comunicar de forma eficiente para minimizar os ataques que sofrerá de parte relevante da grande imprensa; conter eventuais radicalismos dos aliados com mais adrenalina, a fim de não alimentar o noticiário com polêmicas.

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